Na exceção

Fernando Risch*
Quando Marielle Franco, vereadora eleita no Rio de Janeiro – com 46 mil votos, a quinta mais votada – é assassinada com quatro tiros na cabeça, quem está seguro?
Quando uma pessoa pública, ativa, forte, denunciante é executada brutalmente, sem que os agressores se importem com as consequências e repercussões, é porque não vivemos mais num estado democrático de direito. Estamos na exceção.
Marielle Franco era relatora da Comissão da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro que acompanhava a intervenção federal na segurança do Estado. Sua posição era contrária à medida. No dia 13 de março, a vereadora postou em seu Twitter: “Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. Matheus Melo estava saindo da igreja. Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?”.
No dia 14, denunciou abusos em Acari: “Precisamos gritar para que todos saibam o está acontecendo em Acari nesse momento. O 41° Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari”. Antes mesmo da denúncia, pessoas eram ameaçadas caso expusessem tais abusos. Ela teve a coragem de fazer.
E como se a barbárie em si não bastasse, ainda há de se ler que a culpa foi dela, que ela foi morta “pelos bandidos que tanto defende”, como se Marielle, por ser ativista de direitos humanos, defendesse algum bandido; e como se uma perseguição, seguida de uma execução com quatro tiros na cabeça e nove disparos – vitimando também seu motorista, Anderson Gomes –, fosse uma tentativa de furto, um mero latrocínio perpetrado por trombadinhas.
Há de ser muito estúpido, idiota e mau caráter para formular tese tão pequena, mesquinha e ideologicamente manipulada; há de ser um alienado completo, uma sombra de vida, um fantasma de pensamentos, para acreditar num conto de fadas imbecil; há de ser o maior néscio a pisar na terra e de ser cúmplice da barbárie, justificando o injustificável e passando a mão na cabeça dos assassinos, se tornando aquilo que acusavam Marielle Franco de ser: defensor de criminosos.
Para gente assim, quando a onda engolir, não saberão de onde veio. Quando uma pessoa pública, ocupando cargo público, representando ativamente muitas pessoas, é assassinada, quem não pode ser? O estúpido que passa pano para a barbárie, que diminui a morte de Marielle a um mero acaso, não saberá quando for tragado pela maré.
A verdade precisa aparecer e que nenhum comandante com ares de generalíssimo, defensor de regime de exceção, venha querer barrar a justiça de ser feita e de termos os culpados condenados. Sem sindicância obscura. Sem investigação sem conclusão. Se esses passarem impunes, o Brasil acabou – mais uma vez. Que não temam a verdade, seja ela qual for.
*Escritor

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