Um show do cantor nativista Luiz Carlos Borges na hora do almoço marca o dia de campo/abertura nacional da safra de canola nesta quarta (18 de setembro de 2013) em Passo Fundo. Com cerca de 28 mil hectares cultivados em 2013 no Estado, a canola é uma das culturas agrícolas de inverno que mais crescem no Rio Grande do Sul e no Brasil.
Entre as lavouras de inverno, é superada pela cevada (40 mil ha/ano) e o trigo (mais de um milhão de ha/ano). Nesta época do ano as flores amarelas da canola destacam-se na paisagem castigada pelo frio. O óleo de canola é usado na culinária doméstica e como insumo na fabricação de biodiesel.
O evento é promovido pela BSBIOS com o apoio da Embrapa Trigo, Emater RS, Cotrijal, Universidade de Passo Fundo, Produfort, Abrascanola, Grupo Floss e Banco do Brasil.
Mapa do evento
Autor: Geraldo Hasse
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Canola cresce no inverno gaúcho
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Safra brasileira de soja deve superar a dos EUA
A safra brasileira de soja deverá superar a norte-americana em pouco mais de 2 milhões de toneladas na temporada 2013/14, mostraram dados do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) divulgados pela agência Reuters.
A estimativa de colheita dos EUA foi reduzida para 85,71 milhões de toneladas, ante 88,6 milhões do relatório de agosto, devido a “menores perspectivas de produtividade, especialmente no oeste do cinturão de grãos”.
“O USDA deu o primeiro passo para reconhecer os problemas da soja. Nós esperamos uma nova revisão no relatório do próximo mês”, disse o estrategista-chefe da Allendale Inc, Rich Nelson.
As plantações de soja dos EUA têm sofrido com falta de chuvas nas últimas semanas. O desenvolvimento das lavouras está em fase avançada, com a colheita nos EUA prevista para iniciar nas próximas semanas.
Já para o Brasil, onde o plantio deve começar em poucos dias, o USDA elevou a estimativa de safra para 88 milhões de toneladas, ante 85 milhões na projeção de agosto.
O órgão do governo norte-americano cita um aumento da área destinada à oleaginosa no Brasil nesta temporada.
“A recente força dos preços e um real desvalorizado deverão dar incentivos para os produtores de soja elevarem a área em 4 por cento ante o ano passado”, disse o USDA.
O Brasil se aproximou dos EUA em produção de soja nos últimos anos, um mercado tradicionalmente liderado pelos norte-americanos.
Na safra passada, os EUA produziram 82,06 milhões de toneladas, contra 82 milhões de toneladas do Brasil. -
O beco tem saída?
Beco por definição não tem saída. Então o que fará o Homem para sair do beco em que se meteu a bordo do capitalismo?
Já não importa se a economia cresceu, se a inflação subiu ou o emprego está batendo pino. O navio encalhou com sete bilhões de pessoas a bordo. O que fazer?
Como o capitalismo se reinventa a cada crise, é provável que seus batedores aconselhem a demolição do beco metafórico em que se vê o pobrerio.
No lugar do buraco (ou da favela), eles construirão um prédio de apartamentos, um conjunto de lojas ou quem sabe um shoppinzinho maneiro.
Pronto: os investidores e seus aliados se refestelarão em suas cadeiras estofadas enquanto o povo será convidado a procurar sua turma na PQP.
É exatamente assim que pensam os adeptos da tese de que “não há almoço grátis”, como disse o economista Milton Friedman, um dos pilares do neoliberalismo.
Ocorre que não há recursos naturais suficientes para manter o atual modelo competitivo de produção. “The game is over”, o jogo acabou.
É preciso reconhecer que a ênfase no crescimento acelerado não tem condições de se sustentar a longo prazo. O foco, como se diz hoje em dia, tem de se voltar para a cooperação, a solidariedade.
Distribuição da riqueza
A ânsia de acumulação já não se justifica diante da abundância de produtos e mercadorias disponíveis no mundo globalizado. O que falta é distribuir melhor os frutos do trabalho e da riqueza. Alguns grupos e governos já trabalham dentro dessa perspectiva, mas são minoria.
Se nos condoemos ao ver animais abandonados, maltratados ou vítimas de desastres ecológicos (por exemplo, as aves marinhas agonizando nas manchas de petróleo), por que não tomamos a iniciativa de estender a mão aos nossos semelhantes, desprovidos de recursos ou de sorte?
É o que anda se perguntando pelo mundo afora muita gente boa, uns cristãos, outros marxistas.
Neste momento, faz enorme sucesso na Internet a entrevista em que o geógrafo britânico David Harvey desafia os insatisfeitos do mundo a apontarem alternativas ao capitalismo. A entrevista a Ronan Burtenshaw e Aubrey Robinson foi publicada originalmente no site Red Pepper em 22-08-2013.
Harvey tem 77 anos e leciona em Nova York, onde foi espectador privilegiado do colapso, cinco anos atrás, do banco Lehman Brothers, a maior falência da história dos Estados Unidos.
A quebra do Lehman Brothers não foi apenas um tropeço do neoliberalismo, mas o mais recente sinal de que o capitalismo não tem cacife para levar bem-estar a todos os habitantes do planeta.
Mas de que adianta ficar apontando os defeitos e contradições do capitalismo se não temos algo novo a propor?
Harvey está escrevendo um livro chamado As 17 Contradições do Capitalismo. Inspira-se num dos grandes ditados de Karl Marx, segundo o qual toda crise é sempre o resultado das contradições subjacentes. Daí que o foco de Harvey não vai para os resultados da crise de 2008, mas para suas contradições, a começar pela distorção entre o uso e o valor de uma mercadoria como a casa.
Diz o geógrafo: “Antigamente, as casas eram construídas pelas próprias pessoas, e não havia absolutamente nenhum valor de troca. A partir do século XVIII, teve início a construção de casas para fins especulativos. Assim, as casas se tornaram valores de troca para os consumidores providos de poupança”.
Em consequência, metade da humanidade está excluída do direito natural à própria habitação. Para ter um teto, as pessoas pagam aluguel, vivem amontoadas em favelas ou praticam invasões. Para se defender os detentores de imóveis se fecham atrás de muros, grades e condomínios fechados.
Foi assim que a habitação se tornou uma forma de ganho especulativo. O valor de troca assumiu o comando. O boom especulativo dos capitais flutuantes gerou uma bolha imobiliária nos Estados Unidos no início do século XXI. O valor de uso do imóvel foi destruído pelo valor de troca. Uma distorção brutal que todo mundo vê como normal, pois nascemos debaixo desse sistema.
Produção e demanda
E aqui Harvey toca no ponto crucial: o problema não é só com a habitação, mas também com coisas como a educação e a saúde. “Em muitos casos”, diz Harvey, “nós ativamos a dinâmica do valor de troca na hipótese de que ele vai fornecer o valor de uso mas, frequentemente, o que ele faz é estragar os valores de uso, e as pessoas acabam não recebendo bons cuidados de saúde, educação ou habitação.”
Uma das grandes questões abordadas por Harvey é o conflito entre produção e demanda de mercado. Como o capital precisa produzir de forma lucrativa, isso significa suprimir trabalho, isto é, reduzir os custos salariais.
Assim, a produção gera lucros elevados, mas quem vai comprar o produto se os trabalhadores perderam poder aquisitivo?
Nos anos 1990, como o achatamento salarial se tornou inviável diante do poder dos sindicatos de trabalhadores e da manutenção dos direitos trabalhistas (só em parte desmanchados pelo neoliberalismo), a economia global se manteve em alta graças ao aumento do endividamento das pessoas.
“Você começa a criar uma economia do cartão de crédito e uma economia financiada em altas hipotecas na habitação”, diz o geógrafo. Ou seja, as dívidas encobriram o fato de que não havia demanda real.
No fim, isso explodiu em 2008. Para Harvey, é preciso recuperar o valor de uso, organizando a produção de forma a atender aos direitos e necessidades das pessoas – e não o contrário, as pessoas sendo obrigadas a atender às necessidades das empresas. Nas palavras dele:
“O que está acontecendo exatamente agora é que nós produzimos coisas e depois tentamos persuadir os consumidores a consumir tudo o que produzimos, independentemente se eles realmente querem ou precisam disso. Enquanto que deveríamos descobrir quais são as vontades e os desejos básicos das pessoas e, então, mobilizar o sistema de produção para produzir isso”.
Está difícil mudar o jogo porque, de acordo com estudos recentes de países da antiga Europa, uma parcela poderosa dos detentores do capital está se saindo muito bem dentro da crise atual e quer continuar ganhando. “A população como um todo está sofrendo, o capitalismo como um todo não está saudável, mas a classe capitalista – particularmente uma oligarquia dentro dela – tem se saído extremamente bem”, diz Harvey.
Para o entrevistado, a esquerda se tornou tão cúmplice do neoliberalismo que você realmente não pode distinguir os seus partidos políticos dos da direita, exceto em questões nacionais ou sociais. Na economia política, não há muita diferença. Mas é aí que se deve procurar resolver as contradições, como no caso dos valores de uso e de troca de bens essenciais como a casa, o ensino, a saude.
Harvey chama a atenção para a apropriação da moeda como elemento de poder de uns sobre os outros. As pessoas mobilizam as suas vidas ao redor da busca do dinheiro. “Então, nós temos que mudar o sistema monetário, seja cobrando imposto de quaisquer excedentes que as pessoas estejam começando a obter, seja chegando a um sistema monetário que se dissolva e não possa ser armazenado, como as milhas aéreas”, diz ele.
Para fazer isso, é preciso superar a dicotomia entre propriedade privada e Estado, de forma a se chegar a um regime de propriedade comum, baseado mais na solidariedade do que na competição. Na previsão otimista de David Harvey, as pessoas vão deixar de correr atrás do dinheiro ou da acumulação desvairada se entenderem que sempre terão uma renda básica para sobreviver. (Geraldo Hasse) -
Há algo de podre na saúde
A decisão do governo de alocar médicos em cidades do interior e na periferia das grandes cidades toca na ferida, mas não trata (nem poderia) das origens do mal em si: a brutal desigualdade de renda entre pessoas, grupos sociais com acesso à educação e controle dos meios de produção e, ainda, os desequilíbrios regionais históricos que produziram concentrações populacionais no litoral e no entorno das capitais.
Sim, é dura a vida dos pobres, quer morem nos sertões ou nas capitais, mas a partir da iniciativa de contratar médicos, inclusive estrangeiros, a R$ 10 mil por cabeça, mais benefícios e vantagens não divulgados, o governo pode começar a controlar o intenso fluxo de ambulâncias e vans do interior sem médico para as capitais bem providas de profissionais da saúde e bem equipadas.
Ter médicos no interior ganhando salários a que só as elites bem educadas têm acesso pode ser o começo do processo de correção dos problemas do sistema brasileiro de saúde, 25 anos depois que a Constituição de 1988 pariu o SUS, deixando a porta aberta para seguradoras e consórcios de saúde subverterem o lado bom da coisa em favor da mercantilização da medicina.
Uma das coisas mais tristes do Brasil é ver médicos mais interessados no próprio bolso do que naquilo de que falava Hipócrates, o pai da Medicina. Mas não se deve confundir a elite com a corporação. É incompreensível a reação dos órgãos representativos dos médicos contra a iniciativa oficial de mexer no esquema de atendimento médico à população situada fora do alcance do mercado-da-doença.
Nós brasileiros estamos diante de uma baita sinuca: ou damos sequência às medidas de correção do caos na saúde ou temos de continuar engolindo diariamente o atual estado de coisas, no qual uma minoria de médicos ganha extraordinariamente bem, enquanto a maioria da categoria precisa operar em péssimas condições para ganhar o mínimo em dois ou três empregos, sabendo-se que a saúde não depende só do médico, mas de uma infraestrutura humana e de equipamentos também mal distribuída no território nacional.
Indústria farmacêutica
Segundo dirigentes de entidades profissionais, é preciso aumentar significativamente a parcela do PIB que vai para a saúde, sem o que não haverá como se implantar uma estrutura adequada de unidades básicas de atendimento nas diferentes regiões do país.
Para um médico recém-formado, é interessante ganhar 10 mil por mês no interior, mas sem infraestrutura (pessoal, material e de equipamentos) ele não atenderá direito as necessidades da população e, depois de dois anos, estará correndo o risco de ficar desatualizado, pois tudo rola nas capitais, como é praxe em nosso modelo concentracionista.
Há algo podre na saúde pública. Programas de atendimento básico nos postos de saúde e de médicos de família não prosperam porque tiram “clientes” dos planos de saúde e reduziriam o absurdo consumo de medicamentos nas farmácias, o que só favorece a indústria alimentada por concorrências manipuladas.
Não se deve duvidar que esse conjunto de incongruências alimentou as recentes manifestações de rua. As demandas coletivas foram expostas e o governo começou a dar respostas mais ou menos aleatórias, como para acalmar o berreiro dos bebês famintos.
Deve-se lembrar que o começo do programa Mais Médicos nasceu de um pedido da Frente Nacional dos Prefeitos. Em fevereiro, o presidente da Frente, José Fortunati, prefeito de Porto Alegre, pediu à presidenta Dilma que fizesse alguma coisa para evitar o problema de dupla face: de um lado, a sobrecarga da estrutura hospitalar das capitais; de outro, a falta de atendimento médico no interior.
Segundo Fortunati, a presidenta chamou o ministro Alexandre Padilha e ordenou que ele tomasse providências imediatas. Talvez Padilha tenha visto nisso uma alavanca para sua candidatura ao governo paulista, mas se ele concorrer em 2014 os eleitores é que vão decidir se ele deve ou não ficar no lugar de Geraldo Alckmin, aliás também médico.
Assim como na saúde, outros setores governamentais (infraestrutura, educação, energia, segurança) estão buscam saídas para reverter as diversas crises setoriais, mas a maioria parece não acreditar em soluções consensualmente construídas a partir de discussões nas bases sociais. Nesse aspecto o PT, que veio da base, do chão de fábrica, das comunidades eclesiais, das assembleias sindicais, deu um gigantesco passo atrás, elegendo o mercado como o mediador dos conflitos. (Geraldo Hasse)
LEMBRETE
“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. ”
Artigo 196 da Constituição do Brasil -
Dilma já sonha com a primavera
Na sua passagem por Porto Alegre, a presidenta Dilma Rousseff retomou as rédeas do seu governo, abalado recentemente pelas manifestações populares que varreram o país de norte a sul.
Falante e otimista, a presidenta garantiu que o dragão da inflação finalmente se acalmou e que a recente queda de 0,1% do nível do emprego não é nada nesse momento de maré baixa da economia mundial.
Olhando por outro lado, a taxa de desemprego em torno de 6% seria um fenômeno quando comparada, por exemplo, aos 25% da Espanha ou aos 12% dos EUA. Pois bem, retomando o fio da meada econômica – sem a emergência marqueteira que ronda os passos da presidenta –, devemos reconhecer que ainda estamos longe de um bom diagnóstico da situação, pois os dados são muito contraditórios.
Numa entrevista coletiva “improvisada” no saguão do edifício em que se hospeda em Porto Alegre, a presidenta Dilma Rousseff retomou as rédeas do seu governo, abalado pelas manifestações populares, mas dando sinais de recuperação nas últimas pesquisas (o índice de aprovação subiu 8 pontos no Ibope).
Aos repórteres que tentaram extrair-lhe uma declaração típica de quem está em campanha pela reeleição, Dilma disse estar com todo o gás para trabalhar “até o dia 31 de dezembro de 2014”.
Falante e otimista, a presidenta garantiu que o dragão da inflação finalmente se acalmou e que a recente queda de 0,1% do nível do emprego não é nada nesse momento de maré baixa da economia mundial.
Olhando por outro lado, a taxa de desemprego em torno de 6% seria um fenômeno quando comparada, por exemplo, aos 25% da Espanha ou aos 12% dos EUA.
Pois bem, retomando o fio da meada econômica – sem a emergência marqueteira que ronda os passos da presidenta –, devemos reconhecer que ainda estamos longe de um bom diagnóstico da situação, pois os dados são muito contraditórios.
Primeiro, onde a coisa vai mal? Como sempre, o maior nó aparece no fronte externo: dólar em alta, exportações em queda, importações crescendo, dívida governamental realimentando os juros básicos da economia.
Desconexão
No front interno, marcado pela estagnação do consumo e o aumento do endividamento das pessoas, a pressão inflacionária recolocou no horizonte o risco do desemprego, mas nesse campo o jogo se encaminha para o empate. Mesmo com a supersafra 2012/13, o aquecimento do mercado da construção civil e a desoneração fiscal de vários setores, a indústria brasileira viu cair o volume de encomendas. É uma situação desconexa. Até parece que de nada valeu o refresco da redução das tarifas de energia em fevereiro.
Refresco? Nada disso, a redução das tarifas elétricas foi vitamina na veia, mas parece não ter funcionado, pois a economia havia sofrido o aumento dos derivados de petróleo. Mas é lógico pensar que sem as reduções de tarifas e impostos a situação teria ficado muito pior. Isso só vamos saber depois que baixarem totalmente as águas do tsunami de junho/julho.
O que sabemos é que, combinando descontentamento político com insegurança econômica, as manifestações populares comandadas pelas redes sociais levaram 30 pontos percentuais da credibilidade de Dilma Rousseff, que já vinha disparando os primeiros tiros eleitorais contra Aecio Neves, Eduardo Campos e Marina Silva.
Até José Serra saiu da cova para dizer que não morreu, como havia ficado mais ou menos claro em novembro de 2010. Aí veio o Papa pra dar uma folga ao bumba-meu-boi petista. Depois de lançar alguns projetos logo queimados pelos aliados e opositores de plantão, a presidenta volta ao ponto de origem, em Porto Alegre, em busca de uma primavera ainda distante.
Um dos diagnósticos da crise diz que o governo federal errou ao apostar no consumo fácil. Esses críticos vinculados à ortodoxia acadêmica acham que na economia não pode haver rédea frouxa. Mas qual seria a alternativa? Os manuais da economia não têm receita para situações anômalas.
Em artigo recente, o jornalista (formado também em economia) Luis Nassif atribuiu ao ministro Guido Mantega a culpa pela atual “crise” econômica brasileira. É muita crise para uma só pessoa. Sem brilho pessoal, Mantega não age sozinho, embora pareça bastante isolado na Fazenda.
No fundo, no fundo, vem sendo fritado em pouca gordura, mas o PT não dispõe de nenhum economista realmente equipado para exercer o cargo mais pesado do Planalto, depois da Presidência. O veterano Paul Singer, por exemplo, é muito respeitado, mas não tem interlocução com as cúpulas empresariais nem se sujeita a usar gravata.
Como solução para a “crise”, recomenda-se (ao governo) aumentar os investimentos em infraestrutura, como se à obrigação de ter uma política econômica austera a Presidência devesse somar o encargo de orientar e financiar os empreendedores privados.
Estatal ou liberal
A estes bastaria entrar com a gestão e, depois, desfrutar dos lucros, numa repetição de outros ciclos de crescimento da economia brasileira – lembremos apenas os governos militares, o tempo de JK e a longa época de Vargas. E acabamos na velha lenga-lenga: se o governo comanda, é estatizante; se deixa rolar, é liberal demais.
O Programa de Aceleração do Crescimento está devagar não apenas porque faltam recursos, mas porque não há projetos executivos e demoram as licenças ambientais. Recursos, projetos e licenças: o tripé de ouro do desenvolvimentismo roussefiano funciona precariamente, mas a culpa não é só do governo federal.
E aqui entramos numa discussão político-econômica aquecida pelas recentes manifestações populares: qual o modelo que queremos?
Uma economia comandada por grandes investimentos público-privados em usinas, aeroportos, pontes, estradas, ferrovias – tudo isso com escasso controle ambiental?
Ou uma economia ecologicamente sustentável centrada nos pequenos negócios?
Os grandes empresários, os professores de economia e os políticos acham graça dessa última hipótese, mesmo sabendo que o capitalismo predatório não tem futuro. Mais 50, 100, 200 anos e o planeta estará na última lona. Quem vive preso no trânsito das grandes cidades sabe intuitivamente que “o carro está pegando”.
O mais lógico seria parar de enxugar gelo, mas ninguém tem coragem de levantar as mãos e dizer: “Minha gente, está na hora de pormos a mão na consciência e iniciar um programa de desaceleração do crescimento.”
Sendo ela a inventora do PAC, não será Dilma Rousseff quem provavelmente proporá esse pacto pela sustentabilidade. Quem está teoricamente mais próximo desse “basta ao crescimento predatório” é Marina Silva, que tenta construir uma nova alternativa partidária para um novo salto eleitoral em 2014. -
O ano mais ninja da história
Uma das maiores surpresas das recentes manifestações populares foi a desenvoltura da chamada mídia ninja, formada por jovens equipados com celulares que transmitem audio e vídeo on line, gerando uma formidável anarquia informacional.
Ao contrário do que se pensou e se difundiu, essa rapaziada não opera solta no espaço. Ela tem comando, embora desfrute de uma autonomia rara na mídia convencional.
Só isso já bastou para transformar esses jovens repórteres-manifestantes em protagonistas centrais dos acontecimentos que marcaram 2013 como o ano mais louco do século XXI.
Dois cabeças do movimento, Pablo Capilé e Bruno Torturra, deram um depoimento extraordinário ao programa Roda Viva da última segunda-feira, dia 5. Com nomes que lembram codinomes, esses rapazes demonstraram possuir uma rara capacidade de argumentação, tanto que conseguiram escapar ilesos à maior parte dos questionamentos feitos por uma bancada de experientes perguntadores.
Sua articulação tem raízes no movimento estudantil, mas eles têm algo que os diferencia da maior parte dos jovens de hoje – ou muito dependentes dos pais ou completamente descolados das bases familiares: têm consciência social e correm riscos por isso.
Embora a palavra ninja lembre automaticamente os lutadores encapuzados do Japão, no Brasil de 2013 NINJA é uma sigla: Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação. E por aí vamos com ousadia e criatividade.
Nada a ver, portanto, com siglas emergentes como CQC e Pânico na TV, que fazem arremedos de jornalismo temperados por um humor irresponsavelmente corrosivo.
Espaço independente
Segundo o depoimento de Capilé e Torturra, a base do movimento da Ninja começou a se formar há dez anos graças a jovens músicos sem vez no mundo do show business. Eles procuraram cavar espaços independentes da superestrutura que domina a TV, as gravadoras e à qual está atrelada a máquina publicitária.
Sobreviveram e cresceram, conseguindo estabelecer um circuito alternativo de festivais e shows durante os quais também rolam debates e seminários que discutem os problemas dos pobres e oprimidos pelo sistema. Em alguns casos, eles contam com patrocínios públicos, que não representam nem 10% de sua arrecadação.
Hoje há dois mil jovens ativistas que vivem em comunidades de até 30 pessoas que trabalham para se sustentar individual e coletivamente. O custo mensal de cada ativista é R$ 900. Um sucesso: até quando? Qual sua real motivação? Quais seus objetivos? Querem ser absorvidos pelo sistema? Ou desejam transformá-lo? O sistema e o governo são a mesma coisa?
Sua luta lembra a época da ditadura militar, quando muitos jovens e alguns veteranos se uniram para editar jornais alternativos, formar cooperativas de jornalistas, grupos de teatro e cinema. Os mais radicais caíram na clandestinidade e formaram grupos armados que acabaram sendo destruídos pelo regime militar. Até hoje se faz o rescaldo desse período. Aí está a Comissão da Verdade lutando para reunir depoimentos, documentos e provas de violações de direitos humanos em cadeias civis e dependências militares.
Sem patrimônio nem estrutura física, como acontece com a mídia convencional, a mídia ninja é engajada no ativismo dos direitos civis, políticos e econômicos. “Jornalismo pós-industrial”, falou Capilé, tentando explicar o fenômeno sem precedentes à vista na moderna história brasileira.
Seu grande diferencial, além do baixo custo operacional e do voluntarismo, é a habilidade no uso de ferramentas eletrônicas que, além de revolucionar a comunicação interpessoal, estão provocando mudanças profundas na relação da mídia tradicional com seus leitores, ouvintes e telespectadores.
O celular está para essa mídia revolucionária como o microfone móvel esteve para o rádio e a câmera ambulante para a TV. É lógico concluir que, daqui a algum tempo, todas as novas ferramentas estarão dominadas pelos trabalhadores da mídia convencional. Será a banalização de uma nova tecnologia de comunicação.
A pergunta que fica é até que ponto a mídia convencional ancorada na iniciativa privada terá interesse em operar como correia de transmissão de impulsos originários da base da sociedade?
Até onde se sabe pelos relatos da História, os interesses que movem a iniciativa privada estão longe demais do interesse público.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Nos corredores da história, o grito dos ricos ecoa mais alto que o gemido dos pobres”
HENRY THOMAS, historiador inglês, em A História da Raça Humana, de 1938 -
A crise é da economia ou do governo?
Admitamos: por pequena que seja, a crise do governo Dilma afeta a governabilidade e põe em risco uma reeleição que até alguns meses atrás parecia barbada. Entretanto, admitamos também: não será um Deus-nos-acuda se a atual mandatária for descartada pelas urnas em 5/10/2014.
Aécio, Edu, Marina? Neste país sempre à espera da volta do Messias ou de um salvador-da-pátria, é bom que fique claro: o Brasil só irá para a frente por meio da construção de consensos mínimos. Ainda que a visita do Papa Francisco tenha ajudado a baixar a poeira das manifestações populares, nenhum problema desapareceu da agenda por um passe de mágica. É hora de conversar, ouvir, pensar e agir.
A proximidade das eleições deixa todo mundo nervoso, meio louco para dar um golpe mortal no adversário. E o alvo preferido da maioria tem sido a presidenta Dilma e o PT.
Na Internet correm mensagens a tratando por presid’anta. Riem até do seu modo de caminhar.
Segundo os críticos, a falta de diálogo com o Congresso e o Judiciário ressalta o viés autoritário da presidenta, mas até agora ninguém apontou-lhe um erro capital ou uma falha grave.
Não faz bem à democracia transformá-la em alvo fixo de descontentamentos sociais, políticos ou econômicos. O cargo precisa ser preservado como patrimônio do estado de direito. E ambos, o cargo e a pessoa, não se dissociam, a menos que esta faça por desmerecê-lo.
Nos últimos meses, ficou claro que a presidenta perdeu o foco ao se deixar orientar (mal) por um marqueteiro, o pior dos conselheiros em momentos de tensão ou crise.
O profissional de marketing tem a fidelidade de uma biruta de aeroporto: quando muda o clima, vira-se imediatamente para o lado de onde sopra o vento, deixando “o cliente” na poeira ou fazendo força para queimá-lo.
Em abril, quando os candidatos à presidência começaram a sair da toca, a presidenta foi aconselhada a ir ao interior, onde fez discursos mal ajambrados sobre realizações do governo. Ao distribuir tratores e verbas, expôs-se sem necessidade e, pior, sem ganhos reais. Distribuir é obrigação, não pode ser pretexto para buscar simpatias ou elogios ou votos.
Foi esse primarismo eleitoral que erodiu a credibilidade presidencial. Dois meses depois, sem ter a quem recorrer, a presidenta buscou o apoio do CDES, órgão que até então vinha tratando com olímpico desdém, como se fosse um apêndice decorativo criado pelo presidente Lula. Tudo somado, a chefa perdeu 30 pontos em sua imagem.
Como as perspectivas econômicas não são positivas, correu o boato de que o ex-presidente Lula teria aconselhado sua pupila a colocar no núcleo central do governo o jornalista Franklin Martins, que ficou marcado no governo anterior como o patrocinador de um projeto de controle da mídia. Ele atuaria mais como articulador
político do que como assessor de comunicação.
Caem os empregos, caem as exportações, sobem as importações, elevam-se os juros básicos da economia, desacelera-se o consumo, pioram as contas externas, crescem os cortes orçamentários: infelizmente, desenha-se na economia um quadro recessivo que tende a favorecer a concentração da propriedade e da renda. Nesse ritmo, o Brasil pode destruir o que foi construído em uma década de esforço distributivo e inclusão social. Olhando bem, pode-se ver aí o fermento das manifestações de 2013.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Há milhões de crianças sem comida e sem escola. Há milhões de idosos desamparados. Essas tragédias do nosso mundo são esquecidas pela mídia. No entanto, as bolsas caem 3 ou 4 pontos e lá vêm as manchetes, como se o mundo fosse acabar.”
Papa Francisco ao condenar a idolatria do dinheiro em entrevista ao Fantástico de 28/7/2013 -
O explosivo conflito pela terra
A atual celeuma em torno do conflito índios x agricultores precisa ser encarada por uma força-tarefa dos três poderes, sob pena de se conflagrar o Brasil inteiro. Todo mundo dá palpite sobre quem merece ficar com as terras, mas ninguém se dá conta de que à luz da Constituição de 1988 tanto os índios quanto os chamados colonos têm razão.
“Nós acampamos aqui porque queremos adquirir essa terra que foi dos nossos antepassados”, disse um cacique indígena de meia idade, em 2001, ao explicar a um jornalista porque sua família havia armado barracas de plástico no meio de uma plantação de pinus no oeste de Santa Catarina, onde os conflitos por terras se arrastam há décadas.
O verbo “adquirir” tinha um sentido não monetário: a ideia indígena era obter a terra gratuitamente graças à Constituição de 1988. E assim tem sido em várias regiões. Em contrapartida, há reservas indígenas sendo invadidas por aventureiros da agricultura na Amazônia Em alguns casos, trata-se não de invasão, mas de arrendamento das terras indígenas pelos brancos.
A atual celeuma em torno do conflito índios x agricultores precisa ser encarada por uma força-tarefa dos três poderes, sob pena de se conflagrar o Brasil inteiro. Todo mundo dá palpite sobre quem merece ficar com as terras, mas ninguém se dá conta de que à luz da Constituição de 1988 tanto os índios quanto os chamados colonos têm razão.
Ao garantir aos indígenas o direito à terra dos seus antepassados, nossa lei maior criou um conflito com o direito à propriedade de todos os que – colonos, agricultores, posseiros, grandes empresários — obtiveram certidões ou títulos por doação de governos, posse ou compra no mercado imobiliário. Registre-se que a Lei de Terras do Brasil é de 1850. Antes prevalecia a legislação portuguesa com suas cartas régias, sesmarias e titulações variadas.
Início dos conflitos
Há um claro conflito entre o direito natural dos índios (artigos 231 e 232) e o direito de propriedade (artigos 5 e 170) dos “brancos”. Na essência esses artigos se contradizem. Eles armaram uma bomba que agora começa a pipocar em todo o território nacional.
Foi irresponsabilidade dos constituintes de 1988: no apagar das luzes dos trabalhos constitucionais, quando só pensavam na volta para casa, os deputados aprovaram a toque de caixa o capitulo VIII (DOS INDIOS) com apenas dois artigos (231 e 232), fechando os olhos para o risco de um conflito com os artigos anteriores (5 e 170), referentes ao direito de propriedade.
Por tabela, estão no mesmo barco os descendentes de quilombolas, favorecidos pelo artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias. Porém, como os descendentes de escravos rebelados ocupam glebas restritas, seus direitos são pouco contestados, mas ainda assim há conflitos explícitos chegando às páginas da mídia.
Com os índios é diferente: além de ser muito mais numerosos do que os quilombolas, eles reivindicam áreas imensas, algumas ocupadas há décadas por agricultores “brancos”.
E assim, 25 anos depois da Constituição Cidadã, chegamos ao atual cenário. Os índios, cuja população não chega a 1 milhão de pessoas (menos de 0,5% da população brasileira), teriam direito a cerca de 11% do território, onde poderiam exercer o seu “modo de vida” à antiga.
Essa discrepância entre a ampla área das reservas indígenas e a restrita população nativa tem sido especialmente explorada pelos defensores dos agricultores, que somam milhões. É a bancada ruralista contra a bancada ambiental-indigenista numa reedição da batalha em torno da reforma do Código Florestal.
Em face disso, tem aflorado a seguinte questão: será justo sacrificar uma maioria de trabalhadores da terra/produtores de alimentos em favor de uma minoria mais afeita ao lazer do que ao labor?
Há índios que ainda vivem como seus antepassados: caçam, pescam, dormem em cabanas, cultivam alguma roça e circulam por vastas reservas, onde recebem assistência gratuita do estado – saúde, educação, alimentação, infraestrutura de comunicação etc. São tutelados e tratados como carentes, mais ou menos de acordo com a chamada Doutrina Rondon, o militar que entrou no século XX apregoando o tratamento humano aos índios.
Em contrapartida, há índios que vivem como “brancos”: têm educação, sabem fazer negócios e possuem objetivos materiais semelhantes aos dos antigos colonizadores do território brasileiro. São os chamados índios civilizados. Eles têm cacife para dispensar a tutela da Funai e a proteção da Polícia Federal (leia-se Ministério da Justiça), mas não o fazem porque são solidários com seus irmãos indígenas e não vêm motivo para abrir mão de direitos assegurados pela Constituição.
Não há dúvida de que todas essas questões precisam ser mediadas pelo Judiciário, em conjunto com o Congresso e o Executivo – não com base na contraditória legislação vigente, mas por meio de um novo e genuíno espírito de negociação. Sem acordo ou pacto não se vai sair do impasse criado há 25 anos pela Constituição.
O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO
TÍTULO II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
CAPÍTULO VIII
DOS ÍNDIOS
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º – São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º – As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3º – O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º – As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º – É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º – São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.
§ 7º – Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo. -
FHC evita criticar Dilma
Repetindo a dose tucana, iniciada na semana anterior com José Serra, o RodaViva da TV Cultura de São Paulo entrevistou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que paira sobre o PSDB, o partido governante de quatro estados e administrador de 700 municípios brasileiros. Foi nesta segunda feira 1/7.
Decepcionou-se quem esperava um ataque ao governo da presidenta Dilma. FHC falou pouco de política, preferindo manifestar-se como professor de sociologia, sua principal atividade na USP antes de ser cassado pelo AI-5 (1968) e de entrar para a política (pelo PMDB em 1978).
O atual momento de turbulência social e política no Brasil é um prato cheio para um cientista social que chega aos 80 anos na plenitude de sua lucidez intelectual e já (relativamente) destituído das vaidades que o levaram a disputar pra valer o poder no Brasil. FHC elogiou os jovens pelas recentes manifestações, mas não pixou ninguém.
Permitiu-se apenas algumas farpas indiretas. A maior delas foi uma alusão ao ex-presidente Lula: “Há pessoas que ficam em silêncio nesse momento rico porque talvez se sintam culpadas por alguma coisa ligada à corrupção”. Não citou nome algum, mas nas entrelinhas ficou claro a quem queria espicaçar. FHC e Lula vivem de pirraça.
No fundo, disse FHC, as pessoas estão protestando contra a desigualdade, a pobreza, a corrupção. “O Brasil vai bem mas a maioria das pessoas quer mais”, disse ele, relacionando os atuais protestos brasileiros aos de outros países – Espanha, Egito, Islândia –, todos mobilizados pelas redes sociais. Até aí, nada de novo.
À presidenta Dilma, ele recomendou humildade. “Se eu pudesse lhe dar um conselho, com todo respeito, eu lhe diria: ‘Ouça mais’ ”. Não foi um puxão de orelha, mas uma leve beliscadinha. De leve, como manda a boa educação: quando uma pessoa está caída no chão, não se deve chutá-la, mas estender-lhe a mão. “Vejam como sou gente fina…”
Recém-eleito para a Academia Brasileira de Letras, Fernando Henrique acaba de lançar um novo livro sobre os grandes pensadores brasileiros: Oliveira Viana, Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Hollanda, Celso Furtado e outros – o último deles, Antonio Candido, que continua ativo aos 95 anos em São Paulo, foi citado por FHC como o melhor professor que conheceu no Brasil, comparável somente a Raymond Aron, da Universidade de Nanterre na França.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“A democracia é o resultado de um encontro harmonioso entre o Estado, o Mercado e a Sociedade”
Fernando Henrique Cardoso