"O sequestro dos uruguaios": edição em espanhol lançada em Montevidéu

O jornalista Luiz Cláudio Cunha lançou na semana passada, em Montevidéu, a edição em espanhol de “O sequestro dos uruguaios”, o livro reportagem que desnuda o acordo terrorista que vigorou entre as ditaduras do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai.
“É um projeto político, não editorial”, disse ele ao JÁ. “Doei meus direitos de autor ao SERPAJ, Servicio Paz y Justicia, a ONG de direitos humanos mais importante do Uruguai, que assina a edição”.
O livro foi financiado pela Fundação Rosa Luxemburgo, de Berlim, com apoio do Ministério de Desenvolvimento da Alemanha.
Por isso, o livro não será vendido,mas distribuído gratuitamente no Uruguai. Na próxima semana a edição digital estará disponível gratuitamente na internet.
A edição brasileira está esgotada, existem menos de 10 exemplares na Estante Virtual. Mas,desde o mês passado está no formato de e-book, para Kindle, no site da Amazon e da L&PM.
A entrevista abaixo foi dada no lançamento do livro ao jornalista uruguaio Gerardo Iglesias:                
-Qual é o sentimento com esta edição do livro em espanhol?
-Tenho a sensação de haver concluído uma tarefa ao final de quase quarenta anos. Primeiro foram as reportagens na revista Veja em 1978 e 1979, depois o livro que foi finalmente publicado em 2008. A edição em espanhol era um sonho. Recorrí a varias editoras aquí em Montevideo, mas não havia interesse, ou porque o tema era inconveniente, ou não era rentável… Felizmente pude contar com o Jair Krischke, que jamais desistiu do desafío. Um dia Jair me telefonou e disse: “Luiz Cláudio, tenho a solução para teu libro. A fundação Rosa Luxemburgo, de Berlim, vai assumir a tradução e a edição em espanhol”.
A partir desse momento a Fundação contatou o Serviço de Paz e Justiça (Serpaj) de Montevideo e começou a tarefa que tornou possível realizar este sonho, meu e de Universindo Rodríguez,* que infelizmente não pode ver concluído este trabalho tão uruguaio e tão importante para os uruguaios. Tenho como consolo que realizando esta edição cumprimos o sonho de vários uruguaios e isso me alegra profundamente.
Neste livro está a voz de meus irmãos uruguaios que padeceram essa ditadura tão brutal, que se deu paralelamente à brasileira, a argentina, a chilena e a paraguaia.
-Qual é a tua sensação e tua análise quando, hoje, nas manifestações sociais no Brasil pedem o regresso dos militares?
-Felizmente se trata de uma minoria insignificante, são jovens ignorantes e inconsequentes, desinformados, que ouviram por aí que o regresso dos militares solucionaria a atual crise e levantam essa bandeira, que atesta sua ignorância sobre a nossa história recente. Tem também gente mal intencionada, mas a grande maioria são aqueles que ignoram o que se viveu. No Brasil durante os anos da ditadura a imprensa não podia falar de nada vinculado aos militares, muito menos denunciar seus roubos, porque se roubou muito durante esses tempos. Quando vêm com o discurso imbecil de que “voltem os militares para acabar com a corrupção” estão dizendo algo completamente ridículo. Os militares, além do mais, roubaram o mais primordial, o poder do povo, e isso é algo completamente imoral.
-Acreditas que se perdeu uma grande oportunidade  de investigar  o que realmente sucedeu a ditadura brasileira nos governos do PT?
-Nem Lula, nem Dilma Rousseff durante seus governos -14 anos de poder- enfrentaram a questão crucial da impunidade dos crimes de lesa humanidade que se cometeran. Dilma teve o grande mérito de convocar a Comissão da Verdade, da qual participei. Saí da comissão um ano depois, por divergências políticas com as pessoas que conduziam as investigações, mas apesar disso esta Comissão realizou um trabalho muito importante. Depois de dois anos logrou responsabilizar os cinco generais presidentes do ciclo da ditadura: Castelo BrancoMédiciCosta e SilvaGeisel y Figueredo e mais de 300 agentes torturadores, policiais, civis y militares. O que sucedeu foi que seu relatório foi entregue ao governo e nada aconteceu. Se investigou, se descubriram nomes, se detalharam casos e não houve consequências, porque o Brasil tem um medo endêmico de tratar o tema da ditadura. E os militares de agora assumem uma solidariedade corporativa com seus colegas ditadores, com condutas e crímes que deveriam condenar já que não têm nada a ver com eles.
Por outro lado, a classe política brasileira está tão imersa num círculo de corrupção que não tem interesse em tratar temas como os crímes cometidos durante a ditadura.
Sou muito pessimista neste tema. O Brasil não tomou o exemplo do Uruguay, que mandou ao cárcere dois ex-presidentes da ditadura, Juan María Bordaberry y Gregorio Álvarez, um civil e um militar. No meu país, em 21 anos os ditadores  nem sequer foram denunciados.
O Brasil é um país cínico, hipócrita, finge que teve uma ditadura limpa, moderada, práticamente um modelo de ditadura. Mas na realidade foi tremendamente daninha para o país, interveio em milhares de sindicatos, exilou milhares de militantes políticos, destituiu mais de 4.000 parlamentares, perseguiu, matou e promoveu sequestros no âmbito da Operação Condor. Castrou toda uma geração de gente muito criativa que poderia ter dado outros rumos ao país.
E a situação atual, em que todos, direita e esquerda estão envolvidos nas denúncias de corrupção?
Não escapa ninguém, direita e esquerda estão implicadas em todo o tipo de tramas criminosas. Todos envolvidos com a transnacional da corrupção, a Odebrecht, que comprou leis e políticos de norte a sul de América Latina. Uma vergonha, estamos no fundo do poço e o pior é que não vemos uma saída.
O país já teve dois processos de destituição e nos encaminhamos para um terceiro. Que classe de elite política é esta que é derrubada do poder devido a denúncias de corrupção?
-Mas a sociedade está anestesiada…
-Sím, porque estamos em choque. Olhamos ao nosso redor para ver se encontramos algum político que possa nos tirar dessa e não vemos ninguém. Teria que apagar tudo e começar de novo, refundar a classe política,mas isso leva muito tempo.
Todos os días descubrimos uma corruptela nova que envolve novos atores políticos e isso vem desmantelando as esperanças dos brasileiros. Este é um drama existencial. Em 1964 a classe política foi derrotada militarmente. Agora, a classe política foi derrotada moralmente.
Descobrimos que o Estado foi privatizado – OdebrechtOASJBS e toda essa quadrilha que comprou o país e seus governantes. Como vamos a dar volta por cima nesta história? É a pergunta que nos fazemos todos os días e para a qual ainda não temos resposta.
 
 

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