Casas são demolidas para a construção de espigões (Fotos: Carla Ruas/JÁ)
Carla Ruas
O Moinhos de Vento está sofrendo transformações em sua paisagem. Depois da primeira onda de demolições, no início dos anos 2000, tradicional bairro de Porto Alegre está assistindo à uma nova onda de casas postas abaixo.
Imóveis antigos nas ruas Coronel Bordini, Dr. Timóteo, Tobias da Silva e Marquês do Herval estão sendo substituídos por edifícios, estacionamentos e centros profissionais. Os moradores observam as mudanças e lamentam a descaracterização do bairro. Mas não protestam como fizeram nos últimos anos. O fato pode ser explicado pela frustração com a demora na revisão do Plano Diretor.
Na rua Marquês do Herval, entre as ruas Cel Bordini e Quintino Bocaiúva, um tapume cerca um grande terreno. A área abrigava três casas, que foram derrubadas nos últimos meses. Uma era sede do Restaurante Wunderbar, que fechou as portas em fevereiro. Outra casa era da família do músico Rafael Malenotti, da banda Acústicos e Valvulados.
Nas últimas semanas, a mesma construtora que adquiriu os terrenos também comprou as duas casas ao lado. Com isso, colocará abaixo quase a metade do quarteirão, ou seja, os cinco imóveis perfilados vão abaixo.
Na Marquês do Herval, três imóveis já foram abaixo. Casas vizinhas também serão derrubadas
Uma das edificações que ainda está em pé, é o antigo endereço da loja Luciane Design, de móveis externos. A proprietária, Luciane Thomé Lutz, conta que não pretendia se desfazer do imóvel, mas acabou cedendo à insistência dos representantes da construtora. “Não queríamos sair dali, mas eles insistiram muito, ligavam para cá todos os dias”, lembra. Ela continua no Moinhos, só que agora o estabelecimento fica na rua Comendador Caminha.
O terreno das cinco casas totaliza um espaço largo e com profundidade. Segundo os vizinhos, dará lugar a um edifício residencial de 17 andares. A moradora Sílvia Duha, que mora há 20 anos em frente à área, está descontente com a altura do futuro prédio.
“Deveria ter no máximo 13 andares. Essa altura proposta é desproporcional”, diz ela, que lamenta a descaracterização do bairro. “É muito bom morar numa rua com casas”, confessa Sílvia, que reside em um edifício de três pavimentos.
Por outro lado, Sílvia acredita que o edifício novo pode trazer mais segurança. “Vai ter porteiro de plantão na frente e movimento de entrada e saída”. Ela lembra que na semana passada um carro foi arrombado em frente ao seu apartamento. Desde então, ela sai menos de casa porque ficou com medo.
A moradora Sílvia Duha lamenta a descaracterização do bairro
Ainda na Marquês do Herval, entre as ruas Quintino Bocaiúva e Dr. Timóteo, outro tapume evidencia mais um desmanche de casas. São duas, entre os números 540 e 552. O espaço deve dar lugar a um hotel, conforme informação da vizinhança.
Presidente do Moinhos Vive culpa Plano Diretor
A acelerada transformação do bairro Moinhos de Vento está extingüindo as casas do bairro. Os imóveis de um ou dois pavimentos praticamente resistem apenas em empreendimentos comerciais.
O presidente do Associação dos Amigos e Moradores do Bairro Moinhos de Vento – Moinhos Vive, Raul Agostini, observa que o fenômeno desencadeou uma mudança na zona que não tem volta. Ele entende que a culpa é do Plano Diretor, que não favorece a preservação ambiental e cultural.
“Porto Alegre está perdendo um pouco da sua identidade. Qualquer cidade civilizada faria questão de manter e preservar a sua história”, observa. Agostini aponta como solução paliativa a revisão do Plano, discussão que se arrasta desde 2003, sem uma solução. “Isso acontece por interesses que não são da população”, denuncia.
Agostini diz que as alterações no Plano ainda não foram aprovadas por interesses econômicos das construtoras. Para ele, o adiamento é estratégico a fim de que sejam construídos novos espigões, antes da implantação de uma nova lei, que imponha mais limites. “É a ignorância somada à ganância”, ataca.
Além da paisagem, o presidente do Moinhos Vive também se preocupa com a oneração do poder público. Cita como exemplo a impermeabilização do solo a partir das novas construções, o que gera gastos corretivos, como a milionária obra do Conduto Forçado Álvaro Chaves-Goethe. “E quem paga são os cidadãos, com tributos cada vez mais altos”.
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