Jornalista mostra que ministro do Meio Ambiente mente para justificar suas teses

A palavra não foi usada. Mas é disso que se trata: a jornalista Miriam Leitão, em sua coluna no Globo deste domingo, mostra que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não hesita em mentir e manipular dados estatísticos, para sustentar suas teses sobre desmatamento, uso de agrotóxicos e outras questões ambientais.
Vale conferir:
O ministro Ricardo Salles gosta da frase “não é bem assim” para responder a qualquer argumento do qual discorde. Mas a frase é perfeita para o que ele diz. Segundo Salles, havia um terço de ONGs no Comitê Orientador do Fundo Amazônia. É falso.
Ele diz que o desmatamento “se estabilizou” entre 2004 e 2012, mas na verdade despencou 70%. Afirma que está havendo muita liberação de agrotóxicos porque nos anos anteriores eles ficaram retidos por ineficiência da Anvisa.
No ano passado, de janeiro a 24 de junho, foram 193 produtos liberados. Este ano, no mesmo período, foram 239. Houve aumento, mas nada estava parado nos últimos três anos.
Com números e fatos imprecisos, o ministro monta teses insustentáveis. Numa entrevista na Globonews, diante de uma pergunta sobre o desmatamento, ele respondeu:
— Vamos lá, o Brasil tem 5 milhões de quilômetros na Amazônia. A quantidade de quilômetros desmatados no ano passado foi ao redor de oito mil. Dá zero vírgula zero vírgula dois por cento. Percentualmente, já temos um desmatamento zero. É a terceira casa decimal depois do zero. Isso tem que ser dito com todas as letras —respondeu.
É preciso dizer, com números e letras, o quanto o ministro errou aqui. Inventou duas vírgulas seguidas depois do zero. Não é a terceira casa decimal.
Depois, ele corrigiu para 0,16%, mas o problema é que a ideia é toda descabida. Nas redes sociais, foram feitos cálculos sobre o absurdo do raciocínio, mostrando que se a mesma conta for feita com os 61 mil homicídios pelos mais de 200 milhões de habitantes o país teria homicídio zero.
Dá para fazer sumir todos os problemas se a gente quiser brincar com os números.
A verdade é que o desmatamento, após ação decisiva do governo, caiu de 27 mil km2 em 2004 para 4,5 mil em 2012. Daquele ano em diante, o governo iniciou as hidrelétricas na Amazônia, reduziu o tamanho de unidades de conservação e deu outros sinais que levaram ao aumento da perda anual da floresta. E neste junho subiu 88% em relação a junho passado.
Durante a entrevista ele repetiu várias vezes haver uma ligação entre combate ao desmatamento e pobreza na Amazônia ou então a pobreza como causa do desmatamento. Não faz sentido nem uma coisa nem outra. O Brasil teve um crescimento do PIB mais forte no período em que o desmatamento caiu, e mesmo na recessão ele subiu.
— Quando se deixa o morador numa situação de ilegalidade, ou de asfixiamento econômico, ele não verá o filho dele morrer de fome sem tentar gerar alguma receita para si próprio —disse Salles.
Não são os pobres que fazem isso. É preciso capital para ter trator, correntão e caminhão para escoar. Ele sabe, porque contou de um flagrante que deu em São Paulo, quando era secretário, em que foram retidos cinco caminhões e tratores.
Segundo o ministro, “de maneira irresponsável” criou-se no Brasil unidades de conservação, englobando terras onde já havia produção:
— Quem delimitou desconsiderou as áreas produtivas, ignorou essas pessoas, deu o calote nessas pessoas.
Na verdade, 95% das Unidades de Conservação criadas na Amazônia foram em terras públicas. Quem estava lá não deveria estar. De qualquer maneira, é fácil saber quem estava antes da criação com o histórico das imagens de satélite.
Os embaixadores da Noruega e da Alemanha não concordaram com a nova formação do Comitê Orientador do Fundo Amazônia e pediram nova proposta. O ministro diz que dissolveu o Comitê porque um terço é formado por ONGs. O fato: menos de terço é a sociedade civil. Aí se inclui CNI, Contag, SBPC, a indústria de madeira. E tem também um fórum de ONGs e outro de associações indígenas. Esses 2 seriam 8,3% dos 24 membros.
O ministro atribui as críticas vindas da Europa ao medo dos concorrentes do agronegócio. A Europa é protecionista, mas não produz o suficiente. Não é competidora, mas sim cliente. O segundo maior. Salles diz que há uma campanha contra o Brasil e que “um dos maiores focos de detratores são entidades, autores e pessoas do próprio Brasil”. Esse era o mesmo raciocínio usado na ditadura para atacar quem dizia que havia tortura no país. Está na hora de o ministro se reconciliar com números, fatos e conceitos.
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)
 

Um comentário em “Jornalista mostra que ministro do Meio Ambiente mente para justificar suas teses”

  1. De que modo conciliar preservação ambiental com necessidade de terras para o desenvolvimento? o que acarretaria se a mata fosse trocada por algo produtivo como outro tipo de árvores, assim como aconteceu no Jari, empresa que trabalhei como projetista no ano de 1974. em uma área de aproximadamente 100 mil hectares, foi passado o correntão , Catterpillars D9’s fizeram o enleiramento, depois de seco foi queimado e nesta área desmatada foi plantado uma árvore chamada Gmelina, que mais tarde foi substituída pelo Pinus e pelo eucalipto. Hoje há lá a Jari Celulose que gera empregos a milhares de pessoas na região.
    Não há outro modo de se preservar a floresta mas com algo que traga benefícios econômicos para a região? as matas hoje se tornaram algo meio endeusado.

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