Perplexo, Partido dos Trabalhadores tenta voltar às raízes

GERALDO HASSE

O seminário petista realizado no último sábado (14) em Porto Alegre demonstrou haver disposição para superar o impasse que paralisa o partido responsável pelas mudanças socioeconômicas dos últimos anos no Brasil.

Embora reeleito para a presidência da República, o PT tenta interpretar a maré conservadora que emergiu nos últimos meses como reflexo dos problemas de gestão da economia combinados com a descoberta de casos de corrupção nas entranhas da administração pública, claramente contaminada pelo interesses de lobbies privados.

No encontro de centenas de militantes na Câmara de Vereadores da capital gaúcha, iniciou-se o debate sobre a possibilidade de ir à frente por meio de uma volta às origens.

As conclusões de seminários semelhantes em outros estados serão levadas ao 5º Congresso Nacional do PT, marcado para junho em São Paulo.

Nesse sentido foram reveladores os pronunciamentos feitos na manhã de sábado por Tarso Genro, ex-governador; Raul Pont, ex-prefeito; e Rui Falcão, presidente nacional do PT. Eles falaram para cerca de 300 militantes.

Pont (e), Tarso (c) e Falcão (d) debateram durante a manhã os rumos da legenda | Caroline Biccochi/PTRS
Pont (e), Tarso (c) e Falcão (d) debateram durante a manhã os rumos da legenda | Caroline Biccochi/PTRS

A seguir, um resumo dessas três falas, que podem ser resumidas assim: enquanto os dois líderes petistas gaúchos fizeram manifestações radicais, o paulista de origem baiana, recém-entrado na casa dos setenta anos e que acaba de encerrar seu mandato como deputado estadual em São Paulo, veio com um discurso firmemente conciliatório, visando o público interno mas sem perder de vista o entorno.

TARSO GENRO: ”O modelo de distribuição de renda está esgotado”

O PT ainda não está maduro para compreender a extensão e profundidade da atual crise, mas precisa começar o debate defendendo desde já:

1 – a taxação dos altos salários, de forma a reduzir a distância entre os extremos, que chega a mais de 80 por um; nos países capitalistas mais adiantados, essa relação chega a 25/30 vezes;

2 – o início da reforma política;

3 – a taxação das grandes fortunas, já que o modelo recente de distribuição de renda, que foi correto, está esgotado por falta de poupança pública;

4 – a volta da participação popular na definição de políticas públicas;

5 – a redução da dependência financeira internacional, em nome da soberania e de uma inserção inteligente na economia global.”

RAUL PONT: “Não nos confundam com o PP”

Precisamos desmascarar a hipocrisia dessa imprensa safada que atribui somente ao PT uma corrupção que é sistêmica no Brasil. Já aguentamos dez anos de “Mensalão do PT”. Agora tentam nos impingir a corrupção na Petrobras. Estou cansado de ser chamado de ladrão. Temos de acabar com isso. No estatuto do PT está prevista medida cautelar para afastar militantes envolvidos em atos suspeitos. Só assim se vai recuperar a credibilidade do partido. Não nos confundam com o PP, esse sim um partido de ladrões. (APLAUSOS)

Essas políticas econômicas do Levy não fazem parte do nosso programa e não nos representam. Não é verdade que o país esteja em crise. Há dificuldades mas os fundamentos estão sólidos. A queda dos preços das commodities aumentou a instabilidade do Brasil, que mergulhou num ajuste neoliberal enquanto na Europa as políticas de austeridade dão sinais de crise. Se o governo continuar as medidas de “ajuste”, vamos perder a confiança dos movimentos sociais.

É responsabilidade nossa explicar como se constitui um governo que não tem nenhuma garantia de governabilidade e lealdade; como pessoas e partidos se apropriam de cargos em ministérios e estatais. Não é possível ficar só com o canal parlamentar. Nossos governos no Rio Grande do Sul tiveram conselhos populares.”

RUI FALCÃO: “Nosso projeto não é só melhorista”

Dias atrás, cobrei dos estados a lentidão no processo de organização do nosso 5º congresso, em junho. Hoje fiquei sabendo que já temos 14 comissões estaduais trabalhando. O PT tem o que defender. De 2003 até hoje, o Brasil subiu de 14º para sétimo lugar no ranking econômico mundial; melhoramos o salário mínimo e a distribuição da renda. Mas nosso projeto não é só melhorista.

Nós precisamos organizar um bloco político de esquerda, aumentar a participação popular em nossas decisões e rever a correlação de forças no país depois da árdua disputa programática das últimas eleições. A nossa vitória fez aparecer a Direita que estava à sombra do Capital e com o apoio da Mídia. A oposição luta explicitamente para fazer a presidenta Dilma “sangrar” com a ideia do terceiro turno e do impeachment. Temos de começar a pensar em 2018, ver com que lideranças podemos contar.

Após 35 anos de existência, o PT deve fazer uma reflexão, retomar a militância cotidiana e sair ás ruas com disciplina. Nosso quinto congresso deve ser ‘para fora’. Nossa militância está perplexa com o que se passa. O ajuste econômico denuncia o esgotamento do modelo de 2003. O Estado exauriu-se no financiamento do desenvolvimento econômico. Tivemos uma queda do Produto Interno Bruto, redução da arrecadação por causa das desonerações e diminuição do superávit comercial por causa da queda do preço das commodities. É um quadro de crise fiscal que se reflete na estrutura de classes.

O que fazer? Recuamos para um projeto financista? Ou construímos uma nova correlação de forças, caminhando para reformas estruturais capazes de demolir o modelo rentista?

Mais do que taxar grandes fortunas, é preciso taxar grandes lideranças. Os impostos indiretos pagos por toda população representam 50% da carga tributária brasileira. O Imposto de Renda de Pessoa Física só representa 20%. O resto vem de contribuições sociais de trabalhadores e empresas.

Precisamos fortalecer a Petrobras. Não se justifica mexer no pré-sal. A privatização da Petrobras é ideia dos fariseus da ética. Não é só a Lava Jato que fragiliza a Petrobras. O preço internacional do petróleo caiu pela metade.

Precisamos retomar a bandeira da reforma agrária a partir da revisão dos índices de produtividade da terra. A agricultura brasileira aumentou seus rendimentos nas últimas décadas. O país precisa rever os parâmetros de eficiência da exploração agrícola. Só assim haverá liberação de terras capazes de gerar ocupação no campo e produzir alimentos mais baratos.

A reforma política precisa ter cinco eixos:

– fim do financiamento empresarial das campanhas eleitorais;

– fixação de um teto para as contribuições particulares a campanhas;

– aumento da participação popular;

– voto proporcional;

– fim das coligações partidárias.

O partido precisa tratar as dificuldades do momento com um choque de realidade. Devemos começar relendo o manifesto de fundação do partido. Lá está escrito por que devemos participar de eleições. Não é para conquistar mandatos, mas para fazer andar um projeto de reforma da sociedade brasileira. Precisamos fazer a releitura do socialismo petista. Chega de usar os gabinetes para construir mecanismos de poder (APLAUSOS).

O Brasil mudou, o PT também. Não proponho criar um novo partido. Estamos em transição. Nós temos nos mobilizado a cada dois anos, em função das eleições. Precisamos pensar num programa de quatro anos. Mais do que isso, precisamos de um programa que dê continuidade e sustentabilidade ao que já conquistamos. Precisamos atualizar nosso programa e pensar em novas alianças para ajudar o Brasil a mudar.

Diante de tudo que está acontecendo, o partido precisa se preparar para a resistência. E uma das ideias é voltar ao autofinanciamento que existia na época da fundação, quando os primeiros eleitos para mandatos políticos davam ao partido 30% dos seus salários. É por aí que o PT vai livrar-se do estigma da corrupção. Não há dúvida de que o financiamento empresarial das campanhas é a chave da corrupção político-eleitoral, mas precisamos agir com rigor ético. O militante envolvido em atos ilícitos não cabe no nosso partido. O partido não comete ilícitos. Os indivíduos que os cometeram estão pagando e vão pagar, depois dos processos legais próprios do estado de direito democrático.”

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