Alexandre Haubrich
Surgiu uma nova chance para os garotos porto-alegrenses que sonham em ser o novo Ronaldinho, o novo Kaká. O Cruzeiro, de Minas Gerais, acaba de abrir uma franquia na capital gaúcha. Uma das sedes é na Cidade Baixa, na rua Joaquim Nabuco.
O dono da franquia é Auri Montenegro, que já trabalhou nas categorias de base do São José de Porto Alegre. Ele conta com um time de peso para ajudar na administração dos garotos. Por enquanto, são oito professores, coordenados por Nestor Henrique, o homem que, nos seis anos em que treinou times de base do Grêmio, lançou nomes como Assis, Danrlei e Emerson. Há ainda o plano de contratar, para logo, uma psicóloga e uma nutricionista. Tudo isso para trabalhar com mais de duzentas crianças e adolescentes, dos cinco aos 17 anos.
O Cruzeiro sede apenas a marca, os uniformes e a possibilidade de futuro aos garotos que, através da mensalidade – os que podem pagar -, sustentam o negócio, recebendo em troca a chance de encaminhamento para a Toca da Raposa, sede do clube em Belo Horizonte.
A parceria com a prefeitura traz muitos jogadores em dificuldades financeiras, além da cessão de dois campos no Parque Marinha do Brasil, onde ocorre boa parte dos treinamentos. Os menores começam pelo futebol de salão, nas quadras alugadas na Joaquim Nabuco e na Silva Jardim.
O projeto ainda engatinha, mas a idéia é seguir o padrão de regras das categorias de base do clube mineiro. A exigência de bom desempenho escolar, por exemplo, ainda não é aplicada, mas já há uma preocupação nesse sentido. Todos os professores farão estágios na Toca da Raposa, de modo a adquirirem experiência para ser aplicada posteriormente por aqui. Todos admitem que a estrutura ainda está longe da ideal, com campos esburacados e sem vestiários, mas a força de vontade faz com que se treine abaixo de chuva ou de sol, com lama ou com campo seco.
É possível que até o fim do ano funcionários do Cruzeiro venham a Porto Alegre acompanhar o andamento do projeto e observar alguns dos garotos, podendo já levá-los para Minas. É um projeto audacioso, que prevê também a disputa de campeonatos a partir de 2008.
Como em qualquer grande clube, o assédio aos novos craques já começou. Jogadores dispensados ou relegados a segundo plano na dupla Gre-nal têm se destacado, e já despertam interesse de empresários e dos próprios Grêmio e Inter. Mesmo assim, o experiente Nestor Henrique garante: “A diferença é que aqui todos têm oportunidade. Quem não está no time principal, assiste aos treinos para se espelhar naqueles garotos e se integrar a eles. Todos têm sua chance”.
O filho da Dona Divina quer jogar
O nome dele é Carlos Handerson Pacheco Barbosa, mas a mãe o chama de “Hãn”. Ele tem 15 anos, e mora na Restinga com o pai, o irmão de 17 anos – também jogador – e a maior incentivadora: Divina Maria Pacheco.
Handerson treinou nas categorias de base do Grêmio desde os 7 anos de idade. Ali, não tinha muitas oportunidades, e foi nelas que pensou quando viu no jornal a chamada para a primeira peneira que o clube mineiro promoveria na capital gaúcha, em agosto.
Agora, o garoto de pernas finas e cerca de 1,70 m treina duas vezes por semana e espera ser chamado o mais breve possível para a Toca da Raposa, sede do Cruzeiro em Minas Gerais. Seria o início da realização do grande sonho: jogar no Arsenal, da Inglaterra, como seu ídolo, o francês Thierry Henry.
Gremista e volante, o garoto se inspira em Lucas, hoje no Liverpool, mas gostaria de jogar mais avançado, na armação. Quem defende o garoto e ataca a violência é a mãe, Dona Divina, que, desde que o filho foi assaltado na saída de um treino, percorre com ele de ônibus o longo trajeto da Restinga ao Parque Marinha. Promete fazer isso até terminarem suas férias de duas semanas, no trabalho como auxiliar de serviços gerais.
A companheira de torcida é Taisa Fortes, dona de casa. Taisa tem dois filhos jogando no Cruzeiro, Luis Ricardo e João Vitor, de 14 e 11 anos, respectivamente. Os dois são atacantes, e nunca jogaram em outros clubes.
Divina conta que, apenas este ano, viu cerca de 20 crianças conhecidas serem mortas no bairro onde mora, e garante que o esporte e as oportunidades são o caminho para afastar seu tesouro do crime. “Muitos meninos convidam ele para dar uma volta na hora do treino, dizem que ele perde tempo, que o tráfico é o caminho mais fácil. O esporte dá a chance de uma vida diferente, e não deixa que ele fique batendo perna, sem ter o que fazer”, explica.
Handerson quer ganhar dinheiro para ajudar a mãe, que ganha um salário mínimo por mês, mas ela tem outra visão: “Na nossa idade, não precisamos de mais nada. Quero é que ele consiga dar para os filhos a vida que eu não pude dar a ele”.
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