Terras indígenas: protesto em Brasília contra o “marco temporal” de 1988

Fotos Márcia Turcato

MARCIA TURCATO, especial para o JÁ

O risco de perder território fez com que cerca de 500 indígenas de diversas etnias viajassem até Brasília para lutar por seus direitos.

Eles também protestam contra projetos de lei que permitem o garimpo em áreas indígenas.

“Reduzir o território indígena foi uma promessa da campanha eleitoral de Jair Bolsonaro. Eleito, ele colocou seu projeto a favor da especulação em prática”, explica Marcos Kaingang, 27 anos, do Rio Grande do Sul, bacharel em Direito, e assessor de projetos do Conselho de Missões dos Povos Indígenas.

Os Kaingang são um povo pertencente à família Jê, que atualmente ocupa 46 terras indígenas nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além do Uruguai.

A população é estimada em 37.470 pessoas.

Os povos indígenas vivem no Brasil desde antes de Cabral aportar na Bahia no ano de 1500. Então, por quê deveriam ser reconhecidos como territórios indígenas somente as áreas ocupadas pelas populações tradicionais até 1988?

Esse foi o ano da promulgação da Constituição Federal, a Constituição Cidadã.

A tese do “marco temporal”, defendida por deputados e senadores que
representam os interesses de ruralistas, de mineradoras e de madereiros,
pretende rever, e até revogar, territórios demarcados após 1988.

A matéria está em análise no STF, o relator é o ministro Edson Fachin. O ministro Alexandre Moraes pediu destaque ao tema e a sessão da Corte foi suspensa no último 16 de junho e não tem data para retornar à agenda da Corte.

As lideranças indígenas chegaram em Brasília no começo de junho e logo
organizaram um protesto contra o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que abre as terras tradicionais para a exploração econômica e inviabiliza, na prática, novas demarcações.

Os indígenas exigem que o PL 490 seja retirado de forma definitiva da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara dos
Deputados.

A deputada Joenia Wapichana (Rede/RR) conseguiu que a matéria
fosse retirada da pauta por duas sessões, significa que a matéria voltará para a agenda em julho.

A deputada coordena a Frente Parlamentar Indígena. Kretã Kaingang, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil (Apib), alerta para os riscos que o PL 490 trará aos povos indígenas. “O projeto permite que o governo tire da posse de povos indígenas áreas
oficializadas há décadas, escancara as terras Indígenas a empreendimentos predatórios, como o garimpo, e, na prática, vai inviabilizar as demarcações, totalmente paralisadas pelo governo Bolsonaro”.

Os povos também se manifestaram contra outras iniciativas do Congresso,
como o PL 2633/2020, conhecido como o PL da Grilagem, e o PL 984/2019, que pretende cortar o Parque Nacional do Iguaçu e outras Unidades de
Conservação com estradas.

Acampamento

Homens, mulheres e crianças estão acampados no gramado do Teatro
Nacional, em Brasília, para lutar por seu direito ancestral.

São cerca de 500
pessoas representando 30 etnias de Norte a Sul do Brasil. Quatro banheiros químicos foram instalados no local, também há uma cozinha coletiva, uma tenda para atendimento médico e outra para a assessoria de imprensa do acampamento, a Mídia Nativa On.

A comida é feita com alimentos doados. Eles também receberam doação de agasalhos e cobertores porque a temperatura em Brasília, à noite, pode cair abaixo de 10 graus.

A organização do acampamento é bem estruturada: grupo
de cozinha, grupo de limpeza, de recreação infantil, de leitura e de produção de conteúdo para a imprensa.

Todas as etnias trouxeram adornos para vender em Brasília. Essa é uma forma de garantir renda e dar visibilidade a sua cultura
e arte. Os enfeites com plumas e os objetos de cestaria são típicos de cada
etnia.

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