Lei Kandir: União deve mais de R$ 50 bilhões e vai pagar só R$ 6,5 bilhões ao Rio Grande do Sul

O Rio Grande do Sul deverá receber cerca de R$ 6,5 bilhões até 2037 como compensação à Lei Kandir, conforme acordo entre União e estados, homologado nesta semana no Supremo Tribunal Federal (STF). O acordo prevê o repasse de R$ 65,5 bilhões da União para Estados, Distrito Federal e municípios como compensação à Lei Kandir e, em contrapartida, Estados desistirão das ações judiciais de cobrança pelas perdas ocasionadas pela desoneração de exportações.

Dos R$ 65,5 bilhões, 25% são destinados a municípios. Até 2022, devem ser transferidos pela União, anualmente, R$ 5,2 bilhões às unidades da federação. O Rio Grande do Sul receberá 10% do valor total referente aos Estados, o que representa cerca de R$ 6,5 bilhões até 2037, e está entre os maiores beneficiados, juntamente com São Paulo, Minas Gerais e Paraná. No caixa estadual, o ingresso será de R$ 4,9 bilhões e o restante será direcionado a municípios.

Os pagamentos dependem de aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) do Pacto Federativo – que já está no Congresso – ou de proposta de lei complementar com os critérios acordados que precisa ser encaminhada pelo governo em até 60 dias.

Em 2018, o Rio Grande do Sul acumulava perdas com a Lei Kandir que chegavam a R$ 54 bilhões. O então o secretário da Fazenda do RS, Luiz Antônio Bins, afirmava à época que “esta conta bilionária, a partir da diferença entre as perdas brutas desde 1996 com o valor que foi ressarcido neste período, se aproxima do montante da nossa dívida com a União, que fechou o ano em R$ 58 bilhões”. Naquele período, o Estado recebia algo ao redor de R$ 380 milhões por ano como ressarcimento pelo ICMS que deixava de recolher sobre as exportações.

Para o ex-governador Pedro Simon (MDB), a Lei Kandir foi uma desgraça para o Rio Grande do Sul. Ele entende que as finanças do Rio Grande do Sul começaram a degringolar quando a lei entrou em vigor, com o aumento do déficit público. No entanto, o governador Eduardo Leite (PSDB) avaliou como positivo o acordo para que os entes recebam compensações relativas à Lei Kandir. “Foi um bom acordo dentro do possível, todos os estados assinaram”, comentou Leite, em entrevista ao Jornal do Comércio.

O acerto é histórico, pois a discussão abrange mais de duas décadas e o ICMS é um dos principais tributos que os Estados têm para fazer frente à suas necessidades. O trabalho envolveu a Procuradoria-Geral do Estado (PGE), em várias gestões e inúmeras agendas em Brasília, em conjunto com a Secretaria da Fazenda.

“É fruto de um trabalho que reuniu todas as esferas atingidas. As discussões deram origem a um termo que diminui as perdas e garante segurança aos Estados, com repasses e prazos estabelecidos. A PGE, que já vinha atuando na ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) ajuizada pelo Estado do Pará, por meio do instituto do amicus curiae, também acompanhou integralmente as tratativas para a celebração do atual acordo”, afirmou o procurador-geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa.

Histórico

Inicialmente, a Constituição afastou a incidência do ICMS nas exportações de produtos industrializados. Em 1996, a Lei Complementar 87/1996 (Lei Kandir) estabeleceu a desoneração do ICMS sobre as exportações de forma mais ampla, para abranger também os produtos “in natura” e semi-industrializados.

Para compensar Estados e municípios, foi criada uma sistemática de repasses da União. Posteriormente, a desoneração das exportações de produtos primários e semielaborados se tornou matéria constitucional pela Emenda nº 42/2003, que ampliou a não incidência do ICMS a todos os bens e serviços remetidos ao exterior.

A EC n.º 42/2003 estabeleceu, no artigo 91 do ADCT, que, em contrapartida à desoneração das exportações, deveria ser editada lei complementar prevendo a compensação pela União das perdas sofridas pelos Estados.