Donaldo Schüler
Na noite de 12 de maio, passada, Gerald Thomas, em Fronteiras do Pensamento, ensaiou um gesto iconoclasta radical: negando a arte, o pensamento, tudo o que realizou até aqui, propôs a discussão da miséria, da violência, da política partidária. O gesto não é novo. Diógenes, no quarto século a.C., em protesto contra elucubrações verbais, anda, munido de lanterna, pelas ruas de Atenas, à procura de um homem. O cético Sexto, no segundo século da nossa era, investindo contra a especulação, opta por um comportamento empírico. Nietzsche, quebrando as tábuas da lei, derruba, em fins do século XIX, todos os valores. Marcel Duchamp, no início do século XX, envia um vaso de urinar a uma exposição de arte. John Cage reinventa a música com instrumentos danificados. O irreverente Caetano Veloso, no fervor do Movimento Tropicalista, espanta platéias com movimentos inusuais. Gerald Thomas, à tarde do mesmo dia 12, numa entrevista coletiva, perguntado se a poesia seria um antídoto contra a violência, respondeu categoricamente “não”.
Catástrofes esporádicas dessa natureza beneficiam arte e pensamento, obrigando artistas e pensadores a refletir sobre o que fazem. Declará-las, entretanto, definitivas, seria afirmar o apocalipse. Em lugar do fim catastrófico, escolho a regeneração. Sem poesia, bombas continuarão a enlutar povos oprimidos. Sem poesia, choques armados continuarão a ensangüentar ruas e ruelas nas grandes cidades. Sem poesia, troncos continuarão a fumegar em florestas incendiadas. Populações famintas necessitam mais do que pão para sobreviver. Vivem, como todos nós: de ócio, de religião, de mitos, de sonhos, de amor, de arte…Em lugar de condenar espetáculos teatrais, tratemos de torná-los acessíveis a todos.
Se persistirmos em combater a violência com atos de violência, engrossaremos os exércitos armados contra a espécie humana. Insultos e agressões não dignificam a inteligência. Se a palavra nos funda, convém cultivá-la no exercício de nossas divergências. O combate de idéias robustece o vigor de pensar. Formas e imagens confrontadas ativam a imaginação, reformam. Bastaria lembrar o trabalho vigoroso de Platão, Kafka, Beckett e Joyce para confirmá-lo.
A noite de 12 de maio de 2008, oferecida pelo Fronteiras do Pensamento, ergue-se como um dos marcos na construção da arte e do pensamento nesta alvorada do terceiro milênio.
Doze de maio de 2008
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