Opinião: Depois do ciclone vem a tempestade

Está difícil entender o que disseram as urnas de 5/10, pois elas emitiram mensagens contraditórias, mas vem aí o segundo turno para dirimir (ou intensificar) eventuais dúvidas.
O que parece claro é que, diante de sinais de que o PT ficou velho, o povo está a fim de algo novo, ainda que este venha com cara de meninão mimado nascido em berço de ouro. Por isso precisamos tentar fazer uma releitura das coisas.
Fora os episódios Luiza Fontenelle em Fortaleza em 1982 e Erundina em Sampa em 1988, faz apenas 20 anos que a maré petista subiu em dois pequenos redutos eleitorais com Christovam Buarque no DF e Vitor Buaiz no ES.
Só depois a estrela vermelha brilhou em outros lugares. Lula só ascendeu em 2002 e, após três mandatos segurando o violino com a mão esquerda e tocando com a direita, o partido dá sinais de fadiga. É isso mesmo? Quem tem certeza de alguma coisa enquanto grassa um ciclone extratropical?
Fazendo o possível para distribuir renda por meio do aumento do salário mínimo, da criação de empregos, da expansão do serviço público em educação e saúde e de programas de inclusão social, o PT praticou o desenvolvimentismo à moda brasileira, fazendo concessões fiscais a setores estratégicos, financiando campeões do capitalismo e mantendo os privilégios das elites financeiras. Foi bom enquanto durou,  a economia está batendo pino, precisando de novos aditivos. Quem terá a receita para recolocar o carro nos trilhos?
É duvidoso que a classe média e a base da pirâmide social tenham uma percepção exata do que aconteceu, justo elas que foram beneficiadas pela gestão dos últimos anos, mas um dos sintomas do desgaste do petismo é que as duas prefeitas precursoras e os dois ex-governadores pioneiros foram parar em outros partidos.
Fora espasmos e explosões, o Brasil é um país essencialmente conservador cujos impulsos de mudança ocorrem menos através do voto em figuras revolucionárias e mais pela votação em figuras como Tiririca,  personificação de um protesto anárquico e sem futuro. Mas o que fazer se uma parte dos eleitores não reconhece no voto um instrumento de aperfeiçoamento da democracia? Só a educação nos salvará, o que demanda longuíssimo prazo.
No máximo, o que se pode concluir, por ora, é que as urnas sinalizaram um desejo de mudança, mesmo em lugares supostamente politizados como o Rio Grande do Sul, onde Tarso Genro, um dos melhores quadros do PT, com um bom governo e aptidão para concorrer à Presidência da República, levou 4X3 de um PMDB dividido. Tão dividido que o senador Pedro Simon apoiou Marina.
Agora quem lidera o bloco peemedebista em apoio a Dilma no segundo turno é o peemedebista Eliseu Padilha, que foi ministro dos Transportes do tucano FHC, padrinho da candidatura de Aécio Neves. Não é para entender.
Nocaute em Suplicy
Outros sinais da queda da estrela petista foram o nocaute sofrido pelo senador Suplicy diante do tucano José Serra em São Paulo, o afundamento das candidaturas bancadas por Lula em Sampa e no Rio e as derrotas de Dilma em cidades dirigidas pelo PT.
A eleição do petista Fernando Pimentel pelos mineiros talvez seja a exceção que confirma o declínio da estrela, mas só não vê sinais de desagregação no PT quem estiver com a vista turva ou a cabeça inchada. Na gangorra PT-PSDB, condenada por Marina Silva, o polo tucano subiu e o petista caiu. O desgaste é natural, pois já se passaram vários anos de presença no poder, mas falta avaliar o quanto pesou a contribuição de petistas imbuídos de uma arrogância capaz de esfolar a ética, um dos valores originais do partido.
“O PT tem uns problemas a resolver”, disse o ex-governador gaúcho Olívio Dutra, após reconhecer a própria derrota por apenas dois pontos percentuais para o jornalista de rádio e TV Lasier Martins, estreante que conquistou a vaga ao Senado. Olívio não disse, mas todo mundo sabe que se referia à necessidade de lavar a roupa suja e promover uma depuração no partido. Não é o que desejam os dirigentes mergulhados no corporativismo e/ou no fisiologismo.
Ambos septuagenários, Olívio e Lasier pregaram reformas, mas nenhum deles representava mudança. O eleitorado deu um passo atrás e escolheu o mais novo representante do conservadorismo. Eleito pelo PDT, que recebeu apenas 4% dos votos para governador, Lasier nunca teve vínculos partidários enquanto atuou como apresentador de rádio e TV.
Fora a lembrança do pai como eleitor de Getúlio Vargas, seu único liame com o trabalhismo é seu suplente Christopher Goulart,  neto do ex-presidente Jango, que nasceu no exílio em 1976, em plena ditadura militar. Já Juliana Brizola, neta do velho Briza, não conseguiu se reeleger deputada estadual. Não é para entender.
Esses lances do jogo eleitoral confirmam que o Brasil é um país complexo que prima pela contradição. As eleições deviam servir para acomodar as diferenças e levar o país para a frente, mas as urnas do primeiro turno parecem indicar uma volta ao passado recente. Estarão os brasileiros com saudade do neoliberalismo, das privatizações e de uma governança financeira mais fortemente calcada na taxa de juros da dívida federal?
Resposta no final do mês, quando das urnas sairá a colcha de retalhos com que vamos ter de nos cobrir nos próximos anos, faça seca ou temporal.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“O principal problema ético-político do país é que a oposição é incapaz de reconhecer a honestidade dos governantes e estes são incapazes de demonstrá-la”.
(Millôr Fernandes)

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