Porto Alegre precisa de um plano diretor de arborização

As podas radicais feitas nas árvores da capital pela CEEE, por delegação da Prefeitura, estão ferindo o sentimento dos portoalegrenses afeiçoados ao paisagismo estabelecido em avenidas e ruas da cidade desde os festejos da Revolução Farroupilha (1935), quando as autoridades municipais mandaram plantar diversas mudas (então pequeninas, como todas as plantas jovens) de espécies vegetais de grande porte.
Uma das marcas daqueles tempos festivos são as majestosas palmeiras plantadas nos canteiros centrais de algumas avenidas. Outra, as tipuanas que sombreiam ruas inteiras como a Marquês de Pombal e a Gonçalo de Carvalho. Isso para não falar dos alfeneiros, cinamomos, jacarandás e plátanos espalhados por alguns bairros mais antigos, onde os voluntários da arborização se esmeraram na ocupação dos espaços disponíveis com mudas que, por gosto ou acaso, lhes caíam nas mãos.
Para o bem e para o mal, as árvores crescem, suas raízes levantam calçadas, seus troncos elevam galhos acima dos telhados, folhas e frutos “sujam” os passeios, eventualmente algum galho tomba sobre alguém distraído e a população se divide entre a condenação do mundo vegetal e a piedade sobre os infelizes humanos acidentados.
Deu no que aí está: sem um plano diretor de arborização ou paisagismo, a prefeitura entregou a gestão do acervo arborial à concessionária de energia, que naturalmente encara as árvores como estorvos à normalidade do serviço e fontes de prejuízos.
Os cortes executados pela CEEE atingem todos os espécimes que ousam colocar acima de cinco metros de altura. São mutilações que concorrem para acelerar o fim de  abacateiros, angicos, espatódias, flamboyants,  grevíleas, guapuruvus, ipês, mangueiras, paineiras, plátanos, paus ferro, pinheiros e sibipirunas — árvores efetivamente mais apropriadas para parques e jardins do que para calçadas ou canteiros.
A poda deveria ser uma ação humana inteligente, a favor da vegetação.  Aqui e ali cabem intervenções para corrigir distorções ou evitar acidentes. Na maior parte dos casos, as próprias árvores se desfazem de galhos que não lhes servem. Além disso, as árvores, como os animais, têm limite etário. Raras espécies frutíferas ou ornamentais atingem 100 anos. Aos poucos, vão se deixando aniquilar pelas intempéries. Nessa fase senil, são mais perigosas porque seus galhos são muitos pesados. Se apodrecem ou são derrubados pelo vento, os galhos podem causar danos graves em que estiver por perto. Por isso, é fundamental que os responsáveis pelo paisagismo urbano providenciem a paulatina substituição de árvores-gigantes por espécies cuja altura não exceda seis metros de altura. Se o prefeito Fortunati jogou a toalha, talvez Marchesan chegue com ânimo para mudar o panorama paisagístico da capital. Em quatro anos, com sensibilidade e bom senso, dá para iniciar a reciclagem do verde em Porto Alegre.
Nas calçadas sem postes de fiação, é possível manter por longo prazo espécies vegetais de grande porte. Nos passeios com postes, é recomendável que sejam plantadas, com um adensamento capaz de prover o sombreamento das calçadas, sem risco de acidentes graves com os pedestres, as seguintes árvores: acácia, araçazeiro, bico-de-papagaio, cafeeiro, camelieira, cocão, pata de vaca, bergamoteira, extremosa, hibisco, jasmineiro do Havaí, laranjeira, leiteirinho, leucena, limoeiro, primavera, pitangueira e quaresmeira.
Com essas e outras espécies de pequeno porte, ficará claro que a arborização e a fiação são compatíveis, desde que se tenha critério na adoção de um programa de fomento ao paisagismo consciente.
Já ficou suficientemente provado que ninguém está disposto a enterrar os cabos de transmissão de eletricidade e sinais, como manda uma lei aprovada anos atrás pelos vereadores. Além de incorrer em custos elevados, a troca da fiação aérea por dutos subterrâneos provavelmente acirraria as disputas por espaços entre os concessionários de serviços. Além das tradicionais tubulações de água e esgotos do DMAE, a cidade está recebendo os dutos da Sulgás. Em algumas áreas, há cabos telefônicos mantidos por herdeiros da CRT, que também alugam postes da CEEE para atender usuários de telefone e TV a cabo. Isso sem falar dos sinais de trânsito da EPTC.
Numa cidade à beira de um lago e sujeita a cheias, enterrar toda a fiação aérea seria transferir para baixo da terra a parafernália que se vê nos postes de luz. Melhor deixar como está e as árvores que se adaptem ou saiam do caminho.

Um comentário em “Porto Alegre precisa de um plano diretor de arborização”

  1. É a infra-estrutura urbana que deve adaptar-se às árvores. Aliás, é o excesso de prédios e o superadensamento populacional que gera “ilhas de calor” que, por sua vez, contribuem para as tempestades nos grandes centros urbanos brasileiros e que serão cada vez mais freqüentes devido justamente à falta de arborização. No mais, sugiro ao jornalista que sobrevoe bairros “nobres” em cidades como Nova York e Berlim e veja como eles parecem uma floresta. Falta de arborização é algo associado a pobreza, ignorância e imbecilidade! Em outras palavras, terceiromundismo!

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