Antigo ponto de descanso para os carreteiros que cruzavam o Caminho do Meio, depois foi a “redenção” dos escravos alforriados, campo para exercícios militares, recebeu prédios institucionais e por pouco não virou um loteamento imobiliário. O parque está presente em todas as fases da cidade.
A população de Porto Alegre começa com os casais açorianos. Os primeiros desembarcam no porto de Viamão em 1752 e erguem choupanas de taquara e barro no descampado à beira do Guaíba, onde hoje está localizada a Praça da Alfândega. Só 20 anos mais tarde recebem terra e conseguem se estabelecer no povoado.
Durante quase um século, a população ficou restrita à península, atual área do Centro, ligando-se a outros núcleos de povoação por caminhos ao longo dos quais foi se expandindo a cidade. Entre a estrada dos Moinhos e o Caminho do Meio, por exemplo, os terrenos foram sendo ocupados por chácaras que se estendiam até o Campo da Várzea. Foi do loteamento destas chácaras que nasceu o bairro Bom Fim, denominação decorrente da capela que começou a ser construída em 1867. O Campo da Várzea passou a se chamar Campo do Bom Fim, também por causa da capela. Mais tarde, em 1884, com a libertação dos escravos na cidade, muitos acabaram se instalando na área, que passou a se chamar oficialmente Campo da Redenção.
Nessa época, a área pública tinha 69 hectares. Ali acampavam carreteiros e ficava o gado para abastecimento da cidade – havia um grande matadouro no local que depois foi o Cinema Avenida e hoje é ocupado por uma faculdade.
Foram diversas as tentativas de se lotear o enorme logradouro público, cedido ao município em 1807 pelo então presidente da Província, Paulo José da Silva Gama. Em 1826, a Câmara Municipal tentou “parcelar e dividir a várzea em terrenos foreiros”. O imperador D. Pedro I interviu, alegando se tratar de área para exercícios militares. Em 1833, Câmara aprovou o projeto do vereador Francisco Pinto de Souza para dividir parte da área e distribuir terrenos a particulares. Um abaixo assinado da população frustrou o plano.
O primeiro prédio a invadir a grande várzea foi o quartel do exército, atual Colégio Militar, construção iniciada em 1872. No final do século seriam construídos na outra extremidade os prédios da Faculdade de Medicina, depois a de Direito e em seguida a Escola de Engenharia. Nessa época havia um velódromo junto a Redenção, onde hoje é a Faculdade de Arquitetura, na rua Sarmento Leite. Os eventos ciclísticos eram atração na cidade, com movimento equivalente ao que hoje representa o Brique da Redenção.
Em 1914, o arquiteto João Moreira apresenta o projeto para o parque. Em 1935, o local é sede da grande exposição para marcar o centenário da Revolução Farroupilha e passa oficialmente a chamar-se de Parque Farroupilha. Perde então mais um pedaço, com a construção do Instituto de Educação. Em 1941, é completada a obra de ajardinamento do parque. Foram sendo instalados chafarizes e monumentos, e o mercado, que rendeu muita polêmica.
Em 1964, é construído o auditório Araújo Vianna dentro do parque. Hoje a Redenção tem 37,5 hectares, praticamente o mesmo tamanho do bairro Bom Fim, que tem 38 hectares e uma população de 11 mil habitantes, segundo o último censo, de 2010.
Atualmente, o Parque Farroupilha está em obras. A reforma do eixo central foi concluída recentemente, mas a Prefeitura decidiu incluir na obra o restauro da fonte luminosa. Além disso, está sendo instalado um novo sistema de iluminação. A previsão inicial era de que os trabalhos estivessem encerrados no aniversário do parque, na véspera da data Farroupilha. Recentemente o prazo havia sido recalculado para o dia 3 de outubro, entretanto, o parque segue com os tapumes.
A exposição do centenário farrapo
Era uma tarde ensolarada de sexta-feira quando, às 15 horas, se abriram para o público os portões da maior exposição já vista no Rio Grande do Sul. Mais de 50 mil visitantes ocupavam toda a rede hoteleira da cidade, alguns precisaram se hospedar em pensões e até mesmo em casas de família. A cidade estava em polvorosa, nunca vivera dias tão palpitantes, bradavam os jornais.
A Exposição do Centenário Farroupilha foi inaugurada em 20 de setembro de 1935, no então recém-criado Parque Farroupilha, e durou quatro meses. O jornal A Federação, veículo do Partido Republicano, exaltava o vultuoso evento. O Correio do Povo chamava atenção para o enorme gasto de dinheiro público – municipal e estadual – em um período de recessão econômica, e para a alta de preços na cidade, em virtude do movimento de turistas.
Para a solenidade de abertura, veio o presidente Getúlio Vargas. O governador, general Flores da Cunha, definiu o evento como “simplesmente formidável”. Além deles, ocupavam os espaços de honra o prefeito Alberto Bins, representantes de diversos estados brasileiros, do Uruguai, da Argentina e autoridades municipais.
O pórtico de entrada era formado por duas torres de 22 metros de altura. Havia pavilhões de oito estados, da agricultura, da pecuária, da indústria local e estrangeira, além de um dedicado à cultura do Rio Grande do Sul, no prédio onde hoje funciona o Instituto de Educação General Flores da Cunha.
Reuniu mais de 3 mil expositores, foram montados restaurantes, parque de diversões e um cassino, onde aconteciam os eventos de gala. Um dos grandes bailes foi a escolha da Senhorita Porto Alegre, concurso de beleza promovido pelo Jornal da Manhã. Para entrar, pagava-se pelo ingresso. Ou seja, a ideia de cercar o parque, que volta ao debate público periodicamente, vem desde sua criação.
Mais de um milhão de pessoas visitaram o local, segundo o relatório da Prefeitura, sendo que a população de Porto Alegre à época era de apenas 300 mil habitantes. Os números são astronômicos. A iluminação do evento, por exemplo, tinha seis vezes mais lâmpadas do que toda a cidade. Foram utilizadas 28.289 lâmpadas e 2.143.325 velas.
Mais do que exaltar o heroísmo dos farrapos, a ideia de Flores era passar a imagem do Rio Grande do Sul como um Estado desenvolvido industrialmente, e não somente agrícola. “O maior pavilhão era da indústria. O principal objetivo era mostrar o crescimento econômico”, defende o historiador Giovani Ceroni, que fez sua dissertação de mestrado sobre o tema.
Os preparativos começaram dois anos antes, com o projeto de “embelezamento” da área então chamada de Campo da Redenção, ou simplesmente de Várzea, elaborado pelo arquiteto francês Alfred Agache. Foram feitos aterros, escavações, obras de calçamento e um sistema de drenagem. Em 1934, começa a construção dos pavilhões.
Esta foi a primeira iniciativa de ocupação total do terreno. “A área era um banhadão. Hoje é uma área de sociabilidade que caracteriza Porto Alegre. Este foi o principal legado da exposição”, afirma Ceroni. Boa parte do que sem tem hoje no parque é herança da exposição: a fonte luminosa, o espelho d’água, o lago artificial, cujo embarcadouro depois serviria de instalação para o Café do Lago, hoje fechado.
Comitivas de diversos países se fizeram presentes, principalmente os vizinhos Uruguai e Argentina, e os países de onde vieram imigrantes para o Estado. O Clube Uruguaio presenteou o município com a escultura do Gaúcho Oriental; a colônia espanhola, com a Fonte Talavera, no Paço Municipal. e as colônias argentina, portuguesa e sírio-libanesa entregaram obeliscos.
A exposição foi até 15 de janeiro de 1936. No encerramento, foi inaugurado o monumento a Bento Gonçalves, esculpido por Antônio Caringi. A escultura ficou no parque até 1941, quando foi transferida para a avenida João Pessoa, em frente ao colégio Júlio de Castilhos. Os prédios construídos para a exposição só foram demolidos em 1939.
Os 80 anos do Parque Farroupilha
Escrito por
em
Adquira nossas publicações
texto asjjsa akskalsa
Comentários
Uma resposta para “Os 80 anos do Parque Farroupilha”
-
Com certeza esta foi uma ótima leitura, rica em detalhes. Muitos dos quais eu desconhecia. Obrigado!
Deixe um comentário