Matheus Chaparini
Nos altos da rua Borborema, vila São José, na Zona Leste de Porto Alegre, fica a sede da Tribo Comanches. Em uma sexta feira de fevereiro a reportagem do Jornal JÁ foi conferir um ensaio na quadra.
Valdir de Souza Ribeiro é o presidente da Sociedade Recreativa Beneficente Carnavalesca Tribo Comanches, fundada em 10 de outubro de 1959.
Dentro da sede, entre as paredes repletas de fantasias, alegorias e pôsteres de títulos do Sport Club Internacional, ou na avenida, Valdir é Itaúna, seu nome de guerra.
Ele era um guri da São José quando um grupo de amigos decidiram criar uma agremiação carnavalesca. A primeira empreitada foi uma escola de samba, o Comando do Morro, que durou apenas dois anos.
Um dia, após o fim da escola, estavam sentados em uma praça da redondeza quando alguém sugeriu: quem sabe a gente faz uma tribo? “Naquele tempo tinha muita tribo. Bah! Escola de samba não tinha muito”, conta Valdir.
As cores escolhidas foram amarelo, vermelho e azul. O nome foi decidido em uma votação apertada, com diferença de apenas um voto. A inspiração veio dos filmes americanos que passavam na televisão.
“A gente via os Comanches, assim, em cima da montanha, à cavalo e a gente era gurizada nova, achava fantástico”, explica.

Valdir é está no cargo há cerca de 25 anos. Antes disso, se orgulha de ter sido o presidente no ano do primeiro título de campeão de carnaval, em 1967, quando a disputa entre as tribos era a principal atração do carnaval porto alegrense.
“Era o tempo da Pepsi Cola, do Vicente Rao, que era Rei Momo, tempo do Heitor Pires, o comendador. Ele botava o dinheiro e a prefeitura botava os ônibus. A gente pedia 3, 4 ônibus e eles davam”, recorda.
Atualmente a disputa se dá apenas entre duas tribos: Comanches e Guaianazes, “o que restou da guerra”. Há uma forte rivalidade entre as duas tribos e a esta disputa é o que mantém vivo o carnaval de índio, como alguns chamam. Os Comanches venceram as últimas quatro disputas.
Este ano, a tribo vai para a avenida com cerca de 300 pessoas. Segundo Valdir, a maioria dos integrantes mora nas redondezas da sede. A bateria conta com 70 percussionistas.
Surdos, maracanãs, repiniques e agês são os instrumentos da pescussão. A harmonia vem com dois cavacos, violão de seis e de sete cordas. O desfile conta ainda com personagens como porta estandarte, feiticeiro e cacique – em outros tempos, eram mais personagens, como deusa, cacique, pajé.

O tema para o carnaval 2017 é Um tema para Lino e Jacira. Segundo o presidente, as fantasias e alegorias estão praticamente prontas. “É só colocar no carro.”
“Isso aqui é uma família, meu!”
Apesar de ter vivido os melhores dias das tribos, o momento em que Valdir mais se emociona não é ao lembrar glórias de carnavais passados, mas ao defender a união do grupo em momentos de dificuldade. Valdir se considera “um cara glorioso” por ter o seu pessoal ao lado. “Isso aqui é uma família, meu!”
Mesmo com o repasse da prefeitura à Liga, que era dividido entre as agremiações, colocar a tribo na avenida não era uma tarefa fácil. Para Valdir, este feito só é possível, ano após ano, graças à união dos integrantes da tribo, na maioria moradores da região. O trabalho é o ano todo.
As cabeças das fantasias são feitas em papelão reciclado. Um funcionário do supermercado que hoje ocupa o terreno onde já foi a quadra dos Comanches separa caixas de papelão que sobram e encaminha para a tribo.
“Eu tenho minha comunidade muito forte aqui. Talvez saia alguma coisa, mas a gente não tá contando com isso aí. Eu já falei com a minha harmonia: ‘esse ano não tem nada, quem quiser ir, vai, quem não quiser, pode parar agora’. Eles deram o grito de guerra.”
Este ano, o prefeito Nelson Marchezan Júnior decidiu cortar o repasse que todos anos a prefeitura fazia para o carnaval. Dos R$ 7 milhões previstos, cerca de R$ 5 milhões seriam usados na estrutura do desfile e o restante, dividido entre as agremiações.
Uma equipe montada pela prefeitura e Liespa está visitando diversas empresas que são potenciais patrocinadoras. Mas até o momento, não se fala em confirmações ou valores.
O projeto da prefeitura é que a partir deste ano, o carnaval se sustente sem verba pública. A forma de captação ainda não está definida. Se a captação for feita de forma individual, por cada entidade, as menores terão mais dificuldade, correndo o risco de extinção nos próximos anos.
Quando perdeu sua esposa, Valdir quis parar com os Comanches. Dona Georgina era costureira da tribo e braço direito do presidente, que hoje é auxiliado pela filha Karen. Ele propôs o fim da entidade, mas a comunidade não aceitou.
Hoje, mesmo com todas dificuldades e com a incerteza da situação financeira futura, o fim dos Comanches é algo que Itaúna nem cogita: “Nós vamos abraçar e não vamos deixar morrer.”

Os Comanches, uma tradição da Vila São José
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