O muro de Natal e os territórios da criminalidade

PINHEIRO DO VALE
O “Muro da Vergonha” assenta seus primeiros tijolos.
Não se trata do muro da vergonha do Donald Trump para separar os Estados Unidos do México, mas refere-se ao “muro” do Michel Temer, que seu ministro da Justiça, Alexandre Morais, mandou levantar dentro da Penitenciária de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte, para separar o país do Primeiro Comando da Capital (PCC) da nação do Comando Vermelho (CV).
Do lado de fora das muralhas da penitenciária, a Força Nacional (também chamada de “farsa nacional”, devido à sua inutilidade prática) assegura a Constituição da República Federativa do Brasil.
Em espaço exíguo temos três estados diferentes, numa área inferior aos 0,44 km² do Vaticano, até então o menor país do mundo.
PCC e CV constituem, nos subúrbios de Natal, frações dos “estados do crime”, como se definem em suas constituições escritas, territórios demarcados, com força para serem reconhecidos, pois têm povo, limites, legislações e pleno domínio dos territórios.
O CV, no Rio de Janeiro, é senhor absoluto e indiscutível de territórios e tem sob sua legislação uma população de mais de dois milhões de pessoas.
O PCC, em São Paulo, tem um a área maior e uma população de três milhões de habitantes. Em outros lugares, os estados do crime têm outro tanto ou mais.
Esses “países” têm uma população maior que o Uruguai, mais gente que o Paraguai; detêm cerca de 0,5% da população da República Federativa do Brasil. Não é pouco.
Com isto, chega à América do Sul um modelo legal semelhante ao implantado pelo pelos fundamentalistas do Estado Islâmico nas porções do Iraque e Síria, em que tribunais próprios implantaram um código penal baseado da sharia primitiva do Século IX, com degolas e suplícios aos incréus.
Nos países do PCC e CV os “tribunais da criminalidade” impõem seu código penal nos moldes da Europa nos tempos bárbaros do Século V. Com suas tábuas de leis escritas, esses tribunais do crime têm um colegiado de juízes, defensores e acusadores, absolvendo os inocentes ou condenando os culpados a penas de morte cruel, esquartejamento, tortura ou mutilação.
Assim como no cenário político partidário do Brasil, as grandes facções criminosas abrigam mini facções que, tal qual as legendas de aluguel, gravitam em torno dos grandes comandos. Só PCC e CV têm diretórios em todos os estados.
Recentemente surgiu uma nova federação, a Família Do Norte (FDN), que atua na Bacia Amazônica e em alguns estados do Nordeste.
A FDN traz uma novidade, que é a articulação internacional, pois vem associada aos remanescentes das FARC da Colômbia que, recusando-se à pacificação política, decidiram se manter no tráfico de drogas.
A FDN e os dissidentes das FARC abriram a “rota do Solimões”. Esta rota abriu-se com a fragilização da ligação direta dos carteis colombianos com os mercados consumidores da América do Norte e Europa.
No Sul, sob coordenação do PCC, estabeleceu-se o Narcosur, que, segundo o jornal uruguaio El País, tem sede em Montevidéu, associando cartéis Argentinos, Bolivianos, Brasileiros, Paraguaios e Uruguaios.
O Narcosur é comandado pelo brasileiro Marcos Willian Herbas Camacho, o Marcola.
Segundo denunciou a polícia paraguaia dia 25 de janeiro, o crime multilateral está operando seu suprimento numa ação conjunta do PCC com a facção gaúcha Bala na Cara, que tem seus escritórios no Presídio Central de Porto Alegre.
O Muro da Vergonha do presidente Trump visa impedir não só a imigração ilegal, mas também o contrabando (de drogas e mercadorias) do México para os Estados Unidos. É uma providência de resultados duvidosos.
No fim do século XIX sugeriu-se que se fizesse uma muralha humana entre o Rio
Grande do Sul e o Uruguai, ao que reagiu, incrédulo, o senador Gaspar Silveira Martins: “Se botar um soldado ao lado do outro por toda a fronteira, a contrabando passa pelo meio das pernas”.

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