O empresário Ricardo Semler, um tucano de berço, escreveu em defesa da gestão petista na Folha de S. Paulo: “Garantir renda a quem sempre foi preterido no desenvolvimento deveria ser motivo de princípio e de orgulho para um bom brasileiro. Tanto faz o partido.”
Semler compreende o andar dos processos. Desistiu de tentar fornecer para a Petrobrás há décadas. Hoje sócio da Semco, e não mais um herdeiro com uma batata quente nas mãos, na década de 1980 escreveu o livro “Virando a própria mesa”, que foi ao topo dos mais vendidos.
No livro, relatava atitudes tão singelas quanto revolucionárias aos que quisessem entender: por que não vendeu a empresa em partes, pela proposta mais lucrativa, e sim para quem entendeu a filosofia da casa; ou por que achou melhor fazer e receber as próprias ligações telefônicas, sem intermédio de uma secretária para isso.
“Nunca se roubou tão pouco”, escreveu . “Os percentuais caíram”.
“É ingênuo quem acha que poderia ter acontecido com qualquer presidente. Com bandalheiras vastamente maiores, nunca a Polícia Federal teria tido autonomia para prender corruptos cujos tentáculos levam ao próprio governo.”
Para ler a íntegra do artigo de Semler: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/11/1551226-ricardo-semler-nunca-se-roubou-tao-pouco.shtml
Categoria: Geral
-
"Nunca se roubou tão pouco"
-
A brincadeira do impeachment e os desvios de Aécio
LUIS NASSIF
Há que se ter um mínimo de responsabilidade e parar com essa brincadeira de impeachment. O que está em jogo não é o governo A ou B, mas a normalidade democrática e a necessidade de interromper esse terceiro turno para superar o momento econômico atual.
É irresponsável a exploração do senador Aécio Neves em relação à proposta do governo federal de flexibilizar as metas fiscais.
A política fiscal, no governo Dilma Rousseff, de fato, foi de uma irresponsabilidade à toda prova. Tudo o que Dilma pedia era aceito acriticamente pelo Secretário do Tesouro Arno Agustin, ainda que forçando a mão nas contas, para o pedido poder caber na ficção criada.
Tem que haver formas institucionais de impedir a repetição dessas aberrações.
***
Pretender transformar essas barbeiragens em crime de responsabilidade, para levantar a tese do impeachment de Dilma – como pretende o senador Aécio Neves – é uma ação ao mesmo tempo irresponsável e hipócrita
Em 2012 o estado de Minas foi obrigado a assinar com o Tribunal de Contas do Estado (TCE) um Termo de Ajustamento de Gestão por infração muito pior do que o não cumprimento da meta fiscal: o inadimplemento dos gastos mínimos em saúde e educação. As metas fiscais estão na Lei de Responsabilidade Fiscal. Os limites legais de gastos em saúde e educação estão na LRF e na Constituição Federal.
E Minas não cumpriu.
O TAG previu um escalonamento gradual para o reenquadramento de Minas nas despesas mínimas obrigatórias – por saber não ser possível cavalos de pau em política fiscal. O limite mínimo de 12% na saúde e 25% na educação só seriam alcançados em 2014.
Não pode ter ato pior do que descumprir, e reconhecer mediante confissão, percentuais constitucionais e orçamentários definidos em lei complementar. Seria hipótese de crime de responsabilidade evidente.
***
Pior, houve influência política no trabalho do Tribunal de Contas do Estado. Acatou a tese do déficit – proposta pela procuradora do TCE -, mas não impôs nenhuma medida compensatória.
Como explica um especialista, quem ajusta conduta confessa a inadimplência e recebe o benefício da presunção de boa-fé mediante o ônus de compensar o dano”. Isso não ocorreu em Minas mesmo sendo expressamente exigido no art. “25 da Lei Complementar 141/2012.
Poderia ter ocorrido até a suspensão das transferências constitucionais para o Estado, mas nada foi feito. O tema mereceria uma análise do STF (Supremo Tribunal Federal), para questionar os argumentos de Aécio contra direitos sociais.
Ninguém propôs empichar o governador Antônio Anastasia nem incluir Aécio Neves em crime de improbidade administrativa.
***
Para se passar o país a limpo, o primeiro passo é acabar com esse festival de hipocrisia.
Há um conjunto de práticas daninhas e há uma corrupção generalizada entranhada em todos os poros do sistema político, do PT ao PSDB. Assim como Lula, FHC conhece muitíssimo bem esse jogo, porque ambos praticaram em nome da governabilidade.
Pretender utilizar as denúncias em benefício político próprio, ao preço de desestabilizar a própria economia, é tão imoral quanto praticar a própria corrupção política.
Em vez de brincar de conspirador, faria melhor Aécio em assumir o desafio da construção de uma verdadeira oposição. Se Dilma insistir no estilo do primeiro governo, Aécio precisará esperar apenas quatro anos a mais para conquistar o poder.
COLUNA ECONÔMICA – 21/11/2014
email: luisnassif@ig.com.br -
Impeachment: a manchete já está escrita
Já está pronta na gaveta a manchete que vai culminar a campanha pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff: “Petrolão irrigou a campanha de Dilma em 2010”.
Variações correrão por conta do estilo de cada editor.
Será a senha para levar o movimento às ruas, em grandes mobilizações populares e fechar o cerco povo na rua, pedindo “Fora Dilma”.
Desde outubro, quando o doleiro Yousseff disse que dinheiro das propinas na Petrobrás tinha financiado campanhas em 2010, a mídia alimenta essa expectativa, num plano articulado.
Nos últimos dias, subiu o tom e foi explícita.
No domingo, 16, o Estadão pediu abertamente a cassação do mandato da presidente por “crime de responsabilidade”
No dia seguinte, o colunista Merval Pereira, do jornal O Globo, pelo qual se pautam a Rede Globo e suas afilhadas, repeliu a acusação de que são golpistas os que querem o impeachment.
Bateu na tecla do “crime de responsabilidade” e, com absoluta desenvoltura traçou um roteiro completo para levar Dilma ao impasse, que não seria um golpe, mas “uma reação da sociedade aos desmandos…”(leia a íntegra abaixo)
No mesmo dia, a Zero Hora, em Porto Alegre mostrou-se alinhada, com um candente editorial: ”Chega corrupção, chega de impunidade”.
Diz que a crise da Petrobrás representa uma “prova de fogo” para as instituições democráticas Condena “o descaso reiterado de autoridades, que permitiram os desmandos por tantos anos, a começar pela presidência da República”.
“Esse tipo de comportamento tolerante, característico também da gestão anterior, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ajuda a explicar a resistência da corrupção”.
E conclui, num tom que lembra os editoriais do Correio da Manhã,na véspera do golpe contra Goulart: “Basta de tolerância e conivênia com os reiterados saques ao patrimõnio publico”.
Nesta quarta-feira, em editoriais novamente alinhados, ambos esclarecem que não se cogita de quebra da normalidade democrática, rechaçando o golpismo militar. “O que o país precisa é de um golpe dedecência”, diz a ZH.
Dado o sinal, a tropa de colunistas, sempre atentos ao balanço do balde, avança nos calcanhares do governo. Tudo o que puder desgastar, vale, não importa se é verdade ou é boato.
Não se minimize o escândalo da Petrobrás, talvez o maior que o país já viveu. Mas o comportamento da mídia não é de quem quer tudo claro e os culpados punidos, apenas..
Ao pré-julgar, ao desqualificar as ações do governo, ao deduzir envolvimentos que ainda precisam ser provados, ao manipular manchetes – comporta-se como quem vê na crise um instrumento para se livrar “do governo Dilma”.
Um governo reeleito pelo povo, mas que ela, mídia, não aceita, por uma única razão: é o governo promete regulamentar os artigos na constituição que estabelecem regras para as empresas de comunicação.
Coisa que nenhum tentou de 1988 até agora.
LEIA OS TEXTOS MENCIONADOS
BRASIL 24/7
16 DE NOVEMBRO DE 2014 ÀS 05:54
247 – A imprensa conservadora brasileira começa a fazer jus ao apelido que ganhou nos últimos anos, o de PIG, Partido da Imprensa Golpista.
Neste domingo, o jornal Estado de S. Paulo, da família Mesquita, prega abertamente a cassação da presidente Dilma Rousseff, no editorial “Crime de responsabilidade”, cujo título já é autoexplicativo.
Eis um trecho:
“Somente alguém extremamente ingênuo, coisa que Lula definitivamente não é, poderia ignorar de boa fé o que se passava sob suas barbas. Já Dilma Rousseff de tudo participou, como ministra de Minas e Energia e da Casa Civil e, depois, como presidente da República.
Devem, todos os envolvidos no escândalo, pagar pelo que fizeram – ou não fizeram.”
A mensagem é clara: a família Mesquita aderiu ao golpe e irá trabalhar pela queda de uma presidente reeleita há menos de um mês.
Recentemente, um dos herdeiros do grupo conservador, Fernão Lara Mesquita, foi às ruas com um cartaz onde se lia: “Foda-se a Venezuela”.
Para os Mesquita, o Brasil também seria “bolivariano”.
Ontem, em nota, o senador Aécio Neves sugeriu, nas entrelinhas, que o PSDB irá trabalhar pelo impeachment da presidente Dilma (aqui).
O GLOBO
MERVAL PEREIRA, edição de 18/11/2014
SEM GOLPISMO
“As manifestações a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff, sejam nas ruas, sejam de políticos oposicionistas ou de meios de comunicação, podem ser precipitadas, inconvenientes politicamente, mas nunca golpistas, como defensores do governo as rotulam na expectativa de reduzir o seu ímpeto. Nada tem a ver, pois, com pedidos de intervenção militar, esses sim vindos de uma minoria golpista.
A razão da demanda existe pelo menos em tese, seria a indicação, feita pelo doleiro Alberto Yousseff, de que a campanha de 2010 foi financiada por dinheiro do petrolão.
E ainda está para ser aprovada a prestação de contas da campanha deste ano, que até segunda ordem será analisada no TSE pelo ministro Gilmar Mendes.
Ou ainda um crime de responsabilidade por não ter a presidente impedido o uso da Petrobras para financiamentos de sua base política, ou ter compactuado com esse esquema, durante o período em que foi a principal responsável pela área de energia.
No mensalão, quando o publicitário Duda Mendonça confessou que havia recebido pagamento no exterior, num paraíso fiscal, pelo trabalho de campanha de 2002, abriu-se a possibilidade concreta de impeachment do então presidente Lula, que não foi adiante por uma decisão política da oposição.
E quem diz que não há golpismo em usar a Constituição para destituir um presidente da República é o ex-presidente Lula, que aparece em um vídeo que se espalha pela internet defendendo essa tese em um programa de televisão após o impeachment de Collor, liderado pelo PT na ocasião. Disse Lula: “(…) foi uma coisa importante o povo brasileiro, pela primeira vez na América Latina dar a demonstração de que é possível o mesmo povo que elege um político destituir esse político. Eu peço a Deus que nunca mais o povo brasileiro esqueça essa lição”.
As democracias mais sólidas do planeta preveem a possibilidade de impeachment do presidente da República, e um exemplo disso é os Estados Unidos, onde nos anos recentes dois presidentes foram alvos de uma ação dessas pelo Congresso. Um, o ex-presidente Bill Clinton, envolvido em um escândalo sexual na Casa Branca, escapou da punição no Congresso, e outro, Richard Nixon, acabou renunciado diante da certeza de que seria impedido pelo Congresso.
No Brasil, o presidente da República reeleito pode ser impedido por fatos ocorridos no mandato anterior, pois o artigo 15, da lei 1.079, de 10 de abril de 1950, que “define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento”, diz que a “denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo”.
De acordo com o parágrafo primeiro e seus incisos, do artigo 86 da Constituição Federal, “O Presidente ficará suspenso de suas funções: I – nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal; II – nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal”.
Pelo mesmo motivo, o ex-presidente Lula não pode ser acusado de crime de responsabilidade por atos cometidos nos oito anos de sua gestão à frente da Presidência. Caso venha a ser acusado de algum crime, será julgado na Justiça de primeira instância, sem foro privilegiado.
Julgado procedente o pedido de impedimento pelo Senado do presidente da República (artigo 52, § único, da Constituição da República), assumirá o Vice- Presidente da República, em caráter definitivo, nos termos do artigo 79, caput, da Constituição Federal.
No caso da presidente Dilma, no entanto, se a acusação for o financiamento da campanha eleitoral por dinheiro ilegal provindo do petrolão, também o vice Michel Temer estará impedido, pois é a chapa que será impugnada, e nesse caso, de acordo com o artigo 81 caput, da Constituição Federal, “far-se-á eleição, noventa dias depois de aberta última vaga”.
Seria um caso diferente do que aconteceu com o ex-presidente Fernando Collor, pois naquela ocasião apenas ele foi acusado dos desvios de dinheiro, enquanto seu vice Itamar Franco pôde assumir a presidência, pois não foi envolvido nas acusações.
Caso, porém, a acusação contra a presidente for por crime de responsabilidade pela sua atuação no caso da Petrobras, apenas ela será impedida, podendo assumir o vice-presidente Michel Temer.
***
um golpe paraguaio
O processo de impeachment exige aprovação de 2/3 do COngresso. Já a rejeição das contas impede a diplomação. A decisão fica com o Judiciário. Este é o golpe paraguaio.
Luiz Nassif
Já entrou em operação o golpe sem impeachment, articulado pelo Ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Antonio Dias Toffoli em conluio com seu colega Gilmar Mendes. O desfecho será daqui a algumas semanas.
As etapas do golpe são as seguintes:
1. Na quinta-feira passada, dia 13, encerrou o mandato do Ministro Henrique Neves no TSE. Os ministros podem ser reconduzidos uma vez ao cargo. Presidente do TSE, Toffoli encaminhou uma lista tríplice à presidente Dilma Rousseff. Toffoli esperava que Neves fosse reconduzido ao cargo (http://tinyurl.com/pxpzg5y).
2. Dilma estava fora do país e a recondução não foi automática. Descontente com a não nomeação, 14 horas depois do vencimento do mandato de Neves, Toffoli redistribuiu seus processos. Dentre milhares de processos, os dois principais – referentes às contas de campanha de Dilma – foram distribuídos para Gilmar Mendes. Foi o primeiro cheiro de golpe. Entre 7 juízes do TSE, a probabilidade dos dois principais processos de Neves caírem com Gilmar é de 2 para 100. Há todos os sinais de um arranjo montado por Toffoli.
3. O Ministério Público Eleitoral, através do Procurador Eugênio Aragão, pronunciou-se contrário à redistribuição. Aragão invocou o artigo 16, parágrafo 8o do Regimento Interno do TSE, que determina que, em caso de vacância do Ministro efetivo, o encaminhamento dos processos será para o Ministro substituto da mesma classe. O prazo final para a prestação de contas será em 25 de novembro, havendo tempo para a indicação do substituto – que poderá ser o próprio Neves. Logo, “carece a decisão ora impugnada do requisito de urgência”.
4. Gilmar alegou que já se passavam trinta dias do final do mandato de Neves. Na verdade, Toffoli redistribuiu os processos apenas 14 horas depois de vencer o mandato.
5. A reação de Gilmar foi determinar que sua assessoria examine as contas do TSE e informe as diligências já requeridas nas ações de prestação de contas. Tudo isso para dificultar o pedido de redistribuição feito por Aragão.
Com o poder de investigar as contas, Gilmar poderá se aferrar a qualquer detalhe para impugná-las. Impugnando-as, não haverá diplomação de Dilma no dia 18 de dezembro.
O golpe final – já planejado – consistirá em trabalhar um curioso conceito de Caixa 1. Gilmar alegará que algum financiamento oficial de campanha, isto é Caixa 1, tem alguma relação com os recursos denunciados pela Operação Lava Jato. Aproveitará o enorme alarido em torno da Operação para consumar o golpe.
Toffoli foi indicado para o cargo pelo ex-presidente Lula. Até o episódio atual, arriscava-se a passar para a história como um dos mais despreparados Ministros do STF.
Com a operação em curso, arrisca a entrar para a história de maneira mais depreciativa ainda. A história o colocará em uma galeria ao lado de notórios similares, como o Cabo Anselmo e Joaquim Silvério dos Reis.
Ontem, em jantar em homenagem ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski, o ex-governador paulista Cláudio Lembo se dizia espantado com um discurso de Toffoli, durante o dia, no qual fizera elogios ao golpe de 64.
Se houver alguma ilegalidade na prestação de contas, que se cumpra a lei. A questão é que a operação armada por Toffoli e Gilmar está eivada de ilicitudes: é golpe.
Se não houver uma reação firme das cabeças legalistas do país, o golpe se consumará nas próximas semanas.
CHEGA DE CORRUPÇÃO, CHEGA DE IMPUNIDADE
Zero Hora, editorial da edição de 18/11
Já não há mais dúvidas de que o escândalo da Petrobras é um dos maiores, senão o maior, da história do país _ e compromete inquestionavelmente dezenas de dirigentes e executivos de empreiteiras, servidores e diretores da estatal, políticos de diversos partidos e governantes no desvio de recursos bilionários.
O que já se pode antecipar, enquanto avançam as operações da Polícia Federal, é que será um teste de fogo para as instituições democráticas do país.
Aos brasileiros – estarrecidos diante dos desdobramentos do que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chamou de “rastilho de pólvora” das delações premiadas -, resta torcer para essa operação marcar de fato o fim da impunidade.
Mas é importante ficar atento também ao descaso reiterado de autoridades, que permitiram os desmandos por tantos anos, a começar pela presidência da República. Esse tipo de comportamento tolerante, característico também da gestão anterior, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ajuda a explicar a resistência da corrupção.
Diante da inevitável indignação popular provocada pelo caso, não basta a presidente Dilma Rousseff alegar que a investigação vai mudar o país para sempre, pelo fato de se estender também aos corruptores. A presidente da República está devendo à nação uma prestação de contas mais clara e mais convincente sobre os desmandos na estatal. Acima de tudo, deve resposta a uma pergunta que os brasileiros preocupados com seu país e com o futuro de sua maior empresa não têm como evitar: por que o Planalto não fiscalizou seus subordinados a tempo de evitar os danos continuados?
“Não há uma cidade, um Estado no Brasil, sem obra superfaturada”
Para promotor especialista em carteis, algumas empresas atuam como a máfia
DO EL PAIS, DE MADRID
Mudam os esquemas, mas os protagonistas continuam os mesmos. Ano após ano, grandes empresas – em especial, construtoras – são apontadas como pivôs de escândalos suspeitos de desviar uma fortuna dos cofres públicos no Brasil. O mais atual, que atinge a empresa estatal mais importante do país, a Petrobras, revelado pelaOperação Lava Jato, da Polícia Federal (PF), pode ter causado um rombo de até 10 bilhões de reais. Para o promotor de Justiça de São Paulo Marcelo Batlouni Mendroni, especialista em investigar crimes financeiros e cartéis, somente uma ampla reforma na legislação diminuirá a ocorrência de casos de corrupção que, na avaliação dele, é endêmica.
“Não há uma prefeitura, um Estado no Brasil, sem contratos superfaturados de obras, de prestação de serviços”, disse o promotor, doutor pela Universidad Complutense de Madrid, na Espanha, com pós doutorado na Università di Bologna, na Itália. Em entrevista ao EL PAÍS, na sede do Gedec, órgão do Ministério Público paulista criado em 2008 para investigar delitos de ordem econômica, Mendroni comparou as empresas envolvidas em escândalos dessa natureza à máfia italiana.
· Dilma busca as saídas do labirinto de seu Governo
· “Não deixarei pedra sobre pedra”, por JUAN ARIAS
O promotor é autor da denúncia, de 2012, um grupo de empreiteiras suspeitas de fraudar uma concorrência pública para obras do metrô paulista. Embora sejam casos completamente distintos – um afeta o Governo Federal, comandado pelo PT, e o outro o Governo paulista, a cargo do PSDB –, chama a atenção a repetição dos “personagens” da esfera privada. Dentre as denunciadas pela Promotoria de São Paulo há dois anos, seis estão agora sob a mira da Operação Lava Jato da PF: as construtoras Camargo Corrêa, Mendes Júnior, OAS, Queiroz Galvão, Iesa e Odebrecht – todas negam irregularidades. Na semana passada, 36 investigados,entre eles executivos de oito construtoras, foram detidos pela Polícia Federal.
Pergunta. Por que observamos a repetição de algumas empresas em casos diferentes de corrupção?
Resposta. Por causado volume de dinheiro envolvido nos contratos com grandes estatais. O Brasil parece que, indiretamente, vai copiando o modelo das atividades mafiosas. Se você for olhar a Cosa Nostra italiana, de um tempo pra cá, ela parou de praticar crimes violentos e entendeu que conseguia ter muito mais sucesso conseguindo ganhar grandes contratos com o poder público, através da infiltração nas obras públicas, da corrupção de agentes públicos e intimidação de concorrentes. Então eles ganham grandes contratos com o Estado, superfaturam essas obras, que foi exatamente o que parece que aconteceu na Operação Lava Jato e que acontece no Brasil… Aliás, verdade seja dita: é o que acontece em praticamente todos os municípios, todos os Estados e na União. É uma corrupção absolutamente disseminada em todo o país. Eu acho que não existe uma prefeitura nesse país, um Estado, que não tenha esquema de superfaturamento de contratos de obras e serviços públicos. E a União, evidentemente, é onde estão os maiores contratos.
Na corrupção a gente também não sabe quem vem antes, a empresa ou o político
Essas organizações empresariais também são organizações criminosas. Isso tem que ficar bem claro. Hoje em dia, sabemos de empresas perfeitamente lícitas que atuam como um modelo de organização criminosa empresarial, que praticam muitos crimes, além de corrupção, a formação de cartel, os crimes tributários, e outros por aí… ou seja, elas praticam atividades lícitas, mas se valem da estrutura empresarial pra praticar crimes.
P. O senhor foi enfático em mencionar que não tem conhecimento profundo sobre a Operação Lava Jato. Mas, pela sua experiência, é possível que o esquema que vimos na Petrobras hoje tenha começado há muitos anos, até em Governos passados?
R. Sem conhecer o caso, sem opinar especificamente sobre esse caso, acho que esse é um esquema que já vem de muitos, muitos anos. (…) A minha opinião é de que sim. Que isso não é um esquema novo. Não só a Petrobras, mas se fossem investigar a fundo as grandes estatais, todos esses contratos, a gente ia ver aí que muitos outros bilhões de reais foram levados através de superfaturamento de obras, de hidrelétricas, estradas, hidrovias, enfim… Não tenho a menor dúvida. Na verdade, eu diria que, com 99,99% de chance, sim que esse esquema existe há pelo menos aí uns 30 anos, desde que o Brasil saiu da ditadura militar… Meu palpite é que desde os anos 80 a gente tenha aí esses esquemas atravessando os Governos indistintamente. Talvez tenha sido mais forte em um Governo que em outro, dependendo muito da ação de Tribunais de Contas, do Ministério Público, da Polícia Federal, enfim, dos termos de investigação e repressão à criminalidade. Mas que existe há bastante tempo eu acho que sim.
Meu palpite é que desde os anos 80 a gente tenha aí esses esquemas atravessando os Governos indistintamente
P. Muitos classificaram como “histórica” as prisões de empresários na última semana – e recentemente de políticos envolvidos no escândalo do Mensalão. Qual a sua opinião?
R. Eu acho que o Brasil vive uma fase em que deveria rever toda a legislação, a questão da Justiça, pra de alguma forma passar o país a limpo… É lógico que a corrupção não vai ser extirpada, mas que fosse dado um golpe violento contra a corrupção, para que as pessoas tenham mais medo. Porque do jeito que ela existe hoje, eu não tenho nenhum medo de errar em dizer que a corrupção é absolutamente endêmica no Brasil. E não acho que só isso vai ser um divisor de águas. Se não se houver essa reforma processual penal e penal, eu acho que nós vamos viver esse filme mais algumas vezes, achando que dessa vez vai… E isso pode ter um efeito rebote muito perigoso, no sentido de que as pessoas fiquem incrédulas, desestimuladas…
P. O Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, disse à Folha de S.Paulo que algumas das empresas investigadas disseram ter sido alvo de concussão, ou seja, da exigência de dinheiro para fechar contratos. O que o senhor acha desse discurso?
R. É balela. (…) Assim como a gente não sabe quem veio antes, o ovo ou a galinha, na corrupção a gente também não sabe quem vem antes, a empresa ou o agente político. Porque é interessante para os dois. Na verdade, as duas partes se procuram…
P. Qual a dificuldade que o Brasil tem de perseguir e punir os agentes corruptores?
R. A corrupção é talvez um dos casos mais difíceis de se apurar. Porque é um crime silencioso que interessa às duas partes. Na corrupção, existem dois autores ao mesmo tempo e a vítima é o Estado, que é quieto, silencioso, não fala… A investigação da corrupção é dividida basicamente de duas formas cruciais: a primeira é quando as partes não sabem que estão sendo investigadas, que é quando temos um maior grau de possibilidade de eficiência, na medida em que nós temos instrumentos como escutas telefônicas, escutas ambientais, buscas e apreensões… Depois que os casos chegam à imprensa, corremos contra o tempo.
P. O senhor disse que, depois que a investigação vaza, fica mais difícil reunir um conjunto de provas ‘diretas’. Isso não facilita, de certa forma, o trabalho da defesa? Porque grandes empresas têm grandes advogados…
Hoje é muito vantajoso o cara praticar o crime, conseguir roubar milhões, e depois sair, resgatar o dinheiro que eles têm aplicado em outra parte do planeta, e viver uma vida nababesca
R. Se você tem poucas provas diretas, mas tem um conjunto vasto de provas indiretas, é possível que se dê maior valoração para as provas indiretas. Mas o poder Judiciário no Brasil, de uma forma geral, ainda é um pouco resistente em analisar as provas indiretas, coisas que na Europa e nos Estados Unidos, já foi absolutamente superado. Na Itália, por exemplo, os juízes aplicam nos casos de grandes máfias a questão da ‘máxima de experiência’, que é uma coisa muito nova no Brasil. (…) Mesmo a colaboração premiada, que é usada há muito tempo na Europa e nos Estados Unidos, só agora começa a ser usada no Brasil, principalmente depois da Lei de Organização Criminosa, mas ela já estava na nossa legislação. No Direito as coisas são um pouco mais lentas que nas outras ciências, porque envolvem uma adaptação da sociedade. Nós passamos por um período, e ainda passamos de certa forma, de muita resistência de advogados dizendo a colaboração premiada é imoral, mas isso é um instrumento absolutamente lícito. Então é um processo lento.
P. O que pode ser feito para diminuir a ocorrência de crimes financeiros no Brasil?
R. Em uma investigação de uma organização criminosa você precisa de uma engrenagem de três rodas: legislação adequada, estrutura e treinamento. Pra começar, já passou do tempo de os Estados terem varas criminais especializadas em crimes econômicos. Os casos de lavagem de dinheiro e de formação de cartéis, especificamente, e aqueles correlatos, são extremamente complexos. Quando você manda um caso desses pra um juiz comum, que na maioria das vezes não está habituado com esse tipo de processo, ele vai ter que começar tudo do zero.
O outro ponto é que a punição seja efetiva pra esse tipo de crime. Eu costumo dizer o seguinte: esses empresários, esses políticos e agentes públicos que praticam a corrupção não precisam de ressocialização, como os criminosos comuns. Eles precisam de uma pena com caráter exclusivamente punitivo. Não é permitindo que ele deixe a prisão depois de cumprir um sexto da pena… Por que hoje é muito vantajoso o cara praticar o crime, conseguir roubar milhões, e depois sair, resgatar o dinheiro que eles têm aplicado em outra parte do planeta, e viver uma vida nababesca. Se você tem um nível baixo de criminalidade em alguns países da Europa é porque as pessoas têm medo da mão pesada da Justiça, não porque elas nascem naturalmente boas…
P. Qual a sua opinião sobre o financiamento privado das campanhas eleitorais?
R. Eu sou um pouco radical nessa questão. Eu, por exemplo, me questiono por que tem que ter o financiamento público ou privado de campanha… Por que as grandes empresas querem financiar as campanhas? Porque elas têm interesses. Não é de graça. Não é ideológico. Elas bancam candidaturas indistintamente, de vários partidos, sem nenhuma ideologia política, dos concorrentes diretos. Isso é o óbvio ululante. Só não enxerga quem não quer ver. É um ciclo vicioso: eles financiam as campanhas e depois cobram de alguma forma, seja para facilitar os contratos com essas empresas, que são superfaturados e é, muitas vezes, a forma como recebem o dinheiro investido de volta.
-
Petrobras: "Cartel operava há pelo menos 15 anos"
Deveria ser, pelo menos, uma manchete interna, mas só o Estadão registrou em uma coluna ao pé da página, na edição de terça-feira,18.
Trata-se de uma afirmação dos promotores envolvidos na Operação Lava Jato.
Em requerimento ao Juiz Sérgio Moro, eles escreveram que o esquema criminoso liderado pelas maiores empreiteiras do País operava “há pelo menos 15 anos”.
Eis o trecho, reproduzido no Estadão:
“Muito embora não seja possível dimensionar o valor total do dano é possível afirmar que o esquema criminoso atuava há pelo menos 15 anos na Petrobras, pelo que a medida proposta (sequestro patrimonial das empresas) ora intentada não se mostra excessiva”, sustentou o Ministério Público Federal, ao requerer o bloqueio dos ativos das construtoras – pedido este que foi negado pelo juiz Sergio Moro.
(Moro permitiu apenas sequestro de bens dos executivos).
Até agora, não houve retificação ou desmentido, apenas o silêncio.
Porque o silêncio? Porque se foi assim, as falcatruas remontam a 1999, no mínimo, e ai vai chegar à Petrobras presidida por Henri Philippe Reichstul e o Brasil presidido por Fernando Henrique Cardoso.
Aí, já não interessa à mídia, cujo alvo é o governo Dilma.
-
Primeira ação que apontou corruptores começou com Dilma
Está há 18 anos em primeira instância, protegido pelo segredo de Justiça, o processo em que, pela primeira vez, foram indiciadas também grandes empresas, como corruptoras num caso de fraude contra o patrimônio público.
O processo número 01196058232 tramita na 2a Vara da Fazenda, em Porto Alegre, e já acumula 32 volumes principais e mais de 80 anexos.
É uma Ação Civil Pública resultante de uma CPI, a maior já feita na Assembleia do Rio Grande do Sul, concluída em junho de 1996.
A CPI apontou 29 pessoas físicas e 12 empresas por fraude em dois contratos da Companha Estadual de Energia Elétrica, com prejuízos que chegam aos R$ 800 milhões em valores atualizados.
Na origem de todo o processo está um inquérito administrativo determinado pela então secretária estadual de Minas e Energia, Dilma Rousseff
O inquérito reabriu um assunto que já estava engavetado na companhia e comprovou os desvios.
Remetido para a Contadoria Geral do Estado, o inquérito desencadeou a CPI cujo relatório remetido ao Ministério Público deu origem ao processo judicial, hoje a caminho da prescrição.
Foram apontadas na CPI as empresas: ABB Ltda, Allstom Elec. S.A, Camargo Corrêa, Brown Boveri, Coemsa S.A., Construtora Sultepa, entre outras. -
Mudanças climáticas: a caminho do colapso
Está circulando na noosfera (podem chamar de Internet) um assustador documento-síntese assinado pelo cientista Antonio Nobre, o brasileiro que tem assento no IPCC, o painel da ONU sobre as mudanças climáticas.
Depois de ler mais de 200 trabalhos científicos, o cara não deixa barato: estamos perdendo a guerra da sustentabilidade ambiental e o mundo continua caminhando irresponsavelmente para o colapso da civilização.
Numa entrevista à repórter Daniela Chiaratti, do Valor Econômico, Nobre falou especialmente do papel da Amazônia para o equilíbrio climático.
A seguir, o JA apresenta uma síntese do que pensa e anda falando o apocalíptico doutor Nobre.
“Nos últimos 40 anos, a área devastada na Amazônia equivale a três Estados de São Paulo, duas Alemanhas ou dois Japões.
A velocidade do desmatamento na Amazônia, em 40 anos, é de um trator com uma lâmina de três metros se deslocando a 726 km/hora – uma espécie de trator do fim do mundo.
Foram destruídas 42 bilhões de árvores, cerca de 3 milhões de árvores por dia, 2.000 árvores por minuto.
Os cientistas que estudam a Amazônia estão preocupados com a percepção de que a floresta é potente e realmente condiciona o clima. É uma usina de serviços ambientais.
Ela está sendo desmatada e o clima vai mudar. No arco do desmatamento, por exemplo, o clima já mudou. Lá está aumentando a duração da estação seca e diminuindo a duração e volume de chuva.
Agricultores do Mato Grosso tiveram que adiar o plantio da soja porque a chuva não chegou. Ano após ano, na região leste e sul da Amazônia, isso está ocorrendo.
A seca de 2005 foi a mais forte em cem anos. Cinco anos depois teve a de 2010, mais forte que a de 2005. O efeito externo sobre a Amazônia já é realidade. O sistema está ficando em desarranjo.
A mudança climática já chegou. Os céticos do clima conseguiram uma vitória acachapante, fizeram com que governos não acreditassem mais no aquecimento global.
As emissões aumentaram muito e o sistema climático planetário está entrando em falência como previsto, só que mais rápido. Mais de duas dúzias de projetos grandes estão sendo feitos na Amazônia, com dezenas de cientistas.

Agronegócio
A discussão sobre a Amazônia é fragmentada. “Temos que desenvolver o agronegócio. Mas e a floresta? Ah, floresta não é assunto meu”.
Cada um está envolvido naquilo que faz e a fragmentação tem sido mortal para os interesses da humanidade. Quando fiz a síntese destes estudos, eu me assombrei com a gravidade da situação.
Pegue o noticiário: o que está acontecendo na Califórnia, na América Central, em partes da Colômbia? É mundial.
Alguém pode dizer – é mundial, então não tem nada a ver com a Amazônia.
É aí que está a incompreensão em relação à mudança climática: tem tudo a ver com o que temos feito no planeta, principalmente a destruição de florestas.
A consequência não é só em relação ao CO2 que sai, mas a destruição de floresta destrói o sistema de condicionamento climático local. E isso, com as flutuações planetárias da mudança do clima, faz com que não tenhamos nenhuma almofada.
A floresta é um seguro, um sistema de proteção, uma poupança. Se aparece uma coisa imprevista e você tem algum dinheiro guardado, você se vira.
É o que está acontecendo agora, não sentimos antes os efeitos da destruição de 500 anos da Mata Atlântica, porque tínhamos a “costa quente” da Amazônia.
A sombra úmida da floresta amazônica não permitia que sentíssemos os efeitos da destruição das florestas locais.
Eu queria mostrar o que significa aquela floresta. Até eucalipto tem mais valor que floresta nativa. Se olharmos no microscópio, a floresta é a hiper abundância de seres vivos e qualquer ser vivo supera toda a tecnologia humana somada.
O tapete tecnológico da Amazônia é essa assembleia fantástica de seres vivos que operam no nível de átomos e moléculas, regulando o fluxo de substâncias e de energia e controlando o clima.
5 segredos
A Amazônia tem cinco segredos.
O primeiro é o transporte de umidade continente adentro. O oceano é a fonte primordial de toda a água. Evapora, o sal fica no oceano, o vento empurra o vapor que sobe e entra nos continentes. Na América do Sul, entra 3.000 km na direção dos Andes com umidade total. São os gêiseres da floresta.
É uma metáfora. Uma árvore grande da Amazônia, com dez metros de raio de copa, coloca no ar mais de mil litros de água em um dia, pela transpiração. Fizemos a conta para a bacia Amazônica toda, que tem 5,5 milhões de km2: saem desses gêiseres de madeira 20 bilhões de toneladas de água diárias.
O rio Amazonas, o maior rio da Terra, que joga 20% de toda a água doce nos oceanos, despeja 17 bilhões de toneladas de água por dia. Esse fluxo de vapor que sai das árvores da floresta é maior que o Amazonas. Esse ar que vai progredindo para dentro do continente vai recebendo o fluxo de vapor da transpiração das árvores e se mantém úmido, e, portanto, com capacidade de fazer chover. Essa é uma característica das florestas
O segundo segredo: chove muito na Amazônia e o ar é muito limpo, como nos oceanos, onde chove pouco. Como, se as atmosferas são muito semelhantes? A resposta veio do estudo de aromas e odores das árvores. Esses odores vão para a atmosfera e quando têm radiação solar e vapor de água, reagem com o oxigênio e precipitam uma poeira finíssima, que atrai o vapor de água. É um nucleador de nuvens. Quando chove, lava a poeira, mas tem mais gás e o sistema se mantém.
O terceiro segredo: a floresta é um ar-condicionado e produz um rio amazônico de vapor. Essa formação maciça de nuvens abaixa a pressão da região e puxa o ar que está sobre os oceanos para dentro da floresta. É um cabo de guerra, uma bomba biótica de umidade, uma correia transportadora. E na Amazônia, as árvores são antigas e têm raízes que buscam água a mais de 20 metros de profundidade, no lençol freático. A floresta está ligada a um oceano de água doce embaixo dela. Quando cai a chuva, a água se infiltra e alimenta esses aquíferos.
O quarto segredo: estamos em um quadrilátero da sorte – uma região que vai de Cuiabá a Buenos Aires no Sul, São Paulo aos Andes e produz 70% do PIB da América do Sul. Se olharmos o mapa múndi, na mesma latitude estão o deserto do Atacama, o Kalahari, o deserto da Namíbia e o da Austrália. Mas aqui, não, essa região era para ser um deserto. E no entanto não é, é irrigada, tem umidade. De onde vem a chuva? A Amazônia exporta umidade. Durante vários meses do ano chega por aqui, através de “rios aéreos”, o vapor que é a fonte da chuva desse quadrilátero.
O quinto segredo: onde tem floresta não tem furacão nem tornado. A floresta tem um papel de regularização do clima, atenua os excessos, não deixa que se organizem esses eventos destrutivos. É um seguro.
O desmatamento leva ao clima inóspito, arrebenta com o sistema de condicionamento climático da floresta. É o mesmo que ter uma bomba que manda água para um prédio, mas eu a destruo, aí não tem mais água na minha torneira. É o que estamos fazendo.
Ao desmatar, destruímos os mecanismos que produzem esses benefícios e ficamos expostos à violência geofísica. O clima inóspito é uma realidade, não é mais previsão. Tinha que ter parado com o desmatamento há dez anos. E parar de desmatar é fundamental, mas não resolve mais. Temos que conter os danos ao máximo. Parar de desmatar é para ontem.
A única reação adequada neste momento é fazer um esforço de guerra. A evidência científica diz que a única chance de recuperarmos o estrago que fizemos é zerar o desmatamento. Mas isso será insuficiente, temos que replantar florestas, refazer ecossistemas. É a nossa grande oportunidade. É muito sério, muito grave. Estamos indo direto para o matadouro.
Agora temos que nos confrontar com o desmatamento acumulado. Não adianta mais dizer “vamos reduzir a taxa de desmatamento anual.” Temos que fazer frente ao passivo, é ele que determina o clima.
O clima não dá a mínima para a soja, para o clima importa a árvore. Soja tem raiz de pouca profundidade, não tem dossel, tem raiz curta, não é capaz de bombear água. Os sistemas agrícolas são extremamente dependentes da floresta. Se não chegar chuva ali, a plantação morre.
Os serviços ambientais prestados pela floresta estão sendo dilapidados. É a mesma coisa que arrebentar turbinas na usina de Itaipu – aí não tem mais eletricidade. É de clima que estamos falando, da umidade que vem da Amazônia. Estamos perdendo um serviço que era gratuito, trazia conforto, fornecia água doce e estabilidade climática.
Estamos fazendo a transposição do São Francisco para resolver o problema de uma área onde não chove há três anos. Mas e se não tiver água em outros lugares? E se ocorrer de a gente destruir e desmatar de tal forma que a região que produz 70% do PIB cumpra o seu destino geográfico e vire deserto? Vamos buscar água no aquífero?
No norte de Pequim, os poços estão já a dois quilômetros de profundidade. Não tem uso indefinido de uma água fóssil, ela tem que ter algum tipo de recarga. É um estoque, como petróleo. Usa e acaba. Só tem um lugar que não acaba, o oceano, mas é salgado.
Temos nas florestas nosso maior aliado. São uma tecnologia natural que está ao nosso alcance. Não proponho tirar as plantações de soja ou a criação de gado para plantar floresta, mas fazer o uso inteligente da paisagem, recompor as Áreas de Proteção Permanente (APPs) e replantar florestas em grande escala. Não só na Amazônia.
São Paulo tem que erradicar totalmente a tolerância com relação a desmatamento. Um esforço de guerra no replantio de florestas não é replantar eucalipto. Monocultura de eucalipto não tem este papel em relação a ciclo hidrológico, tem que se replantar floresta e acabar com o fogo.
Reconstruindo as florestas
Para não competir com a agricultura, se poderia começar reconstruindo ecossistemas em áreas degradadas. Nos morros pelados onde tem capim, nos vales, em áreas íngremes. Em vales onde só tem capim, tem que plantar árvores da Mata Atlântica.
O esforço de guerra para replantar tem que juntar toda a sociedade. Precisamos reconstruir as florestas, da melhor e mais rápida forma possível.
O desmatamento legal não pode nem entrar em cogitação. Uma lei que não levou em consideração a ciência e prejudica a sociedade, que tira água das torneiras, precisa ser mudada.
A realidade é que estamos indo para o caos. Já temos carros-pipa na zona metropolitana de São Paulo. Estamos perdendo bilhões de dólares em valores que foram destruídos. Quem é o responsável por isso?
Um dia, quando a sociedade se der conta, a Justiça vai receber acusações. Imagine se as grandes áreas urbanas, que ficarem em penúria hídrica, responsabilizarem os grandes lordes do agronegócio pelo desmatamento da Amazônia. Espero que não se chegue a essa situação.
Temos uma floresta de mais de 50 milhões de anos. Nesse período é improvável que não tenham acontecido cataclismas, glaciação e aquecimento, e no entanto a Amazônia e a Mata Atlântica ficaram aí. Quando a floresta está intacta, tem capacidade de suportar. É a mesma capacidade do fígado do alcoólatra que, mesmo tomando vários porres, não acontece nada se está intacto. Mas o desmatamento faz com que a capacidade de resiliência que tínhamos, com a floresta, fique perdida.
Aí vem uma flutuação forte ligada à mudança climática global e nós ficamos muito expostos, como é o caso do “paquiderme atmosférico” que sentou no Sudeste. Se tivesse floresta aqui, não aconteceria, porque a floresta resfria a superfície e evapora quantidade de água que ajuda a formar chuva.
O replantio florestal não garante o reequilibrio, porque existem as mudanças climáticas globais, mas reconstruir ecossistemas é a melhor opção que temos.
Quem sabe a gente desenvolva outra agricultura, mais harmônica, de serviços agroecossistêmicos. Não tem nenhuma razão para o antagonismo entre agricultura e conservação ambiental. Ao contrário.
A agricultura consciente, que soubesse o que a comunidade científica sabe, estaria na rua, com cartazes, exigindo do governo proteção das florestas. E, por iniciativa própria, replantaria a floresta nas suas propriedades”.
-
Quinze municípios recebem 14,1 milhões para investimentos
Quinze municípios gaúchos assinaram contratos com o Badesul, nesta quarta-feira (12/11), no Palácio Piratini, através do Programa Badesul Cidades, totalizando o montante de R$ 14.143.000,00.
Os recursos serão aplicados em infraestrutura urbana, aquisição de máquinas e equipamentos, construção e reforma de centro administrativo e ampliação de escola e creche.
Os contratos foram assinados pelos representantes dos municípios e pelo diretor financeiro do Badesul, Aldino Dick.
A secretária de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (SDPI) em exercício, Mariela Klee, representou o Governador Tarso Genro no evento. “Através destes repasses, colocamos em prática a descentralização do desenvolvimento, beneficiando regiões menos favorecidas, com reflexo direto na qualidade de vida da população”, afirma Mariela Klee.
Programa Badesul Cidades já contratou mais de R$ 281 Milhões com 243 Municípios do RS.
Integrado às políticas públicas do Governo do Estado, o Programa Badesul Cidades já contratou, desde 2011, com 243 municípios gaúchos, totalizando R$ 281 milhões, para investimentos em infraestrutura urbana, construção de pavilhões industriais, ginásios, máquinas e equipamentos rodoviários, centros administrativos, escolas e revitalização de praças.
A relevância do Programa do Badesul Cidades no apoio aos municípios gaúchos é destacada pelo diretor financeiro, Aldino Dick: “O Badesul Cidades é um programa de investimentos direcionado para os municípios gaúchos – financiado integralmente com recursos do capital do Banco. Estes recursos são provenientes da capitalização feita pelo Governo do Estado para viabilizar uma política de apoio aos municípios do Estado”.
O Badesul Cidades já contratou R$ 95,5 milhões para 83 municípios gaúchos, somente em 2014.
Municípios contemplados com financiamento:
Tucunduva
Máquinas e equipamentos
Provias/BNDES
689.000,00
Augusto Pestana
Máquinas e equipamentos
PIMES
700.000,00
Barão do Cotegipe
Infraestrutura Urbana
PIMES
700.000,00
Barra Do Quarai
Máquinas e equipamentos.
PIMES
350.000,00
Brochier
Infraestrutura Urbana
PIMES
700.000,00
Canguçu
Infraestrutura urbana
PIMES
3.000.000,00
Doutor Mauricio Cardoso
Infraestr. e ref. Centro adm.
PIMES
665.000,00
Entre-Ijuís
Infraestrutura Urbana
PIMES
700.000,00
Guaporé
Infraestrutura Urbana
PIMES
2.000.000,00
Igrejinha
Infraestrutura Urbana
PIMES
1.223.000,00
Iraí
Infraestrutura Urbana
PIMES
700.000,00
Itapuca
Centro administrativo
PIMES
700.000,00
Não Me Toque
Infraestrutura urbana
PIMES
1.000.000,00
Nova Esperança do Sul
Ampliação escola e creche
PIMES
318.000,00
Pontão
Infraestrutura Urbana
PIMES
698.000,00
Total: R$ 14.143.000,00
(Com assessoria de imprensa) -
Itamar Franco: em defesa da memória
O Brasil decidiu seu destino pelos próximos 4 anos.
Diante desse quadro, não posso calar o que não quer calar dentro de mim.
Refiro-me aos ataques, feitos em todos os debates eleitorais, à memória de um grande estadista: Itamar Franco.
Ninguém esteve mais presente nesses debates quanto o ex-presidente.
Primeiro, foi-lhe cassada acintosamente a paternidade do Plano Real, oriunda de sua competência e certeza da necessidade de uma medida para conter e disciplinar o processo inflacionário galopante da época.
Esta, porém, repetida inúmeras vezes como obra de tucanos – repudiados por Itamar Franco -, não é a mais grave referência ao ex-presidente.
A mais cruel e insidiosa referência ao ex-governador de Minas Gerais, Estado que governou de 1998 até 2002, está nas afirmações do senador Aécio Neves, dando ênfase às condições do nosso Estado: “recebi uma Minas quebrada e desorganizada”.
Tal afirmação foi feita ainda quando Itamar estava entre nós. Ele reagiu, denunciando firmemente a fraude contábil nascida dentro do governo de seu sucessor.
Conhecedor dos números, Itamar exigiu o reparo, obrigando o governo Aécio a reconhecer o erro.
Na verdade, não havia Estado quebrado. Itamar entregou um Estado muito melhor que o que recebeu de Eduardo Azeredo. Mas era necessário repetir a mentira do tão propalado choque de gestão.
O silêncio tucano permaneceu enquanto Itamar estava vivo, quando ele, e apenas ele, saiu em defesa de seu próprio governo, resistindo bravamente, às investidas do governo FHC contra Minas.
Itamar desfez a privatização da Cemig, estancando aquele processo doloso de furto de uma das maiores e mais significativas estatais de Minas e do país.
Vale lembrar que teve nessa empreitada o apoio decisivo do embaixador José Aparecido de Oliveira, então membro do Conselho de Administração da Cemig.
No confronto político e econômico em defesa de Minas e do Brasil, Itamar teve que enfrentar, ainda no governo FHC, até mesmo a figura de um presidente do Banco Central que aconselhava e orientava investidores estrangeiros a não investir em Minas, violando, criminosamente, o pacto federativo, além de ignorar o compromisso com o desenvolvimento do país.
De todas as paternidades negadas a Itamar Franco, a mais triste e que mais enxovalha a alma política mineira é a paternidade política do sr. Aécio Neves, feito governador de Minas, pelas mãos do próprio Itamar. É, igualmente, a prova cabal de que a ingratidão é a arma política dos espertos e daqueles que reescrevem suas biografias ao prazer de suas ambições, como FHC.
A ingratidão em um país, segundo descreveu Jonhathan Swiff, em suas “Viagens de Gulliver”, é tida como o mais grave delito que pode ser praticado pelo cidadão.
Considerava que a ingratidão não era um crime do indivíduo contra outro indivíduo, mas de um indivíduo contra todos. Saiba dr. Itamar que a sua retidão e o seu exemplo estão fazendo falta à vida pública de nosso país.
JOSÉ FERNANDO APARECIDO DE OLIVEIRA – ex-deputado Federal. -
Projeto sobre hospitalidade no pampa disputa prêmio
Três cooperativas gaúchas — Certel, Sicredi e Cotrijal — estão entre as 21 finalistas ao 9º Prêmio Cooperativa do Ano, que será entregue no dia 25 de novembro na sede da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), em Brasília.
Inscreveram-se mais de 250 projetos de 185 cooperativas. A Certel, cooperativa de energia elétrica, apresentou seu projeto (Certelnet) de extensão da internet aos associados.
A Cotrijal (cooperativa agrícola) disputa com seu projeto de assistência técnica.
E o Sicredi, cooperativa de crédito que opera como banco, tenta entrar na história com seu projeto de marketing sobre a hospitalidade do Pampa Gaúcho. -
Queda de braço entre o PT e o governo Dilma
* Glauco Peres da Silva
O segundo mandato da presidente Dilma começou com claros atritos entre ela e seu partido. Na semana passada, a presidente correu mostrar-se em posição distinta do partido em relação às declarações do partido sobre alguns temas, dentre eles, regulação da mídia. Por outro lado, Lula tem buscado participar mais, ao menos explicitamente, deste segundo mandato. Ainda o PT, através de seu presidente, declarou que a relação entre o partido com a presidente precisa se ajustar melhor. Atualmente parece termos, de um lado, Dilma; de outro, Lula e o PT. Dilma teve uma reeleição bastante apertada, o que a coloca em posição mais frágil nas diferentes mesas de negociação que participará; dentre elas, está a relação com o seu partido e o ex-presidente Lula. Por outro lado, o partido acredita que tenha tido uma participação fundamental durante a campanha e quer atuar mais diretamente neste governo.
Esta disputa está atualmente concentrada na nomeação do Ministro da Fazenda. De um lado, Lula seguido pelo PT sugere nomes que acalmariam as pressões geradas pelos maus resultados econômicos dos últimos anos, flanco aberto e fartamente explorado pela oposição durante a campanha de 2014. Henrique Meirelles e Nelson Barbosa são nomes que, nesta ordem, parecem ser a preferência do ex-presidente Lula. Esta antecipação do debate público em torno dos novos ministros acontece, a meu ver, em razão do desempenho econômico do país ter sido bastante abaixo do esperado durante todo o governo Dilma, o que foi altamente contestado pela oposição. Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, embora já tenha sido cotado, a esta altura parece já não fazer mais parte dos prováveis nomes a ocupar a pasta.
Porém, a interferência neste ministério não passa apenas pela escolha de um nome-chave para as decisões econômicas do governo que se inicia. Ela cria ruídos por outras razões. Cogita-se que a presidente Dilma tinha em mente outros nomes para o ministério, como Aloízio Mercadante, atualmente na Casa Civil. Sua preferência por um nome mais afim ao partido não seria apenas por uma questão ideológica ou de afinidade em outros âmbitos, mas também em razão dela ser formada em Economia. Um nome com quem tivesse alguma proximidade daria a ela espaço para manter o que parece ter feito com Mantega ao longo de todo o seu governo anterior: intervir diretamente na condução econômica. Adotando um estilo bastante centralizador, supõe-se que Dilma sinta-se ainda mais à vontade para interferir em um ministério afinado à sua formação.
Ou seja, a escolha deste ministro coloca em choque as duas forças presentes neste governo que já iniciam o mandato dividindo-se. Por um lado, a vontade e estilo da presidente Dilma e de outro, as pressões do PT e do ex-presidente Lula para um governo menos criticado e com uma condução econômica mais próxima da observada durante os dois primeiros governos petistas. A presidente tem a caneta. Mas não se sabe se tem a autonomia que apresentou no primeiro governo e que pode acreditar ainda possuir, mesmo depois de uma reeleição tão apertada.
*Glauco Peres da Silva: professor de ciência política da Universidade de São Paulo e autor do blog Entrementes
