Brigada desiste da ajuda do Estado

Naira Hofmeister
Há dois meses no comando da 3ª Companhia de policiamento da capital, responsável pela segurança de sete bairros, o Major Aroldo Medina aposta em recursos federais e privados para o reaparelhamento da Brigada Militar. Durante sua primeira participação nas reuniões do Conselho de Segurança do Bom Fim, em abril, ele apresentou um plano de recuperação da corporação. “Quero melhorar as condições de trabalho e a auto-estima do policial”, aponta.
Utilizando o recente exemplo de um consórcio formado por bancos da região, que assumiram cotas mensais de R$ 2.500,00 para patrocinar a aquisição de viaturas, Medina pediu que a comunidade rateasse o custo de uma rede de rádio de emergência. “Seriam R$ 200,00 pelo aparelho, mais R$ 90,00 de mensalidade para cada unidade”.
O oficial também espera conseguir dinheiro para adquirir viaturas e motocicletas. “Um policial a pé percorre quatro ruas no tempo em que poderia vigiar quase o bairro todo”, calcula. As regiões centrais sofrem bastante com a escassez de veículos. A 1ª Cia faz as rondas no centro de Porto Alegre apenas com motos. Os carros têm de ser emprestados de outras unidades.
O mesmo ocorreu durante o verão nos sete bairros atendidos pela 3a. Cia, quando a única viatura em condições de circulação – recuperada pela comunidade judaica – foi enviada para a Operação Golfinho. Para não repetir o fato, Medina sugere que se faça um termo de concessão, como se fosse um empréstimo.
Comandante do Policiamento da Capital, o coronel Jarbas Vanin, admite que com o remanejo, o bairro ficou sem nenhum veículo da polícia durante os meses de veraneio. “Mesmo assim, nunca deixamos de atender ocorrências na região”. Ele observa que no verão a maior parte da população migra para as praias, o que obriga a corporação a intensificar o policiamento nessa região. “A comunidade do Bom Fim também tirou férias no litoral e estava protegida”, acredita.
Vanin salienta que há 400 viaturas em Porto Alegre, mas existe uma redução natural oriunda da manutenção dos carros. Em média, 25% da frota fica parada diariamente para reparos. “Essas viaturas rodam 300 km por dia. E impossível mantê-las funcionando integralmente”.
Novas aquisições estão nos projetos da Secretaria de Segurança Pública, que tenta convencer as montadoras a participar novamente das licitações. O motivo da recusa é a dívida de R$ 5 milhões que o governo do Estado tem com as fábricas de carro. Em março, o secretário Francisco Malmann prometeu sanar as dívidas. Depois de um acordo, 77 carros já puderam ser encomendados para a Polícia Civil.
O tenente coronel Florivaldo Nunes, chefe do Departamento de Relações Institucionais e com a Comunidade da BM, aplaude a mobilização das comunidades e incentiva seus oficiais a proporem projetos. “Está na Constituição de 1988: segurança é dever do Estado e responsabilidade de todos”, frisa. Nunes se orgulha de ter recebido mais de R$ 10 milhões dos órgãos comunitários gaúchos. “Foram R$ 4,5 milhões em 2006 e ano passado atingimos R$ 6 milhões”, relata.
Apesar da falta de recursos, o comandante julga que o grande problema da segurança é a diminuição de efetivo. “Há 10 anos, tínhamos 33 mil homens nas ruas. Hoje são 21 mil”, lamenta. A previsão é que 2 mil brigadianos sigam para a reserva apenas em 2008.
Recentemente foram chamados 1.500 homens aprovados em concurso. “Sempre que tivermos uma sobra no orçamento, aplicaremos para a redução desse déficit”, promete a governadora Yeda Crusius. A chefe do executivo gaúcho admite ainda a revisão da lei que concede patentes aos policiais que se aposentarem aos 25 anos de serviço. “Se um soldado cumpre o tempo mínimo e opta por permanecer na ativa, continuará um soldado. Se sair das ruas, se torna segundo sargento”, critica o tenente coronel Nunes.
Recursos podem vir de Brasília
O Governo Federal destina uma verba para a segurança nos Estados. O Ministro da Justiça, Tarso Genro, anunciou um investimento de R$ 41 milhões no Rio Grande do Sul, através do Programa Nacional de Segurança com Cidadania, o Pronasci. De olho nesse dinheiro, o Major Medina formulou um plano de reestruturação do 9º Batalhão de Porto Alegre, que reúne 450 homens e 20 bairros sob sua responsabilidade.
Ele quer transformar o quartel em um centro de capacitação e comando, visando a Copa do Mundo de 2014, que acontece no Brasil e terá partidas em Porto Alegre. O projeto de Medina está sendo elaborado em parceria com um escritório de arquitetura e prevê investimento de R$ 350 mil. “O governo federal investiu R$ 3 bilhões no Pan-Americano. Para o maior evento de futebol do planeta não serão menos de R$ 50 bilhões”, aposta.
Enquanto o projeto não fica pronto, soldados do 9º Batalhão reclamam do péssimo estado em que se encontra o prédio. “Temos que mostrar a realidade humilhante que vivemos aqui”, reclama um sargento oriundo o interior do estado, que, sem verbas para alugar um imóvel, é obrigado a dormir no alojamento coletivo.
No amplo quarto, colchões estão espalhados pelo chão. Alguns têm camas, mas nenhuma privacidade já que a o único armário da sala, de duas portas, faz também às vezes de divisória.
As roupas são estendidas em varais improvisados, depois de terem sido lavadas em tanques que acumulam limo e sujeira. A lavanderia divide espaço com o único banheiro em condições de uso do prédio anexo: dos cinco canos do lavatório, apenas dois possuem ducha instalada. Ralos estão descobertos e há muitas rachaduras no chão e nas paredes.
O que um dia foi o refeitório abriga hoje – assim como a grande maioria das salas do anexo – um depósito para material apreendido. No caso, dezenas de computadores e máquinas caça-níqueis dividem o espaço com cenouras e batatas que os soldados preparam para o almoço.
No prédio principal, onde funciona o atendimento ao público e as diversas companhias que formam o batalhão, a situação é ainda mais assustadora.
Além de paredes com rachaduras intermináveis e fiações aparentes, o chão já cedeu aproximadamente cinco centímetros. O que deveriam ser banheiros para os soldados viraram depósito de entulho.
Destampando uma fossa descobre-se uma comunidade de baratas que vivem nos dejetos que quase transbordam do reservatório e parece inacreditável que o odor não seja mais forte. No final de um dos corredores escuros, pintada na parede, a insígnia do batalhão traz uma águia que carrega uma mensagem quase metafórica: “Dignidade acima de tudo”.
SSP também quer sua fatia
A Secretaria de Segurança Publica também já começou articular suas solicitações. A primeira medida será a construção de sete novos presídios. Um novo acordo firmado entre os governos prevê a redução da participação do Estado no aporte de verbas. Até 2007, o dinheiro era dividido: 80% dos recursos provinham da União e os 20% restantes, do tesouro estadual. A gestão Malmann resolveu a questão baixando para 2% o aporte financeiro do Rio Grande do Sul para esse fim.
Os novos presídios vêm a calhar. O sistema prisional do Rio Grande do Sul tem 18 mil vagas e 25 mil presos. Ou seja, já há excesso de sete mil condenados. Outros sete mil mandatos de prisão já foram expedidos. No ano passado, foram efetivadas 26 mil prisões, quase o tamanho da atual população carcerária do Estado.
“Nunca prendemos tanto como em 2007. O problema é que não temos onde botar tanta gente e eles acabam soltos ou sendo encaminhados para penas alternativas”, lamenta o ten. cel. Nunes, do DRIC.
Rotatividade nos comandos atrapalha
O coronel Jarbas Vanin é comandante do policiamento da capital há apenas seis meses. Seu antecessor ficou no cargo pelo mesmo tempo. “Não sei se completo um ano no CPC”, lamenta.
Para ele, a rotatividade nos cargos de comando da Brigada atrapalha, pois o oficial que é antigo, “desenvolve mais familiaridade com a região, moradores e ocorrências mais comuns”. Vanin acredita que a mobilização das comunidades pode auxiliar na manutenção dos oficias em seus postos.
Essa reportagem é um dos destaques da edição 382 do jornal JÁ Bom Fim/Moinhos. A publicação é quinzenal e circula gratuitamente nos 10 bairros da área central de Porto Alegre.

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