Naira Hofmeister
A cena se repete todos os dias: centenas de alunos do Instituto de Educação General Flores da Cunha sobem as escadarias do prédio para as salas de aula, biblioteca e outras dependências da escola.
Poucos reparam nas três grandes telas que ornamentam o lugar, preservando a memória histórica e o patrimônio artístico gaúcho. Mesmo um observador atento encontraria dificuldades para distinguir nas pinturas as figuras de Garibaldi, a Ponte da Azenha, os imigrantes açorianos na chegada a Porto Alegre, em 1752. As imagens, pintadas por Augusto Luiz de Freitas e Lucílio de Albuquerque, praticamente desapareceram depois de anos de abandono. Afora a sujeira – as telas estão cobertas de pó –, as três obras tem manchas de água, consequência de uma inundação ocorrida em 1984.
Pode-se observar ainda partes rasgadas pelo cascalho que ficou entalado entre a tela e o suporte. Mais: a tinta está ressecada e sem pigmentação, os contornos das figuras se perdem, as molduras estão tomadas por cupins e a iluminação local é péssima. Teias de aranha, chiclés e nomes “assinados” nas molduras completam a triste realidade dessas obras de arte. “Considerando que as
telas estão nessa escola pública, onde não há educação patrimonial nem conscientização de conservação, poderia ser muito pior”, exclama Thaís Gomes Fraga, funcionária do arquivo do IE.
A despeito da desconsideração diária que sofrem, as telas mantém sua imponência, ao menos por seu tamanho. As duas menores medem mais de 5m x 3m e a maior, localizada no centro da escadaria, 6m30cm x 5m50cm. Datam do início do século 20, entre 1916 e 1923 e originalmente deveriam adornar as paredes do Palácio Piratini, sede do governo gaúcho. No Brasil, apenas duas
outras telas clássicas superam em tamanho as expostas no IE.
“Agora parece que estamos no caminho certo”
Após 20 anos de luta, finalmente um projeto da Associação de Ex-alunas foi aprovado pela LIC estadual, para receber investimentos em troca de isenção fiscal, mas Cecília Heckthever diz que está tendo dificuldades em encontrar parceiros para o trabalho: “As pessoas têm medo de apoiar, pois há um descrédito nas coisas públicas”, exclama.
Segundo Cecília, o vice-governador Antônio Hohlfeldt “prometeu céu e terra” ao grupo que pede a restauração. “Ele disse que se sentia compromissado com a instituição na qual sua mãe havia estudado, mas agora deve ter coisas muito mais importantes para fazer”, ironiza.
Por conta do descaso dos governantes, um dos prováveis parceiros da obra, se mantém indeciso: “O Tumelero viu com simpatia a idéia, mas está esperando uma palavra do vice-governador para liberar os recursos”.
O maior problema para a restauração das três telas do Instituto de Educação é o estado e o tamanho de cada quadro. “Precisaremos de dois ou três meses de trabalho antes de removê-las, pois assim como estão, vão se romper com certeza”, diz Leila Sudbrack, a restauradora. O primeiro passo será a limpeza, no local onde elas estão. Depois, uma substância fixadora da tinta será colocada sobre as telas. “A primeira fase da restauração é o que eu chamo de terapêutica ou hospitalar”, brinca a restauradora. “É a etapa mais preocupante, que leva mais tempo e dá mais trabalho, mas é pura tecnologia”, esclarece.
As técnicas utilizadas serão as mais avançadas no mundo: “São as mesmas usadas na recuperação da Capela Sistina”, exemplifica.
O trabalho final, ao contrário, utiliza técnicas artesanais do século 19 onde entra a habilidade dos restauradores. Leila explica que o maior cuidado desses profissionais será o de não intervir nas características do pintor. “São pinceladas quase matemáticas, calculadas para que o novo traço não venha a competir com os do artista”. A cor utilizada também não é a mesma que a utilizada originalmente, ficando um tom abaixo. A previsão é que as obras durem 2 anos.
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Se tudo der certo, dentro de 2 anos os quadros estarão totalmente renovados e prontos para serem apreciados pelo público. O projeto da Associação, que tem todo o apoio de Leila Sudbrack, é incluir o Instituto de Educação na rota artística de Porto Alegre.
Para isso, estudam alternativas como investir em iluminação adequada, realizar campanhas de preservação patrimonial entre os alunos e ate mesmo cobrar ingressos dos visitantes para observar as obras. “Temos que rever a conservação, mas eu só abraço uma briga por vez”, brinca Cecília.
Dados das obras
Chegada dos Açorianos
Autor: Augusto Luiz de Freitas
Localização: Centro da escadaria
Dimensões: 6m30cm X 5m50cm
Local e data: Roma, 1923
Batalha da Azenha
Autor: Augusto Luiz de Freitas
Localização: Lado direito da escadaria
Dimensões: 5m64cm X 3m76cm
Local e data: Roma, 1922
Expedição à Laguna
Autor: Lucílio de Albuquerque
Localização: Lado esquerdo da escadaria
Dimensões: 5m45 X 3m312cm
Local e data: Rio de Janeiro, 1916
Para ajudar
Associação dos Ex-alunos do Instituto de Educação general Flores da Cunha
Endereço: Av. Oswaldo Aranha, 527 – Bairro Farroupilha – Porto Alegre – RS
Fones: 3311.0386 (segundas, quartas e sextas das 14h00 às 17h30).
Ligue também: 3221.7941/9961.7623 Amélia Bulhões/ 3227.3918 Valdeci Bezerra
3217.9406/9115.0426 Gilda Vasconcelos
E-mail: ass_exalunosie@yahoo.com.br
Site: www.sosarteie.com.br
Obras históricas viram pó no velho Instituto
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