Nei Duchós*
Confesso que senti falta da barreira de velhos eucaliptos que existiam atrás da goleira do campo de futebol do Colégio Santana, em Uruguaiana.
Hoje o campo está muito melhor, mais cuidado, mas falta alguma coisa, precisamente essa fila de árvores que definiram o cheiro da minha infância. Costumávamos juntar folhas secas para queimá-las, só para sentir o ar perfumado. Acho também que eram usadas para afastar mosquitos. Serviam de quebra-vento, evitando assim que os jogos fossem assolados pelo minuano importado do pampa hispânico.
Costumávamos dizer, quando a bola extrapolava os limites do bom senso e se chocava muito além do travessão, que ela batia lá nos eucaliptos. Isso servia quando a árvore nem estava por perto. Chutar forte, longe do gol, só para buchinchear, era atingir os eucaliptos, estivessem eles lá ou não.
Tudo isso me ocorre depois da leitura de Eucalipto, Histórias de um Imigrante Vegetal (JÁ Editores, 128 pgs., 25 reais), de Geraldo Hasse, que aprofunda o tema e dá um banho de informação sobre silvicultura no Brasil e, especialmente, no Rio Grande do Sul.
TALENTO – Escrito com clareza e talento, o livro dedica uma boa parte do estudo à polêmica gerada pelo interesse de grandes empresas de papel e celulose de se instalar no pampa. Lança luz sobre essa briga candente, privilegiando os aspectos técnicos, fundamentado em seleta e providencial bibliografia e manejando a sustentabilidade de um espírito desarmado, a serviço da informação bem apurada.
Hasse é craque no seu ofício. Dá voz a engenheiros, empresários, ambientalistas e aposta num acordo em favor do desenvolvimento sem agressão ao meio ambiente. Minha dúvida é se as leis de regulamentação não serão desvirtuadas em favor da desertificação da paisagem, mas isso o autor também discorre com propriedade.
Hoje, com a pressão internacional a favor do planeta, é impossível para empresas multinacionais, diz Hasse,deixarem de lado as necessidades de um país escaldado na agressão ambiental.
HISTÓRIA – Mas a polêmica é uma parte do livro. O que mais gostei foi a história do eucalipto em terras brasileiras e os estudos que o colocam entre as opções mais preciosas do insumo para uma série de atividades industriais. O argumento mais poderoso apontado por Hasse é que o Rio Grande do Sul original não existe mais, transformado que foi pela pecuária e as plantações de arroz.
Há vasta devastação e estagnação econômica. Nas entrelinhas, se é que eu entendi direito, Hasse sugere que a luta ambientalista está voltando a maior parte das suas baterias para uma empresa nacional, a Aracruz Celulose, e que a pressão poderá muito bem ajudar a concorrência de empresas estrangeiras, de olho na paisagem superfavorável à silvicultura (que não se restringe ao eucalipto, mas também ao pinheiro, este muito mais maléfico quando transformado em monocultura).
CONFIANÇA – O que importa é que o jornalismo está a serviço do esclarecimento neste livro. Por mais que exista convencimento de ambas as partes, é importante que os espíritos se desarmem e encontrem soluções a favor do país e da população.
Pessoalmente, implico demais com essa indústria e só mesmo Geraldo Hasse para prender minha atenção num texto que levanta todas as possibilidades existentes sobre o tema. Sou contra a desertificação, mas o livro sustenta que a convivência pacífica entre o eucalipto e a paisagem é favorável e proveitosa para ambos os lados. Confio no trabalho de Geraldo, que tive o prazer de encontrar na Feira do Livro de Porto Alegre em 2006, quando ele me trouxe um exemplar de presente.
O Diário da Fonte é uma coluna de um jornal de Uruguaiana que reproduz crônicas do blog: www.consciencia.org/neiduclos
Lá nos eucaliptos
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