Museu Nacional em chamas é o retrato do Brasil de 2018

O incêndio que destruiu quase todo o acervo do Museu Nacional na noite deste domingo, no Rio, é o “retrato” do Brasil de 2018, submetido a uma política de desmonte dos serviços públicos em todos os níveis.
O Museu não tinha prevenção e os bombeiros, quando o incêndio se alastrou, não tinham água para conter o fogo.
“Todas as unidades (da universidade) estão afetadas por esse política”, segundo o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, à qual o Museu é vinculado.
“Este incêndio sangra o coração do país,” disse o reitor.
Leher reconheceu a falta de condições para enfrentar uma emergência desse porte. “Reconhecemos o trabalho valoroso do Corpo de Bombeiros, mas percebemos claramente que faltou uma logística e uma capacidade de infraestrutura.”
Sem água nos hidrantes, o incêndio avançava enquanto os bombeiros aguardavam a chegada de carros-pipa enviados pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio (Cedae).
Bombeiros, professores e técnicos do museu dizem que ainda conseguiram salvar algumas peças do acervo, composto por milhões de obras e documentos.
Mas, segundo o diretor de Preservação do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, João Carlos Nara, “o dano é irreparável”. 
“Infelizmente a reserva técnica, que esperávamos que seria preservada, também foi atingida. Teremos de esperar o fim do trabalho dos bombeiros para verificar realmente a dimensão de tudo.
“É uma edificação muito antiga que foi concebida em um contexto em que não existia o uso de energia, muito menos o uso intensivo de energia como são as edificação acadêmicas, que têm laboratórios, área administrativa, informática”, afirmou Nara.
Ele também afirmou que as instalações do museu contavam com uma brigada de incêndio que realizava “trabalho sistemático” junto ao Corpo de Bombeiros e à Defesa Civil, e que os extintores estavam “em ordem”.
Para a ex-secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura Ivana Bentes, não é possível atribuir à tragédia a um suposto “descaso” da UFRJ. “Não existe política pública para manter e conservar nosso patrimônio. É o mesmo descaso com o patrimônio, a pesquisa, a ciência e tudo que é público. O Museu sobrevive com o mínimo de recursos do Estado.”
Ela lembra que até mesmo o público chegou a contribuir com “vaquinha” para ajudar na manutenção do museu, e disse que tragédias dessa dimensão podem ocorrer em outras instituições que vivem na mesma situação. “São incêndios e tragédias que não são ainda mais frequentes nem sabemos porquê. Na adversidade vivemos e as universidades fazem muito e muitíssimo com muito pouco.”
Segundo a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC-RJ), desde 2014, o “Governo Federal não faz os repasses apropriados para a manutenção do Museu”. O órgão também declarou que o incêndio “é um símbolo do descaso do governo atual com a nossa cultura, ciência e patrimônio.”
Perdas
Com 20 milhões de peças e documentos, tratava-se do quinto maior museu do mundo em acervo. Suas obras contavam uma parte importante da história antropológica e científica da humanidade. Talvez o exemplo mais emblemático seja o fóssil com mais de 11 mil anos de Luzia, a mulher mais antiga das Américas, cuja descoberta nos anos 1970 reorientou todas as pesquisas sobre a ocupação da região.
Ali também estava a reconstrução do esqueleto do Angaturama Limai, o maior dinossauro carnívoro brasileiro, com quase todas as peças originais, algumas com 110 milhões de anos. O sarcófago da sacerdotisa Sha-amun-em-su, mumificada há 2.700 anos e presenteada a Dom Pedro 2º em 1876, nunca tinha sido aberto. A coleção de múmias egípcias e a de vasos gregos e etruscos evidenciam o perfil transfronteiriço do acervo, que também abrigava o maior conjunto de meteoritos da América Latina.
Menos de 1% dessas obras estava exposta ao público. Centro de pesquisa e pós-graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Museu Nacional é uma referência para pesquisadores das mais diversas áreas, como etnobiologia, paleontologia, mineralogia, antropologia, entre outras.
“Todos que por aqui passem, protejam esta laje, pois ela guarda um documento que revela a cultura de uma geração e um marco na história de um povo que soube construir seu próprio futuro.” Após o incêndio que destruiu o Museu Nacional neste domingo, a frase inscrita em lápide na entrada do local soa como um grito de socorro.

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