Agricultura biodinâmica estimula a produção de alimentos sem agrotóxicos

O evento híbrido aconteceu no sítio sustentável Quinta das Jabuticabeiras, em Viamão | Foto: Divulgação

“A sociedade está ainda aceitando alimentos contaminados, mas chegará o dia que dirá não aos produtos com agrotóxico”, acredita o agrônomo formado pela UFRGS, mais de três décadas produzindo arroz biodinâmico, João Volkmann. Ele afirma que a biodinâmica promove o renascimento de um conhecimento que dispomos. “Isso é o que a gente traz com o conhecimento da Antroposofia – do grego conhecimento do ser humano -, que seria o uso filosófico da biodinâmica.”

Dados do Ministério da Economia apontam que o Brasil importou 335 mil toneladas de agrotóxico em 2019. O número representa recorde em uma marca histórica iniciada em 1997 e crescimento de 18% em relação a 2018. Ao todo, a importação desse tipo de produto aumentou 11 vezes desde 2000.

Volkmann participou virtualmente de um evento híbrido no sítio sustentável Quinta das Jabuticabeiras, em Viamão, que promoveu uma saudação à primavera e ao Dia da Árvore, com uma conversa sobre o tema “Uma visão da natureza na ótica da biodinâmica”. O mediador do encontro, que aconteceu no sábado, 19/9, foi o jornalista José Barrionuevo, com produção e organização da Storia Eventos. Os convidados presenciais, professor titular do departamento da Horticultura e Silvicultura da Faculdade de Agronomia da UFRGS, Paulo Vitor Dutra de Souza, e o formando da Faculdade de Agronomia da UFRGS, Marcelo Pedroso, respeitaram todos os protocolos de segurança de saúde.

A agricultura biodinâmica nasce em 1924, a pedido de agricultores que sentem uma perda de fertilidade do solo e de vitalidade nas sementes. O movimento biodinâmico originou-se de uma série de oito conferências ministradas por Rudolf Steiner em 1924, em Koberwitz, Alemanha (atualmente localizada na Polônia). Os produtores buscaram o austríaco Steiner porque ele vinha trazendo muitas novidades em várias áreas do conhecimento humano. Nas conferências ele apresenta uma nova concepção de mundo.

Segundo Volkmann, Steiner não citou a biodinâmica nas conferências, mas conhecimentos científicos e espirituais para o prosperar da agricultura. Ele imaginava a possibilidade de fazer agricultura de tal forma que a produção fosse para alimentar o ser humano em harmonia com a natureza. “A árvore, por exemplo, está num estado de meditação tão profundo, que devemos alcançá-la para nos comunicarmos com ela. Assim, tentar compreender esse ser tão especial, que nos protege e nos alimenta.”

Um exemplo possível de aplicação da biodinâmica acontece no município de Santa Vitória do Palmar, localizado no sul do Rio Grande do Sul, na divisa com o Uruguai. Por ele se conecta um corredor de espécies provenientes do ecossistema Chaco, entre elas o Butia odorata. O nome Palmar tem origem na grande quantidade de palmeiras historicamente existentes na região. “Infelizmente, o butiá, da família das palmeiras, está em extinção no lado brasileiro, devido a pressão que o agricultor teve que exercer sobre a natureza para extrair o máximo possível e esqueceu da paisagem produtiva. Só atravessando a fronteira com o Uruguai é possível encontrar uma área plantada com butiás”, explicou Volkmann.

Para ele, é possível recompor a paisagem naquela região e torná-la produtiva. “Esta é a ótica que a biodinâmica poderia trazer no momento que decidirmos que na região não entra mais insumos de fora. O agricultor terá que utilizar o que tem dentro desse organismo. Essa encosta da lagoa pode ser autossuficiente na fertilidade do solo, sem fazer esse transporte enorme de substâncias que geram gastos e energia, quando o homem tenta ser mais inteligente do que a natureza.”

Esse é o desafio da biodinâmica, conforme ele. A recomposição de paisagem. “O húmus é o fruto de tudo que aconteceu durante o verão. Na primavera as folhas crescem, desenvolvem, maturam e depois no outono caem na terra. Nesse destruir da folha pela microvida do solo surge a substância escura que é o húmus, como se fosse a sabedoria que as plantas captaram durante todo o período de primavera e verão. “Imagens cósmicas, estrelas, fenômenos todos plasmados na folha. Isso tudo cai no solo e fica guardado como um segredo, que é desvendado pela vida no solo e impulsiona a brotação nova no ano seguinte.”

Segundo Volkmann, a fertilidade do solo depende do que aconteceu no ano anterior. No caso das culturas anuais, quanto de carbono foi guardado e liberado através do solo, fornecendo energia, até que a planta possa surgir novamente. “Observar esses fenômenos é um grande exercício para compreender toda essa metamorfose. É um exercício que temos que desenvolver no nosso pensar.”

Os chineses dizem que a agricultura é a arte de cultivar o sol. O ser humano pode tocar a natureza e tornar essa arte mais aprimorada do que ela já em si. Para Volkmann, é uma sinfonia muito complexa que nós no alçamos a dissecá-la e entendê-la, mas sempre escapa da nossa capacidade de compreensão. “Talvez seja possível se permitirmos ao nosso coração entrar no processo do pensar e nessa forma amorosa desvendar como a natureza se forma.”

No final do século 1700, início de 1800, o ministério da Agricultura estava junto com do ministério da Educação. Volkmann lamenta que fomos dissecando e hoje o ministério da Agricultura está separado da Educação. “É agricultura. É cultura que estamos construindo juntos.”

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