Em vigor desde 1996, a chamada Lei Kandir* retira o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de produtos primários ou semielaborados, com o objetivo de fomentar as exportações.
A própria lei prevê que os Estados sejam indenizados pelas as perdas na arrecadação do principal tributo estadual, mas essa compensação nunca foi feita como deveria. É uma demanda antiga dos Estados exportadores, com ações na Justiça, inclusive.
Uma tentativa de encaminhar a questão é o Projeto de Lei Complementar 511/18, criado pela Comissão Especial Mista, em tramitação no Congresso Nacional. Propõe alterações na Lei Kandir para garantir que se refere a compensação da União aos Estadosl e Municípios, por conta da perda de receita decorrente de desoneração do ICMS.
Segundo o Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado do Rio Grande do Sul (Sindifisco/RS), na proposta em tramitação no Congresso Nacional, cerca de R$ 39 bilhões por ano seriam destinados aos Estados exportadores. O Rio Grande do Sul, um dos maiores exportadores de grãos, tem potencial para receber algo em torno de R$ 3 bilhões por ano.
Nos últimos cinco anos, a média de ressarcimento foi de apenas 10% das perdas, quando nos primeiros anos da lei era de 50%.
Conforme a Secretaria da Fazenda, o Estado recebe algo ao redor de R$ 380 milhões por ano como ressarcimento pelo ICMS que deixou de recolher, uma média que veio despencando nos últimos anos.
Em 2017, o Sindifisco-RS informa que a União liberou R$ 185,3 milhões, sendo que 25% desse valor vai para os municípios. As prefeituras também se beneficiariam com o projeto: em Porto Alegre, por exemplo, seriam cerca de R$ 85 milhões a mais por ano.
A regulamentação da Lei Kandir precisa ser aprovada até o final de agosto. Caso o Congresso não vote, o TCU deverá regulamentar. Se chegar até esse tribunal, o pleno poderá derrubar o texto benéfico aos Estados.
Em 21 anos de vigência da Lei Kandir, o Rio Grande do Sul acumula perdas estimadas em mais de R$ 50 bilhões.
Segundo cálculos do Comitê dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) os Estados que mais acumularam perdas ao longo de 20 anos foram Minas Gerais (R$ 88,1 bilhões); Rio Grande do Sul (R$ 50,1 bilhões) e Pará (R$ 32,5 bilhões).
A proposta em tramitação no Congresso Nacional, se aprovada, determinará o repasse anual aos Estados de R$ 39 bilhões, com valores diferenciados nos dois primeiros anos.
Segundo o projeto, haverá um período de transição com pagamentos específicos para os anos de 2019 (R$ 19,5 bilhões) e 2020 (R$ 29,25 bilhões), sempre corrigidos pelo IPCA. O valor total deverá ser pago no prazo máximo 30 anos.
Se vingar esta proposta, o Rio Grande do Sul passaria a receber algo ao redor de R$ 3,6 bilhões por ano a partir de 2021. Em 2019, seria R$ 1,8 bilhão. Atualmente, o Estado recebe por ano menos de 10% disso, como ressarcimento pelo ICMS que deixou de recolher sobre as exportações.
*Lei Kandir, lei complementar brasileira nº 87 que entrou em vigor em 13 de setembro de 1996 no Brasil, dispõe sobre o imposto dos estados e do Distrito Federal, nas operações relativas à circulação de mercadorias e serviços (ICMS).
A lei Kandir isenta do tributo ICMS os produtos e serviços destinados à exportação. A lei tem este nome em virtude do seu autor, o ex-deputado federal Antônio Kandir.
O que pensam os candidatos
José Ivo Sartori (MDB)
O governador, candidato à reeleição, aceitou, num primeiro momento, desistir da via judiciária, para obter compensação das perdas causadas pela Lei Kandir.
A desistência de ações na Justiça contra a União era uma das exigências para a adesão ao Programa de Recuperação Fiscal, que Sartori negocia com o governo Federal. Integrantes do governo estadual chegaram a declarar que buscar ressarcimento pela Lei Kangir era “uma utopia”.
Agora, as expectativas do governador voltam-se para o projeto que tramita no Congresso, estabelecendo normas para a compensação aos Estados. Diz Sartori: “É fundamental a pressão junto ao Congresso Nacional visando a votação do projeto que estabelece o repasse de recursos da Lei Kandir para Estados e municípios exportadores”.
Jairo Jorge (PDT)
“A Lei Kandir é necessária porque torna os exportadores gaúchos, sobretudo os de soja, mais competitivos no mercado mundial. Ao mesmo tempo, o governo tem de buscar as compensações da Lei Kandir, não pode ficar parado”.
Júlio Flores (PSTU)
“Pretendo lutar pelo fim da Lei Kandir que beneficia grandes empresários e fazendeiros. As isenções de impostos devem ser direcionadas às classes trabalhadoras. Recuperar os créditos da Lei Kandir e acabar com ela é uma necessidade imperiosa, porque são R$ 5 bilhões todo ano que deixam de entrar nos cofres por conta dessa lei.”
Miguel Rosseto (PT)
“O Estado é credor de R$ 4 bilhões ao ano junto à União por conta das isenções previstas na Lei Kandir. Uma articulação capaz de buscar esses recursos é necessária.”
Roberto Robaina (PSol)
“Requer que a União ressarça o Estado por cerca de R$ 50 bilhões em perdas em consequência da Lei Kandir, uma legislação que precisa ser revogada. Compreendo que a medida traria impacto ao agronegócio, mas uma solução possível seria a criação de um imposto nacional sobre as exportações. Esse tributo permitiria aos Estado ter parte da arrecadação, substituindo o atual modelo em que os governo estaduais perdem e deixam de ser ressarcidos.”
Eduardo Leite (PSDB)
“As medidas de reestruturação, que vão dar o fôlego para o desenvolvimento, têm que ser propostas nos seis primeiros meses de governo. As mudanças não podem ser depositadas em temas que são temerários, como a Lei Kandir. Nós temos que trabalhar muito na geração de riquezas do Estado, para estarmos em uma melhor condição quando reencontrarmos a dívida com a União.”
Mateus Bandeira (Novo)
“Essa história da Lei Kandir é uma falácia. Não há perdas com essa lei. Ela foi implementada em 1996, promovendo a desoneração dos produtos semielaborados. Nos primeiros três anos, o ICMS gaúcho teve uma ligeira queda em relação ao PIB. Mas, a partir de 1998 – e nesses três anos o Estado recebeu compensações – o ICMS cresceu na proporção do PIB. Portanto, a lei propiciou uma melhoria da competitividade na exportação de produtos semielaborados, por conta da desoneração, permitindo que o Rio Grande do Sul pudesse exportar mais. Isso gerou renda, que ficou aqui. No cenário oposto, se tivéssemos mantido a tributação sobre os produtos semielaborados, será que teríamos exportado tanto? É claro que não. Apontar as compensações da Lei Kandir como solução significa fugir do verdadeiro problema. A equação fiscal não é um problema de receita, mas do tamanho do Estado, da despesa pública.”
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