Dias da Cruz vai completar 100 anos

Instituição abriga há 75 anos pessoas de toda a cidade (Fotos: Helen Lopes)

Helen Lopes

A fila começa às 17h30. Num banco de cimento, embaixo de um telhado meia-água, homens, mulheres, idosos, jovens, sozinhos ou acompanhados com crianças esperam a recepção abrir, todos na procura de um pouso para passar a noite. Tem sem-teto, desempregados, moradores do interior com parente no hospital, pessoas que vieram tentar a vida na Capital e outras que por algum motivo estão na rua.

Ás 18h30, começa a conferência dos dados e a distribuição das chaves, para que cada um guarde seus pertences. Primeiro entram as mulheres que dormiram na casa no dia anterior, depois as que vêm pela primeira vez, em seguida, os homens, na mesma ordem.

Em comum, a expressão cansada e a negativa em falar, uns por vergonha, outros por medo. Apenas os primos Luiz Fernando Dutra, de 25 anos, e Denoci Castro(foto), de 21 anos, decidem contar suas histórias. Nascidos em Pelotas, os dois desembarcaram na Capital há um mês. “Viemos trabalhar em Porto Alegre porque lá está muito difícil”, justifica Castro, que saiu do interior pela primeira vez.

O primo mais velho está na estrada há mais tempo. “Passei 11 meses em Novo Hamburgo, desses, três foram na rua”, recorda Dutra, pai de uma menina de seis anos. “Existem situações em que tu cai um degrau e é desacreditado. Agora tô me reerguendo”. Eles conseguiram trabalho como servente em uma construção na zona sul da cidade.

Luiz Fernando: “Agora tô me reerguendo”

Os dois estão dormindo há quase 30 dias no albergue noturno do Instituto Espírita Dias da Cruz, na esquina da Avenida Azenha com a Ipiranga. O período máximo de uso de cada visitante é de 10 dias nos meses quentes e 15 nos demais. Isso a cada dois meses. Ou seja, a dupla é uma exceção.

“É que os rapazes estão trabalhando”, explica o presidente da entidade, Oswaldo Oliveira da Silva (foto). “Quando arrumam emprego ou o parente continua internado ampliamos o prazo, mediante documentação, porque senão, ao invés de albergados, teremos moradores”.

O albergue Dias da Cruz funciona desde 1927, de domingo a domingo. “Nesses 75 anos, nunca fechamos uma noite”, comemora Oswaldo, de 70 anos. Ele se dedica em tempo integral à instituição, desde que se aposentou da Brigada Militar.

A rotina de quem procura a casa é bem definida. Depois da triagem, seguem para o banho, recebem roupas limpas e chinelos para dormir e são convidados a assistir uma palestra de 10 minutos, religiosa ou com psicólogas voluntárias. Logo após, a janta é servida e às 21h vão para o dormitório.

A disciplina é mantida no dia seguinte. Às 6h30 da manhã, todos têm que estar de pé, pois o café da manhã já está na mesa. “O pessoal reclama de acordar cedo, mas é muita gente para se ajeitar, tem que ser assim”, entende o albergado Denoci Castro.

O Dias da Cruz tem capacidade para 100 pessoas (62 vagas masculinas e 38 femininas – meninos de até 12 anos ficam com a mãe). O atendimento é feito por dois funcionários com carteira assinada. Os demais são voluntários.

É o caso de Alexandre Cândido da Silva, que há sete anos atrás foi albergado e hoje auxilia na recepção. “Fui parar na rua porque me desentendi com a família e não tinha como pagar aluguel. Aqui me deram uma mão e voltei a trabalhar”, conta o homem de 38 anos, pai de três filhos. Há mais de três meses como voluntário, ele acredita que “existe gente boa nessa situação, cada um com algum problema, uns choram, se acomodam, outros dão a volta por cima”.

Entidade completa 100 anos em janeiro de 2007

O Instituto Dias da Cruz surgiu em janeiro de 2007, a partir da iniciativa de um pequeno grupo de adeptos do Espiritismo, que fundaram a Sociedade Espírita Dias da Cruz. “A idéia de construir um albergue era antiga e pertencia a todo o movimento espírita de Porto Alegre”, recorda o presidente da entidade. Espírita desde a adolescência, Oswaldo conta que em 1926, os membros do Dias da Cruz fizeram um mutirão e construíram o albergue com 25 leitos.

Outra ação da entidade é a creche Casa do Pequenino, que tem como objetivo atender crianças de família de baixa renda. “Nosso único pedido é que os pais estejam trabalhando”, ressalta Oswaldo. Inaugurada em 1981, acolhe 153 crianças de quatro meses a sete anos. “Contratamos professores com pedagogia ou que estejam cursando”, enfatiza a coordenadora Zuleica da Silva.

Até hoje, o Dias da Cruz se sustenta através do trabalho de voluntários e de doações. Para ajudar é necessário pegar um carnê para depósito bancário, na sede da entidade (Avenida Azenha, 366), ou entregar alimentos ao mesmo endereço. Informações através do telefone: 3223-1938.

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