Empreendedor foi abandonado durante a pandemia

A globalização, a política neoliberal dos anos 1990, alavancou o empreendedorismo no Brasil. Com Fernando Collor de Mello na presidência da República houve entrada de capital de fornecedores estrangeiros e aumento da competitividade resultantes da abertura econômica. Os produtos importados passaram a invadir o mercado brasileiro, com a redução dos impostos de importação. A indústria brasileira desce a ladeira.

Para o sociólogo Ricardo Antunes, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), o empreendedorismo é um “mito”, que se fortalece em meio ao alto desemprego, enfraquecimento das políticas sociais do Estado e às novas tecnologias.

Como empreender em um país que destrói sua educação, pesquisa científica, saúde, cultura, meio ambiente, direitos humanos, política externa independente, a indústria nacional, deixa de criar riqueza e emprego, o capital deixa de ser produtivo e foge para o mercado financeiro, conforme sintetiza muito bem o sociólogo Liszt Benjamin Vieira.

Mesmo neste ambiente inóspito, os microempresários encheram os pulmões se assumiram como empreendedores. Passaram chamar os antigos patrões de clientes e foram cercados por coaches. Adotaram o discurso neoliberal das entidades empresariais e acreditaram que seriam tratados como seus “colegas” do andar de cima.

Veio a pandemia do novo coronavírus e com ela o Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Pese), que reservou R$ 40 bilhões – R$ 34 bilhões do governo e R$ 6 bilhões de instituições financeiras – para pagamento da folha de salários de pequenas e médias empresas. O dinheiro é para financiar, no máximo, dois salários mínimos por trabalhador.

A empresa tem seis meses de carência e 36 meses para pagar o empréstimo, com os juros de 3,75% ao ano. A ideia era preservar empregos, mas somente empresas com faturamento anual de R$ 360 mil a R$ 10 milhões, ou seja, quem fatura no mínimo R$ 30 mil/mês. E era um empréstimo que o empreendedor teria que pagar após o período de carência.

Os bancos criaram uma série de obstáculos para o empreendedor conseguir o dinheiro. Até agora foram liberados R$ 1,6 bilhão em empréstimos, apenas 4% dos recursos. A “morte de CNPJs” está cada vez mais evidente.

Levantamento feito pelo Sindicato de Micro e Pequenas Indústrias do Estado de São Paulo (Simpi) mostrou que 87% das micro e pequenas indústrias não tiveram acesso à crédito e que 75% acreditam que as medidas anunciadas não estão chegando a seus negócios.

Enquanto isso, o Banco Central lançou um conjunto de medidas para aumentar a liquidez do Sistema Financeiro Nacional (SFN) em R$ 1,2 trilhão, com o objetivo de garantir que as instituições financeiras tenham recursos para atender às demandas do mercado e nenhuma contrapartida. Reduziu a alíquota do compulsório sobre recursos a prazo nos bancos de 25% para 17%.

Além disso, o presidente Jair Bolsonaro sancionou com vetos nesta segunda-feira (18) a lei que concede uma linha de crédito para pequenas e microempresas enfrentarem os efeitos da pandemia. Só que o Palácio do Planalto barrou quatro dispositivos do projeto original, aprovado em abril pelo Congresso. Um dos vetos acaba com a carência de oito meses para que os empresários comecem a pagar o empréstimo.

O Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) prevê uma linha de crédito até o limite de 30% da receita bruta obtida em 2019. São R$ 15,9 bilhões, que devem ser usados para “o desenvolvimento e o fortalecimento dos pequenos negócios”.

O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS), Gilberto Petry, sugeriu, ao participar de uma live com o vice-presidente da República general Hamilton Mourão, que o governo federal crie um fundo para socorrer diretamente as empresas, com linha direta, de R$ 40 ou 50 bilhões. A ideia, segundo Petry, é “irrigar a economia” brasileira em um momento tão crítico, abalada pela forte crise provocada pela pandemia do coronavírus, sem precisar passar pela burocracia das instituições bancárias.