Celular não é brinquedo

Celular não é brinquedo, adverte cientista(Foto: Tânia Meinerz/JÁ)

 

Cleber Dioni Tentardini

A Câmara Federal levou a Brasília especialistas de diversos países para um seminário sobre os efeitos do telefone celular e outras fontes de radiações eletromagnéticas no organismo humano. Tramitam na Casa sete projetos sobre o assunto.

O encontro ocorreu em abril e não mereceu atenção da imprensa, nem antes, nem durante, nem depois, apesar das graves advertências feitas por pesquisadores respeitados, como Francisco de Assis Tejo, da Universidade Federal de Campina Grande, Martin Blank, da Columbia University, Estados Unidos, Carlos Abrahão, de Campinas, e Álvaro Salles, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Salles foi particularmente incisivo ao alertar para os riscos e defender regras mais severas do que as recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), seguidas na legislação do Brasil e de muitos países.

Doutorado pela University College London e membro de associações científicas internacionais, ele foi taxativo no seminário de Brasília: “Já existem evidências científicas suficientes para que o assunto seja tratado como uma questão de saúde pública”.

Chefe do Laboratório de Comunicações Eletro-Óticas do Departamento de Engenharia Elétrica da UFRGS, Salles coordena uma equipe de pesquisadores, que há mais de dez anos estuda os efeitos biológicos das radiações eletromagnéticas no organismo humano.

Foi com sua ajuda e muita pressão dos movimentos comunitários, que Porto Alegre se tornou a primeira cidade do país a ter legislação modelo sobre a instalação de Estações de Rádio Base, os equipamentos que transmitem o sinal para os aparelhos celulares. Nas paginas seguintes, Álvaro Salles fala sobre o assunto em entrevista exclusiva.

No meio científico a polêmica é grande

Os meios científicos esperam para o final deste ano a conclusão do International EMF Project, pesquisa da OMS, em andamento há onze anos para avaliar os efeitos da exposição do organismo a campos eletromagnéticos.

A coordenadora do Projeto, Emilie van Deventer, presente ao encontro em Brasília, afirmou que os resultados parciais já divulgados não mostram relação entre a exposição a certos níveis de radiação e ocorrência de doenças como o câncer.

Segundo ela, os limites recomendados pela OMS contemplam ampla margem de segurança, pois o nível máximo admitido (0,08W/kg) é 50 vezes inferior ao menor nível a partir do qual se observaram efeitos térmicos sobre o corpo humano (4 W/kg).

“Não existe qualquer comprovação científica de que a exposição à radiofreqüência na faixa de até 4 W/kg ofereça danos à saúde humana”, afirmou Emilie.

No meio científico a polêmica é grande. Apesar dos riscos apontados em diversas pesquisas, muitos especialistas, como o professor Renato Sabbatini, da Faculdade de Ciências Médicas, da Unicamp, consideram que ainda não há dados conclusivos sobre os danos das radiofrequências à saúde. “Existe muita especulação sobre o assunto, mas o que se sabe é que podem ocorrer danos para freqüências muito mais altas”, disse.

Os limites aceitos pela Organização Mundial da Saúde foram estabelecidos pela Comissão Internacional para Proteção contra Radiações Não Ionizantes, a ICNIRP – organização não governamental formada por cientistas independentes. A União Européia e outros 30 países, o Brasil inclusive, têm suas leis baseadas nestes critérios.

Legislação sobre antenas é confusa

Outro aspecto polêmico da questão das radiações está relacionado às antenas, as chamadas Estações de Rádio-Base, que reproduzem os sinais da telefonia celular.

Presente no seminário em Brasília, o presidente-executivo da Associação Nacional das Operadoras Celulares, Ércio Alberto Zilli, reclamou da profusão de leis para disciplinar as antenas das operadoras de telefonia celular. Citou 174 legislações municipais e estaduais, com diferentes restrições e alertou para o risco de se tornar inviável o trabalho das operadoras.

“Em Criciúma (SC), por exemplo, uma lei determina que o limite de exposição à radiação seja quase cem vezes menor do que o recomendado pela Anatel, que já é bastante restritivo. Isso desacredita as operadoras perante a opinião pública”, criticou o executivo.

O presidente da Anatel, Plínio de Aguiar Júnior, disse que a agência tem dificuldades de fiscalizar todas as antenas de telefonia celular. “A medição é feita por amostragem ou quando há demanda de moradores, preocupados com a proximidade do equipamento de suas residências”, afirmou.

Câmara tem sete projetos sobre o assunto

Foi discutido ainda no seminário em Brasília o projeto de lei do deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), para regular a instalação de fontes emissoras de radiação eletromagnética.

Senário em Brasília discutious os efeitos do telefone celular e outras fontes de radiações eletromagnéticas no organismo humano.  (Foto: Diógines Santos/Agência Brasil)

Também determina que 5% dos recursos do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel) sejam destinados à pesquisa sobre a exposição humana a campos de radiofreqüência e que a Anatel seja a responsável por fiscalizar a aplicação das novas regras. Entre elas, a exigência de que os fabricantes de celular informem no manual de operação ou na embalagem que o produto atende aos limites legais da taxa de absorção de radiação.

Tramitam na Câmara outros seis projetos de lei semelhantes, como o do deputado Henrique Fontana, do PT gaúcho, que estabelece limites de exposição à radiação menores do que os atuais, determina a obrigação de alvarás e licença ambiental prévia para a instalação de ERBs e o compartilhamento de torres pelas empresas prestadoras do serviço celular.

As restrições propostas se assemelham com a legislação que vigora hoje em Porto Alegre: incluem a proibição de instalação das antenas em prédios e terrenos públicos, em áreas de lazer, centros comunitários e culturais, museus e teatros, a menos de trinta metros de clínicas médicas, centros de saúde, hospitais, escolas e residências; e em posições que prejudiquem a paisagem natural e urbana de seu entorno.

Entrevista exclusiva: professor e engenheiro Álvaro Salles

“Estamos servindo de cobaias”

Cada vez mais cientistas acreditam que o uso constante do telefone celular pode estar relacionado com o aumento dos casos de tumores cerebrais. Os estudos não são conclusivos, mas um ponto já é consenso: as crianças são muito mais sensíveis aos efeitos das radiações.

As grandes indústrias do setor já desembolsaram algumas centenas de milhões de dólares em estudos. Existem dois grandes projetos sobre a telefonia celular em andamento, envolvendo 16 países de quatro continentes.

Hoje, mais de três bilhões de pessoas utilizam a telefonia móvel. No Brasil, já são mais de 100 milhões de usuários, perto de 57% da população, segundo dados da Anatel, de fevereiro deste ano.

O pouco interesse no assunto deve-se à falta de informação, segundo o engenheiro Álvaro Augusto Almeida de Salles, um dos maiores especialistas em pesquisas sobre telecomunicações.

Professor Salles: Uma coisa é certa: está se usando amplamente uma tecnologia que ainda não se mostrou inócua à saúde. (Foto: Tânia Meinerz/JÁ)

Em entrevista exclusiva ao JÁ, o professor falou sobre as duas grandes pesquisas em andamento, como os países estão lidando com as novas descobertas, os efeitos nas crianças e que medidas o Brasil deve adotar para prevenir os usuários dos perigos dessa tecnologia, que veio para ficar.

JÁ – O que está claro nesse terreno, professor?

Uma coisa é certa: está se usando amplamente uma tecnologia que ainda não se mostrou inócua à saúde. Ao contrário, os resultados das pesquisas disponíveis mostram diversos efeitos danosos à saúde, inclusive câncer. Então, estamos servindo de cobaias. Como afirmou o doutor Leif Salford, neurocirurgião na Universidade de Lund, na Suécia, referindo-se às bilhões de pessoas no mundo que conversam pelos celulares, forçando livremente radiações eletromagnéticas para seus cérebros: “Esta é a maior experiência biológica na história do mundo”. Há pesquisas em andamento no várias partes. Em Naila, na Alemanha, e em Netanya, em Israel, os estudos mostram que o risco de novos casos de câncer é bem maior entre as pessoas que viveram durante dez anos num raio de 400 metros das Estações de Rádio Base (ERBs). Este estudo mostrou que não é mais possível assumir que não há relação casual entre emissões de rádio freqüências e o aumento de incidência de câncer.

JÁ – Esses riscos já foram reconhecidos pelas empresas?

Não publicamente. São os efeitos biológicos, que nós chamamos de não-térmicos. Como falei no seminário em Brasília, em abril, já existem evidências científicas suficientes sobre os efeitos biológicos da radiação emitida pelos celulares. Por isso, não existe outra alternativa senão a adoção imediata do Princípio da Precaução. Principalmente pela disseminação dos celulares entre as crianças.

JÁ – As crianças estão mais expostas à radiação dos celulares?

Crianças e adolescentes. Os efeitos são mais críticos que em adultos, especialmente porque nas crianças e adolescentes a espessura do crânio é menor e maior a penetração, a onda atinge a regiões mais internas do cérebro. Além disto, nas crianças verifica-se que o metabolismo é mais rápido e quaisquer efeitos danosos devem ser mais críticos, e normalmente, as recomendações de prudência e cautela são menos consideradas.

JÁ – Há estudos com crianças?

O professor Ohm Gandhi, da Engenharia Elétrica e Computação da Universidade de Utah (EUA), publicou uma pesquisa sugerindo que os cérebros das crianças absorvem 50% a mais a radiação dos telefones móveis do que adultos. William Stewart, do Departamento da Saúde da Inglaterra, alertou há dois anos que crianças com idade inferior a nove anos não deveriam utilizar telefones móveis porque o tecido do cérebro é particularmente vulnerável e que o crânio em crescimento das crianças é menos espesso que aqueles dos adultos, e então menos resistente à radiação.

JÁ – E as pesquisas sobre as Estações de Rádio-Base?

A população normalmente está bem afastada das ERBs e a distância é fundamental porque a radiação decai na medida em que a pessoa se afasta da antena. Mas é preciso meios eficazes para fiscalizar essas antenas. Então, o aparelho celular passa a representar o maior perigo, por estar encostado na cabeça. Mas o mais grave nisso é que os estudos trabalham com níveis de exposição à radiação bem abaixo dos limites permitidos. Nesse estudo de Naila, por exemplo, os níveis de radiação estavam cerca de 800 vezes menor.

JÁ – O que acha da legislação de Porto Alegre?

Em Porto Alegre, a lei 8.706, de 14 de janeiro de 2001, proposta pelo então vereador Juarez Pinheiro (PT) obriga os fabricantes de aparelhos celulares a divulgar os níveis de radiação eletromagnética emitidos pela antena dos telefones e substituir os aparelhos cujo nível de radiação supere o limite aceito internacionalmente. Não vingou. Nessa mesma época surgiu um projeto de lei na Assembléia Legislativa gaúcha que tornaria obrigatório às operadoras de telefonia colocar adesivos nos aparelhos para advertir os usuários sobre os riscos à saúde, como nas carteiras de cigarro, mas não sei o que houve, deve ter sido engavetado.

JÁ – O que significa o Princípio de Precaução

É um critério que já foi adotado em vários países diante do alto grau de incerteza científica frente aos potenciais riscos de determinada tecnologia, no caso, a telefonia móvel celular. Toma-se uma atitude preventiva sem esperar os resultados da pesquisa científica. Porque se os riscos existem, são sem dúvida problemas de Saúde Pública, e como tal devem ser tratados. A própria Organização Mundial da Saúde decidiu que já é hora de adotar o Princípio da Precaução sobre o uso do celular e do funcionamento das Estações de Rádio-Base.

JÁ – Esse princípio tem amparo na legislação em vigor?

A Anatel é a reguladora. Ela precisa estabelecer normas mais rígidas do que está em vigor, já que os estudos apontam a possibilidade de ocorrer prejuízos à saúde dos usuários em níveis muito abaixo da radiação emitida hoje pelos aparelhos.

JÁ – A Anatel adotou uma norma ineficiente?

Acontece que as normas existentes para os aparelhos celulares e para as ERBs prevêem somente os efeitos térmicos, de curta duração, que já foram comprovados, como o aquecimento dos tecidos internos do ouvido e de outras partes do corpo. Hoje, a Anatel utiliza a norma adotada pela ICNIRP, que estabelece a radiação emitida pelo celular, a Taxa de Absorção Específica (SAR) máxima permitida é de dois miliwatts por grama de tecido (2 mW/g), considerando-se a antena do parelho a uma distância mínima de dois centímetros da cabeça. Só que pesquisas recentes mostram repetidas vezes efeitos danosos à saúde em níveis de exposição substancialmente abaixo da norma ICNIRP.

JÁ – Quem estipula a SAR?

Pela própria ICNIRP. SAR significa a potência por unidade de massa de tecido.

JÁ – Em quanto a norma é superada?

Em muitas vezes. A dois centímetros você está no limite da norma. À medida que a antena se aproxima, esses valores começam a crescer, a ponto de que, a um centímetro, você já superou três ou quatro vezes a norma. E, quando a antena está encostada na cabeça, esse limite é superado entre cinco e dez vezes. A Anatel adotou esse limite em 1999 e já está na hora de adotar uma norma mais rígida, que proteja os usuários. O problema é que a norma existente está baseada somente nos efeitos térmicos, que já foram comprovados, mas a precaução vai além, justamente para proteger as pessoas do que pode ocorrer.

JÁ – Qual é a norma mais rígida?

Sugerimos como limite de exposição aos campos eletromagnéticos 0,6 V/m, adotado em Salzburg, na Áustria. A norma suíça e italiana também são recomendáveis. Esse limite está sendo pleiteado na França, através de dois projetos de lei em tramitação na Assembléia Nacional.

JÁ – Quais são os problemas com os aparelhos celulares?

São muito ineficientes. O principal problema é com a antena atualmente utilizada na grande maioria dos telefones móveis, que é do tipo monopólo convencional. Pior ainda nos aparelhos com antena interna. Quando está afastada de qualquer obstáculo, esta antena irradia simetricamente em torno de si mesma, em um plano perpendicular a ela. Quando está muito próxima á cabeça, perde a irradiação em simetria, em círculo, e cerca de 70% da energia que deveria chegar a uma ERB é absorvida pela cabeça, ficando menos de 30% para a função principal, que é a comunicação com a Estação mais próxima. E geralmente em potência elevada devido ao ajuste automático dos aparelhos. Nestas condições, os resultados medidos mostram que mesmo normas restritivas são substancialmente superadas. Essa tecnologia não foi dimensionada para operar próxima da cabeça, mas foi aproveitada de um tipo de antena que já existia, dos rádios portáteis, por exemplo.

JÁ – Quais prejuízos dos efeitos térmicos?

Os mais notados são no olho. Quando há aquecimento, o globo ocular pode ficar esbranquiçado, que chamamos de opacidade, e se aproxima de uma catarata interna. E também pode haver casos de glaucoma. Esses efeitos são conhecidos há mais de trinta anos. E as normas como do ICNIRP são baseadas nesses efeitos.

JÁ – Existem casos comprovados de glaucoma?

Alguns casos já foram relatados na literatura médica. O olho está mais exposto porque é um tecido muito sensível e a antena deve ficar distante mais de cinco centímetros do olho. A gente vê policiais, pessoal de organização de eventos usando aparelhos de comunicação na frente dos olhos…é um risco.

JÁ – A Universidade Federal da Paraíba concluiu uma pesquisa sobre os efeitos da radiação, mas em ratos.

É. Dizem que houve redução em 26% na fertilidade dos animais expostos. Esses são efeitos biológicos.

JÁ – Os não-térmicos?

É. Efeitos no sistema nervoso, no sistema cardiovascular, no metabolismo, em fatores hereditários, com problemas hormonais. As mais sensíveis são as células nervosas, neurônios e moléculas de DNA, os cromossomos. Se fosse só calor externo não tinha problema. Mas lá no cérebro as coisas podem estar acontecendo muito pior, porque você não tem sensores térmicos ali, então não percebe. Esses tecidos não se regeneram. Se você perder 10 mil neurônios de 100 mil nem vai notar, mas a médio e longo prazo vai sentir.

JÁ – O que representa médio e longo prazos?

Médio prazo é cinco, dez anos. Tendo em vista que cerca de 3 bilhões de pessoas utilizam os terminais móveis, e no Brasil já são mais de 100 milhões, isto se tornou uma questão de saúde pública, e não existe outra alternativa responsável senão a adoção imediata do Princípio da Precaução. Caso isto tardar, já poderá ser tarde demais para a reparação dos danos. Qual será o custo disto? Quem pagará esta conta?

JÁ – E qual seria a antena ideal?

O melhor seria uma antena diretiva, que emitisse energia no sentido oposto da cabeça. Como o farol do automóvel, que tem diretividade. Ele concentra energia num determinado facho. Então, a cabeça ficaria protegida. Já existem antenas assim, algumas já foram patenteadas. A Motorola está fazendo pesquisas com as antenas diretivas. Patrocinou um estudo no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) em São José dos Campos, um projeto de 100 mil dólares, se não me engano. Mas isso nem precisaria porque eles já têm patente internacional dessas antenas, era só colocar em prática. Em 1995, esse tipo de antena não era novidade nos Estados Unidos.

JÁ – Por que não estão disponíveis no mercado?

Realmente, eu tenho pensado bastante nisso, mas não tenho resposta. Como a norma é ultrapassada várias vezes, além de ser um problema de saúde pública, eu digo que também é um problema de direitos humanos e de defesa do consumidor. Porque os usuários têm o direito de serem informados sobre as normas e precauções. Mas, para muitos, isso não é conveniente que seja divulgado.

JÁ – Essa nova antena poderia elevar o custo do produto?

Não seria um custo muito maior, cerca de 10 ou 20 dólares. Serviria até como um bom marketing para os fabricantes.

JÁ – Mas aí os fabricantes teriam que substituir os atuais modelos?

É. Talvez seja uma estratégia mercadológica para vender mais do primeiro tipo e depois entrar com o outro. Quanto tempo eles tiverem, melhor. Não estou dizendo que essa é a estratégia. Agora, está comprovado que essa antena é um dos piores projetos de engenharia das últimas décadas, não há a menor dúvida.

JÁ – Alguma semelhança com a indústria do cigarro?

Assim como ocorre há décadas com as indústrias de tabaco, agora é a vez das fabricantes de telefones celulares enfrentarem os tribunais de diversos países. Um dos primeiros processos, que abriu as portas para centenas de ações contra a indústria de telefonia móvel, iniciou em 2000 contra a Motorola. Advogados do neurologista norte-americano, Christopher Newman, 43 anos, vítima de câncer no cérebro, usaram a análise para sustentar uma ação de US$ 800 milhões. Michael Murray, de 35 anos: US$ 1,5 bilhões, Outras cinco causas, de mais que US$ 1 milhão cada, todos envolvendo tumores cerebrais associados ao uso do aparelho celular. Como disse o Veríssimo (L.F. Veríssimo, ZH, 1/3/2004): o cigarro, comprovadamente, mata. A venda de cigarro não é proibida porque os impostos pagos pela indústria do fumo são responsáveis por um naco gigantesco do orçamento estatal e o vício que mata sustenta boa parte das atividades do governo…

JÁ – Que providências a Anatel poderia tomar?

A Anatel deveria emitir uma determinação para que os fabricantes medissem a SAR de todos aparelhos em uso no Brasil e divulgassem amplamente os valores. Os que estivessem acima da norma, de preferência uma mais rígida, deveriam ser recolhidos, uma coisa elementar.

JÁ – O que falta, então?

Há muito interesse em jogo. Enquanto estiverem vendendo os aparelhos… Agora, o que precisa haver é uma imposição oficial que obriguem a fazer o negócio direito. Só que a Anatel tem que impor isso. Assim como deve mandar ser visíveis na caixa do celular os índices de radiação que o usuário está sujeito com aquele aparelho.

JÁ – O representante da Agência que esteve lá no seminário em Brasília, Maximiliano Martins, declarou que o único efeito comprovado das ondas eletromagnéticas é o aquecimento dos tecidos.

Ele declarou que os limites da ICNIRP são 50 vezes abaixo da faixa considerada segura. Mas as pesquisas indicam que mesmo em níveis muito baixos os riscos são reais.O Relatório de Progressos do projeto Reflex, que envolve sete países, indica efeitos danosos a saúde em baixos níveis de exposição, e deu como exemplo as quebras simples e duplas nas moléculas de DNA. Do outro Projeto, chamado Interphone, envolvendo 13 países, ainda não existe o relatório final. Mas já foram publicados artigos que mostram pesquisas epidemiológicas onde aparecem aumentos de riscos de tumores cerebrais para usuários constantes de celulares.

JÁ – O professor Renato Sabbatini, colaborador da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, disse que apenas 1% ou 2% dos estudos mostraram a possibilidade de algum dano às pessoas.

Essa é a opinião dele. Acontece que há estudos que comprovam a relação entre a exposição às ondas eletromagnéticas provenientes principalmente de celulares e de antenas de transmissão do sinal desses aparelhos com a maior incidência de câncer na população. O representante das operadoras (presidente-executivo da Associação Nacional das Operadoras Celulares, Ércio Alberto Zilli) reclamou do excesso de regras. Citou a existência de 174 decretos, leis e resoluções em seis estados, 141 municípios. Mas não vejo outra alternativa.

JÁ – Fale mais do Projeto Interphone

Projeto iniciado em 2001, envolvendo os principais laboratórios em 13 países (Suécia, Finlândia, Dinamarca, Inglaterra, Alemanha, Noruega, Itália, França, Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Israel, Japão). Alguns liberaram resultados dos estudos, sendo a maioria publicada na Revista Internacional de Oncologia. Todos fizeram pesquisas com pessoas que usam constantemente o aparelho celular a mais de dez anos. Dos sete estudos, cinco encontraram relação com o aumento de tumores cerebrais, dos tipos meningioma, glioma e neurinoma acústico. Um dos estudos, realizado na Universidade de Orebo, na Suécia, revelou que pessoas que utilizam o celular por mais de meia hora por dia, durante 10 anos, tem 310% de risco de desenvolver tumor no sistema auditivo (Neurinoma Acústico) e, durante 15 anos, o risco chega a 380%.

JÁ – E o Projeto Reflex?

É um estudo financiado pela União Européia, envolvendo sete países (Alemanha, Áustria, Espanha, Finlândia, França, Suíça e Itália), e orçado em mais de 3 milhões de Euros), cujos resultados detectaram alteração no DNA e nos fibroblastos (uma das estruturas celulares) mesmo quando a exposição ao campo magnético ocorre em níveis menores do que os permitidos pela ICNIRP. O neurocirurgião Leif Salford e o biofísico B. Persson, da Universidade de Lund, na Suécia, mostraram que níveis muito baixos de exposição (SAR = 0,002 W/Kg, durante somente duas horas) podem alterar a Barreira Cérebro-Sangue, permitindo que substancias químicas penetrem em neurônios no córtex, no hipocampo e em gânglios basais do cérebro. Esta alteração permanecia ainda evidente quatro semanas após uma única exposição de duas horas. O professor Francisco Tejo, da Universidade Federal de Campina Grande, divulgou resultados de pesquisas que indicam que a exposição a campos eletromagnéticos, independentemente da intensidade, reduz em cerca de 40% a produção de melatonina, substância produzida pelo cérebro que tem a função de identificar e destruir células defeituosas. Sua atuação principal é na proteção contra o câncer de mama e de próstata. Quer mais?

JÁ – Claro

O estudo de doutor Lennart Hardell, do Örebo Medical Center, na Suécia, mostrou que os usuários de telefones celulares apresentavam uma probabilidade 2,5 vezes maior para desenvolver tumores nestes lobos, no lado da cabeça onde o aparelho era normalmente operado. Em outros estudos ele verificou aumento do risco de câncer cerebral quando o telefone móvel é usado do mesmo lado da cabeça que o tumor, quando há excesso no número de horas de uso dos telefones móveis e com os anos de uso dos aparelhos. Outra pesquisa coordenada por Hardell, publicada em 2005, mostra que os usuários de celulares em áreas rurais tinham 50% a mais de riscos de desenvolver tumores cerebrais em comparação com os usuários dos locais urbanos. Essa probabilidade cresce para 250% para pessoas que usaram celulares durante mais de cinco anos. Os celulares digitais podem irradiar potência cerca de mil vezes maior quando estão em áreas onde o sinal é fraco, normalmente afastados das ERBs.

JÁ – Quando os europeus começaram a se preocupar com essa tecnologia?

A Inglaterra foi um dos primeiros países a advertir os usuários contra o uso excessivo do aparelho, principalmente por crianças. O Ministério da Saúde britânico soou o alerta depois que o jornal de medicina Lancet publicou um artigo do médico Gerard Hyland, da Universidade de Warwick, onde ele afirmou que as freqüências do celular interferem nas freqüências do corpo humano e que os usuários com menos de 18 anos são vulneráveis a dores de cabeça, perda de memória e distúrbios do sono. Na Alemanha, estudos mostraram que as freqüências de rádio emitidas pelos celulares e torres poderiam provocar modificação genética em células e animais de laboratório, podendo chegar ao câncer.

JÁ – Uma pergunta que parece óbvia: você usa celular?

Não, e estou sempre recomendando aos meus familiares que utilizem o menos possível.

JÁ – Que tipo de recomendações o senhor pode deixar para o nosso leitor?

Falar o menor tempo possível no celular; não encostar o aparelho na cabeça quando estiver falando; quando for possível, levantar a antena ao máximo; e evita que crianças utilizem esse telefone. Se for utilizar fones de ouvido, manter o aparelho afastado do corpo.

 

Entenda melhor

Radiação eletromagnética – conjunto de ondas elétricas e magnéticas, que se propagam no espaço transportando energia. Alguns tipos: microondas, rádio, tevê, raios X, ultravioleta, infravermelho.

ICNIRP (Comissão Internacional de Proteção às Radiações Não Ionizantes) – organização formada por cientistas independentes de vários países que desenvolvem estudos de saúde e segurança sobre exposições a ondas de radiofreqüências.

IEEE (Institute of Electrical and Electronic Engineer) – organização fundada nos Estados Unidos por engenheiros eletricistas e eletrônicos, que trabalha no estabelecimento de normas e padrões e na edição de publicações técnicas.

SAR (Specific Absorption Rate) – Taxa de Absorção Específica, é a intensidade de radiação absorvida por grama de tecido do corpo.

MW/g – Miliwatts por grama de tecido. De acordo com a ICNIRP, a SAR máxima admitida de um aparelho de celular é de 2 mW/g, dependendo da intensidade emitida e respeitando uma distância mínima de dois centímetros da cabeça.

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