Naira Hofmeister
Com novas regras de exibição dos competidores, o 34º Festival Internacional de Cinema de Gramado divulgou na semana passada os filmes que participam da edição 2006. As mostras de longas-metragens não dividem-se mais em ficção e documentário, mas sim, entre cinema brasileiro e latino, que antes concorriam na mesma categoria. Outra novidade será a sessão exclusiva para curtas-metragens, que não serão mais projetados entre os dois longas de cada noite, para adiantar o final da sessão, que, em alguns casos, passava da meia-noite.
Entre os longas brasileiros, destaca-se a temática comum: com exceção da ficção de Marcelo Santiago, Sonhos e Desejos, que narra diálogos de três jovens sobre a política nacional, os outros quatro concorrente versam sobre situações factuais brasileiras. Dois documentários – Atos dos Homens, de Kiko Goifman e Pro Dia Nascer Feliz, de João Jardim – narram aspectos problemáticos da realidade brasileira. Atos dos Homens, é explicado em sua sinopse como “um raio X da violência na Baixada Fluminense”. Desigualdade social, banalização da morte e o cotidiano agressivo do local são o foco da película, que também dialoga com os moradores do local. Já Pro Dia Nascer Feliz, do aclamado diretor João Jardim, de Janela da Alma, tem como tema a educação brasileira e suas disparidades: “Meninos e meninos, ricos e pobres em situações que revelam precariedade, preconceito, violência e esperança. Em três estados brasileiros, em classes sociais distintas, adolescentes falam da vida na escola, seus projetos e inquietações numa fase crucial de sua formação”.
Serras da Desordem, do ítalo-brasileiro Andrea Tonacci registra a fuga de um índio durante um ataque de fazendeiros à sua aldeia, que passa 10 anos vagando pelas serras do Brasil Central. Após esse tempo, é descoberto e vira notícia em Brasília, onde especialistas debatem sua origem e identidade. Ele termina por reencontrar um filho com quem retorna ao Maranhão mas a situação que encontra não está mais de acordo com a vivência de sua liberdade nômade. A curiosidade desse longa-metragem é que os papéis principais do filme são vividos pelos próprios personagens que passaram pela situação real. Carapirú, Tiramukõn, Camairú e Myhatxiá do filme, são os da vida real, assim como os brancos Sydney Ferreira Possuelo e Estelita Rosalita dos Santos, que interpretam a si mesmos.
Por fim, a ficção Anjos do Sol, dirigida por Rudi Lagemann – conhecida figura do cinema gaúcho, onde produziu os clássicos Deu Pra Ti Anos 70 e Verdes Anos – traz para a tela o problema da prostituição. Em sua estréia em longas, o diretor conta a saga da menina Maria, de 12 anos, que, no verão de 2002, é vendida pela família, no interior do nordeste brasileiro, e termina num prostíbulo localizado numa pequena cidade, vizinha a um garimpo, na floresta amazônica. Após meses sofrendo abusos com outras meninas, Maria consegue fugir e atravessa o Brasil na carona de caminhões, chegando ao Rio de Janeiro onde vai novamente se deparar com a possibilidade de vender seu corpo.
Anjos do Sol narra drama de uma menina obrigada a se prostituir (Divulgação)
O 34º Festival Internacional de Cinema de Gramado acontece de 14 a 19 de agosto de 2006, na cidade serrrana. Alem dos longas-brasileiros em competição, outros cinco filmes concorrem na categoria Latinos (Di buen dia a papa, El Método, 4 Mujeres Descalzas, Mezcal e El Caracazo).
Nenhum gaúcho na mostra de curtas
À exceção da mostra exclusiva para a produção cinematográfica local, o Rio Grande do Sul será representado apenas por dois curta-metragens, que concorrem na catergoria 16mm (Terra Prometida, de Guilherme Castro e a animação Super Mano, dirigida por Luiz Rangel e Xande Soares). Na mais nobre das bitolas, 35mm, não há nenhum filme produzido no sul entre os concorrentes ao Kikito. Em edições anteriores, os curtas do estado sempre foram alvo de elogios: em 2004, Messalina, de Cristiane Oliveira e Cinco Naipes de Fabiano de Souza foram os destaques. Já na edição passada, o brilho gaúcho ficou por conta de Os Olhos do Pianista de Frederico Pinto.
Em 2006, dos 13 concorrentes na categoria 35mm, as produções se concentram no centro do país, com quatro representates dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Ainda há dois concorrentes da Bahia, um do Ceará, um do Espírito Santo e outro de Santa Satarina. Entre os curtas em 16mm, além dos gaúchos, disputam os troféus três filmes paulistas, três cariocas e outro do Distrito Federal. Entre os gaúchos, Luiz Rangel domina a cena de curtas-metragens, dirigindo nada menos que 7, das 24 produções que disputam os troféus.
Acompanhe a lista completa:
CURTAS 35mm
Alguma Coisa Assim (SP)
Diretor: Esmir Filho
Beijo De Sal (RJ)
Diretor: Felipe Gamarano Barbosa
De Glauber Para Jirges (SP)
Diretor: André Ristum
Dos Restos e das Solidões (CE)
Diretor: Petrus Cariry
Distúrbio (SP)
Diretor: Mauro D´Addio
Fúria (RJ)
Diretor: Marcelo Laffitte
Manual Para Atropelar Cachorro (RJ)
Diretor: Rafael Primo
O Anjo Daltônico (BA)
Diretor: Fábio Rocha
O Quintal Dos Guerrilheiros (SP)
Diretor: João Massarolo
O Sr. e a Sra. Martins (SC)
Diretor: Laine Milan
No Princípio era o Verbo (ES)
Diretor: Virgínia Jorge
Vermelho Rubro Do Céu Da Boca (BA)
Diretor: Sofia Federico
Quando O Tempo Cair (RJ)
Diretor: Selton Mello
CURTAS 16mm
A Goiabeira (RJ)
Diretor: Ed Lopez
Alguns Recados (SP)
Diretor: Thiago Faelli
Arraiada (SP)
Diretor: Henrique Rossi
Berenice (RJ)
Diretores: Bruno Duarte, Luciana Penna
Meus Amigos Chineses (RJ)
Diretor: Sérgio Sbragia
O Poeta e O Capitão (DF)
Diretor: Jorge Oliveira
Recortes (SP)
Diretor: José Eduardo Milani
Terra Prometida (RS)
Diretor: Guilherme Castro
Super Mano (RS)
Diretor: Luiz Rangel E Xande Soares
MOSTRA GAÚCHA
A Domicílio
Diretor: Nelson Diniz
A Noiva E O Violonista
Diretor: Vicente Moreno, Moisés Westphalen E Denny Chang
A Porta
Diretor: Marcelo Restori
A Re-Volta Da Banana
Diretor: Luiz Rangel, Gustavo Rosseb, Vânia Martins
Cavalo De Tróia
Diretor: Luiz Rangel
Como Se Atravessa
Diretor: Luiz Rangel,Vania Martins, Bruno Carboni
Da Pomerânia A Ibirubá – A Saga De Um Povo
Diretor: José Carlos Heinemann
Efeito Dominó
Diretor: Emílio Caio Ferasso
Estrondo
Diretor: Luiz Rangel
Júlia
Diretor: Carlos Eduardo De Oliveira Nazário
Leonel Pé-De-Vento
Diretor: Jair Giacomini
Lótus
Diretor: Cristiano Trein
Mal Comum
Diretor: Luiz Rangel, Bruno Carboni, Jone Shustes, Vânia Martins
Noite Quente
Diretor: Rodrigo Goulart Godinho
O Tempo De Clarissa
Diretor: Jessica Luz E Tatiana Nequete
Rolex De Ouro
Diretor: Beto Rodrigues
Sketches
Diretor: Fabiano De Souza
Super Flufi
Diretor: Tula Anagnostopoulos
Super Tinga
Diretor: Luciano Moucks
Vera Lúcia
Diretor: Diego De Godoy
Pai
Diretor: Luiz Rangel, Vania Martins, Bruno Carboni
Super Mano
Diretor: Luiz Rangel e Xande Soares
Terra Prometida
Diretor: Guilherme Castro
Um Aceno Na Garoa
Diretor: Mário Nascimento
Homenagens para aqueles que construíram a história do cinema nacional*
O cineasta Nelson Pereira dos Santos, o dcumentarista Vladimir Carvalho e o ator Antônio Fagundes serão as personalidades a receber troféus na 34º edição do festival.
O aclamado diretor Nelson Pereira Dos Santos, primeiro cineasta brasileiro a integrar a Academia Nacional de Letras, receberá uma comenda na noite de premiação no sábado, dia 19. Responsável pela adaptação de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, para o cinema, entre outras obras-primas, é um dos brasileiros mais prestigiados e premiados internacionalmente. Em reconhecimento ao seu trabalho, já foram organizadas mostras e retrospectivas de suas produções em países como França, Itália, Canadá, EUA e Japão, entre outros. Além disso, recebeu o troféu Eduardo Abelin no Festival de Gramado de 1998, bem como homenagens nos festivais de Cannes, Havana e Polônia.
Vladimir Carvalho, pela dedicação de toda a sua vida ao cinema, e mais particularmente aos documentários, receberá a 6ª edição do troféu Eduardo Abelin. Professor titular da Universidade de Brasília nas disciplinas de cinema, foi o roteirista do documentário Aruanda, no final dos anos 50 – uma resposta ao surgimento do cinema novo no sul do país – dando início ao documentário moderno no Brasil. É autor de O País de São Saruê, que permaneceu cerca de nove anos interditado pela censura e só foi liberado com a Anistia, em 79. Ainda em sua filmografia estão O Homem de Areia (sobre a revolução de 30), O Evangelho Segundo Teutônio, A Paisagem Natural e Conterrâneos Velhos de Guerra.
Por sua contribuição de mais de três décadas ao cinema brasileiro, Antônio Fagundes receberá o troféu Oscarito, em sua 17ª edição. O ator, carioca de nascimento, mas que aos oito anos mudou-se para São Paulo com os pais, desde muito cedo demonstrava apreço pelas artes cênicas. Aos 14 anos fez sua estréia nos palcos, ainda no colégio. Já em 1969 ele roda A Compadecida, adaptação da obra de Ariano Suassuna dirigida por George Jonas – uma das produções mais caras do cinema brasileiro até aquele momento. A partir de então, Fagundes transita intensamente entre o cinema, os palcos e a TV, construindo uma sólida reputação baseada no trabalho e no talento e transformando-se em um dos ícones da dramaturgia nacional.
A entrega dos troféus Oscarito e Eduardo Abelin ocorrerá nos dias 15 e 16 de agosto, respectivamente, e a comenda especial a Nelson Pereira dos Santos será oferecida na noite de sábado, 19 – a principal noite de premiações.
* Com informações da Assessoria de Imprensa do Festival
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