Feira de Cambará do Sul tem o "melhor mel do mundo"

GERALDO HASSE
Os mais antigos apicultores de Cambará do Sul não se esquecem da primeira tentativa de realizar uma feira do mel da cidade. O ano, ninguém sabe, mas foi no mês de julho do início da década de 1980.
O CTG Baio Ruano realizava seu tradicional rodeio na Fazenda das Corucacas, a um quilômetro do centro da cidade. Vendo a multidão atraída pelo evento equestre, um grupo de apicultores teve a ideia de armar ali mesmo uma barraca para vender o estoque de mel remanescente do último verão.
Teria dado certo se os promotores do rodeio não se incomodassem com a incursão comercial dos produtores de mel.
Obrigados a retirar seu caminhão do recinto, os apicultores aproveitaram a desfeita para organizar a Associação Cambaraense de Apicultores (Acapi), fundada em 11 de julho de 1984  sob incentivo e orientação do agrônomo José Otávio Aragon, responsável técnico pelo escritório da Emater-RS no município (Aragon vive hoje em Florianópolis).
O primeiro presidente foi Luiz Eleu dos Santos Lima, o Biriva, auxiliar de veterinário da Secretaria da Agricultura do Estado. Aos 79 anos, “todo quebrado” por acidentes com animais, ele continua na ativa, não mais como produtor de mel, mas como guia e zelador de apiários migratórios que chegam para explorar a rica flora regional.
Logo depois da fundação da Acapi foi realizada a 1ª Feira do Mel de Cambará do Sul, evento que passou a divulgar anualmente ou a cada dois anos as excepcionais qualidades do “mel branco” produzido pelas abelhas dos Campos de Cima da Serra a partir do néctar das flores de três árvores típicas desse ecossistema: carne-de-vaca, gramimunha e guaraperê.
Trata-se de um mel claro e aromático cuja principal característica é cristalizar sob baixa temperatura, assumindo facilmente a aparência da banha de porco. Exatamente por isso ele gera desconfiança nas pessoas acostumadas ao mel viscoso da maioria das fontes vegetais.
Quatro décadas depois da sua estréia, a feira do mel de Cambará está em plena 25ª edição.
Começou no fim de semana da Páscoa passada e termina no próximo domingo, 8 de abril. Modesta, orçada em R$ 105 mil, ocupa um quarteirão ao lado da igreja matriz consagrada a São José.
Para evitar o frio e as chuvas comuns nos Campos de Cima de Terra, o local foi coberto por uma estrutura de lona branca que abriga cerca de 30 expositores, seis deles membros ativos da Acapi, que apóia o esforço da nova Associação dos Apicultores dos Campos de Cima da Serra (Apicampos) para registrar o mel branco como um produto regional digno de merecer um selo de origem geográfica, como os vinhos da Serra Gaúcha, as carnes do Pampa e os queijos artesanais da agricultura familiar, entre outros alimentos orgânicos.
Com sete mil habitantes, Cambará do Sul tem 400 famílias rurais atendidas pela Emater-RS. Destas, 120 possuem alguma atividade apícola. Destes, 30 são profissionais que têm na apicultura sua maior fonte de renda.
“A maioria das pessoas ignora que o mel se tornou um bom negócio”, diz Nivaldo Castellan, presidente da Acapi, autodeclarado profissional da apicultura, embora também faça dinheiro com a criação de gado.
Aos 50 anos, ajudado em sua banca pelo filho Maicon, de 15 anos, e a esposa Lurdinha, funcionária municipal, Castellan está vendendo mel a R$ 25 o quilo, o mesmo valor praticado pelos apicultores presentes na feira. Estão todos satisfeitos com as vendas.
A safra de 2018 revelou-se melhor do que os prognósticos feitos com base no comportamento anômalo do clima. Ainda não foi feito um balanço da produção, mas é consenso que não se chegou ao recorde de 2002, quando Cambará produziu 450 toneladas de mel, o equivalente a 1% da produção nacional.
Naquele ano sobrou tanto mel que o veterano apicultor Cely Carvalho foi escalado para apresentar o produto cambaraense num seminário de apicultura em Porto Alegre. “Isso não é mel, é puro açúcar”, disse um técnico diante do pote de conteúdo esbranquiçado. “Pois mande analisar: se não for mel, eu pago a despesa do laboratório”, respondeu Carvalho.
É claro que o desafio não foi levado adiante, mas desde então o mel branco não parou de crescer no conceito dos consumidores e dos especialistas em apicultura.
“Estou pra lhe dizer que o mel de Cambará é o melhor do mundo”, afirma Carvalho, ainda ativo no ramo, aos 81 anos.
Entretanto, ao observar as mudanças em curso nas atividades apícolas, entre elas a presença crescente de apicultores migratórios disputando áreas de mata na região e a diversificação no uso das terras por agricultores vindos de fora para plantar batata e soja nos Campos de Cima da Serra, ele conclui: “A apicultura está ficando mais complicada do que namoro de vesgo”.
 

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