Ana Barros Pinto
Perto de completar sete meses da retomada das suas terras ancestrais em Maquiné, no Litoral Norte gaúcho, as 27 famílias Mbya Guarani já plantam milho e mantêm boas expectativas para permanecer no local, uma parte da área da extinta Fepagro. O processo de reintegração de posse já foi suspenso por três vezes enquanto se tenta negociar uma composição com a permanência dos indígenas e a continuidade da pesquisa.
A Associação dos Servidores da Fepagro (Assep) considerava impossível a convivência da pesquisa com os Mbya na área e está debatendo essa possibilidade com seus associados. Pesquisadores antigos – a maioria dos diretores estava na criação da Fepagro -, eles consideram legítimos os movimentos sociais e não são contrários aos indígenas em Maquiné, apenas se preocupam com o compartilhamento da área por conta de problemas anteriores em outros locais, disseram na última reunião da Comissão de Direitos Humanos, da Assembleia Legislativa.
Participaram da reunião técnicos do Estado (Sema e SDR), professores da Ufrgs e Uergs, os caciques André Benites e Joel Pereira, pelo Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI), Merong Santos e representantes da Raiz Movimento Cidadanista que defenderam a possibilidade de uma gestão compartilhada da área, que leve em consideração a manutenção da pesquisa científica associada ao conhecimento tradicional dos índígenas.
Esse processo já iniciou em meados de julho, em reunião técnica na aldeia Mbya, quando se debateu a possibilidade de pesquisa que integre a ciência não indígena com o conhecimento tradicional indígena. Foi ressaltado o conhecimento milenar dos Mbyá Guarani na conservação e propagação de sementes tradicionais. Só de milho há uma infinidade de variedades. E como diz um pesquisador da Embrapa – Clima Temperado: “Os guaranis são os guardiões de sementes”.

Técnicos e pesquisadores da Ufrgs, Uergs, IFRS, Embrapa, Emater, Sema, CTI, Aepim e Anama, apoiam os indígenas e que se propõem, junto com os Mbya e pesquisadores da Secretaria da Agricultura, a realizar pesquisas, incentivando a geração de saberes intercientíficos. O grupo avalia que uma pesquisa assim inovadora possui grandes chances de obter apoios financeiros de institutos nacionais e internacionais.
“A Ufrgs realiza projetos de ensino, pesquisa e de extensão com a participação indígena”, disse o professor de Antropologia José Otavio Catafesto.
No Litoral Norte, professores e pesquisadores têm trabalhado com diversas comunidades Mbyá-Guarani.
“O vale do Rio Maquiné é uma área de atuação por décadas no desenvolvimento de projetos de pesquisa e de experimentação na produção de alternativas de insumos necessários ao sustento destas comunidades originárias”.
Especificamente na área da antiga Fepagro, pesquisadores e alunos têm realizado pesquisas e intervenção com a participação dos Mbyá-Guarani nos últimos anos.
O cacique André Benites conhece a área como a palma da mão e participou de várias projetos com a equipe da Fepagro e Ufrgs. Mas prefere falar da alegria que a comunidade experimenta ao viver na terra ancestral.
“Ali tem água limpa, pássaros, plantas medicinais, argila para fazer as casas tradicionais. Tudo o que é necessário para o Mbya viver de acordo com a sua cultura. Por isso é a retomada guiada por Nhanderú (Deus)”, disse

Merong Santos complementou: “Estamos do mesmo lado, queremos que a pesquisa continue e que o povo Guarani mantenha as sementes sagradas”.
Ao final, a diretoria da Associação dos Servidores da Fepagro informou que debaterá com os associados a proposta de composição, em reunião no dia 23 de agosto, e anunciará a posição dos técnicos.
Reintegração de posse suspensa
Representante da Procuradoria Geral do Estado (PGE) no Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI), o procurador Sílvio Jardim lembrou aos servidores da ex-Fepagro o quanto todos ali presentes lutaram contra a extinção das fundações no Estado. Os deputados Jeferson Fernandes (PT) e Pedro Ruas (PSol) também manifestaram essa posição e defenderam a solução combinada com a presença indígena no local.
Jardim informou ainda que o processo de reintegração de posse vem sendo suspenso justamente para se buscar essa composição. Foram feitos três pedidos de suspensão do processo de reintegração de posse. O último, com o prazo de 10 dias úteis, deve expirar no final do mês.
Enquanto isso, o secretário da Agricultura, Ernani Polo, tem recebido relatórios e cartas dos apoiadores sustentando a importância de conciliar a pesquisa com a presença Mbyá na área. O Comitê Estadual da Reserva da Biosfera Mata Atlântica reconhece também a pertinência do uso e manejo dos indígenas para a conservação da mata, “como um novo paradigma sócio ambiental’.
Na reunião da Comissão que participou, na semana passada, Polo disse que o objetivo da Secretaria é preservar a pesquisa. Mas que vai conversar os servidores da extinta Fepagro e da Funai para buscar construir um caminho. E deixou uma porta aberta para negociação: “se há como compatibilizar, meu esforço será nessa direção”.
Técnicos de universidades e empresas públicas manifestam apoio às famílias Mbyá Guarani, em Maquiné
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