Hidrovia do Mercosul pode entrar no PAC III

O projeto está pronto, os investimentos detalhados, as licenças ambientais estão encaminhadas.
Os técnicos agora estão  buscando apoio político para incluir no PAC III a sonhada Hidrovia do Mercosul. O PAC III é o novo pacote de investimentos em infraestrutura que o governo federal está gestando.
A hidrovia é um projeto de  20 anos, faz parte de um acordo entre os governos brasileiro e uruguaio.
Vai ligar o centro produtivo do Rio Grande do Sul aos portos de Rio Grande e Montevidéo, numa extensão de 1.800 quilômetros de vias navegáveis.
O  porto de Estrela (foto), no rio Taquari, é o ponto estratégico deste projeto. Está situado num entroncamento onde se ligam importantes rodovias e ferrovias que ligam as regiões de onde sai a maior parte da produção de grãos do Estado.
 Estrela, um porto abandonado
Inaugurado em 1977 pelo general Adalberto Pereira dos Santos, vice-presidente da República, o porto fluvial de Estrela brilhou inicialmente como o maior entroncamento rodo-hidro-ferroviario do Sul do Brasil.
Em operações sustentadas por caminhões e trens, ali eram carregadas barcaças de soja para o porto de Rio Grande. O recorde de movimentação chegou a 1,3 milhão de toneladas em 1987.
Depois daquele pico, a maior parte das indústrias de soja se transferiu para junto do porto de Rio Grande, esvaziando Estrela e Lajeado, a cidade do outro lado do rio Taquari.
Movimento diminui a cada ano
Além de ter perdido a maior parte de suas cargas, o porto não cresce porque, mesmo sendo alvo permanente de dragagens para a retirada de cascalho, seixos e pés-de-moleque, passa a maior parte do ano com baixo calado, desanimando tanto os donos de cargas quanto os armadores de navios.
Além disso, pesa-lhe a baixa conexão com a ferrovia ALL, que prefere concentrar seus vagões em trechos mais lucrativos.
Devido ao baixo movimento naval, o pessoal do porto, reduzido a 17 pessoas, tem tempo de manter uma bela horta nos fundos da repartição.
Quando pinta operação de carga ou descarga, o porto faz mutirão com mão-de-obra contratada na cidade.
Quem vê o cais quase sempre vazio não imagina que esse simpático porto fluvial tenha maquinário capaz de movimentar 600 toneladas por hora.
Em abril  de 2013, um acidente com o navio Trevo Azul chamou atenção para as péssimas condições de navegação no rio Taquari, entre o Porto de Estrela e o cais de Porto Alegre.
O casco do navio quase se rompeu no choque com os cascalhos no leito raso do rio.
Resultado: em 2014, apenas cinco embarcações – afora chatas carregadas de areia – realizaram o trajeto entre Estrela e a capital gaúcha.
A última empresa a desistir de transportar mercadorias pela hidrovia do Taquari, a Navegação Aliança desistiu de seguir “arriscando”.
Foram só três viagens até Estrela em 2014.
O diretor operacional da empresa, Ático Scherer, declarou à imprensa: “Não estamos mais fechando contratos para buscar carga no Porto de Estrela. É muito arriscado”.
Segundo Scherer, o último frete realizado levou cerca de 2,4 mil toneladas de fertilizantes, menos da metade da capacidade do navio, por causa dos bancos de areia. “Com pouca carga, o transporte naval fica caro”.
A empresa opera na hidrovia desde 1980. Em épocas de intensa atividade, costumava fazer entre seis e sete viagens por semana.
A média era de 40 mil toneladas transportadas a cada 30 dias. Em 2014 não atingiu 25% desse montante. “Estrela conta com um dos melhores portos do Brasil, e ele está cada vez mais abandonado. É desanimador.”
“Sem pai e nem mãe”
Quando assumiu no início de 2014, o superintendente da Administração das Hidrovias do Sul (AHSul/Dnit), Elói Spohr, disse que o Porto de Estrela estava “sem pai e nem mãe”, apesar da qualidade da estrutura. Ligado  à Secretaria dos Portos (SEP), era administrado pela Docas do Maranhão, uma empresa privada .
Spohr advertia  no entanto que, sem um real envolvimento da iniciativa privada e de gestores municipais, nada aconteceria. Nada aconteceu.
No início do ano passado o governo do Estado chegou assumir o porto, disposto a revitalizá-lo. Penso em criar uma empresa pública para administrá-lo, mas não teve tempo de fazer nada. Agora o governo Sartori faz gestões para devolver o porto de Estrela à União.
No ano passado, executivos da Terminal Multiusos do Beato, grupo português, acenaram com a intenção de investir R$ 300 milhões na reestruturação do local. As negociações não avançaram.
Projeto está orçado em R$ 270  milhões
Um “corredor multimodal”, interligando o Porto de Estrela aos portos de Montevidéu e Rio Grande, é um projeto de mais de 20 anos, que já perdeu o crédito junto aos empresáros do setor naval.
Agora, mesmo com o entusiasmo aque suscita, não sairá do papel antes do segundo semestre de 2015. Se sair.
Anunciado no início do ano passado, o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTA) foi entregue em novembro de 2014.
Custou cerca de R$ 5 milhões, e apontou as principais necessidades de investimentos. Os projetos executivos estão prontos. Faltam os licenciamentos ambientais do Ibama e da Fepam para iniciar as licitações.
O estudo aponta falta de dragagem contínua, sinalização e necessidade de balizamento como as principais carências do trecho.
Alterações nos limites da eclusa de Bom Retiro do Sul também devem ocorrer a partir do próximo ano. Permitirão elevar em 50 centímetros o calado, que hoje é de 2,50 metros.
Há discrepâncias entre os valores anunciados para implementar o novo corredor. Em 2009, a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, anunciava cerca de R$ 240 milhões em investimentos provenientes do PAC II. Em 2012, o anúncio era de R$ 270 milhões. No início do ano passado, o valor baixou para R$ 217 milhões.
Apontada como prioridade dentro do Plano Nacional de Logísticas e Transportes entre os anos de 2008 e 2011, a hidrovia deve abranger a Bacia da Lagoa Mirim, da Lagoa dos Patos, do Lago Guaíba, os rios Jacuí, Taquari, Sinos, Gravataí, Camaquã, Jaguarão, Uruguai e Ibicuí. No lado uruguaio, o projeto inclui ainda os rios Cebollatí e Tacuary.
Detalhes do Porto
A estrutura está construída em uma área de 49 hectares, com capacidade para movimentar até três milhões de toneladas por ano.
Tem acesso pelo Rio Taquari, e os terminais têm conexões pelos modais rodoviário e ferroviário. O cais de acostagem tem 585 metros de extensão e dispõe de seis berços, sendo três para operações de embarque e três para desembarque.
Conta ainda com dois armazéns graneleiros. Um para 13 mil toneladas e outro para 37 mil toneladas de capacidade estática, e um silo vertical de 40 mil toneladas. Para carga geral, o armazém disponível tem 2,26 mil metros quadrados. A estrutura foi construída entre 1975 e 1977, quando houve a inauguração oficial.
“SEM COMPROMETIMENTO DE TODAS AS PARTES, HIDROVIA NÃO FUNCIONA”
(da revista JÁ, maio de 2014) – “Eu vivo dizendo que as cargas existem e as hidrovias estão aí, mas só poderemos  juntá-las se houver um real comprometimento das partes envolvidas: os donos das cargas, os donos dos barcos, os operadores dos portos e a ferrovia”. A frase, entre otimista e desanimada, é de José Luiz Azambuja, diretor da Administração das Hidrovias do Sul (AHSul), responsável  pela Hidrovia do Mercosul, que liga (mais na teoria do que na prática) o porto de Estrela à porção uruguaia da Lagoa Mirim.
Remanescente da Portobrás, extinta em 1990, a AHSul permanece vinculada ao Ministério dos Transportes, embora devesse fazer parte da Secretaria Especial dos Portos. Essa situação administrativa anômala se agrava quando se recorda que a AHSul cuida da pólos menos operativos do sistema hidroviário gaúcho. Com três eclusas, o rio Jacuí é movimentado apenas por barcos de areia, lazer e pesca, todos de pequeno porte. Com uma eclusa e o calado de 2,50 metros (o mesmo do Jacuí), o rio Taquari raramente recebe navios, mesmo oferecendo um porto bem equipado em Estrela, município bem servido por rodovia federal (BR-277) e ferrovia operada pela América Latina Logística. Na Lagoa Mirim, navegam apenas pequenas embarcações de lazer ou pesca.
Mais movimentado, com calado de 5,20 m e os cais mais extensos do país, o porto de Porto Alegre é administrado pela Superintendência de Portos e Hidrovias, estatal gaúcha que tem também a concessão do porto de Pelotas, praticamente inviabilizado pela proximidade (60 km) do porto de Rio Grande, cujo calado se mantém acima de 16 metros, atraindo grandes navios transoceânicos.
O rico porto de Rio Grande, que caminha para se tornar o maior do Mercosul, tem administração exclusiva, mais voltada para a navegação internacional do que para a  interior. No total, os portos e as hidrovias gaúchos são explorados por três instituições públicas que se olham atravessado, pois são absolutamente desiguais.

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