Higino Barros
Amanhã (20) acontece, no bar Ocidente, a primeira das duas apresentações (a outra será na próxima quinta feira, dia 27) que a banda de rock instrumental Pata de Elefante, já extinta, fará na casa noturna do Bom Fim. Mais do que uma oportunidade da imensa legião de admiradores da banda em vê-la tocar, a ocasião é considerada também como uma grande celebração. Afinal, se há uma banda que marcou o cenário de rock dos primeiros anos do século 21 em Porto Alegre, foi a Pata de Elefante.
A Pata é formada por Gustavo Telles, 38 anos, Gabriel Guedes, 45 anos, e Daniel Mossmann, 37 anos. Com 11 anos de trajetória, gravou quatro CDs, fez trilha sonora de filmes, tocou em incontáveis bares, teatros e festivais no Brasil, tornando-se uma referência no País pelo rock extremamente melódico que executava. Era uma mistura de The Ventures, com Cream, Jimi Hendrix, Enio Morricone, Burt Bacharach e acima de tudo muito rock e blues.
Em 2008, o CD da banda, “Um Olho na fagulha, outro no fósforo”, foi escolhido como um dos 25 melhores trabalhos musicais lançados no Brasil, pela revista Rolling Stone. A banda teve também a canção “Hey!” incluída em uma coletânea de bandas independentes brasileiras lançada em 2008, pela revista francesa Brazuca. Em 2009 ganhou o VMB 2009 na categoria Instrumental.
A Pata terminou em 2013 e nessa conversa, o baterista Gustavo Telles, que sempre atuou como o porta voz da banda, fala do grupo e do atual reencontro para o show no Ocidente:
O começo, no Bom Fim
“Em março 2000, eu cheguei numa casa no bairro Bom Fim, na rua Santo Antônio, numa jam session, e o Gabriel estava tocando guitarra e o Bocudo, que foi da Cachorro Grande, estava no baixo. Toquei bateria, foi muito legal e a partir daí a gente às vezes se encontrava e comentava que precisávamos fazer um som junto, mas só fomos nos reunir mesmo um ano depois. Numa data marcada pelo Gabriel, nas Catacumbas do CEUE, o Centro Estudantil da Engenharia da UFRGS, um local onde sempre tinha festa e som rolando.”
“Marcamos para fazer um show. Eu, o Gabriel, o Bocudo, e o Beto Bruno, vocalista da Cachorro Grande. Eles moravam com o Gabriel e a gente ia tocar Rolling Stones nas Catacumbas. No dia, o Beto e o Bocudo furaram. Aí o Gabriel se lembrou do Dani, que ele já conhecia, da banda Montanha Azul. Como ele não podia ligar pro Daniel do lugar que estava, pediu que eu falasse com o Dani. Mas alertou. Não fala que ele vai tocar baixo. E diz também que não tem cachê, mas a gente paga as passagens dele, tem bebida liberada e tal. A gente se deu bem desde a primeira conversa.”
Gritos e urros nas Catacumbas
“Antes da apresentação fomos para o apartamento do Gabriel, que morava na Barros Cassal, e fizemos um ensaio, sem bateria, eu tocando nas pernas, eles com violão. Isso às onze da noite, o show era à uma da madrugada. Deu tanto certo que as pessoas gritavam e urravam de entusiasmo nas Catacumbas durante e depois da apresentação. Desde esse primeiro show ficou estabelecido o que seria uma característica da banda. Eles trocavam de instrumento no meio da apresentação. Quem estava na guitarra ia para o baixo e vice-versa. É uma coisa muito peculiar no som da banda por que cada um tem uma sonoridade. E uma coisa muito forte entre nós aconteceu desde o primeiro encontro.”
“Lembro que cheguei em casa de manhã, eufórico, convencido. Achei minha banda. Isso foi em março de 2001. Em agosto fizemos outro show, no mesmo lugar. Mas só no começo de 2002 resolvemos encarar a banda como a única atividade, já que eu tinha terminado Jornalismo e estava começando a trabalhar no ramo e os guris faziam outras coisas. E o propósito sempre foi de banda instrumental. Não tinha como ser diferente. Ter um cantor ou alguém para tocar baixo, nunca foi cogitado.”
Método de composição
“Desde o início a gente compôs junto. Quando nos juntamos, eu já compunha e me dei conta que eu ia ter como parceiros de composições gente muita talentosa. Combinamos que a gente tinha que ter músicas diferentes. Eles eram excelentes músicos, melhores do que eu, e hoje vejo como eu era meio ingênuo, mas que legal que era assim. Eles eram músicos infinitamente superiores do que eu, tinham mais conhecimento musical. Mas assim sempre me senti desafiado e sempre confiei no meu taco. E fui me especializando na questão da melodia. E a coisa da composição tem outros elementos e isso se deu desde o início. A gente compondo junto. Um aparecia com um tema, os outros sempre acrescentavam algo. Esse processo me levou a tornar compositor com foco na questão melódica, o que eu não fazia antes. Virei um melodista.”
Na estrada, pelo Brasil
“A gente queria tocar e onde tivesse um lugar que nos convidasse a gente ia. A cena de música de Porto Alegre na época era diferente, com muitos espaços e mais shows. A gente tocava onde dava. E as coisas aconteceram de uma maneira muito rápida. Viajamos muito para o interior nessa época e em 2003 começamos a viajar pelo Brasil. Íamos a festivais, a bares, aonde nos levassem. Tivemos a ajuda de muita gente generosa nesse início de trajetória, na parte da produção, que eu fazia também. No final de 2004 saiu nosso primeiro disco.”
“Em 2005 eu tocava, acumulava a função de produtor e trabalhava, para garantir uma grana, como jornalista com a Dedé Ribeiro, no IPA. Ficava lá o dia inteiro. Aí um dia veio uma pauta para eu cobrir um campeonato de badminton do Colégio Americano. Fui ver o que era isso e descobri que era um campeonato de peteca. Eu estava numa banda legal, tinha lançado um disco e cobrindo jogo de peteca de criança de dez anos? Tinha alguma coisa errada comigo, pensei. Pedi minhas contas e resolvi encarar a música como profissão em definitivo. Assim o jornalismo perdeu um soldado…”
“Nós tínhamos contrato com a gravadora Monstro e uma base em São Paulo que foi muito boa. A partir daí tivemos mais visibilidade, culminando com uma participação no Programa do Jô, quando a gente fez a abertura do programa com o sexteto do Jô e mais duas músicas nossas. Em 2006 começamos a fazer o segundo disco, lançado no Goiânia Nois, um festival grande que acontece lá. Esse trabalho rendeu bastante também. Fizemos o circuito do Itaú Cultural e outros projetos bacanas pelo País até 2008.”
Premiado pela Rolling Stone
O primeiro disco tem um sonoridade mais crua, é visível a influência do Cream, de Jimi Hendrix, mais essa coisa de power trio. O segundo já tem mais baladas, mais folk rock, mais blues, que é a fonte dos guris e a minha. A Pata é um somatório de muitas vertentes musicais. O rock dos anos 1960, 1970, da surf music, funk, soul, trilhas sonoras de filmes, principalmente de compositores como Henry Mancini, Enio Morricone e Nino Rota, mais Burt Bacharach. A gente misturou tudo, pegou todas essas influências e trouxe para a nossa sonoridade. Dá para notar de um trabalho para o outro nosso crescimento como músicos, crescemos juntos, desenvolvemos juntos.”
“O disco de 2008, foi considerado pela revista Rolling Stone brasileira como um dos 25 melhores discos daquele ano, ficou em vigésimo lugar. Um disco instrumental concorrendo com todos os discos com cantores. À frente inclusive de um disco do Roberto Carlos e o Caetano Veloso cantando bossa nova. Foi um trabalho marcante para nós.”
Quarteto, a última formação
“Em 2010 fizemos o terceiro disco, que saiu pela Trama. Esse foi o último disco em formato de trio, embora a gente sempre tivesse participação de outros músicos em nossos trabalhos. Eu e o Dani nessa época morávamos em São Paulo e o Gabriel ia e voltava. Ficamos cerca de um ano lá. Aí em 2011, o Edu Meirelles assumiu o baixo, deixando os guris livres para assumirem as guitarras. O quarto e último disco, feito em 2013 e lançado no ano seguinte, foi em forma de sexteto, com o Luciano Leães e o Júlio Rizzo. É um trabalho diferente dentro da discografia da Pata.”
“A banda terminou em 2013 porque a gente se deu conta que estava cansado do que a gente vinha fazendo. Foram 11 anos de convivência muito legal. Por isso três anos e meio depois quando fomos convidados a tocar de novo, o convite foi aceito com o maior prazer.”
“A música da Pata transcende a nossa individualidade, ela ficou, apesar de não ser mainstream. Basta ver o carinho que as pessoas falam da banda e mostram interesse nessas apresentações. Mas vão ser somente essas, a banda não vai voltar. Cada um de nós está envolvido com seus projetos e a vida segue para todos nós. Sempre com muita música.
SERVIÇO:
Show Pata de Elefante – Projeto Acústico Ocidente
Dias 20 e 27 de outubro, às 23 horas (a casa abre às 21 horas)
Ingresso: R$ 50,00.
Uma celebração de rock no Ocidente com a Pata de Elefante
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