Marcha global pelo clima mobiliza ativistas em diversas cidades brasileiras

Em defesa do meio ambiente, jovens e ativistas de diversas partes do mundo se unem na greve mundial pelo clima, nesta sexta-feira, 20, para cobrar medidas emergenciais contra o aquecimento global. As manifestações ocorrem em mais de 150 países, entre eles Estados Unidos, Alemanha, Grécia, Japão, Austrália e Brasil. Em São Paulo, centenas de manifestantes também se reúnem, em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), na Avenida Paulista, desde o fim da tarde desta sexta.
Puxando a marcha, na avenida, um cordão com dezenas de crianças segurando cartazes e faixas com desenhos que remetiam ao meio ambiente. Em alguns deles, era possível ler frases como “estão destruindo o planeta” e “luta como uma criança”. No Rio de Janeiro, jovens manifestantes também saíram às ruas em protesto pela causa ambiental.

Fridays for Future

As mobilizações são inspiradas no movimento Fridays for Future (Sextas-feiras pelo Futuro), greve estudantil em favor da defesa do meio ambiente criada no ano passado por Greta Thunberg, uma jovem ativista sueca de 16 anos.

Em 2018, ela passou a protestar em frente ao parlamento de seu país contra as mudanças climáticas. E suas ações vêm conquistando o apoio de jovens de diversos países europeus.

Pelo Twitter, Greta acompanha as mobilizações mundiais realizadas nesta sexta-feira. Os eventos estão previstos para ocorrer até o dia 27.

Nas redes sociais, outra jovem ativista também chama a atenção para a urgência de ações em prol do meio ambiente. Katie Eder, de 19 anos, é diretora executiva da Future Coalition (Coligação Futura), organização norte-americana que promove mudanças sociais e ambientais.

Trecho morto do Tietê aumenta 33% e está com 163 quilômetros

Camila Boehm, da Agência Brasil

O trecho morto do Tietê, maior rio do estado de São Paulo, alcançou a marca de 163 quilômetros (km) neste ano, o que representa um aumento de 33,6% em relação ao ano passado (122 km), deixando a água imprópria para uso nessa extensão.
A menor mancha de poluição já registrada na série histórica do levantamento ocorreu em 2014, quando a extensão do trecho considerado morto foi de 71 km.
Os dados foram compilados pela Fundação SOS Mata Atlântica no relatório Observando o Tietê 2019 – O Retrato da Qualidade da Água e a Evolução dos Indicadores de Impacto do Projeto Tietê”, divulgado nesta quinta-feira (19).
Às vésperas do Dia do Tietê, comemorado a 22 de setembro, o estudo mostra que a condição ambiental do rio está imprópria para o uso, com a qualidade de água ruim ou péssima nesses 163 quilômetros, que correspondem a 28,3% da extensão monitorada pela entidade.
O monitoramento ocorre em 576 quilômetros do rio, desde o município de Salesópolis, na sua nascente, até a jusante da eclusa de Barra Bonita, na Hidrovia Tietê-Paraná.
O maior rio paulista corta o estado por 1.100 quilômetros, desde sua nascente até a foz no Rio Paraná, no município de Itapura.
“Rios e águas contaminadas são reflexo da ausência de instrumentos eficazes de planejamento, gestão e governança”, disse a especialista em água Malu Ribeiro, da Fundação SOS Mata Atlântica.
Alguns fatores que levaram ao aumento da mancha de poluição são: urbanização intensa, falta de saneamento ambiental, perda de cobertura florestal, insuficiência de áreas protegidas e diferentes fontes de poluição, agravados pela falta de chuva.
A mancha de poluição de 163 quilômetros estendeu-se entre os municípios de Mogi das Cruzes e Cabreúva e em mais um pequeno trecho de 8 quilômetros, no município de Salto.
Dois dos piores trechos, onde a água é considerada péssima, localizam-se nas proximidades do Cebolão – no encontro com o Rio Pinheiro – e junto à barragem da Penha, onde o Tietê recebe os efluentes do município de Guarulhos, ambos na capital paulista.
Saneamento
Alguns municípios da região  têm baixíssimos índices de coleta e tratamento de esgoto, como Guarulhos, que tem apenas 6% de esgoto tratado.
Mogi [das Cruzes] também não faz parte do projeto de despoluição do Tietê e está na cabeceira do rio”, disse a especialista. Para Malu, é necessário integrar os municípios não atendidos pela Sabesp ao projeto de despoluição do Tietê.
“Outro motivo é o aumento no desmatamento e nas áreas de ocupação irregular na bacia – são mais de 3 milhões de pessoas invisíveis ao saneamento que moram em áreas irregulares, ou seja, não tem serviço de coleta de esgoto, nem sequer de lixo”, acrescentou.
Além desses, a especialista ressaltou os prejuízos da poluição por agrotóxicos, fertilizantes, produtos farmacológicos, microplásticos, óleos e graxas à base de combustível fóssil.
“Por mais que se invista em coleta e tratamento de esgoto, nossa legislação vem sendo cada vez mais permissiva no uso, por exemplo, de venenos na agricultura e de produtos farmacológicos. Isso tudo vai para o rio, o sistema de tratamento de esgoto não trata e, com o menor volume de chuvas, há uma concentração de poluentes invisíveis. Tudo isso se concentra, o rio perde a capacidade de diluir os poluentes, e perdemos qualidade”.
Fuligem das queimadas na Amazônia
No período monitorado, as chuvas nas bacias do Alto e Médio Tietê registraram volumes 20% inferiores à média dos últimos 23 anos, segundo dados da fundação.
De acordo com Malu, as últimas chuvas da região da Grande São Paulo, vieram carregadas de fuligem de queimada da região amazônica, além de material particulado de diesel.
“Isso mostra que a relação da qualidade da água não está mais ligada só ao esgoto que o rio recebe, seja industrial ou doméstico, está ligada a todos esses fatores que ocorrem na bacia”, afirmou.
Os dados foram medidos em 99 pontos de coleta monitorados mensalmente entre setembro de 2018 a agosto de 2019.
Os pontos analisados estão distribuídos em 73 rios das bacias hidrográficas do Alto Tietê, Médio Tietê, Sorocaba e Piracicaba, Capivari e Jundiaí, que abrangem 102 municípios das regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e Sorocaba.
O estudo registrou uma quebra na mancha de poluição da região metropolitana na altura do município de Itaquaquecetuba, em uma extensão de 10 quilômetros, onde está localizado o Parque Ecológico do Tietê.
“Essas várzeas protegidas pelo parque ecológico fizeram uma função de regulador climático e mantiveram a condição de qualidade da água regular. Essa é uma saída: manter áreas protegidas, evitar ocupação das áreas de preservação permanente, para que a natureza ajude na diluição dos poluentes que o rio recebe. Só tratar esgoto não vai resolver”, destacou Malu.
Nos outros 413 quilômetros monitorados (71,7%), o rio apresentou qualidade de água regular e boa, condição que permite o uso da água para abastecimento público, irrigação para produção de alimentos, pesca, atividades de lazer, turismo, navegação e geração de energia.
A SOS Mata Atlântica ressaltou o impacto positivo dos investimentos em coleta e tratamento de esgotos nos municípios da bacia.
Segundo a fundação, o impacto positivo ficou evidente com a redução do trecho com condição de água considerada péssima – que neste ciclo de monitoramento ficou em 18 quilômetros, entre o Cebolão, no encontro dos rios Tietê e Pinheiros, até o município de Barueri.
No ciclo de monitoramento anterior, o trecho considerado péssimo chegou a 60 quilômetros.
“Apesar da falta de chuvas, a mancha não aumentou para o interior do estado. Então, isso mostra que os investimentos em saneamento, mesmo que lentos, trazem resultados mais perenes. A gente precisa desses resultados em todos os rios urbanos. Se não tivéssemos bilhões investidos em coleta e tratamento de esgoto, estaríamos com tudo péssimo”, disse.
Projeto Tietê
Desde 1992, a Sabesp desenvolve o Projeto Tietê, com foco na ampliação da coleta e do tratamento de esgoto na região metropolitana de São Paulo.
Segundo a companhia de saneamento, até hoje, mais 10 milhões de pessoas foram beneficiadas pela coleta e tratamento de esgoto na região e houve investimentos de quase US$ 3 bilhões em obras do projeto.
Atualmente, a Sabesp faz a coleta e o tratamento de esgoto em 32 municípios da Grande São Paulo, de um total de 39.
A expectativa da Sabesp é chegar em 2025 com 92% de coleta, considerando os municípios atendidos, e 91% de tratamento do total de esgoto coletado, de modo a ampliar os serviços de tratamento de esgotos para mais 7 milhões de pessoas.
A Sabesp confirmou a extensão da mancha em 163 quilômetros atualmente, mas disse que o trabalho de coleta e tratamento do esgoto vem contribuindo para a redução da mancha de poluição do rio, que apresenta tendência de queda histórica desde a década de 1990. “De uma maneira geral, a diminuição da mancha de poluição do Tietê é de cerca de 75% no período.
Em 1992 a mancha se estendia por 530 quilômetros do rio, de Mogi das Cruzes a Barra Bonita; hoje está em 163 quilômetros”, diz nota da companhia.
No entanto, a Sabesp destaca que o processo de despoluição de rios vai muito além do saneamento e inclui fatores como coleta de lixo e varrição de ruas, limpeza de galerias de águas pluviais, controle do uso e ocupação do solo, o controle de poluição industrial e a conscientização ambiental da sociedade. “Isso porque o esgoto de ocupações irregulares, o lixo jogado nas ruas, as fezes de animais e demais resíduos também chegam aos rios, formando o que se chama de poluição difusa”, acrescenta a Sabesp, o que também interfere na qualidade da água.

Violência e impunidade na Amazônia: 300 mortes e apenas 14 julgamentos

O agricultor Gilson Temponi era presidente da Associação dos Agricultores Nova Aliança, em Placas, estado do Pará, onde cerca de 600 famílias vivem de forma precária.
Por mais de 10 anos lutou pela regularização das terras junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Em 2018, Temponi denunciou ao Ministério Público, em âmbito estadual e federal, a exploração ilegal de madeira na Amazônia e as ameaças de morte que recebia. Nada adiantou. Em dezembro, dois homens bateram à sua porta e o executaram a tiros.
Gilson é um entre centenas de casos de assassinatos de lideranças rurais que atuam contra grileiros e a extração ilegal de madeira na região.
Em uma década, mais de 300 desses defensores da floresta foram mortos, de acordo com os dados compilados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e utilizados pela Procuradoria-Geral da República.
Em relatório divulgado nesta terça-feira (17), a Human Rights Watch (HRW) detalha o contexto em que ocorrem os crimes.
“A organização internacional examinou 28 assassinatos, a maioria a partir de 2015 – além de quatro tentativas de assassinato e mais de 40 casos de ameaças de morte –, nos quais havia evidências críveis de que os responsáveis estavam envolvidos no desmatamento ilegal e viam suas vítimas como obstáculos a suas atividades criminosas.
Algumas vítimas eram agentes públicos. A maioria eram indígenas ou outros moradores que denunciaram a exploração ilegal de madeira às autoridades”, informa a HRW.
As investigações realizadas pela organização revelam, ainda, que os responsáveis pela violência raramente são levados à Justiça. “Dos mais de 300 assassinatos registrados pela CPT, apenas 14 foram julgados; dos 28 assassinatos examinados pela Human Rights Watch, apenas dois foram julgados; e dos mais de 40 casos de ameaças, nenhum foi a julgamento.”
A impunidade, avalia a HRW, deve-se em grande parte ao fato de a polícia não conduzir investigações adequadas. “A polícia local reconhece as deficiências e afirma que isso acontece porque as mortes ocorrem em áreas remotas. No entanto, a Human Rights Watch documentou graves omissões, como a falta de autópsias, nas investigações de mortes ocorridas nas cidades, não muito longe das delegacias de polícia”, explica.
“As investigações sobre as ameaças de morte não são diferentes. Em alguns locais a polícia inclusive se recusa a registrar as denúncias de ameaças, segundo a pesquisa. Em pelo menos 19 dos 28 assassinatos examinados, ameaças contra as vítimas ou suas comunidades antecederam os ataques. Se as autoridades tivessem conduzido investigações sobre as ameaças, os assassinatos poderiam ter sido evitados”, critica.

Bolsonaro e as mortes

O relatório revela que antes mesmo de completar um ano no cargo, o presidente Jair Bolsonaro cometeu estragos consideráveis nas políticas de proteção ao meio ambiente e aos defensores da Amazônia.
Retrocedeu na aplicação das leis de proteção ambiental, enfraqueceu as agências federais responsáveis, além de atacar organizações e indivíduos que trabalham para preservar a floresta.
O desmatamento quase dobrou em comparação com o mesmo período de 2018, segundo dados oficiais preliminares. Em agosto de 2019, queimadas ligadas ao desmatamento na Amazônia ocorreram em uma escala não vista desde 2010.
“Os povos indígenas e outros moradores há muito tempo desempenham um papel central nos esforços para combater o desmatamento, alertando as autoridades sobre as atividades madeireiras ilegais que de outra forma poderiam passar despercebidas. A redução da fiscalização ambiental incentiva a extração ilegal de madeira e resulta em maior pressão sobre a população local para que assuma um papel mais ativo na defesa das florestas. Ao fazer isso, ela se expõe ao risco de represálias”, esclarece a HRW.
O programa de proteção de defensores dos direitos humanos e do meio ambiente, criado em 2004, oferece pouca proteção real, de acordo com as autoridades entrevistadas pela HRW.
O relatório informa que a extração ilegal de madeira na Amazônia é impulsionada por redes criminosas com capacidade logística de coordenar a extração, o processamento e a venda da madeira em larga escala. Para isso, empregam homens armados e uso da violência.
Chamados de “máfias do ipê” – em referência à árvore cuja madeira está entre as mais valiosas procuradas pelos madeireiros –, têm por objetivo final derrubar a floresta totalmente para dar espaço ao gado e ao cultivo. A Floresta Amazônica alcança nove países, 60% dela ocupa território brasileiro, mas o Brasil responde por 90% de seu desmatamento.
Por isso, alerta a HRW, o que está em jogo vai muito além da Amazônia e até das fronteiras do nosso país. “Sendo a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia desempenha um papel vital na mitigação das mudanças climáticas, absorvendo e armazenando dióxido de carbono. Quando cortada ou queimada, a floresta não apenas deixa de cumprir essa função, mas também libera na atmosfera o dióxido de carbono que havia armazenado anteriormente. Sessenta por cento da Amazônia está localizada no Brasil e o desmatamento é responsável por quase metade das emissões de gases de efeito estufa do país”, denuncia o estudo.

Impunidade que mata

O relatório da HRW destaca que os povos indígenas e moradores locais desempenham papel importante nos esforços de conter o desmatamento, alertando autoridades sobre as atividades madeireiras ilegais que, sem a participação desses “guardiões da floresta”, poderiam não ser detectadas.
“De fato, vários estudos baseados em dados de satélite mostram que o desmatamento é muito menor em terras indígenas”, informa o estudo. “Essa contribuição se tornou ainda mais vital nos últimos anos, devido à capacidade reduzida das agências ambientais brasileiras de alocarem fiscais para monitorar o que está acontecendo no terreno.”
Ao assumir esse papel primordial em defesa da floresta e de todo o planeta, portanto, tanto indígenas como moradores locais ficam à mercê da represália dos madeireiros.
• Eusebio Ka’apor, liderança do povo Ka’apor que ajudou a organizar as patrulhas indígenas “guardiões da floresta”, para impedir que madeireiros entrassem na terra Alto Turiaçu, no estado do Maranhão, foi baleado nas costas, assassinado por dois agressores em uma moto, em 2015. Logo após sua morte, seis dos sete integrantes do conselho de gestão dos Ka’apor, que coordena as patrulhas, receberam ameaças de morte por madeireiros.
• No assentamento Terra Nossa, no estado do Pará, um morador foi morto e outro desapareceu em 2018 depois de dizerem para algumas pessoas que denunciariam às autoridades a exploração ilegal de madeira. O irmão de uma das vítimas, que estava investigando o crime por conta própria, também foi morto, assim como o líder de um sindicato de pequenos agricultores, depois de, da mesma forma, ter demonstrado intenção de denunciar a extração ilegal de madeira. Os moradores do assentamento relataram que os quatro homens foram mortos por uma milícia armada que trabalha para uma rede criminosa de fazendeiros que, segundo um relatório do Incra, estão envolvidos em extração ilegal de madeira.
• Osvalinda Pereira e seu marido, Daniel Pereira, pequenos agricultores, recebem ameaças de morte há quase uma década, desde que começaram a denunciar extração ilegal de madeira por uma rede criminosa no estado do Pará. Em 2018, eles encontraram em seu quintal duas covas, com cruzes de madeira afixadas no topo.
• Dilma Ferreira Silva, ativista do meio ambiente no estado do Pará, juntamente com cinco outras pessoas, foi morta em 2019 sob encomenda, de acordo com a polícia, de um fazendeiro envolvido em extração ilegal de madeira que temia que Dilma e os outros denunciassem suas operações criminosas.
• Em 2017, Naraymi Suruí, líder do povo Suruí Paiter, foi atacado por homens armados duas semanas depois de confrontar madeireiros dentro da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia. Duas pessoas que ele reconheceu como madeireiros atiraram cinco vezes contra ele e sua esposa, sem atingi-los.
• João Luiz de Maria Pereira, sargento da Polícia Militar do Pará, foi assassinado em 2016 por um suposto madeireiro enquanto participava de uma operação de combate à exploração da Floresta Nacional Jamanxim.
• O defensor ambiental Raimundo Santos foi assassinado em 2015 depois de denunciar a exploração ilegal de madeira na Reserva Biológica de Gurupi, no Maranhão. Um fazendeiro supostamente envolvido com a extração ilegal confessou à polícia que contratou um policial reformado que, por sua vez, contratou dois policiais da ativa para cometer o assassinato.
• Por mais de uma década, homens armados ameaçaram e atacaram pequenos agricultores em Taquaruçu do Norte, estado do Mato Grosso, na tentativa de expulsá-los de suas terras para que os madeireiros pudessem explorar ainda mais a área. Em 2007, mataram três agricultores e torturaram pelo menos outros dez, segundo a Comissão Pastoral da Terra. Ataques e ameaças foram relatados à polícia, pelos moradores, em 2010, 2012 e 2014, mas as investigações nunca avançaram. Em abril de 2017, homens armados mataram nove moradores de Taquaruçu do Norte, o que ficou conhecido como o massacre de Colniza.
Com informações da Human Rights Watch

Governo e garimpeiros defendem mineração na Amazônia

Representantes do Ministério de Minas e Energia (MME) e do setor de mineração defenderam nesta terça-feira (17), em audiência pública na Câmara dos Deputados, a viabilidade de atividades mineradoras sustentáveis na região Amazônica. Segundo eles, o esforço para regularizar os garimpos aumentaria a arrecadação de tributos e aprimoraria o controle do Estado sobre as unidades de conservação.
Secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do MME, Alexandre Vidigal entende que o atual modelo de mineração é mais sustentável do que a construção civil e a indústria. “Não há mineração hoje sem o compromisso com as próximas gerações, tanto do ponto de vista social quanto ambiental“, disse Vidigal, mesmo reconhecendo o impacto socioambiental do rompimento de barragens rejeitos de mineração em Brumadinho e Mariana, ambas em Minas Gerais.
Segundo o MME, o setor de mineração representa 4% do Produto Interno Bruto PIB e 22% da pauta de exportações do País (US$ 11 bilhões entre janeiro e julho).
Vidigal ressaltou ainda o compromisso assumido pelo governo para destravar mais de 200 mil processos envolvendo pesquisa e lavra de minérios que aguardam a análise da Agência Nacional de Mineração (AMN). “Não queremos mais tratar a mineração apenas como patrimônio e sim transformá-la em riqueza”, completou.
Garimpos ilegais
Representando o Departamento de Desenvolvimento Sustentável do MME, Gabriel Maldonado citou exemplos de compatibilidade entre exploração de minérios e preservação ambiental e destacou o potencial arrecadatório da regularização de garimpos ilegais no País, que, segundo ele, faturam entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões por ano.
Para Maldonado, o Estado deve ser educador e não apenas repressor. “Precisamos levar tecnologias, ensinar técnicas de manejo adequado e de recuperação de áreas.”
Durante o debate proposto pelos deputados Silas Câmara (REPUBLICANOS-AM) e Joaquim Passarinho (PSD-PA) na Comissão de Minas e Energia (CME), entidades ligadas ao garimpo criticaram a criação de diversas unidades de conservação colocando tradicionais áreas de garimpo na ilegalidade.
“Enquanto o País não reconhecer a existência do garimpeiro como ele é, esse País não vai chegar a lugar nenhum. Nós não conseguimos sair de uma simples mendicância mineral para chegar ao topo como minerador. Essa lei não nos permite”, observou o fundador da União Nacional dos Garimpeiros e Mineradores do Brasil, José Machado.
O deputado Joaquim Passarinho comentou os benefícios de transformar os garimpos em empresas legalizadas. “Quando você legaliza, você conhece o CNPJ de quem está explorando lá. Se houver excessos, a polícia pode bater lá para cobrar”, disse. “Nós precisamos é dar dignidade para quem está ali produzindo”, disse.
Sugestões
Por sua vez, Silas Câmara, que preside a Comissão de Minas e Energia, disse que as sugestões do debate poderão ser usadas para embasar propostas legislativas de regularização da lavra e da comercialização de produtos do garimpo. “Se for apresentada de forma coletiva pela comissão, quem sabe nós possamos juntos produzir uma legislação moderna, atual, e tenhamos essa matéria brevemente em condição de ser aprovada”, observou.
A atividade garimpeira é regulada pela Lei 7805/89 por meio de permissão de lavra garimpeira (PLG), que é concedida pela ANM – sucessora do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) –, após prévio licenciamento ambiental.
Lentidão
Representante da Associação Brasileira de Metais Preciosos (ABRAMP), Valmor Bremm disse na audiência que mineração e garimpo não são crimes. “Minerador não é criminoso. O que não podemos é esperar 10 anos para termos a concessão de lavra”, disse ele, ao comentar a demora na análise de processos pela ANM.
Garimpeiro no Pará há 40 anos, Marcelo Duarte disse que o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) permite a existência de garimpos legalizados dentro de unidades de conservação, mas, segundo ele, isso é impossível na prática.
“A área de preservação permanente do Triunfo do Xingu, que é a estadual do Pará, tem 13 anos e 1 milhão e 700 mil hectares. Ela não tem plano de uso, não tem zoneamento, nenhuma documentação. Como é que eu vou tirar licença mineral?”, questionou Duarte, destacando a existência de garimpos na região desde a década de 70.
(Com informações da Agência Câmara)

Human Rights Watch denuncia violência na Amazônia 'encorajada' pelo governo

Há uma década denunciando a extração ilegal de madeira, Osvalinda e Daniel Pereira encontraram duas covas com duas cruzes de madeira no quintal de casa, no assentamento Areia, próximo a Trairão (oeste do Pará), em junho do ano passado.
Depois de denunciar ao Ministério Público o desmatamento ilegal, Gilson Temponi, presidente de uma associação de agricultores em Placas (PA), foi executado a tiros em casa em dezembro de 2018.
Em março deste ano, criminosos mataram a ativista Dilma Ferreira da Silva no assentamento Salvador Allende, na região de Tucuruí (PA), e mais cinco pessoas, segundo a polícia a mando de um fazendeiro envolvido em extração ilegal que temia ser denunciado.
Casos como esses de ameaças e assassinatos estão compilados no relatório “Máfias do Ipê: como a violência e a impunidade impulsionam o desmatamento na Amazônia brasileira”, da organização não-governamental Human Rights Watch.
O documento detalha a ação de redes criminosas na região da Amazônia, seu custo ambiental e humano e como ações do governo Bolsonaro prejudicam essa situação.
Segundo a organização Human Rights Watch, a extração ilegal de madeira na Amazônia é “impulsionada por redes criminosas que têm a capacidade logística de coordenar a extração, o processamento e a venda de madeira em larga escala, enquanto empregam homens armados para proteger seus interesses.”
Os agentes ambientais da região apelidaram esses grupos de “máfias dos ipês”, em referência à extração de madeira dessas árvores tidas como “diamante da Amazônia”.
“Os criminosos responsáveis por uma grande parte da destruição da Amazônia estão usando da intimidação, ameaças, ataques e assassinatos para continuar suas atividades ilícitas. Há um nível de violência vinculado ao desmatamento, que às vezes as pessoas não percebem”, diz César Muñoz, autor do relatório e pesquisador da ONG.
Citando dados da Comissão Pastoral da Terra, ligada à Igreja Católica, a organização afirma que houve mais de 300 assassinatos na última década envolvendo conflitos pelo uso da terra e de recursos naturais. O documento detalha 28 desses assassinatos.
Um dos casos citados é o do assentamento Terra Nossa, próximo a Novo Progresso (sudoeste do Pará). Em janeiro do ano passado, um agricultor local, Romar Roglin, conhecido como “Polaquinho”, avisou a uma liderança local que relataria o desmatamento ilegal à polícia. Foi morto 20 dias depois.
Seu irmão, Ricardo Roglin, começou a investigar o assassinato por conta própria. Ele foi morto em julho daquele ano.
Pouco antes, em maio, Antonio Rodrigues dos Santos, o Bigode, que vivia no mesmo assentamento, ameaçou denunciar um fazendeiro que ocupou cerca de 800 hectares de uma reserva florestal. Ele está desaparecido desde então. Caso parecido aconteceu em outubro, ainda no Terra Nossa, com o agricultor Aluisio Sampaio, conhecido como Alenquer.
A Human Rights Watch aponta o grave problema de impunidade, que piora o clima de violência na região amazônica. Segundo a organização, das 300 mortes relatadas pela Pastoral da Terra, apenas 14 foram a julgamento.
A organização entrevistou policiais envolvidos na investigação de seis assassinatos. Em dois casos, os investigadores nem sequer foram à cena do crime. Em cinco casos, não houve autópsia do cadáver.
O relatório ainda cita a violência contra agentes públicos de fiscalização. Em julho, em Rondônia, bandidos queimaram um caminhão-tanque que levaria gasolina a helicópteros do Ibama, destruíram pontes e derrubaram árvores sobre uma estrada. O órgão federal precisou cancelar a operação. No mesmo mês, criminosos queimaram duas pontes da Transamazônia próximo ao município de Placas (PA), em retaliação contra uma operação do mesmo órgão.
A Human Rights Watch entrevistou 170 pessoas, a maior parte de comunidades indígenas e de comunidades locais que têm sofrido com ameaças, além de policiais, promotores, advogados, membros de órgãos do governo (como Ibama, ICMBio e Funai), representantes de ONGs e acadêmicos.
A pesquisa foi feita entre 2017 e julho de 2019.
A organização faz críticas contundentes ao governo Jair Bolsonaro (PSL). Embora reconheça que os episódios de violência começaram antes do atual governo, a entidade afirma que Bolsonaro “retrocedeu na aplicação das leis de proteção ambiental, enfraqueceu as agências federais responsáveis, além de atacar organizações e indivíduos que trabalham para preservar a floresta”.
“A violência rural na Amazoônia é um problema crônico, que o Brasil nunca respondeu adequadamente. Mas piorou desde janeiro, porque quando você enfraquece o ICMBio e outros órgãos de fiscalização, não só dá carta branca para os criminosos destruírem a floresta. Eles se sentem livres para atacar qualquer um que entre no caminho deles”, afirma Muñoz à Folha.
A organização faz algumas recomendações ao governo brasileiro. Segundo a Humans Right Watch, o Ministro da Justiça deveria elaborar e implementar, junto a autoridades federais e estaduais, um plano de ação para desmantelar as redes criminosas e reduzir os atos de violência e intimidação; o procurador-geral da República deveria fazer do combate à violência na Amazônia uma de suas prioridades e o Congresso Nacional deveria criar uma CPI para apurar o desmatamento ilegal e os atos de violência.
A Human Rights Watch afirma ainda que o governo Bolsonaro deveria se pronunciar de forma clara em apoio aos defensores da floresta, estabelecendo mecanismos para que as comunidades possam denunciar o desmatamento ilegal ou atos de intimidação.
(Com informações da Folha de São Paulo)

Entenda o que está em jogo com o limite de aumento da temperatura média do planeta em 1.5 º C

 
Nós ouvimos e lemos diariamente que o aquecimento global e as mudanças climáticas são o grande desafio deste século. Os noticiários, volta e meia, estampam os alertas emitidos em relatórios do grupo formado por centenas de cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), que dão o suporte aos governos de pelo menos 195 países, nas negociações nas Conferências das Partes da Convenção-Quadro sobre a Mudança do Clima (COPs).
Inúmeras vezes, somos impactados por uma mensagem, que vem sendo repetida, desde o Acordo de Paris, na COP 21, em 2015. – “Os países se comprometeram a fazer esforços para limitar o aumento da temperatura média do planeta a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais até o final do século, por meio da diminuição das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs)”. Afinal, o que estará, então, em jogo, na COP 25, em dezembro, no Chile?
Compromissos brasileiros no Acordo de Paris
Abrindo parênteses, não podemos esquecer qual é o papel do Brasil neste cenário geopolítico ambiental, não é? O governo brasileiro ratificou o Acordo de Paris, por aqui, em setembro de 2016, após a aprovação pelo Congresso. E a promulgação foi estabelecida com o Decreto nº 9073, de 2017.
Com o que nos comprometemos mesmo?
A reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005, em 2025, com uma contribuição indicativa subsequente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030. Para isso, o país se comprometeu a aumentar a participação de bioenergia sustentável na sua matriz energética para aproximadamente 18% até 2030, restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas, bem como alcançar uma participação estimada de 45% de energias renováveis na composição da matriz energética em 2030. (Fonte: Ministério do Meio Ambiente – MMA)
“O Brasil tem de cumprir seus compromissos, será cobrado pelas metas e pela situação atual de desmatamento. Na área de matriz elétrica e energética, a combinação com energia solar e eólica tem sido um bom caminho no país, que tem de ser ampliado”, analisa o Doutor em Meteorologia, especialista em Modelagem Climática José Marengo, que foi um dos revisores do relatório especial do IPCC sobre o Aquecimento Global de 1,5 °C, divulgado no final do ano passado.
“Com a estação seca agora, um dos problemas no país ocorreu com a diminuição da fiscalização em um período que historicamente tem aumento de incêndios e queimadas. Devemos lembrar que é uma situação urgente não só aqui, mas na Pan-Amazônia, que atinge a Bolívia e no norte do Paraguai. Os aerossóis originados com o fogo não têm fronteiras, que afetam o ciclo hidrológico. É um processo que tem de ser controlado”, analisa.
Segundo Marengo, é importante frisar que é necessário haver a redução do desmatamento em todo o mundo, nesta contabilidade de GEEs. Dados da Global Forest Watch apontam que de 2001 a 2018, houve um total de 361 Mha de perda de cobertura arbórea globalmente, o equivalente a uma redução de 9.0% desde 2000 e 98.7Gt de emissões de CO₂.
E que tal compreendermos o que são, de fato, os GEEs?
Primeiramente é necessário compreender que o efeito estufa é um fenômeno natural e necessário para a preservação da vida na Terra, porque tem o papel de manter o planeta aquecido e habitável ao permitir que parte da radiação solar refletida de volta para o espaço seja absorvida pela Terra.
O que acontece, desde o início do período industrial até hoje, é que os GEEs estão sendo produzidos de forma cada vez mais descontrolada, tanto pela emissão provocada por combustíveis fósseis (petróleo, carvão mineral, gás natural e derivados) para transporte e produção de energia, e decorrentes do desmatamento e do mau uso da terra (iniciativas extensivas agropecuárias, de mineração) e, inclusive, da destinação que damos aos nossos resíduos. Com isso, acarretam as mudanças climáticas e o aquecimento global. E quais são os principais gases em questão? Dióxido de Carbono (CO2), Metano (CH4), Óxido Nitroso (N20) e Hidrofluorcarbonetos (HFCs), entre outros.
O caminho para a revolução climática está calcado justamente na mudança dos padrões das matrizes energéticas. Segundo o secretário-geral da ONU António Guterres, em todo o mundo, mais da metade da nova geração de energia vem de fontes renováveis, sendo que este percentual é de 90% na Europa. Este esforço vem ao encontro dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs) estabelecidos pelos países, no âmbito da ONU, para serem cumpridos até 2030.
Os 17 propósitos principais dos ODS tratam de temas importantes, como erradicação da pobreza, energia limpa e acessível, cidades e comunidades sustentáveis e ação contra a mudança global do clima.
Quem mais emite GEEs?
– China;
– EUA;
– União Europeia;
– Índia;
Atualmente, o Brasil figura em 7º lugar.
Qual é a quantidade de GEEs atualmente no planeta?
A concentração na atmosfera do planeta estava na casa de 300 partes por milhão (ppm), no início do século XX. Já em maio deste ano estava em 415 ppm, segundo a NASA. O limite seguro à saúde, de acordo com os cientistas, é de no máximo 350 ppm. Bem, é só fazer as contas. A situação está complicada já em 2019, não é?
Ação antrópica está no centro do desafio
Cientistas brasileiros do IPCC destacam que os principais desafios que estão colocados à mesa e alternativas para revertê-los giram em torno justamente da ação antrópica, ou seja, de nós, seres humanos. Não estamos falando do outro, mas de nós mesmos e da figura institucional dos governos, dos poderes legislativos e judiciários, das empresas, das organizações não governamentais municipais e federais. O que está em xeque é o modelo de desenvolvimento que queremos e como afetará as atuais e futuras gerações.
“A atividade humana já provocou um Aquecimento Global, entre 0,82 a 1,05 graus C. No Ártico, por exemplo, em algumas estações do ano, atinge 3,5 vezes mais que 1,5 graus C”, alerta a vice-presidente do IPCC, a cientista Thelma Krug, Segundo ela, nem um centésimo de aumento pode ser desprezado. “Cada pedacinho tem um efeito. Quanto mais forem retardadas ações de mitigação (redução de danos), teremos mais dificuldades de atingir as metas do Acordo de Paris”, diz. Atualmente o que se observa é o aumento de 0,2º por década. Neste ritmo, atingir a temperatura média de 1,5º C pode ocorrer antes da metade do século.
“De 20 a 40% da população global já vivem em regiões que na última década experienciou um aquecimento de mais de 1,5º C acima do nível pré-industrial”, diz a Doutora em Ecologia Humana Patrícia do Pinho, uma das cientistas brasileiras que integrou a equipe que elaborou o relatório 1.5º C do IPCC. Ela analisa que grupos humanos que menos contribuíram para o aumento dos GEEs sofrem as maiores consequências. Assim é possível identificar que entre as regiões mais vulneráveis estão os continentes africano e sul-americano.
O contexto urbano tem cada vez mais um papel relevante nesta análise, porque a projeção é de que até 2040, 90% da população mundial estará vivendo nas cidades. Isso implica também necessidade de mudanças no estilo de vida na sociedade, que parte desde a dieta alimentar ao uso sustentável de energia, além das ações de governança.
Mitigação e adaptação são as palavras da vez
Pois é, o que vimos agora, é que o que está em questão a todo momento gira em torno de duas palavras: mitigação e adaptação, no caso daquilo que não podemos frear, como comprometimentos de eventos climáticos extremos. Estamos falando de aumento do número de ocorrências de ciclones, tornados, furacões, secas, processos de desertificação, enchentes, deslizamentos em decorrência destes eventos.
“A mitigação é um enfoque que deve ser buscado ao máximo, independentemente de podermos ou não nos adaptar aos impactos considerados irreversíveis. A adaptação, por outro lado, não se limita somente às medidas para lidar com eventos climáticos extremos: está relacionada com os impactos irreversíveis e ou não evitáveis, independentemente de serem eventos extremos (tópicos/ agudos) ou problemas ‘crônicos’ “, avalia Rubens Born, diretor interino da 350.org Brasil e América Latina.
As combinações de todos estes fatores levam a projeções maiores, que são a grande preocupação mundial na atualidade, num limiar de aumento populacional na casa de 10 bilhões de pessoas até a metade deste século: segurança alimentar, acesso à água potável, poluição do ar, degradação da terra e dos oceanos e extinção de espécies, entre outras. A lista é longa e tem a ver com toda nossa dinâmica de vida.
Refugiados climáticos
Os problemas já podem ser identificados na atualidade, e tem rostos e histórias de vida. “Podemos exemplificar o caso da Síria. Parte da crise política começou com uma seca, causando fome e falta de alimentos. O que detectamos no Brasil é principalmente no Nordeste. A seca atingindo pequenos agricultores no sertão, no semiárido. Não conseguem sobreviver lá e migram para grandes cidades. Mas as capitais já têm problemas sociais suficientes e estas questões são ampliadas nestas áreas mais carentes”, diz Marengo. Já em São Paulo e no Rio de Janeiro, ele alerta que extremos de chuva têm aumentado.
“As pessoas são deslocadas forçadas pelas mudanças climáticas. Em regiões como a Amazônia, a resposta adaptativa é muito baixa”, explica Patrícia. E alerta que as megacidades já correm o risco de exposição de pessoas a calor letal, um contingente de mais de 350 milhões de cidadãos.
Sobre a 350.org Brasil e a causa climática e indígena
A 350.org é um movimento global de pessoas que trabalham para acabar com a era dos combustíveis fósseis e construir um mundo de energias renováveis e livres, lideradas pela comunidade e acessíveis a todos. Nossas ações vêm ao encontro de medidas que visem inibir a aceleração das mudanças climáticas pela ação humana, que incluem a manutenção das florestas.
Desde o início, trabalha questões de mudanças climáticas e luta contra os fósseis junto às comunidades indígenas e outras comunidades tradicionais por meio do Programa 350 Indígenas e vem reforçando seu posicionamento em defesa das comunidades afetadas por meio da campanha Defensores do Clima.

Indigenista que defendia tribos isoladas na Amazônia foi assassinado

A Reuters informou que o indigenista Maxciel Pereira dos Santos foi assassinado na frente de seus familiares no município deTabatinga, próximo da fronteira da Amazônia brasileira com a Colômbia e o Peru.
O fato teria ocorrido domingo, segundo a Indigenistas Associados (INA), associação de servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). Santos foi assassinado com um tiro na nuca, em uma rua movimentada da cidade.
O crime seria uma represália ao papel de indigenista no combate a invasões ilegais por caçadores, madeireiros e mineradores na reserva do Vale do Javari, região que abriga a maior concentração de tribos indígenas não contactadas do mundo.
Santos atuava há mais de 12 anos junto à Funai, sendo cinco deles como chefe do Serviço de Gestão Ambiental e Territorial do Vale do Javari.
A reserva  abriga cerca de 6 mil pessoas de oito tribos indígenas e cerca de 16 tribos não contactadas.
A INA  lamentou o assassinato de Maxciel e informou que o presidente da fundação vai a Manaus acompanhar o caso e se reunirá com autoridades de segurança pública.
A Funai ressalta ainda que repassou à Polícia Federal todas as informações que podem ajudar a solucionar o crime.
“A morte de Maxciel representa uma grande perda para a Fundação, deixando todos sensibilizados”, diz a nota.
A organização indígena União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) também informou que acionou o Ministério Público Federal e a Polícia Federal.
“Queremos que as investigações sejam realizadas pela Polícia Federal e MPF, pois acreditamos que o ocorrido esteja relacionado aos trabalhos finalísticos da Funai, já que essa foi a atuação do servidor há mais de 12 anos consecutivos em nossa região”, declarou a Univaja, em nota.

Propriedades privadas na Amazônia concentram queimadas

 
As propriedades privadas responderam por 33% dos focos de calor registrados na Amazônia até agora. Em segundo lugar vieram as áreas sem destinação fundiária específica, que somam 30% dos focos de calor – 20% apenas em florestas públicas não destinadas, um forte indicativo de grilagem de terras.
Os números fazem parte de uma nova análise sobre a atual temporada de fogo na Amazônia, separada agora por categoria fundiária, feita pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), com base em dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, de 1º de janeiro a 29 de agosto de 2019.
Clique aqui para ver a nota técnica na íntegra.
Terras indígenas e unidades de conservação são as categorias com menor incidência no ano, registrando 6% e 7% dos focos, respectivamente. Essa análise de áreas protegidas exclui as áreas de proteção ambiental, ou APAs: apesar de serem categorizadas como unidades de conservação, elas apresentam um comportamento similar ao de propriedades privadas, e sozinhas responderam por 6% dos focos no período.
Os assentamentos de reforma agrária responderam por 18% dos casos; contudo, análises preliminares indicaram grande concentração de casos em poucos projetos.
O estudo reforça outra nota técnica sobre o tema lançado em agosto pelo IPAM, estabelecendo a relação entre derrubada da floresta e queimadas. “O principal gatilho desta temporada de fogo na Amazônia não é a seca, mas o pico de desmatamento”, explica a diretora de Ciência do instituto, Ane Alencar, que estuda o tema há mais de duas décadas. “Este ano não é especialmente mais seco do que anteriores.”
Ao comparar 2019 com a média de focos de calor registrada entre 2011 e 2018, todas as categorias fundiárias apresentaram crescimento nos casos, com destaque para as APAs (aumento de 141% em relação à média dos oito anos anteriores) e as florestas públicas não destinadas (126% de aumento).
“Existem 67 milhões de hectares de florestas públicas sem destinação na Amazônia que são patrimônio dos brasileiros, mas que por falta de governança estão hoje à mercê de grileiros e especuladores irregulares de terra. O desmatamento e o fogo que acontece nessas regiões é totalmente ilegal, e devem ser alvo de investigação e ações de comando e controle”, diz o pesquisador sênior do IPAM, Paulo Moutinho.
Clique aqui para ver a nota técnica na íntegra.
(Envolverde)

Igreja quer formar padres indígenas para ampliar presença na Amazônia

Eram 7h de uma sexta-feira (30) quente e úmida na comunidade indígena de Mercedes, na Amazônia boliviana, quando o padre católico Juan Elías Luricy, 42, começou sua oração. Concentrados, os cerca de 20 takanas abaixaram a cabeça e acompanharam o Pai Nosso.
Era uma ocasião rara em Mercedes. Fazia três meses que um padre não aparecia na comunidade distante cerca de 5 horas de barco de Puerto Maldonado, no Peru, e 4 horas de carro de Cobija, a capital do departamento boliviano de Pando, onde fica a paróquia do padre.
Os índios chegaram a construir uma igrejinha em Mercedes, mas, por falta de uso, ela virou uma sala de aula.
“Estive aqui em duas oportunidades. Esperamos estar mais perto de vocês. […] Santa Rosa Lima [1586-1617]. Temos uma grande devoção por ela porque dizem que é boa para mandar chuvas quando há incêndios. Vamos pedir a Santa Rosa Lima que apague os incêndios que existem agora na Bolívia.” Amém, responderam os fiéis.
Elías personifica os desafios vividos por centenas de padres nos nove países amazônicos e que serão o foco do Sínodo (assembleia) de 250 bispos convocado pelo papa Francisco para o período de 6 a 27 de outubro no Vaticano.
O encontro, que discutirá a presença da igreja na região, se tornou foco de atrito neste ano entre o governo Jair Bolsonaro (PSL) e religiosos.
Integrantes da gestão federal se dizem receosos com interferências na soberania do Brasil ao tratar de questões ambientais e indígenas. Já a igreja diz que a principal motivação do encontro é avaliar a presença missionária.
As distâncias e as dificuldades na Amazônia são imensas. Na região de Tanaka II, segundo o padre Elías, a igreja atua desde o início do século passado, mas, com o tempo, foi perdendo músculo.
“Os padres que havia por aqui envelheceram e não foram substituídos. Os indígenas mais velhos se lembram deles. Eles dizem ‘foi graças à igreja que aprendemos a ler’. Mas na Amazônia é preciso estar muito próximo deles ou os laços vão se perdendo”, disse Elías.
Também não adianta apenas chegar para conversar, os indígenas querem ver missas de verdade, afirmou o padre. “As pessoas gostam de símbolos e signos e a igreja é rica em símbolos. As pessoas não querem apenas me ver. Elas querem ver um crucifixo, a hóstia, a oração, os cânticos”, afirmou o padre.
Indígena amahuaca da comunidade Boca Pariamanu, na Amazônia do Peru, com cerca de 130 moradores, Adela Aguirre, 23, concorda. “Nós não temos igreja e os padres vêm às vezes. Mas quando vêm, assistimos sempre. Neste ano o padre veio duas vezes. Eu não sou católica nem batizada. Mas creio em Deus.”
Secretário especial do Sínodo, o bispo de Puerto Maldonado, onde o papa lançou a ideia do encontro, em 2017, David Martinez de Aguirre, 49, disse que a igreja “não quer ser de visita, quer ser de presença”.
“Isso significa que não apenas os missionários vão aos lugares, mas sim que as próprias comunidades indígenas ou campesinas assumam sua liderança na igreja, seu papel de ser sujeitos, não objetos, da evangelização, de serem artífices da igreja”, disse Martinez em Puerto Maldonado.
Uma das medidas a serem discutidas no Sínodo é acelerar a formação de padres indígenas. O amahuaca Alberto Fernandez, 56, se mostra orgulhoso com a possibilidade de virar, já na semana que vem, conforme lhe prometeram, um “diácono [assistente do padre] dos povos indígenas”. Desde o ano passado ele integra um grupo itinerante que está visitando os pontos mais distantes da paróquia de Puerto Maldonado.
Estão imbuídos da missão iniciada depois da visita do papa à cidade. “Vou ser diácono. Isso queremos que ocorra em outras comunidades. Estou convidando [os indígenas] para que possam participar e também ser sacerdotes e diáconos”, disse Fernandez.
Há duas semanas, afirmou Fernandez, seu grupo itinerante chegou à localidade de Monte Salvado, na selva peruana, após viagem de três dias de barco. Ali rezaram uma missa, segundo ele, pela primeira vez em muitos anos. Dos 102 indígenas yines do povoado de Puerto Nuevo, 16 estavam com leishmaniose. Das 36 comunidades da sua região, o amahuaca visitou dez até agora.
Mas como fazer esse trabalho sem caracterizá-lo como uma intervenção indevida na cultura indígena e sem repetir os erros do passado, quando a igreja promoveu massivas conversões, às vezes destruindo culturas inteiras?
“Estamos fazendo isso respeitando os costumes e as tradições das comunidades para que não haja problemas como antes, quando os padres diziam que a religião só era orações, que havia um só Deus”, disse Fernandez.
“Mas não havia projetos para melhorar nossa qualidade de vida. Agora estamos conectando com projetos e apoios em educação, saúde e a segurança alimentar, que é mais essencial”, completou.
O próprio amahuaca é um símbolo dessa dupla identidade, cristã e indígena. Além de candidato a diácono católico, ele é o xamã da comunidade Boca Pariamanu, estuda e aplica ervas medicinais e realiza rituais de cura em moradores da região.
“As famílias vivem apoiando-se nelas mesmas, com a medicina natural, por exemplo. Pegam as raízes das árvores dos rios, as folhas. Praticam muito a medicina natural porque a medicina dos médicos não chega aqui”, disse o padre Elías.
A igreja também terá que vencer desconfianças que trabalho do gênero deve ocasionar. Como no caso dos professores enviados pelo Estado boliviano de outras partes do país para ensinar comunidades takanas na Amazônia.
Rolando Justiniano, 43, presidente da associação que representa cerca de mil indígenas na Terra Indígena Takana II, disse que os professores procuram incutir nas crianças e adolescentes uma noção de que o desenvolvimento econômico está acima da proteção do meio ambiente.
As lideranças indígenas não parecem gostar desse discurso e aceleraram um processo de formação de professores próprios takanas para suas crianças.
Nos próximos meses ou anos, os takanas terão que enfrentar e decidir sobre dois projetos estruturais apresentados pelo governo na região, uma rodovia e exploração de petróleo e gás nas suas terras.
“Os professores trazem uma visão diferente do que é a nossa vivência. Às vezes, nas aulas, eles põem essas coisas para os meninos, o desenvolvimento, a agricultura, a revolução produtiva, tudo que é alheio a nós. É uma manobra para que nós digamos ‘ah, o desenvolvimento é melhor que a Amazônia’”, disse Rolando.
SÍNODO PARA A AMAZÔNIA
O que é: encontro de bispos convocado pelo papa Francisco para o período de 6 a 27 de outubro no Vaticano
Objetivo: Discutir a presença da igreja na região, incluindo a formação de padres
Polêmica: Integrantes do governo Jair Bolsonaro (PSL) se dizem receosos com interferências na soberania do Brasil ao tratar de questões ambientais e indígenas. Já a igreja afirma que a principal motivação é avaliar a presença missionária
(Com informações da Folha de São Paulo)

São os índios guardiães da floresta ou sujeitos de direitos que o Estado deve garantir?

A resposta é ambos e não há contradição no fato.
Os indígenas brasileiros são povos originários e em estatísticas desencontradas – porque há grupos isolados, sem contato conosco – somam cerca de 400 mil indivíduos. Distribuídos em aldeamentos e ocupações do território regulados e administrados pela FUNAI – organismo federal.
Em todos os continentes em que se deu o fenômeno de invasão e conquista do território que chamamos docemente de COLONIZAÇÃO, houve genocídio, aculturação dos povos nativos e o que se tem são remanescentes dessas populações em “reservas” – supostamente áreas protegidas pelo Estado.
No Brasil estes remanescentes são- em sua maioria – coletores e caçadores com pequena agricultura de subsistência, se agrupam em 185 etnias e falam 150 dialetos além do Português que é obrigatório.
A maioria desses grupos está na Amazônia – não só brasileira, por razões óbvias: ali tem floresta, bicho, água e podem sobreviver seguindo o modo de vida que conhecem.
Poucos índios se dedicam a atividades outras, minerarias ou de outra natureza. São em geral falsas as acusações de que se dedicam a atividades ilegais.
Em geral suas aldeias pequenas e grupos itinerantes têm pouco impacto na destruição da vegetação ou da fauna.
Não estamos aqui defendendo o “mito do bom selvagem” tampouco somos “o homem cordial” que surgiu do amestiçamento entre as três raças fundantes do brasileiro. Continuamos com a mentalidade colonialista, rentista, predadora do pior pré-capitalismo.
Boi na pecuária extensiva e serras peladas é o nome do capitalismo amazônico. À bala e fogo.
Porque a cobiça sobre as terras indígenas não é para beneficiar nem o índio nem os homens e mulheres ordinários desse país. Essa cobiça que se materializa em assassínio de lideres ecologistas e indígenas, e invasões com capangas armados tem o selo da grilagem, do desmate ilegal e dos fazendeiros inescrupulosos. Em geral, a experiência mostra, estes crimes ficam impunes.
Ivaneide Cardozo, chamada Neidinha com propriedade (é pequena, magra, mas tem olhos incendiados de indignação) – lidera uma organização em Rondônia, a Kanindé. A organização existe desde 1992 e ali se instalou para fazer cumprir os desígnios da nossa Constituição de 1988 – que garante as terras indígenas e a sua demarcação.
No caso do centroeste de Rondônia, onde atua a Kanindé vive o povo Uru-eu-wau -wau.
Neidinha, presente ao Congresso de Jornalistas Ambientais, acontecido em agosto (São Paulo), onde também estive, trouxe vídeos comoventes, mostrando as invasões que se aceleraram nos últimos meses.
As cenas se repetem: 5 a 10 homens armados escoltam grupo que vem com equipamento para desmatar e aumentar o território de algum fazendeiro ou outro empreendedor ilegal.
Muitas vezes os índios os rechaçam- apenas com arcos e flecha. Os grupos recuam com ameaças de que vamos voltar, somos muitos e armados.
Neidinha relata mais de 2.000 focos de invasão nos 2 milhões de hectares da terra dos Iru-eu-wau wau na última década.
São áreas remotas de um Brasil que não vemos, não visitamos. São propriedades asseguradas por Lei – se a Lei valer alguma coisa. Tomara que sim.
No atual governo temos acompanhado o desmonte da FUNAI, as tentativas mal sucedidas de rever as áreas indígenas por decreto e discursos temerários de “tem muita terra pra pouco índio”.
A solução que o governo encaminha então é a do FATO CONSUMADO – deixar queimar, derrubar e não punir. Ou fazer de conta.
A violência contra indígenas e contra as populações tradicionais não é nova nem ocorre só na Amazônia.
A violência não é sazonal nem terminará com o período da seca.
Muito mais do que donos de terras os indígenas- pelo seu modo de vida – vêm prestando enormes serviços ambientais ao Brasil todo e ao mundo. A floresta em pé significa água, carbono fixado e biodiversidade riquíssima que devemos explorar com bom senso.
Defendê -los do genocídio que se anuncia, e dos conflitos já armados no horizonte, para muito além das queimadas que agora assustam e são vistas no Jornal Nacional – é evitar um ecocídio, o colapso do bioma amazônico.
Deu para entender o tamanho do desatino?
Vidas indígenas importam.
Nosso futuro como civilização está correndo sério risco.
De como lidaremos com a Amazônia sairemos piores ou melhores como gente.
(Envolverde/Carta Capital)