Os mais fracos pagam a conta

O economista John Kenneth Galbraith (1908/2006), dizia que tanto a inflação quanto os recursos que geralmente se utilizam para combatê-la prejudicam os mais fracos. A política monetária, de controle inflacionário, age provocando desemprego e deprimindo os preços dos que exercem menos controle sob seus rendimentos. Assim, o fardo do controle da inflação sempre fica nas costas dos mais fracos e dos que perdem o emprego.

É exatamente isso que acontece mais uma vez no Brasil, através das últimas medidas do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central. O BC elevou em cinco de maio passado a taxa básica de juros de 2,75% para 3,5% ao ano e disse que “antevê” nova alta de 0,75 ponto percentual na próxima reunião do Copom. Juros muito baixos, para um mercado acostumado a taxas reais elevadas deixa o especulador nervoso e tem ainda a rolagem da dívida pública através da oferta de títulos.

Ao contrário do Brasil, a redução da taxa básica de juros é um movimento internacional, exatamente por causa da recessão causada pela pandemia da Covid-19. Como o mercado aguardava, no final de abril passado, o Banco Central Europeu confirmou que os juros seguem inalterados nos países da zona do euro – a taxa de depósitos em -0,5% e a de empréstimos em 0,25% ao ano.

Também no final de abril, o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) manteve sua taxa de juros estável entre zero e 0,25%. O comitê indicou ainda que a taxa de juros pode permanecer próxima ao piso por algum tempo. No documento, o Fed afirma que será ‘apropriado’ manter essa taxa até que as condições do mercado de trabalho alcancem um nível consistente com as avaliações do comitê sobre emprego máximo.

Portanto, nos Estados Unidos e Europa existe a preocupação com a manutenção do emprego, com a estabilização do mercado interno. No Brasil não existe preocupação alguma com o mercado interno, que está sendo destruído. Milhares de estabelecimentos comerciais e de serviços fecharam suas portas, colocando na rua também milhares de trabalhadores. E nenhuma medida significativa foi tomada pelo governo federal.

O argumento do BC é o de sempre: o aumento da inflação. Só que desta vez estamos no meio de uma pandemia, com a economia cambaleando, um brutal desemprego que, se incluirmos os trabalhadores informais do país, chega próximo de 60 milhões de pessoas. Portanto, nossa inflação obviamente não é de demanda, mas de custos com reajustes de energia, gás e gasolina.

Também devido aos preços internacionais das commodities favoráveis, principalmente alimentos, como carnes e arroz. Naturalmente, os preços no mercado interno explodiram. Como o Brasil não têm mais estoques reguladores, o brasileiro viu os preços dos alimentos nos supermercados mais do que duplicarem.

O resultado foi o aumento das expectativas da inflação futura. A volatilidade do dólar e a desvalorização do real pressionam a inflação, encarecendo principalmente alimentos, matérias-primas, roupas e bens duráveis, como eletrônicos.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, não se preocupou com a inflação ao encaminhar ao Congresso projetos de investimentos na ordem de US$ 2,3 trilhões, a serem usados ao longo de dez anos, a serem distribuídos com foco em infraestrutura, a fim de injetar capital na economia investindo na força de trabalho e retomada da produção industrial.

Para não elevar a taxa de juros, atualmente próxima a zero, e reduzir a expectativa de inflação, o governo Biden criou contrapartidas: a elevação de impostos aplicados a empresas, atualmente em 21%, para 28%, e impostos incidentes sobre os ricos (famílias que ganham acima de US$ 1 milhão), principalmente investimentos, elevados ao patamar de 39,6%, acrescidos de 3,8%, já incidentes, sobre o rendimento dos ganham mais que US$ 200 mil.

No Brasil, o BC não se mexe em defesa da economia popular. O cenário só é favorável aos especuladores e exportadores de commodities, como uma colônia do século XVII.

Uma das alternativas para recuperar a economia no pós-pandemia seria o crédito com taxas reduzidas, tanto para empresas como para o público em geral. Claro que isso não interessa ao sistema financeiro que controla o BC. O Brasil é um país capitalista com a maioria avassaladora da população sem capital. Então o essencial seria que o sistema financeiro passasse a conceder mais créditos, como um verdadeiro indutor do desenvolvimento.

O crédito com taxas razoáveis provoca consumo interno, distribuição de renda, mas a parte do Brasil escravocrata, exportadora de commodities, colonial, não admite distribuir renda. O que aconteceu é que as famílias pagaram taxas de juros mais altas em março passado, de acordo com as Estatísticas Monetárias e de Crédito divulgadas pelo BC.

O número de famílias com dívidas no país alcançou em abril passado 67,5% do total de entrevistados na Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Com isso, o número de endividados alcançou nível recorde, igualando o patamar de agosto do ano passado.