Aumentam os relatos de ferrugem nas lavouras de soja

Como nas safras anteriores, o mês de janeiro vem apresentando rápido aumento nos relatos de ferrugem-asiática nos estados e municípios produtores de soja. Segundo levantamento do Consórcio Antiferrugem, na safra 2022/23, há 119 relatos da doença e a ferrugem está presente em nove estados brasileiros, sendo 79% das ocorrências em lavouras comerciais na fase de enchimento de grãos. Na mesma época, na safra passada, havia 59 relatos, porém, as condições climáticas eram diferentes – menor volume de chuvas na região Sul do País, Mato Grosso do Sul e Paraguai – o que reduziu a ocorrência da doença.

A pesquisadora Cláudia Godoy, da Embrapa Soja, explica que a ferrugem está favorecida pelas chuvas bem distribuídas ao longo desta safra. “Em regiões em que as chuvas estão regulares, a doença é mais comum quando ocorre falhas de aplicações de fungicidas ou os fungicidas utilizados têm baixa eficiência para o controle da ferrugem”, explica Godoy.

De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mais de 50% das lavouras estão em fase de enchimento de grãos (após R5), situação onde a doença causa menos dano. Godoy afirma que o potencial de dano da ferrugem-asiática é maior nas lavouras ainda em estádio vegetativo, floração e formação de vagens, que recebem maior quantidade de inóculo do fungo das áreas semeadas mais cedo.

“Permanecendo as condições favoráveis para a doença, as lavouras mais atrasadas irão necessitar de aplicações com fungicidas com alta eficiência para o controle da doença”, alerta. “Mesmo os produtos mais eficientes para o controle devem estar associados ao uso de fungicidas multissitios, à medida que aumenta o inóculo da ferrugem nas regiões”, comenta.

A comparação da eficiência de fungicidas registrados e em fase de registro para o controle da ferrugem-asiática vem sendo feita em experimentos em rede, realizados desde a safra 2003/2004, no Brasil. Os fungicidas são avaliados individualmente, em aplicações sequenciais, em semeaduras tardias, para determinar a eficiência de controle. Os resultados mais recentes sobre a eficiência dos fungicidas para controle da ferrugem podem ser acessados na publicação Eficiência de fungicidas para o controle da ferrugem- asiática da soja, Phakopsora pachyrhizi, na safra 2021/2022: resultados sumarizados dos ensaios cooperativos

Outras doenças da soja na safra 22/23 – A pesquisadora da Embrapa relata ainda a ocorrência de outras doenças nessa safra. Nas regiões do Cerrado, por exemplo, onde vem ocorrendo boa distribuição de chuvas nas semeaduras iniciais, tem-se observado alta incidência de mancha-alvo.

Além disso, na região Sul, há relatos de mofo-branco nas regiões mais altas com temperaturas mais amenas e em períodos de menor precipitação a presença do oídio.

(Com informações da Assessoria de Imprensa) 

Acervos ameaçados: pesquisadores criticam modelo de concessão do Jardim Botânico e do Museu de Ciências

Cleber Dioni Tentardini

Ambientalistas e servidores do Jardim Botânico de Porto Alegre e do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul estão mobilizados para garantir a integridade do patrimônio das duas instituições.

O futuro das coleções científicas, do mobiliário e da própria área do JB e do MCN é incerto, diante da intenção do governo do Estado em conceder a gestão de ambos à iniciativa privada.

Nesta sexta-feira, 27, representantes da Secretaria Extraordinária de Parcerias (SEPAR) e do grupo de empresas contratado para elaborar o modelo de concessão promovem a segunda audiência pública para tratar do tema.

O grupo é formado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), pelo Instituto Semeia e o Consórcio Araucárias – Parques Brasileiros, registrado em abril de 2021, em São Paulo, para prestar consultoria em gestão empresarial.

O quadro societário é formado por Vitor Amauri Antunes, administrador, SPIN Soluções Públicas Inteligentes Consultoria, Plantar Ideias, Vallya Advisors Assessoria Financeira e Queiroz, Maluf Sociedade de Advogados.

Jardim Botânico e Museu de Ciências Naturais. Foto: CMPA/Divulgação

Antes vinculados à Fundação Zoobotânica do RS (FZB), que foi extinta, em 2017, pelo governo de José Ivo Sartori, hoje JBPOA e MCN são administrados pela Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura, a SEMA.

O biólogo Jan Karel Júnior, presidente da Associação dos Funcionários da FZB, critica vários itens do projeto de concessão por apresentar de forma vaga como serão os mecanismos de gestão do Jardim Botânico.

“A proposta prevê que a empresa concessionária poderá ser dispensada de anuência prévia ou comunicação ao Estado em situações a serem definidas futuramente. Quer dizer, não há critérios ou parâmetros técnicos de como isso será feito, quem vai acompanhar esse processo e garantir a integridade do JB e do interesse público, questiona o biólogo.

Jan diz que o projeto não demonstra quais e de que forma serão realizadas as intervenções no Museu de Ciências Naturais e como as pesquisas, atividades e o acervo desse órgão serão mantidos se a própria intenção do Governo do Estado de demitir os funcionários especializados do JB e MCN é incoerente com uma proposta de concessão do uso público que promete manter as funções técnicas e de pesquisa sob sua responsabilidade.

“O Poder concedente, no caso o Estado do Rio Grande do Sul, sem a participação de curadores, pesquisadores e técnicos do JBPOA, não tem condições adequadas para considerar todas as questões necessárias relativas à transição para a concessionária sem colocar em risco o patrimônio ambiental e científico, material e imaterial, representado pelo Jardim Botânico”, completa o representante dos servidores.

Bromeliario. Foto: Cleber Dioni Tentardini

O biólogo Paulo Brack, professor do Departamento de Botânica, do Instituto de Biociências da UFRGS, e membro do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (INGÁ), diz que o Estado vai transferir à futura concessionária uma série de compromissos e exigências técnicas rigorosas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para manter a qualificação na categoria “A” do JBPOA, obtida na década passada.

Brack lembra que a Ação Civil Pública em tramitação na Justiça determina obrigações do Estado para manter o Jardim Botânico como um centro de pesquisa e conservação da flora rio-grandense, sendo considerado um dos cinco melhores do país, inclusive com espécies raras, endêmicas (que se encontram apenas em uma determinada região) e ameaçadas de extinção.

“Além disso, o Estado tem que manter a integridade da área, e não é o que está acontecendo, pois uma parte do muro do terreno até hoje não foi reconstituída, possibilitando invasões de animais domésticos ou de pessoas mal intencionadas, para depredar e roubar, ocorrências que já aconteceram”, observa. “Tudo isso tem de ser cobrado de um futuro gestor, além da manutenção das bolsas de iniciação científica e dos jardineiros, técnicos e pesquisadores”, completa.

Outro problema estrutural, antigo, ocorre no telhado do prédio do Museu de Ciências Naturais, especialmente no Herbário Prof. Dr. Alarich R. H. Schultz (HAS). Foi feito um conserto provisório, mas quando chove, os servidores precisam improvisar para não perder itens do acervo histórico.

A bióloga Rosana Senna, uma das curadoras, explica que o HAS é um acervo botânico com cerca de 150 mil espécimes da flora gaúcha e 300 tipos nomenclaturais, com coletas que datam desde 1854 até os dias atuais.

 

 

 

 

Acervo do herbário HAS danificado

“A reforma do telhado do prédio se mostra urgente para sanar os problemas de infiltração da água da chuva nas salas de coleções científicas do Museu. O Estado tem a obrigação de proteger esses registros que contam a história da nossa biodiversidade”, ressalta.

A bióloga Caroline Zank, do Instituto Curicaca, diz que os membros da entidade não são contra as concessões à iniciativa privada, mas exigem transparência e a possibilidade de as ONGs e funcionários das instituições participarem ativamente da elaboração do edital.

“O modelo de edital de concessão que foi à apresentado na primeira consulta pública é omisso em dar garantias sobre a manutenção do patrimônio e, por outro lado, dá uma série de possibilidades de intervenção direta na área do JB e do Museu, onde inclusive permite à concessionária a utilização de prédios e a apropriação das áreas, computadores, softwares e equipamentos que são fundamentais à manutenção das pesquisas e atividades técnico-científicas do JB e do MCN, sem demonstrar claramente de que maneira afetará ou não as atividades desses órgãos”, sublinha Caroline.

Orquidário. Foto: Cleber Dioni Tentardini

Outro ponto em que a bióloga chama a atenção é que o edital possibilita ao Estado alterar o Plano Diretor do JB, colocando em risco o patrimônio.

“O Estado concedeu parte da área da coleção científica viva do JB, composta por espécies ameaçadas de extinção, para o IBAMA utilizar na implantação de um CETAS, sem que houvesse qualquer restrição ou garantia de manutenção desta coleção no local”, critica. Essa área é ocupada por uma coleção da Floresta Ombrófila Mista, com espécies raras e ameaçadas de extinção.

CETAS é o Centro de Triagem de Animais Silvestres. Funcionava junto ao Parque Zoológico e, há seis anos, teve suas funções absorvidas pelo órgão federal sendo transferido para um imóvel na esquina das ruas Baronesa do Gravataí e Miguel Teixeira, na Cidade Baixa.

Área será cedida ao IBAMA. Foto: Cleber dioni

Aquela área do Jardim Botânico a que se refere Caroline tem entrada pela avenida Salvador França, também – distante cem metros do pórtico principal -, e já foi ocupada por laboratórios químicos da FEPAM. Desocupado e sem vigilância, foi invadido e teve dois prédios saqueados e incendiados. O local foi descontaminado graças ao empenho de 161 mil reais de um fundo gerido pelo Ministério Público. Agora, será cedido pela SEMA ao IBAMA.

A diretora do SEMAPI-RS Sindicato, Cecília Bernardi, ressalta que o Jardim Botânico e o Museu de Ciências sempre prestaram um serviço de excelência quando estavam vinculados à Fundação Zoobotânica, mas os últimos governos, desde Sartori, vêm tentando precarizar e privatizar tudo.

“Essa concessão é uma temeridade, retira autonomia de trabalho dos pesquisadores que estão nos quadros do Estado e passa a gestão dos acervos científicos para a iniciativa privada. Qual o interesse da empresa, que visa o lucro, em manter esse patrimônio ambiental dos gaúchos”, questiona a dirigente sindical.

Ação Civil Pública corre desde fevereiro de 2017

A Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre ingressou com a Ação Civil Pública em fevereiro de 2017, um mês após o governo estadual extinguir a Zoobotânica. A intenção é preservar o patrimônio ambiental e cultural do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais do Rio Grande do Sul. O Parque Zoológico não está contemplado nesta ACP.

Juiz e promotoras de Justiça em vistoria na área do Jardim Botânico desprotegida. Foto: Cleber Dioni

Não há previsão de quando ocorrerá o julgamento da Ação, segundo a assessoria do juiz Eugênio Couto Terra, da 10ª Vara da Fazenda Pública, do Foro Central.

A promotora de Justiça Vera Sapko solicitou nos autos do processo que o Estado fosse intimado a prestar informações quanto às providências que está adotando, ou adotará, para informar no edital a existência da ação civil pública e as obrigações que o futuro concessionário assumirá perante o Governo do Estado.

“Estamos acompanhando com atenção o processo de concessão anunciado pelo Estado para garantir que, em caso de procedência da ACP, seja cumprida de forma integral a decisão”, afirmou.

No dia dois deste mês de maio, a Procuradoria-Geral do Estado respondeu ao pedido de informações do MP junto ao processo, negando a necessidade de mencionar no edital de licitação a existência da ACP. “O risco relacionado a demandas judiciais que “impactem, onerem, impeçam ou impossibilitem a concessionária de executar integral ou parcialmente o objeto contratual” está alocado ao Poder Concedente (Estado)”, consta no documento, assinado pelos procuradores César Marsillac, que atua junto à SEPAR, Victor Herzer da Silva e Gustavo Petry.

A SEPAR foi procurada pela reportagem, mas não respondeu ao pedido de informações.

A ACP foi assinada por quatro promotores e tem mais de 60 páginas com os argumentos para justificar a manutenção dos servidores e das atividades de pesquisas e conservação das coleções científicas, além de garantir a integridade da área e dos bens imóveis.

Representantes do MP e da Justiça…
….realizaram vistorias no Museu de Ciências

A ação requer que o Estado apresente em juízo um plano que garanta a continuidade e a mesma qualificação de todos os serviços e atividades do Jardim Botânico e do Museu de Ciências Naturais, após a extinção da FZB, e providencie o conserto do muro que faz a divisa com a Vila Juliano Moreira. E determina ao IPHAE (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do Sul) a inscrição do Jardim Botânico no Livro Tombo, por já ter sido declarado patrimônio cultural do Estado, em 2003.

Todo o arboreto é identificado. Foto: Cleber dioni

“Além de constituir o maior acervo de material-testemunho da biodiversidade dos ecossistemas terrestres e aquáticos do Estado, ferramenta imprescindível para estudos que envolvam a flora e a fauna, recente e fóssil, vinculados ao Museu de Ciências Naturais, essas coleções subsidiam a descrição de novas espécies. Os ‘exemplares-tipo’ dessas coleções, que servem de base para as descrições, tornam-se essenciais para a identificação precisa de cada espécie e sua conservação futura na natureza. Os acervos científicos são, portanto, bibliotecas da biodiversidade. Essenciais para a expansão do conhecimento por meio da pesquisa e da educação. Estudos que envolvem taxonomia, biotecnologia, biogeografia, perda e conservação da biodiversidade, invasões biológicas e mudanças climáticas, por exemplo, dependem das coleções biológicas. As coleções paleontológicas, por sua vez, são de grande relevância do ponto de vista científico e cultural para a reconstituição de paleoambientes e o entendimento da paleoecologia”, descrevem os promotores na ACP.

Biólogo Patrick fala dos anfíbios a alunos em evento de educação ambiental /  Fotos: Mariano Pairet
Engenheiro agrônomo José Fernando Vargas
em oficina de educação ambiental

O documento lista uma série de consequências do ponto de vista científico para o Rio Grande do Sul em caso de “descontinuidade das atividades”:

Butiazeiro, árvore mais antiga do JB, com 200 anos. Foto: Cleber Dioni Tentardini

* Perda de patrimônio científico, histórico e cultural que integra o conhecimento científico nacional;

* Comprometimento do maior conjunto de amostras biológicas e paleontológicas do Bioma Pampa;

* Interrupção da rede de colaboração científica estabelecida há décadas entre os curadores/pesquisadores da FZB com universidades e instituições de pesquisa do país e do exterior;

* Perda irreparável em Taxonomia (ciência que descreve e classifica novos organismos) no caso de perda de material-tipo (material que embasa a descrição da espécie. A perda de material-tipo aconteceu pela última vez durante a 2ª Guerra Mundial, o que trouxe dificuldades taxonômicas até hoje para toda comunidade científica mundial;

* Perda de informações sobre a biodiversidade que deveriam subsidiar políticas públicas voltadas à gestão da biodiversidade, no âmbito estadual e nacional;

* Interrupção da socialização da informação para o mundo científico de um dos três maiores herbários do RS. Em 2016, o Herbário HAS do MCN teve quase três milhões de acessos (2.909.189), através da Rede Herbário Virtual da Flora e dos Fungos do Brasil;

* Perda de geração de conhecimento aplicado à gestão ambiental. Atualmente, os registros da coleção de anfíbios do MCN estão sendo utilizados na revisão do Plano de Manejo do Parque Estadual de Itapeva, na elaboração do Plano de  Manejo da Reserva Biológica Estadual da Mata Paludosa e na elaboração do Plano de Manejo da APA do Banhado Grande;

* Perda dos registros que subsidiam o Plano de Ação Nacional para a Conservação da Herpetofauna do Sul (PAN Herpetofauna do Sul);

* Perda da capacidade de descoberta de usos potenciais da biodiversidade. Recentemente estudos desenvolvidos pelo MCN com espécies nativas de anfíbios revelaram novas substâncias com potencial para uso farmacêutico. Esse serviço não existe na iniciativa privada, portanto não há como reparar a sua perda;

* A perda da coleção de microalgas continentais do Herbário Prof. Dr. Alarich R. H. Schulz (HAS), que possui o maior número de lotes em líquido e tipos nomenclaturais do Brasil, significa a perda de acervo fundamental para obtenção de conhecimento e testemunho da biodiversidade do Rio Grande do Sul;

* Desaparecimento de local com condições de receber espécimes coletados por ocasião de EIA/RIMA, conforme legislação;

* Perda de banco genético de representantes de cianobactérias da flora do RioGrande do Sul;

* Interrupção de trabalhos realizados em parceria com outras instituições brasileiras no estudo das cianobactérias(Centro de Energia Nuclear na Agricultura, USP, Piracicaba, SP;

* Impossibilidade de descrição de novos táxons de cianobactérias sul-rio-grandenses (gêneros e espécies) para a ciência;

* Perda de banco amostral de referência de florações de cianobactérias registradas em distintos sistemas hídricos do Rio Grande do Sul, dentre outras.

Jardim Botânico é indivisível, diz MP

O Jardim Botânico de Porto Alegre é um museu vivo com um patrimônio público inalienável, não privatizável, indivisível e que exige o máximo zelo dos gestores públicos na sua preservação para as gerações presentes e futuras, diz a Ação Civil Pública do MP.

O JB contempla um conjunto de 27 coleções vivas de plantas envasadas ou em arboreto. Dentre as atividades, estão a manutenção de coleções científicas de plantas vivas, o banco de sementes, os programas institucionais de iniciação científica envolvendo bolsistas do Pibic/CNPQ, Probic/Fapergs e convênios para estágios curriculares, o viveiro de mudas, a biblioteca, as atividades de educação ambiental, e o envolvimento em inúmeros projetos de pesquisa.

Dyckia reitzii, espécie de bromélia, na lista de espécies ameaçadas de extinção. Fotos: Priscila Ferreira
Tillandsia winkleri, na lista de espécies ameaçadas de extinção
Parodia claviceps, cacto. Foto Cleber Dioni
Muda de Pau Ferro, ameaçada de extinção

Em função desse cipoal de atividades, dizem os promotores, o Jardim Botânico de Porto Alegre está entre os cinco do Brasil que se enquadram na categoria A, o que significa que atende a todas as 16 exigências previstas no artigo 6º da resolução Conama 339/2003. “Entre elas, a primeira e mais importante é possuir quadro técnico-científico compatível com suas atividades.”

Outras considerações da ACP

O Jardim Botânico possui em seu acervo um conjunto de plantas que integram a Flora Gaúcha ameaçada de extinção. Esse conjunto somado a outras plantas raras compreende um total de mais de quatro mil plantas.

Viveiro. Foto Cleber Dioni

A perda do registro na Agenda Internacional de Jardins Botânicos do Botanic Gardens Conservation International (BGCI), o que dificultará a captação de recursos para pesquisa; ocorrerá a perda de exemplares de espécies raras, endêmicas e ameaçadas, dificultando a ampliação do conhecimento voltado à conservação; haverá o desaparecimento de ambiente controlado para desenvolvimento de pesquisas com universidades nacionais e internacionais interessadas na flora do RS.

Viveiro

Em relação ao Banco de Sementes, eventuais danos serão incomensuráveis. Haverá o encerramento das atividades de análise fisiológica e morfológica de sementes de espécies arbóreas e arbustivas nativas do RS.

Sementes sendo catalogadas
Mostruário da coleção científica do banco de sementes

 

 

 

 

O Laboratório de Análise de Sementes do Banco de Sementes/JB é o único no RS que procede, rotineiramente, essas funções, inclusive no tocante às espécies ameaçadas.

Haverá profunda perda em termos de sistematização de dados gerados em experimentos nos últimos 20, podendo comprometer a lista de Index Seminum, pois não existirão sementes armazenadas.

Esse conjunto de perdas e reduções certamente implicará a perda de pré-requisitos para a obtenção da categoria “A”, por parte do JB.

A par do acervo, o patrimônio imaterial do Museu de Ciências Naturais se alimenta de seu corpo funcional extremamente qualificado. Esse corpo técnico mantém a instituição viva e capaz de nutrir o Estado do Rio Grande do Sul com informações sobre a biodiversidade, patrimônio paleontológico, patrimônio genético, dentre outros bens culturais e ambientais de suma relevância para a preservação da vida humana, animal e vegetal.

O Conama foi criado pela lei n. 6.938/81, que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente. Esta lei foi regulamentada pelo decreto n. 99.274/90, com alterações feitas pelo decreto n. 3.942/01, disciplinando finalidades consultivas e deliberativas, bem como as competências do conselho.

Art. 2° Os jardins botânicos terão por objetivo:

I – promover a pesquisa, a conservação, a preservação, a educação ambiental e o lazer compatível com a finalidade de difundir o valor multicultural das plantas e sua

utilização sustentável;

II – proteger, inclusive por meio de tecnologia apropriada de cultivos, espécies silvestres, ou raras, ou ameaçadas de extinção, especialmente no âmbito local e regional, bem como resguardar espécies econômica e ecologicamente

importantes para a restauração ou reabilitação de ecossistemas;

III – manter bancos de germoplasma ex situ e reservas genéticas in situ;

IV – realizar, de forma sistemática e organizada, registros e documentação de

plantas, referentes ao acervo vegetal, visando plena utilização para conservação e

preservação da natureza, para pesquisa científica e educação;

V – promover intercâmbio científico, técnico e cultural com entidades e órgãos

nacionais e estrangeiros; e

VI – estimular e promover a capacitação de recursos humanos.

Art. 6° Serão incluídos na categoria “A”, os jardins botânicos que atenderem às seguintes exigências:

I – possuir quadro técnico – científico compatível com suas atividades;

II – dispor de serviços de vigilância e jardinagem, próprios ou terceirizados;

III – manter área de produção de mudas, preferencialmente de espécies nativas da

flora local;

IV – dispor de apoio administrativo e logístico compatível com as atividades a

serem desenvolvidas;

V – desenvolver programas de pesquisa visando à conservação e à preservação

das espécies;

VI – possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em estruturas

adequadas;

VII – desenvolver programas na área de educação ambiental;

VIII – possuir infra-estrutura básica para atendimento de visitantes;

IX – dispor de herbário próprio ou associado a outras instituições;

X – possuir sistema de registro informatizado para seu acervo;

XI – possuir biblioteca própria especializada;

XII – manter programa de publicação técnico-científica, subordinado à comissão de

publicações e/ou comitê editorial, com publicação seriada;

XIII – manter banco de germoplasma e publicação regular do Index Seminum;

XIV – promover treinamento técnico do seu corpo funcional;

XV – oferecer cursos técnicos ao público externo; e

XVI – oferecer apoio técnico, científico e institucional, em cooperação com as unidades de conservação, previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC, instituído pela Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.

Pesquisa: Pampa Gaúcho absorve gases de efeito estufa mas sofre destruição acelerada

Uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria mostra que o bioma pampa , se bem manejado, é um aliado do equilíbrio ambiental por sua capacidade de absorver C02. Mas está gravemente ameaçado pela expansão das lavouras de soja e as plantações de eucalipto.

Reportagem de João Lara Mesquita, do Estadão:

Dos seis biomas brasileiros ele é o menor, o que menos chama a atenção do público, e o único localizado apenas em um Estado, o Rio Grande do Sul. Apesar de ser destruído numa velocidade impressionante é muito raro ver alguém se manifestar em seu apoio.

Pampa é uma palavra de origem quechua que significa ‘região plana’.

Ocupa apenas 2% do território nacional e sofre um processo de destruíção acelerada. Nos últimos 34 anos mais de 2 milhões de hectares de campos nativos do bioma Pampa foram convertidos em lavouras, pastagens plantadas e silvicultura, segundo dados do projeto MapBiomas.’ Agora uma pesquisa revela  um aliado: O Pampa Gaúcho absorve gases de efeito estufa e pode ser lucrativo.

O Pampa, com suas pastagens naturais e pecuária bem manejadas, compensa emissões de gases de efeito estufa

O pampa gaúcho é um prolongamento natural do pampa argentino e uruguaio. A geomorfologia do relevo onde ocorre é suavemente arredondada, formando as coxilhas. E, de acordo com o agronews.tv.br, Uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que vem sendo desenvolvida desde 2015, mostra que a pastagem natural do Bioma Pampa, quando bem manejada, pode compensar as emissões de metano produzidas pelo gado através da absorção de dióxido de carbono (CO2) pela pastagem.

Segundo a pesquisadora Débora Regina Roberti, os resultados alcançados até o momento são suficientes para comprovar o sequestro de carbono (CO2) de forma orgânica no Pampa Gaúcho. O desafio agora é monetizar estas informações, tornando o processo algo lucrativo para o produtor rural.

Segundo matéria do site www.girodoboi.com.br a EMBRAPA desenvolveu estudo sobre os biomas brasileiros quando equipes de pesquisadores em pecuária e sistemas integrados estudaram protocolos de sistemas de produção a campo. As avaliações buscam entender a dinâmica do ciclo do carbono na atividade. Nesse sentido, o Bioma Pampa recebeu estudos para três protocolos: integração, emissões de metano pelos bovinos e pastagem nativa.

Leandro Volk fez uma estimativa de que, mantendo a altura indicada (da vegetação do Pampa), nós teríamos 18 toneladas de carbono por hectare acumuladas nessa área. Em síntese, esse carbono seria da forragem disponível, das raízes no solo e do próprio solo. Analogamente, em sistema silvipastoril, uma árvore estoca 23 toneladas. Ou seja, não são só as árvores que imobilizam esse carbono. O pasto bem manejado e permanente também imobiliza.”

Ilustração UFSM

Drenos de gases de efeito estufa

O estudo que constata que o bioma Pampa funciona como dreno de GEEs foi realizado pelo Laboratório de Micrometeorologia da UFSM e coordenado pela professora do Departamento de Física, Débora Regina Roberti.

A partir da coleta de dados sobre trocas de carbono e metano nos ecossistemas, o grupo de pesquisadores coordenado pela professora concluiu que o bioma Pampa, em condições de manejo adequado, funciona como uma espécie de dreno de gases de efeito estufa.

O Pampa  ocupa uma área de 176.496 km² (IBGE, 2004). Isto corresponde a 63% do território estadual e a 2,07% do território brasileiro.  Mas a perda anual tem sido 125 mil hectares nos últimos seis anos, sem sinais de decréscimo. Isso corresponde a 175 mil campos de futebol por ano, o que deveria gerar comoção pública e ações rigorosas de fiscalização.

Mas, nenhum deles acontece de fato. A fiscalização é quase nula, e a comoção não acompanha o que se passa no bioma. Já estamos acostumados. No mar, o descaso acontece porque as pessoas não veem o que está debaixo d’água. Para ampla porção da população mundial, mar é sinônimo de lazer, praias, sol, férias ou feriados. Assim parece ser no Pampa, apesar da beleza e biodiversidade.

As paisagens naturais do Pampa

As paisagens naturais do Pampa se caracterizam pelo predomínio dos campos nativos, mas há também a presença de matas ciliares, matas de encosta, matas de pau-ferro, formações arbustivas, butiazais, banhados, afloramentos rochosos, etc.

Segundo o site coladaweb.com, Área de relevo plano, com baixas altitudes, onde dominam grandes extensões de vegetação herbácea.

E, por ser um conjunto de ecossistemas muito antigos, o Pampa apresenta flora e fauna próprias e grande biodiversidade, ainda não completamente descrita pela ciência. Estimativas indicam valores em torno de 3000 espécies de plantas, com notável diversidade de gramíneas, são mais de 450 espécies (capim-forquilha, grama-tapete, flechilhas, barbas-de-bode, cabelos de-porco, dentre outras).

E, no que diz respeito ao Rio Grande do Sul, ‘a qualidade da água, e dos alimentos, depende diretamente da conservação dos ecossistemas naturais. Sem a vegetação nativa, a polinização de muitas culturas agrícolas fica comprometida. A hidrografia dos pampas é formada pelos rios da Bacia do Uruguai e pela Bacia Secundária do Sudeste-Sul. A Bacia do Uruguai serve de limite entre as terras brasileiras, uruguaias e argentinas.

Quem sabe agora comece a mudar…

Se o Pampa só atinge o Rio Grande do Sul, ele se estende pela  América do Sul, onde os campos e pampas se estendem por uma área de aproximadamente 750 mil km2, compartilhada por Brasil, Uruguai e Argentina.

‘Características únicas da paisagem contribuem para o manejo adequado do gado’

 Conforme a pesquisa, a combinação entre o clima e as características únicas da paisagem contribuem para o manejo adequado do gado, que podem ajudar na elaboração de estratégias para a redução da emissão dos gases de efeito estufa na atmosfera.

A pesquisadora Débora explica que, durante o inverno, em que há menor crescimento das pastagens, o Pampa emite mais dióxido de carbono (CO2) do que absorve. No entanto, a quantidade de absorção dos gases no verão compensa a emissão do inverno e, em uma média anual, o local funciona como um absorvedor de CO2.

Débora Regina Roberti, graduada em Física Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (1998), mestrado em Física pela Universidade Federal de Santa Maria (2001) e doutorado em Física, com estágio sanduíche no CNR Itália, pela Universidade Federal de Santa Maria (2005). Atualmente é professora associada III da UFSM.

Fontes: https://agronews.tv.br/pesquisa-revela-que-o-pampa-gaucho-absorve-gee-e-pode-ser-lucrativo/?fbclid=IwAR3UJjwXojBdwXuAv8ytdbRUi3_xsAeIBYqvhkeZDKsQs-IMopkR0DmjlFo; https://www.girodoboi.com.br/noticias/pastagem-nativa-bem-manejada-acumula-ate-18-t-de-carbono-por-hectare/?fbclid=IwAR05lYhsfNcerMHEeCOIypAuUh6qgAxx3RSHsKD8c_xwgYEfHRsfKbS6D_8.

 

 

Vento a favor no Pampa

Aprovado pela Eletrobras, Complexo Eólico Coxilha Negra, de 300MW,  começa a ser construído até junho de 2022, em Santana do Livramento

Por Cleber Dioni Tentardini

A licitação para compra dos aerogeradores já foi aberta. As obras estão previstas para iniciar até junho de 2022.

Trata-se do Complexo Eólico Coxilha Negra, com 300 megawatts (MW) de capacidade instalada, energia suficiente para abastecer quase 800 mil habitantes.

Coxilha Negra é um distrito do município de Santana do Livramento, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, polo de geração de energia a partir dos ventos desde 2010, com a instalação de 108 turbinas no Complexo Cerro Chato, na mesma direção.

Parte de Livramento, com Cerro Chato (acima) e Coxilha Negra / Arquivo Jornal JÁ

É uma região de extensos campos, exatamente na divisa com o território uruguaio. A proximidade com a fronteira pode facilitar a interligação energética com o país vizinho, para quem a estatal brasileira prestou consultoria técnica nessa área. Ultimamente o Brasil tem importado energia do Uruguai e da Argentina.

A implantação do Coxilha Negra foi aprovada pelo Conselho de Administração da Eletrobras há 15 dias.

Quem vai executar o projeto é a CGT Eletrosul, estatal que resultou da fusão da CGTEE (Companhia de Geração de Energia Elétrica) com a Eletrosul Centrais Elétricas, ambas subsidiárias da Eletrobras.

O número de aerogeradores desse mega parque eólico vai depender da potência das máquinas adquiridas. Estima-se entre 55 e 72 torres para alcançar a capacidade de 300 MW.  

Localização das turbinas dos primeiros projetos dos complexos Coxilha Negra (à esq.) e Cerro Chato. Foto: Arquivo Jornal JÁ

Fabricantes como Gamesa, WEG e GE fornecem máquinas que podem chegar a 6MW. Quanto maior a capacidade de geração de cada turbina, menor é o número de torres. O sistema de conexão dos parques será composto por duas subestações coletoras de energia. Está prevista a construção de novos acessos internos, além da melhoria daqueles já existentes.

O Complexo está projetado para ocupar área de aproximadamente 126 km² de extensão e as questões envolvendo cessão de direito de uso de terras particulares já estão resolvidas com os proprietários rurais.

A empresa Geopampa Ambiental realizou o georreferenciamento na região. O trabalho consiste em medições de áreas geográficas com alto grau de precisão, feitas com GPS geodésicos, para que constem no mapa geográfico nacional, homologado pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – e pelo Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

O empreendimento já possui a Licença de Instalação do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), órgão responsável pelos estudos de impactos ambientais em áreas de fronteira.

Durante um ano, mensalmente, foi feito monitoramento da fauna,  o que permitiu identificar os padrões de ocupação da área pelos diversos grupos de animais. Também foram mapeados os locais de ocorrência de cactáceas endêmicas (que só ocorrem em determinada região) ou ameaçadas de extinção.

A CGT Eletrosul estima a criação de 310 empregos diretos e cerca de 150 indiretos, durante as obras de instalação. O início da operação comercial está previsto para ocorrer até o final do ano de 2024. O investimento deve ultrapassar R$ 1 bilhão.

Ao contrário de outros parques eólicos construídos em Livramento, quando os investidores tiveram que comercializar a energia através de leilões promovidos pelo Governo Federal antes da instalação das usinas, a CGT Eletrosul vai vender a energia no mercado livre.

O edital completo contendo as instruções, especificações técnicas e condições para participação está à disposição no site da www.eletrosul.gov.br. O pregão ocorre no dia 12 de dezembro de 2021, às 9h.

Usina Cerro Chato deu a largada

Parque eólico em maio ao ambiente da Campanha gaúcha. Foto: Nélio Pinto/Divulgação

Os futuros parques irão se somar ao Complexo Eólico Cerro Chato, o primeiro investimento feito pela estatal nesse setor de fontes renováveis de energia. Pioneira no pampa rio-grandense, a usina completou dez anos de operação comercial no dia 7 de junho.

A distância é relativamente curta até a usina eólica. São cerca de vinte e cinco quilômetros do centro de Livramento. O melhor caminho é pela avenida Saldanha da Gama. O motorista anda dez minutos, passa o Prado, cruza a subestação da CEEE e segue até um trevo que dá acesso à BR 293. Na rodovia, o visitante percorre quinze quilômetros em direção a Quaraí, onde vai encontrar placas de sinalização indicando o início da estrada de terra. Bem antes dali, já dá para avistar as torres. Aliás, alguns geradores podem ser vistos da avenida João Pessoa, no Centro, que faz limite com a Trinta e Três Orientais, em Rivera. No terraço dos prédios mais altos a visão é melhor ainda.

Quem esteve visitando as obras, no final de abril de 2010, foi um convidado ilustre, o folclorista santanense João Carlos D’Ávila Paixão Côrtes.

Sob um sol escaldante, mas rigorosamente pilchado, ele circulou pelas obras, acompanhado por familiares e amigos, e se emocionou ao falar da localidade onde foi criado até os sete anos.

Paixão Côrtes durante visita ao Cerro Chato em sete de abril de 2010./Arquivo Jornal JÁ

“O Rincão dos D’Ávila estava aqui antes mesmo da chegada da imagem de Nossa Senhora do Livramento, portanto é um orgulho imenso poder voltar à minha terra e de meus ancestrais num momento de revitalização da cidade e espero que o zumbido do minuano traga desenvolvimento e conforto social para a fronteira, declarou.

Atualmente, 81 aerogeradores estão operando em sete parques, que somam 163,2 MW de capacidade instalada. Outros 27 aerogeradores continuam inoperantes devido à falência da fabricante argentina de turbinas IMPSA. A Eletrobras já decidiu alienar estes parques.

O projeto da UECC foi um dos vencedores do Leilão de Energia de Reserva do governo federal, em 14 de dezembro de 2009, o primeiro leilão de energia eólica do país.

A usina começou a ser construída em junho de 2010 e a operar em 2011, um ano antes do prazo estipulado pela ANEEL.

Melhorias nos acessos. Fotos:NélioPinto
Construção das bases das torres

 

 

 

 

 

Encaixe das hélices na turbina
Montagem do aerogerador

 

 

 

 

 

 

 

Em sua primeira etapa, entre 2011 e 2012, foram erguidos 45 aerogeradores, distribuídos em três parques (Cerro Chato I, II e III), totalizando 90 MW de capacidade instalada, integralmente sob responsabilidade da CGT Eletrosul.

Em 2014, já estavam operando outros oito parques eólicos: o Entorno 1, composto por Cerro Chato IV, Cerro Chato V, Cerro Chato VI, Ibirapuitã I e Cerro dos Trindades, e o Entorno 2, que inclui os parques Galpões, Capão do Inglês e Coxilha Seca. O projeto do parque eólico Ibirapuitã II ficou de fora do leilão de energia realizado pelo governo federal em que estes projetos foram viabilizados.

Inicialmente, o Entorno 1 tinha entre os membros do consórcio construtor a fabricante de aerogeradores Impsa, mas após sucessivos problemas a Eletrosul e demais sócios desfizeram a parceria com a multinacional argentina.

Ventos de 250km/h derrubaram oito turbinas.. Foto: Fabian Ribeiro / Agencia Freelancer

Em dezembro de 2014, rajadas de vento que chegaram a quase 250 km/h derrubaram oito turbinas no complexo eólico, todas pertencentes a Impsa. Os destroços foram recolhidos dos campos meses depois.

Em 2015, foi reinaugurado o parque Ibirapuitã I, com 12 máquinas da empresa WEG e 25,2 MW de capacidade instalada. Entre os sócios, a CGT Eletrosul (74,83%), Brasil Plural (22%) e Fundação Elos (3,17%).

Com a construção de novos parques e participações societárias, hoje, é denominado o Complexo Eólico Cerro Chato.

A energia gerada flui para a Subestação Livramento 2, unidade conectada ao Sistema Interligado Nacional (SIN).

Instalação de uma das linhas de transmissão de energia. Foto: Nélio Pinto/Divulgação

Medição dos ventos no RS tem vinte anos

 A medição dos ventos no Estado começou em 1999, quando Dilma Rousseff, secretária de Energia do governo Olívio Dutra (1999-2002), mandou medir a velocidade desse fenômeno meteorológico para produzir o Atlas Eólico do Rio Grande do Sul.

No segundo semestre daquele ano, se realizou o primeiro seminário sobre a energia eólica no RS. Nesse evento apareceram pela primeira vez os espanhóis da Elecnor que mais tarde fundariam a Ventos do Sul Energia, com sede em Porto Alegre e base operacional no litoral norte. Antes disso, apenas a CEEE, dirigida por Telmo Magadan no governo de Antonio Britto (1995-1998), havia feito alguns movimentos para iniciar a exploração dos ventos no Rio Grande do Sul.

Coordenado pelo engenheiro elétrico Ronaldo Custódio dos Santos, funcionário da Secretaria de Energia que, na época, fazia mestrado em energia eólica, o primeiro protocolo para medição dos ventos no RS envolveu a CEEE e a empresa alemã Wobben Windpower, que possuía uma fábrica de componentes eólicos em Sorocaba e montaria uma parceria com a Elecnor.

Para fazer o trabalho de campo, foi contratada a empresa Intercâmbio Eletro Mecânico, do imigrante Hans Dieter Rahn, representante de uma fábrica alemã de anemômetros (medidores da velocidade do vento).

Hans Dieter Rahn. Foto: Tânia Meinerz

As primeiras usinas em solo gaúcho foram construídas em Osório.

Os estudos em Santana do Livramento iniciaram somente em 2005, quando a Eletrosul deixou de ser proibida por lei de realizar investimentos para geração de energia elétrica.

Dilma e Lula em Osório, em 2006. Foto: Ricardo Stuckert

Naquele ano, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou uma medida provisória ao Congresso, elaborada pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, que reorganizava o setor elétrico no país e retirava as estatais do Plano Nacional de Privatizações, incluindo a Eletrosul.

A partir daí, dois funcionários da estatal foram designados para ir àquela cidade de fronteira todos os meses fazer as medições de vento, inicialmente na Coxilha Negra e, depois, Cerro Chato. Daí, surgiram os dois projetos eólicos.

Estima-se uma potência energética que pode chegar a 500 MW em uma área superior a 24 mil hectares, nessa região.

Servidores da Eletrosul na Coxilha Negra, em 2005

Os técnicos da Eletrosul Darian de Lima Guerra e Ronaldo Barros de Lima foram os responsáveis pela manutenção das torres com os ‘anemômetros’ (coleta dados) e enviar os registros. Ambos eletrotécnicos que já trabalhavam com linhas de transmissão.

Anemômetro na Coxilha Negra
Instalação da torre com anemômetro

 

 

 

 

 

 

 

“Havia três torres de monitoramento na Coxilha Negra. Como é possível expandir até cem quilômetros a medida dos ventos que é coletada numa torre, aí acharam um local tão bom como o de Coxilha Negra. Então, foi deslocada uma torre de monitoramento para o Cerro Chato para confirmar os dados sobre os ventos”, explica Darian, que hoje é chefe do Centro de Manutenção e Apoio a Operação da Eletrosul, em Santana do Livramento.

Em março de 2005, foram colocados três anemômetros no Cerro Chato. A partir de 2007, foram instalados equipamentos de medição nos municípios de Pinheiro Machado, Santa Vitória do Palmar, Jaguarão e Candiota. Em 2010, havia torres de monitoramento também em Quaraí, outro em Livramento, na Fazenda Cati, e outro em Camaquã.

Segundo Darian, há ventos melhores a região litorânea, mas naquele região de  fronteira com o Uruguai os ventos são mais constantes. E para um parque eólico o mais importante é o vento constante e não as rajadas.

O aerogerador é programado para travar automaticamente quando atinge 128km/h ou 35,5 m/s. A conversão de km/h em m/s é feita dividindo o valor por 3,6.

Na fronteira com o Uruguai os ventos são mais constantes. Foto: Nélio Pinto/Divulgação

O vento Aragano, proveniente do Sudoeste, é o mais constante. Resulta de confluências que vem do Centro-Sul do Brasil para a fronteira. Só que são épocas do ano. O famoso Minuano, do Sul, chega com mais intensidade, mas é menos constante. A proporção seria de 60% para vento Aragano e 40% para o Minuano. No litoral, predomina o Nordestão, vem do mar, mas os ventos mudam muito a direção porque depende da topografia, do clima, explica o técnico.

Com um litoral com mais de nove mil quilômetros de extensão, o Brasil apresenta condições ideais para aumentar a participação desta fonte renovável de energia na matriz energética brasileira.

 

Estado é o quinto maior produtor

O Rio Grande do Sul tem o maior potencial eólico do país e hoje é o quinto maior produtor de energia a partir dessa fonte.

O Estado tem instalados 1,836 GW de capacidade de geração de energia a partir dos ventos, mas, no momento, 1,740GW estão funcionando.

Durante o 13º Fórum Nacional Eólico – Carta dos Ventos, no final de julho deste ano, o governador Eduardo Leite informou que o RS possui, hoje, 51 novos projetos de geração de energia eólica, em 28 municípios, que somam 10,860 gigawatts.

Citou como exemplo inovador o Parque Eólico Off-Shore da Neoenergia, projetado para o litoral dos municípios de Capão da Canoa e Xangri-lá. Além disso, está em elaboração um edital de licitação para concessão, a título oneroso, de uso de áreas na Lagoa dos Patos, para geração de energia eólica.

Leite afirmou que há 51 novos projetos no RS. Foto Gustavo Mansur/Palácio Piratini

“Temos potencial ainda maior e há muitos projetos sendo destravados por conta de investimentos no nosso sistema de transmissão, que era um limitador em novos leilões de energia por dificuldades de escoamento da energia”, ressaltou Leite.

O diretor do Departamento de Energia, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Semai), Eberson Silveira, acompanha há pelo menos duas décadas o desempenho da energia eólica no Rio Grande do Sul. Participou da produção do Atlas Eólico, trabalho técnico que tornou o Rio Grande do Sul referência para a instalação de parques eólicos no país, e garante que aqui estão os melhores ventos entre os estados brasileiros.

Eberson Silveira, diretor de departamento de Energia da SEMAI. Foto: Cleber Dioni

“Temos o maior potencial eólico, com capacidade de gerar 102,8 GW de energia com torres instaladas a 100 metros de altura, em terra firme, 80 GW no mar e 34GW em lagoas. Desses 216,8 GW, 89% estão nas regiões da Campanha e Litoral Sul. Agora, se as medições de vento forem com torres a 150 metros de altura, o potencial eólico vai a 245 GW”, afirma.

“Levando em conta o que está disponível, sempre gerando, o que chamamos de fator de capacidade dos parques eólicos, que hoje é de 35%, em média, então temos 600MW de energia eólica abastecendo a rede. Mas, nos novos projetos, o fator de capacidade chega a 50%. A competição está muito alta. E quem oferecer equipamentos mais potentes, sai na frente”, completa.

Silveira ressalta que o estado está preparado para receber novos projetos pela boa infraestrutura de redes de transmissão de energia elétrica. “Em 1999, nossa demanda era maior que a capacidade de transmissão e tivemos uma série de apagões porque havia limitação no escoamento de energia. Hoje, dentro do trabalho que está sendo feito no Comitê de Planejamento Energético do Estado, não temos risco de queda, acompanhamos e projetamos a demanda com previsões de curto, médio e longo prazo.”

Brasil completa 19 GW

Os parques eólicos em funcionamento no Brasil garantiram a marca de 19 gigawatts (GW) de capacidade instalada de energia eólica, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica). A potência é superior à produção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que é de 14 GW.

Desde 2019, a energia eólica é a segunda fonte da matriz elétrica brasileira. Há 726 parques e mais de 8.500 turbinas, operando em 12 estados.

Região Nordeste agrega a maior parte da produção. Rio Grande do Norte aparece em primeiro lugar com 5,934GW de capacidade. Em seguida vem a Bahia (5,258GW), Ceará (2,406GW), Piauí (2,336GW) e o RS, em quinto lugar.

Essa infraestrutura gerou, no ano passado, 57 TWh de energia, o que, na média mensal, é suficiente para abastecer 28,8 milhões de residências por mês, o que significa uma população de cerca de 86 milhões de pessoas.

A energia produzida a partir dos ventos está chegando a atender quase 14% da demanda nacional por energia elétrica. No caso específico do Nordeste, os recordes de atendimentos ultrapassam 70% da energia produzida na região.

Até 2024, o Brasil terá pelo menos 24 GW de capacidade instalada de energia eólica.

“Dizemos ‘pelo menos’, porque esse é o valor considerando apenas leilões já realizados e contratos firmados no mercado livre. Com novos leilões, este número será maior. E é muito importante considerar a importância que o mercado livre vem tomando para o setor. Em 2018 e 2019, por exemplo, foram os primeiros anos em que a contratação foi maior no mercado livre do que no regulado.”, analisa Elbia Gannoum, presidente executiva da Abeeólica.

Elbia Gannoum, presidente executiva da Abeeolica/Divulgação

“No entanto, é bom que se explique que o Brasil poderia ser inteiramente abastecido por energia eólica. Nossa matriz elétrica tem a admirável qualidade de ser diversificada e assim deve continuar. Cada fonte tem seus méritos e precisamos de todas, especialmente se considerarmos que a expansão da matriz deve se dar majoritariamente por fontes renováveis, e a energia eólica tem sido a mais competitiva nos últimos leilões”, completa Elbia.

Limpa e abundante, eólica também gera impactos

A energia produzida a partir dos ventos é uma das mais limpas dentre todas as fontes. Não queima combustíveis fósseis e não emite dióxido de carbono. Estima-se que deixaram de ser emitidas na atmosfera 21 milhões de toneladas de CO² até agosto de 2019, equivalente ao que emite 16 milhões de automóveis, de acordo com a Abeeólica.

Abertura de vala para colocação de cabos subterrâneos. Foto: Nélio Pinto/Divulgação

No entanto, elas alteram paisagens e podem ameaçar pássaros se forem instaladas em rotas de migração. A avifauna é quem mais sofre os impactos negativos dos parques eólicos, segundo a Fepam. Emitem um certo nível de ruído (de baixa frequência), que pode causar algum incômodo aos animais.

Por isso, o monitoramento ambiental tem importância decisiva na concessão das licenças de instalação, uma vez que os dados levantados são heterogêneos e podem determinar o zoneamento dos locais em que é permitido e onde não é permitido instalar aerogeradoes ou qualquer outra obra.

Durante toda a construção da Usina Cerro Chato, uma sala no canteiro de obras foi ocupada pela equipe de meio ambiente, supervisionada pela geóloga Bibiane Michaelsen. Com as licenças ambientais aprovadas pelos órgãos municipal, estadual e federal debaixo do braço, ela orientava os trabalhadores a proceder conforme as diretrizes estabelecidas pelos estudos.

As licenças foram expedidas conforme os locais e as atividades. O licenciamento ambiental de atividades de impacto local passou a ser de competência da Prefeitura de Santana do Livramento a partir de um convênio firmado com a Fepam.

Abertura de acessos e concretagem da base do aerogerador. Fotos: Nélio Pinto/Divulgação

 

 

 

 

 

 

Foram licenciados pelo município o canteiro de obras, os acessos externos ao parque, a linha de transmissão e a ampliação da subestação Livramento 2, assim como a extração mineral, a construção de açudes e a abertura de poços artesianos.

O parque eólico, acessos internos, subestação coletora e a rede de média tensão foram licenciados pela Fepam.

Geóloga Bibiane Michaelsen. Foto: Cleber Dioni Tentardini

“Os impactos ambientais são inerentes a qualquer obra civil do porte dos parques do Cerro Chato. A implantação desse tipo de empreendimento acaba por modificar os hábitos de alguns animais, que não estão habituados à circulação de tantos veículos, além da movimentação de terra. A própria abertura de estradas mudou a paisagem e a rotina de todo aquele bioma”, observa a geóloga.

A orientação era para que os trabalhadores se protegessem e, sempre que possível, espantassem os animais, e nunca tentassem matar, até porque os animais silvestres são protegidos por lei e os animais domésticos são propriedade particular.

Com relação à flora, os capões de mata e a vegetação ciliar são protegidas por lei e não há intervenção nesses locais, além das ‘cactáceas endêmicas’ (cactos concentrados no bioma) que devem ser conservadas, algumas vezes implicando em remoção e plantio em outras áreas. Já os campos acabam por sofrer as maiores modificações, porém, todas as áreas que sofreram intervenção temporária foram recuperadas, como previsto no Programa de Recuperação de Áreas Degradadas.

Os licenciamentos também levaram em conta as Áreas de Proteção Permanente (APPs) onde foram construídos os parques eólicos no Cerro Chato. As margens de arroios e rios são consideradas APPs e não podem sofrer qualquer intervenção em função das obras. Já a Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã está bem próxima, e deve respeitar as normas que regulam aquela APA.

Morcego capturado em rede
A Coral-verdadeira. Foto Nelio Pinto

Outra questão levada em conta eram os possíveis prejuízos aos morcegos e às aves gerados pelo ruído dos cataventos. A disposição desalinhada dos aerogeradores segue critérios técnicos mas, sobretudo, as orientações dos estudos ambientais.

Antes da emissão da Licença de Instalação, por exigência da Fepam, foi feito o monitoramento da fauna durante um ano, para que fossem identificados locais de importância, tais como reprodução, nidificação e alimentação, o que então é considerado para definir a disposição final das torres, obedecendo ainda uma distância mínima de 600 metros desses locais.

O ruído pode trazer algum incômodo aos animais, mas há vários exemplos onde eles convivem bem com as torres, e quanto às aves, o maior impacto seria a possibilidade de colisão com os aerogeradores. As residências também foram levadas em conta, ficando determinado um distanciamento de 400 metros dos aerogeradores.

De posse do RAS, o órgão ambiental responsável emitiu uma LP, cuja responsabilidade para executar as condicionantes e exigências da LP ficaram a cargo da Hidrobrasil, de Canoas. Esta, por sua vez, estabeleceu uma parceria com a Geonaturae, de Erechim, para realizar os estudos de fauna.

Antes da Licença , fauna foi monitorada por um ano. Foto Nelio Pinto/Divulgação

Após a LP, ainda é preciso receber as licenças de Instalação – LI e de Operação – LO.

Seis profissionais – quatro biólogos especializados em mastofauna, quiropterofauna, ornitofauna e herpetofauna, além de universitários locais colaboraram nos trabalhos.

Rede de neblina para captura de voadores/Geonaturae
Método de identificação indireta de espécies através de vestígios dos animais/Geonaturae

 

 

 

 

 

 

 

O biólogo Valdir Coppini, especialista em morcegos, um dos três sócios da Geonaturae, explica que os estudos avaliaram se a comunidade animal da região suportaria a presença dos empreendimentos e serviram de base para sugerir mitigações ou compensações aos eventuais danos à fauna.

“Avaliamos o ambiente durante um ano inteiro, focados nos grupos de aves, mamíferos, morcegos, répteis e anfíbios, cada qual com metodologias adequadas, próprias às suas características. Utilizamos técnicas sofisticadas, como o uso de um aparelho chamado bat-detector (detector de ultrassons, que permite registrar o número de contatos de morcegos em voo), redes de neblina, para captura de animais voadores, transecções veiculares, pontos de escuta, etc. Um ponto que gostaria de destacar é que a operação dos aerogeradores está revelando um dos mais baixos impactos ambientais de que se tem notícia no Brasil. A disposição desalinhada dos aparelhos no Cerro Chato é muito bom para não atrair morcegos e gerar mortandades, bem como a grande área proporcionada pelo relevo do pampa, em que as turbinas podem estar mais distantes uma das outras, facilitando a travessia de bandos de aves”, ensina Valdir Coppini.

Ornitólogo registra as aves/Divulgação Geonaturae

A Geonaturae continua os estudos, em parceria com a Hidrobrasil, nas demais fases de instalação e operação dos empreendimentos (LI – licença de instalação e LO – licença de operação). E, atualmente, monitora os impactos à fauna causados pela operação das primeiras usinas, além da LO dos novos parques eólicos e realiza o monitoramento populacional da ave Asthenes baeri (lenheiro), espécie ameaçada que ocorre na região.

Para a realização do licenciamento ambiental de construção da linha de transmissão que ligou a subestação coletora no Cerro Chato à rede da CEEE, no Prado, foi necessário também autorização da APA do Ibirapuitã –  Área de Proteção Ambiental ligada ao ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente.

“No caso dos parques eólicos do Cerro Chato, o que passou por nós foi a Linha de Transmissão, sobre o qual nós sugerimos alteração no traçado, adequações para evitar o impacto ambiental dentro da APA”, lembra a engenheira agrônoma Eridiane Lopes da Silva, na época gestora da APA do Ibirapuitã.

O impedimento maior deve-se ao aspecto topográfico. As torres não podem ficar em áreas de Preservação Permanente (APPs), a menos de 30 metros de cursos d’água e nos cerros. Rios, banhados e cerros têm de ser preservados.

Novas expectativas para Fronteira

Praça Internacional/Cleber Dioni

As cidades de Santana do Livramento, na Fronteira-oeste gaúcha, e Rivera, no Norte do Uruguai, formam a Fronteira da Paz. São separadas por uma linha imaginária que se estende pelas zonas urbana e rural. O símbolo maior de integração é a Praça Internacional, que, como o próprio nome diz, pertence aos dois municípios. São comuns no local os eventos binacionais como feiras culturais e gastronômicas.

Elas guardam muitas semelhanças. Do alto, é uma só cidade. Ambas estão distantes cerca de 500 quilômetros das capitais Porto Alegre (RS) e Montevidéu (UY). Possuem aproximadamente o mesmo número de habitantes, entre 76 mil e 78 mil. Muito comum, também, as famílias possuírem integrantes das duas nacionalidades, os chamados doblechapas.

Do convívio permanente entre gaúchos e castelhanos, surgiu um modo único de expressar-se, batizado de Portunhol. É marcante, também a presença de italianos, espanhóis, libaneses e outras nações árabes e europeias, e, mais recentemente, de chineses e africanos.

Livramento é considerado um município de porte médio, com o segundo maior território do Estado, numa área com 6,9 mil km², atrás apenas de Alegrete. A economia é baseada na pecuária, e o clima frio característico da região, localizada no Paralelo 31, nos últimos anos atraiu muitos produtores de uva, vinho, azeitonas e azeite de oliva. Rivera tem um atrativo a mais, que é o turismo de compras nos Free-Shops.

Santana do Livramento se tornará um polo eólico com novos parques/Cleber Dioni

Ambas cidades são beneficiadas com o manancial subterrâneo do Aquífero Guarani, uma das maiores reservas mundiais de água doce, subjacente aos territórios de Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina.

E o constante vento Aragano e as rajadas do Minuano tornaram essa região do Pampa uma das mais cobiçadas para instalação de parques eólicos.

As usinas viraram símbolos da recuperação econômica da região, com benefícios ambientais, sociais e econômicos: Geram empregos, aumentam a arrecadação das prefeituras, movimentam o comércio, a indústria hoteleira e geram renda aos proprietários que alugam suas terras para os empreendimentos – estima-se que mais de quatro mil famílias recebem ao todo mais de 10 milhões de reais, mensais, dos produtores de energia eólica. E convivem com outras atividades como a pecuária e a agricultura.

No Cerro Chato, os proprietários rurais foram beneficiados principalmente com a construção de estradas e açudes, sem mencionar os royalties da energia produzida, cerca de 1% do que é gerado por cada aerogerador. Também foram colocados seguranças circulando pelos campos para cuidar dos geradores, o que ajuda a coibir o abigeato.

A geração de energia eólica representa 26% do Valor Agregado do ICMS do município, informa o advogado e economista Carlos Grisolia da Rosa, que foi secretário municipal de Desenvolvimento, de janeiro de 2007 a janeiro de 2010, época de implantação dos parques.

Economista Carlos Grisolia na Usina Eólica

“Se vivemos tempos difíceis, imaginem a nossa cidade sem os empreendimentos eólicos, que estão entre os principais vetores de nosso desenvolvimento, seria um caos”, afirma o economista.

O sentimento geral dos santanenses é de que as oportunidades de trabalho ainda têm de melhorar muito, mas as expectativas mudaram.

Muitos que trabalharam no canteiro de obras da usina eólica receberam cursos de capacitação e foram contratados para os próximos parques. Outros adquiriram experiência, aprenderam novas profissões e melhoraram a renda da família.

O motorista Denizart Silveira acompanhou diariamente os operários do início ao fim das obras. Era ele quem transportava o pessoal para a Campanha. Eram doze homens no início, entre serventes, pedreiros, carpinteiros.

Ele conta que os primeiros dias foram uma aventura: “A cada semana chegavam mais dez trabalhadores. Pegamos o pior do inverno, quatro graus negativos. Quem mais sofreu foi o pessoal do Nordeste. Teve dias que vinha aquele minuano gelado com uma garoa fininha, que o engenheiro supervisor das obras liberava os operários duas horas da tarde pra ir para casa, porque o pessoal encarangava e não conseguia trabalhar. Num desses dias, nós estávamos bem no cerro e pegamos a pior tormenta de todas, o pessoal saiu correndo e entrou para o ônibus, que balançava muito. Quase uma hora de tormenta. Um cearense caiu numa poça d’água e congelou. Mas duvido quem não gostaria de voltar pra lá, porque pagavam bem, horas extras, e muitos tiveram oportunidade de crescer”, lembra.

Silveira viu servente promovido a chefe do almoxarifado, motoristas de caminhão virarem operadores de máquinas gigantes, passando a ganhar quatro mil reais por mês.

Denizart Ribeiro Silveira/Foto: Nereo Mendes

“Foi uma tábua de salvação para operários da cidade, mestre de obras, pedreiro, carpinteiro, ferreiro, mas que trabalhavam somente durante a safra da colheita das maçãs em Vacaria ou em Santa Catarina. Conheço pai e filho que foram trabalhar em linhas de transmissão em São Paulo, funcionários com carteira assinada, e um mecânico, dono de borracharia, que lucrou muito fazendo o socorro de todos lá fora, a qualquer hora do dia ou da noite”, conta.

O mecânico é o Milton Barbo Vieira. Com vários cursos de especialização em máquinas pesadas, como caminhões eletrônicos, colheitadeiras e alguns tipos de tratores, ele prestou serviços desde o início das obras.

Muitas vezes, ele teve que acompanhar o trabalho de concretagem das torres de madrugada para socorrer em caso de algum problema porque não podiam parar o trabalho nessa fase.

– Claro que pegamos a garoa galopeada, o frio e vento que algumas vezes não tinha como continuar, e parávamos para esperar passar, e encontramos pepinos grandes na parte mecânica, mas tudo isso a gente resolve. Basta ter vontade de trabalhar, comenta.

Guindaste em meio aos animais. Foto Nelio Pinto/Divulgação

 

Novo uso da terra, fonte de renda e vantagens para os pecuaristas

 Carlos Roberto Laurindo, na época trabalhava no Departamento de Engenharia Ambiental e Fundiária da Eletrosul, foi um dos responsáveis por apresentar o projeto da Usina Cerro Chato aos donos dos campos, a maioria pecuarista.

Em dezembro de 2007, ele partiu de Florianópolis para Livramento a fim de realizar as primeiras visitas. As três primeiras usinas ocupariam 22 propriedades rurais em uma área de 3.644 hectares. A área licenciada atingiu 59 imóveis rurais em 5.665 hectares.

Carlos Laurindo, o Betinho no Cerro Chato/Cleber Dioni

“A dificuldade que tive foi não conhecer ninguém. Era eu e a camionete, um mapa e um GPS. Eles ficaram desconfiados, não sabiam direito o que era, até porque era tudo novo, até para a os funcionários da Eletrosul. Eu apresentava um pré-projeto, mostrava a disposição das torres de acordo com os estudos iniciais. Após analisarem as minutas dos contratos com seus advogados, nos reunimos mais uns dias. Alguns não quiseram, mas a maioria fechou com a gente”, explica.

 O pecuarista João Alberto D’Ávila Fernandes foi um dos primeiros proprietários rurais do Cerro Chato a assinar contrato de cessão de uso da terra com a estatal de energia. Recebeu em suas terras dois aerogeradores.

Seu João faleceu em 2020. Na época, ele explicou a necessidade que os pequenos proprietários rurais tinham de diversificar as atividades, porque a renda era mínima e de longo prazo.

Pecuarista João D’Ávila Fernandes com a muher, Leda, a filha Rosane e o neto Luciano/Foto: Cleber Dioni Tentardini

Uma das vantagens apontadas por Fernandes é que em troca do balastro retirado das jazidas para cobrir as estradas, colocaram no lugar uma terra preta, muito fértil. “Eles tiram o cascalho, que é permeável, para colocar nas estradas, fácil de secar depois das chuvas, e devolvem essa terra que não serve para eles”, ressaltou.

Outra vantagem é abertura de açudes. “O que é muito bom porque a seca maltrata os nossos animais. Com os anos, as águas estão sumindo, as vertentes estão secando”, avaliou. O que mantém o comércio pecuário da família D’Ávila é um arroio de pedra com vertentes. A água proveniente do Aquífero Guarani está a 70 metros de profundidade no seu campo.

Uma das vantagens destacadas pelo pecuarista foi a construção de açudes/Nélio Pinto

Seu João destacou ainda a circulação de seguranças pelos campos, o que acaba coibindo o abigeato. “Esses investimentos têm que tirar nosso município da miséria, porque tinha tudo aqui, empresas, frigorífico, cooperativas, uma delas abatia ao dia 2,5 mil reses, e foram todos embora ou faliram. Inclusive mão de obra qualificada, no campo e na cidade”, completou.

 

A cada ano, Brasil queima área maior que a Inglaterra

Um levantamento inédito, feito pelo Projeto MapBiomas após analisar imagens de satélite entre 1985 e 2020, mostra o impacto do fogo sobre o território nacional.

A cada um desses 36 anos o Brasil queimou uma área maior que a da Inglaterra: foram 150.957 km² por ano, ou 1,8% território brasileiro.

O acumulado do período chega a praticamente um quinto do território nacional: 1.672.142 km², ou 19,6% do Brasil, sendo que 65% do total da área queimada foi de vegetação nativa.

O estado de Mato Grosso apresentou maior ocorrência de fogo, seguido pelo Pará e Tocantins.

Embora os grandes picos de área queimada no Brasil tenham ocorrido principalmente em anos impactados por eventos de seca extrema (1987, 1988, 1993, 1998, 1999, 2007, 2010, 2017), altas taxas de desmatamento principalmente antes de 2005 e depois de 2019 tiveram um grande impacto no aumento da área queimada nesses períodos.

A estação seca, entre julho e outubro, concentra 83% das queimadas e incêndios no país.

Parte da série Brasil Revelado, do estudo do MapBiomar, mostra que, de 1985-2020, existe uma tendência de redução da superfície de água em oito das doze regiões hidrográficas e em todos os biomas do país.

O Mato Grosso do Sul é o estado com maior índice de subtração, 57%. Foram analisadas imagens de satélite de todo o território nacional entre 1985 e 2020.

Em 1991, a superfície coberta por água do Brasil era de 19,7 milhões de hectares. Já no ano passado, diminuiu para 16,6 milhões de hectares. Houve, portanto, uma redução de 15,7% no país. A perda de 3,1 milhões de hectares em 30 anos equivale a mais de uma vez e meia a superfície de água da região nordeste em 2020.

Entre os cinco biomas brasileiros, nenhum foi tão atingido como o Pantanal: 57% de seu território foi queimado pelo menos uma vez entre 1985 e 2020.  A vegetação campestre é a mais afetada no bioma, durante os períodos úmidos as plantas acumulam biomassa e no período seco, a vegetação seca vira combustível para o fogo. “Essas características do bioma, associadas a eventos climáticos de seca e fortes ventos, torna o fogo um problema a ser controlado.

Questões relativas ao uso do fogo como forma de manejo, em condições inadequadas, podem levar a ocorrência de incêndios descontrolados por extensas áreas”, alerta o coordenador do MapBiomas Pantanal, Eduardo Reis Rosa.

O pesquisador explica que o Pantanal tem uma vegetação adaptada ao fogo, no entanto, a alta frequência pode torná-lo prejudicial à biodiversidade de fauna e flora.

“Questões relativas ao uso do fogo devem ser integradas às condições de uso das pastagens, de forma preventiva, controlada e seguindo os ciclos do Pantanal e condições meteorológicas adequadas, com o objetivo de proteger o bioma”.

O mapeamento é inédito e revela todo pedaço de território brasileiro nos últimos 36 anos que sofreu com o fogo. Para Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Fogo, sabendo onde foi queimado é possível entender a dinâmica do fogo e quais as áreas que estão mais vulneráveis no futuro.

Assim, o mapeamento é fundamental para entender a frequência, intensidade do fogo, para o planejamento do combate e apontar áreas de maior risco”.

Cerrado e Amazônia representam 85% da área queimada nesses últimos 36 anos. “A Amazônia não é um bioma do qual o fogo faz parte da dinâmica natural do ecossistema, diferente do Cerrado onde o fogo natural faz parte de sua dinâmica evolutiva. ”, destaca a pesquisadora.

Para chegar a esses números, a equipe do MapBiomas processou mais de 150 mil imagens geradas pelos satélites Landsat 5, 7 e 8 de 1985 a 2020.

Com a ajuda de inteligência artificial, foi analisada a área queimada em cada pixel de 30m X 30m dos mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados do território brasileiro ao longo dos 36 anos entre 1985 e 2020, independente do uso e cobertura do solo.

Ao todo, foram 108 terabytes de imagens processadas para mostrar áreas, anos e meses de maior e menor incidência do fogo.

A resolução é de 30m, com indicação do tipo de cobertura e uso do solo que queimou, permitindo recortes territoriais e fundiários por bioma, estado, município, bacia hidrográfica, unidade de conservação, terra indígena, assentamentos e áreas com Cadastro Ambiental Rural (CAR).

O Projeto de Mapeamento Anual do Uso e Cobertura da Terra no Brasil é uma iniciativa que envolve uma rede colaborativa com especialistas nos biomas, usos da terra, sensoriamento remoto, SIG e ciência da computação que utiliza processamento em nuvem e classificadores automatizados desenvolvidos e operados a partir da plataforma Google Earth Engine para gerar uma série histórica de mapas anuais de uso e cobertura da terra do Brasil.

 

 

O Planalto Sul agora é Denominação de Origem do mel de melato de bracatinga

O Planalto Sul Brasileiro tornou-se Indicação Geográfica (IG) do Mel de Melato da Bracatinga na categoria Denominação de Origem (DO) do Planalto Sul Brasileiro.

Mel de melato de bracatinga: mais escuro, menos doce, mais sais minerais/ Aires Mariga/Epagri/JÁ
A certificação é concedida pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). A Denominação de Origem parte do pressuposto de que as características geográficas (naturais e humanas) dessa região determinam a singularidade e a qualidade do produto.

A IG do mel de melato da Bracatinga abrange 134 municípios, sendo 107 de Santa Catarina, 12 do Paraná e 15 do Rio Grande do Sul. Por sua prevalência no território catarinense, o processo de certificação teve participação da Epagri nas ações de pesquisa e extensão, em parceria com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e as associações de apicultores da região.

A Federação das Associações de Apicultores de Santa Catarina (Faasc) foi a instituição solicitante da IG, em parceria com as federações de apicultores de Rio Grande do Sul (FARGS) e do Paraná (FEPA).

Coube à Epagri a  caracterização edafoclimática (solo, clima, relevo, altitude) da região produtora, a delimitação da área geográfica de abrangência da IG e a elaboração do documento que estabelece a relação entre o meio geográfico e o produto.

Reconhecimento

“Essa IG é a comprovação da excelência do mel de melato produzido no Planalto Sul Brasileiro. Também coroa o trabalho pioneiro da Epagri de reconhecer e documentar a importância desse produto que, por suas características, se destaca internacionalmente”, ressalta a presidente da Epagri, Edilene Steinwandter. Ela lembra que a capilaridade da Epagri, que está presente em todos os municípios do Estado, dá à Empresa o privilégio de poder identificar com rapidez e precisão as peculiaridades do que é produzido no território catarinense. “Nossos extensionistas sempre caminharam ao lado destes apicultores, dando as orientações necessárias para a produção do mel de melato da bracatinga e a consequente concessão da IG”.

Everton Vieira, assistente de pesquisa da Epagri/Ciram, descreve que o mel de melato da bracatinga é um produto único, singular, que só ocorre em condições específicas de clima, altitude e condição geográfica. “Durante muito tempo esse produto não foi valorizado no país, mas a partir do envio de amostras para a Alemanha, houve o reconhecimento da qualidade desse mel típico da região do Planalto Sul Brasileiro”, relata. Ele conta que, por ser mais escuro e amargo que o mel silvestre, ele não era valorizar no mercado nacional.

Vieira pontua que a busca pela IG teve por objetivo destacar as qualidades do mel de melato da bracatinga, de modo a aumentar o mercado nacional, garantir a qualidade e a procedência ao consumidor final e preço justo aos produtores. “Mas, sobretudo, a ação tem a finalidade de promover e estimular a organização e o desenvolvimento do território onde é produzido, garantindo geração de renda e qualidade de vida aos apicultores locais”, destaca. Hoje, 95% da produção catarinense é exportada.

“Essa IG, que agrega os estados do Sul do país, pode apoiar não só a geração de valor ao produto, mas também agregar valor ao território, estimulando a geração de novos negócios e integrando setores como o agro, a gastronomia e o turismo”, afirma o diretor técnico do Sebrae/SC, Luc Pinheiro.

Cochonilha

Este mel tem compostos bioativos e antioxidantes
O mel de melato da bracatinga é fabricado pelas abelhas a partir do líquido açucarado que um inseto chamado cochonilha produz ao se alimentar da seiva da bracatinga, uma espécie arbórea nativa do Brasil, com distribuição predominante na região Sul. Esse fenômeno ocorre apenas em áreas com altitudes acima de 700 metros no Planalto Sul Brasileiro.

A cada dois anos, nos anos pares, os bracatingais são infestados por cochonilhas, que se fixam no tronco das árvores e se alimentam da seiva, excretando um líquido adocicado, o melato. Este mesmo líquido, que fica depositado nas partes externas da planta, é utilizado como matéria-prima pelas abelhas da espécie Apis mellifera para elabora o mel de melato de bracatinga.

Estudos pioneiros com mel de melato da bracatinga da região demarcada demonstraram que ele possui características diferenciadas em relação aos méis florais e de melato de outras origens. Além da presença das enzimas das abelhas produtoras, contém enzimas derivadas das secreções das glândulas salivares e do intestino das cochonilhas, que promovem a coloração mais escura (âmbar), maiores teores nitrogênio e minerais, entre outras características.

Mas seu grande diferencial são os efeitos benéficos à saúde devido à presença de compostos bioativos e potencial antioxidante. Destaque para a maior concentração dos aminoácidos livres serina, prolina, asparagina, ácido aspártico e ácido glutâmico. Apresenta ainda menores quantidades de frutose e glicose e não cristaliza como o mel floral.

Segundo Everton Vieira, o próximo desafio das equipes envolvidas no trabalho será a operacionalização e gestão da IG do Mel de Melato da Bracatinga do Planalto Sul Brasileiro. Neste sentido, uma das primeiras ações será a efetivação do Conselho Gestor, que envolve as Associações de Produtores e suas Federações nos estados do Sul do Brasil, além de representantes de todos os segmentos da cadeia produtiva, como empresários, técnicos, instituições públicas etc.

Fonte: Epagri

Governo tenta, mais uma vez, conceder Zoológico de Sapucaia à gestão privada

Em reunião virtual realizada na terça-feira (20), foi aprovado um novo edital de licitação para concessão do Parque Zoológico de Sapucaia do Sul.

A previsão é de publicá-lo no início de maio e a expectativa é de que o contrato seja assinado até o fim de dezembro.

O primeiro edital foi publicado em 2018, mas não houve interessados.

O Conselho Gestor do Programa de Concessões e Parcerias Público-Privadas do Rio Grande do Sul definiu um novo modelo de viabilidade econômica para a futura administração do local, que será concedido à iniciativa privada.

Segundo o secretário extraordinário de Parcerias, Leonardo Busatto, foi realizado um intenso trabalho de revisão do edital anterior,  para tornar o projeto mais atrativo, mas garantindo todo o cuidado com a fauna e a flora.

Desta forma, a nova modelagem não estipula valor de ingresso ao parque. Atualmente, o valor cobrado é de R$ 10 e o modelo anterior previa cobrança de R$ 15.

“A análise aprofundada dos técnicos do governo indicou que a melhor forma seria utilizar o padrão das concessões recentes e bem-sucedidas de parques federais, como o dos Aparados da Serra e o da Serra Geral. Afinal, a nossa ideia não é arrecadar com o parque, mas transformá-lo em um uma atração interessante para os usuários a partir de uma boa gestão pela iniciativa privada, com todos os cuidados que um zoológico deve ter”, reforçou Busatto.

O objetivo da concessão à iniciativa privada é estabelecer novos parâmetros de conforto para os usuários e os animais.

Por isso, o edital indicará a obrigatoriedade do administrador em obter acreditação ou certificação em bem-estar animal, implantar um controle do desempenho por parte da empresa responsável ou concessionária, assim como de satisfação do usuário e de qualidade do tratamento dos animais.

O novo edital de concessão do Zoo ainda possibilita ao novo administrador oferecer outros serviços, cujos ingressos poderão ser cobrados à parte, tais como trenzinho, safári, fazendinha, arvorismo e atrações como aves, répteis etc.

Além disso, poderão ser oferecidas atividades consideradas receitas acessórias, desde que em conformidade com a certidão de uso e viabilidade da prefeitura de Sapucaia do Sul, no equivalente a seis hectares de área, como parque de diversões, parque aquático, parque temático, centro de convenções, hotel, pousada, centro comercial, espaço gastronômico e comércio.

Pato-crioulo

 

Servidores fizeram críticas e sugestões para um novo edital

Em 4 de agosto de 2018, a Associação Zoo Melhor divulgou um documento com cinco páginas em que biólogos, veterinários e advogados apontam uma série de críticas e sugestões ao estudo de viabilidade e às minutas do edital e do contrato de concessão à iniciativa privada do Parque Zoológico, uma das três instituições vinculadas à Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, extinta no governo Sartori.

Foi produzido um vídeo explicativo sobre o documento.

O objetivo, segundo o biólogo Eduardo Polanczyk da Silva, presidente da entidade, é tornar o processo mais seguro para os animais, para o Estado, assim como para o concessionário.

Dentre os itens abordados, estão a atualização e correção de dados do estudo de viabilidade, críticas e sugestões aos critérios de habilitação para que as empresas participarem, bem como a falta de quesitos técnicos para a qualificação das empresas.

“Ficamos apreensivos com a forma displicente como os indicadores de qualidade foram sugeridos, a negligência a diversas espécies nativas e ameaçadas de extinção na lista que comporá o plantel obrigatório do Zoo, dando ênfase a espécies exóticas. Outro apontamento é a não inclusão de rinocerontes-brancos nesta lista, espécie exótica e ameaçada de extinção, e que o Zoo hospeda um casal há muitos anos”, diz Polanczyk.

Outra observação é que o Estudo de Viabilidade do Parque Zoológico  apresentou dados contidos no relatório de vistoria realizado pelo IBAMA no período de 21 a 23 de janeiro de 2015.

“Estes dados trazem o número médio de visitantes de aproximadamente 500 mil visitantes por ano. Porém, cabe salientar que este dado foi obtido no início do ano de 2015, período este em que a informação sobre a concessão ainda não circulava. Ao passo que, a partir do início da divulgação da intenção de conceder o Parque Zoológico, bem como algumas informações equivocadas divulgadas pela mídia, fizeram com que a visitação fosse de 261 mil 374 pessoas em 2015, 251 mil 264 pessoas em 2016 e 262 mil 502 visitantes em 2017, registra o documento da Associação Zoo Melhor.

Babuíno

Próximas etapas

O edital prevê a gestão, operação, manutenção e ampliação do Zoológico de Sapucaia do Sul pela empresa vencedora da licitação por um período de 30 anos. A partir da aprovação pelo conselho de PPPs, será enviado um resumo das alterações do projeto para conhecimento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e posterior análise pela Subsecretaria da Administração Central de Licitações (Celic).

O critério de julgamento será o de maior outorga fixa, sem definição de valor mínimo. Isto significa que o vencedor da licitação será quem oferecer o maior valor no leilão. O investimento obrigatório estimado em até dois anos após a assinatura do contrato é de R$ 25,5 milhões, resultando em 60% das obras necessárias. O total ao longo da concessão deverá ultrapassar os R$ 70 milhões.

Além disso, está prevista uma outorga variável de 1% da receita bruta, cujo valor arrecadado será encaminho ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (FEMA), para financiar serviços de fiscalização. Atualmente, o Zoo custa R$ 10 milhões anuais ao governo.

Entre os investimentos obrigatórios no Zoo estão a qualificação dos espaços dos animais (recintos e área de manejo), manter no mínimo 60% do plantel atual, qualificação dos serviços veterinários, novos estacionamentos, banheiros e lojas, praça de alimentação, restauração e manutenção da infraestrutura existente, além de qualificar as redes de água e esgoto. Haverá mais espaços para o público usufruir em uma área de 159 hectares. Hoje, o parque ocupa 40 hectares.

Cronograma previsto da licitação do Zoológico de Sapucaia do Sul:

• Maio: publicação do edital
• Agosto: recebimento de envelopes e sessão de abertura
• Setembro: convocação para assinatura de contrato
• Dezembro: assinatura do contrato

Com informações da SEMA/RS

MPF vai investigar suposto crime e ato de improbidade do presidente do Ibama

A 4ª CCR-MPF (Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal) determinou que a Procuradoria Regional da República no Distrito Federal abra uma investigação para apurar a atuação do presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Eduardo Bim.

Para o órgão colegiado, ligado à Procuradoria Geral da República, há indícios de improbidade administrativa e responsabilização criminal nos despachos que Bim assinou para flexibilizar as regras de exportação de madeira no Brasil.

O caso já tinha sido apurado pela Procuradoria Regional, que não encontrou irregularidades e sugeriu o arquivamento do caso. No entanto, a 4ª CCR considerou que o parecer do procurador que analisou o caso inicialmente foi baseado em uma instrução do próprio Ibama, posterior às mudanças assinadas por Bim. Com isso, as eventuais irregularidades não se aplicariam às novas regras.

Em novembro de 2019, Bim assinou o primeiro despacho que, segundo técnicos do Ibama, facilitou a circulação de madeira ilegal. Ele aprovou 1 entendimento segundo o qual 1 comprador de madeira com o DOF (Documento de Origem Florestal) não poderia ser responsabilizado se fosse constatada fraude do documento.

Um 2º despacho, assinado em fevereiro de 2020, eliminou a necessidade de autorização específica para exportação de madeira, permitindo apenas o DOF, que pode ser extraído pelo Sisdof (Sistema de Emissão de Documento de Origem Florestal), um sistema de informações do Ibama que funciona mediante autodeclaração, ou pela GF (Guia Federal), documento expedido por órgãos ambientais estaduais que não abrange todos os critérios de controle da autorização específica para exportação.

“Como a declaração no Sisdof é realizada pelo próprio exportador, ou seja, autodeclaratória, sem passar pelo controle direto do Ibama, está sujeita a erros e muitas vezes má-fé, portanto, insuficiente para o controle da legalidade do produto vegetal destinado à exportação, necessitando de ações diretas fiscalizatórias, como inspeções por amostragem in loco”, afirmou a decisão da Câmara.

“A GF-Sisflora é apenas um dos documentos que passam por inspeção do Ibama antes que seja emitida a autorização para a exportação do produto vegetal. A GF Sisflora não pode ser o único documento exigido para a exportação da madeira nativa, considerando que o Sinaflor não abrange todos os itens/mecanismos de fiscalização necessários para o controle da madeira à exportação”, acrescentou.

PODER360

Ministério Público Estadual investiga devastação ambiental em Arambaré

A Promotoria de Justiça Especializada de Camaquã, do Ministério Público Estadual (MPE), investiga o corte de vegetação e queimadas em áreas de restinga no bairro Caramuru, às margens da Lagoa dos Patos, em Arambaré.

A promotora de Justiça Fabiane Rios informa que o processo NF.01604.000.061/2021 está em fase de instrução. O município de Arambaré e a Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luís Roessler) prestaram esclarecimentos ao MP, mas falta o relatório da vistoria que a Brigada Militar Ambiental de Camaquã (Patram) realizou no local.

As queimadas e os desmatamentos foram registrados por moradores nos dias 9 e 10 de janeiro. As suspeitas são que os danos tenham sido provocados por empresas da construção civil interessadas em loteamentos e por grupos ou associações que estariam abrindo acessos para atividades com veículos de tração 4×4, os “jipeiros”.

Além do desmatamento, há o temor de que as queimadas possam ter provocado a morte de exemplares da lagartixa-das-dunas (Liolaemus arambarensis), única espécie de réptil endêmico do Rio Grande do Sul, ou seja, encontrado somente no Estado.

Lagartixa-das-dunas, única espécie de réptil endêmico do RS, apresenta camuflagem adaptada às areias das dunas da Laguna dos Patos / Foto: Tiago Quaggio Vieira/Divulgação

A promotora Fabiane pediu providências também em relação a essa espécie, que se encontra ameaçada de extinção, conforme último levantamento feito em 2014 pela Fundação Zoobotânica do RS, órgão extinto pelo governo Sartori em 2016.

O Patrulhamento Ambiental da BM (Patram) foi contatado por bombeiros mas não pode estar presente no local, por “falta de efetivo” para fiscalizar o possível crime.

O InGá (Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais) encaminhou denúncia relativa às queimadas e cortes de vegetação, em especial de butiás (também ameaçados de extinção) no dia 18 de janeiro, ao MP em Camaquã.

De acordo com um dos coordenadores daquela ONG ambiental, biólogo Paulo Brack, a queima da vegetação de restinga nativa associada à abertura da referida área para circulação de veículos acabou comprometendo não só as espécies ameaçadas de extinção mas destruiu também a vegetação protegida pela Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/2006), constituída por campos arenosos, moitas arbustivas, capões baixos, butiazais e banhados.

“As intervenções destruíram dunas e restingas formadas predominantemente por gramíneas esparsas, principalmente capim-limão, espécie produtora de óleos essenciais aromáticos, que também representam abrigos fundamentais para a existência da lagartixa-das-dunas”, diz Brack, que é professor do Instituto de Biociências da Universidade Federal do RS.

Se fosse incêndio acidental, os espaços de areia sem vegetação seriam barreiras para expansão do fogo, diz Brack

Fepam e Bombeiros negam irregularidades na área devastada

O jornal JÁ tentou contatos por inúmeras vezes, durante um mês, com a Prefeitura de Arambaré, mas não obteve retorno em nenhum momento. O tentou obter os relatórios de vistoria da Fepam e do Corpo de Bombeiros via Lei de Acesso à Informação (LAI), mas a Secretaria da Casa Civil, responsável pela LAI, não encaminhou os documentos públicos solicitados no prazo prometido.

Cerca de 40 dias depois do pedido feito pelo , no último dia 9, a Secretaria da Casa Civil enviou a seguinte resposta: “Relativo ao seu pedido de informação ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul, informamos, conforme resposta da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura/SEMA, de acordo com orientação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler – FEPAM/RS, que seja efetuado contato direto com a Polícia Ambiental.”

Butiás sofreram maior impacto com os incêndios

A assessoria de comunicação da Fepam (da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler) informou que foi realizada fiscalização no local em 27 de janeiro e não foi constatada irregularidade no local, estando presentes barreiras para impedir o acesso de veículos, sendo a fiscalização feita a pé.

Na ocasião, servidores da Fundação fizeram uma reunião na Prefeitura de Arambaré, sendo que os responsáveis acompanharam a vistoria e informaram que o Poder Público Municipal não autoriza ação de jipeiros (objeto de denúncia).

Além disso, foi informado pelo Corpo de Bombeiros a servidores da Fepam que a provável causa do incêndio foi natural, conforme relatório técnico apresentado. Em virtude dos fatos, não foram adotadas ações específicas por parte da Fepam.

Vegetação queimada

Com relação à presença de animais ameaçados de extinção no local, estudos estão sendo realizados por instituições capacitadas que participam da elaboração e execução dos Planos de Ação Nacionais (PANs), que tem como objetivo a conservação de ambientes, animais ou grupo de animais que necessitam de proteção, propostos pelo ICMBio.

As informações oriundas desses planos, e particularmente da área e da fauna em questão, já estão disponibilizadas para todos os técnicos responsáveis por licenciamentos para que as considerem em suas tomadas de decisão.

Biólogo explica importância de uma área de conservação no local

Até dezembro de 2020, a área ficou fechada para impedir o acesso de veículos na localidade. A Prefeitura de Arambaré tomou tal medida a partir das informações científicas e intermediação com técnicos do ICMBio e do grupo de pesquisa da UFRGS, ligados aos planos de conservação das espécies ameaçadas para a constituição de área de conservação,

Segundo Brack, o objetivo era justamente proteger a área de ocorrência original das espécies da fauna e flora ameaçadas de extinção, tendo em vista o crescimento de projetos de loteamentos previstos para a zona próxima às praias de Arambaré. Mas a nova administração do município manifestou-se contrária à criação de uma Unidade de Conservação.

Espécie de orquídea ameaçada de extinção / Foto: Tiago Quaggio Vieira/Divulgaçãoo

“Infelizmente, alguns gestores no Estado, em especial do Pampa, desconsideram a vocação na pecuária tradicional, os aspectos de potenciais turísticos de paisagens naturais únicas que poderiam gerar, via atividades ecoturísticas rarefeitas e orientadas por órgãos ambientais, renda compatível com a sustentabilidade ecológica de áreas prioritárias para a biodiversidade como esta, além de manter qualidade de vida diferenciada dos grandes centros urbanos ou áreas com forte antropização.

As zonas costeiras são regiões de transição ecológica que desempenham importantes funções de ligação e trocas genéticas entre os ecossistemas terrícolas e de lagunas, onde existem inclusive espécies marinhas de peixes que desovam em tipos de vegetação como juncais e sarandizais da margem da Laguna dos Patos. Muitos alevinos e organismos jovens ou imaturos destas costas vivem com influência dos ecossistemas de restingas e dunas, como insetos e outros invertebrados. Constituem-se em ambientes complexos, diversificados e de papel fundamental para a sustentação da vida da Laguna dos Patos. A elevada quantidade de nutrientes e outras condições ambientais favoráveis, como os gradientes térmicos permitem excepcionais condições de abrigo e suporte à reprodução e à alimentação inicial da maioria das espécies que habitam as lagunas e inclusive migram desde o mar. As cadeias de relações são múltiplas, desde a produção de alimento para organismos marinhos que vivem nas costas até a presença de aves migratórias que, em ciclos anuais, buscam abrigo, alimentação e descanso para viagens entre continentes do hemisfério sul e do norte.

A zona costeira interna da Laguna dos Patos, na interface entre os ecossistemas terrestres, lagunares e com alguma influência marinha, é responsável por uma ampla gama de funções ecológicas, como a proteção contra a erosão da margem das lagunas e habitat para espécies ameaçadas de flora e fauna. Cabe destacar como elemento novo de impacto o incremento da elevação do mar e das lagunas, situação que tende a se agravar até o final deste século, com a elevação provável de pelo menos 50 cm do nível atual, segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).”

 

Casan descarta proposta de moradores e diz que só Covid retarda conclusão do sistema Ingleses/Santinho

A Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, Casan, informou que a Estação de Tratamento de Esgoto em construção no bairro dos Ingleses, em Florianópolis, “só não está em operação ainda devido a contratempos gerados pela pandemia”.

“Depois de 15 anos, a obra sonhada está perto do fim”, diz a nota da Assessoria de Imprensa em resposta a um questionário encaminhado pelo Jornal JÁ.

A extensa nota (veja a íntegra abaixo) desconsidera a controvérsia sobre a colocação de duas estações elevatórias dentro de  uma área de preservação, o Parque Natural Municipal Lagoa do Jacaré das Dunas do Santinho.

Para a Casan, pelo que diz a nota, a controvérsia está resolvida desde que o Ministério Público mandou arquivar uma ação dos moradores em 2018.

A nota da Casan não considera a proposta alternativa assinada pelo Instituto Socioambiental da Praia do Santinho – ISAS, em nome do movimento de moradores, entregue à presidente da Casan, Roberta Maas, em fevereiro deste ano.

Em seu gabinete, ela recebeu uma comissão de moradores e vereadores  e prometeu uma nova reunião antes de decidir. A proposta foi encaminhada para análise no dia seguinte.

“Nós estamos há mais de mês aguardando a reunião”, disse ao JÁ o presidente do ISAS, Rafael Freitag, professor e consultor, especializado em ecoturismo, que participou da audiência com a presidente  da Casan no dia 23 de fevereiro.

A rede de esgoto é unanimidade entre os moradores, mas a localização de duas Estações Elevatórias de Esgoto projetadas  é alvo de protestos.

Estas elevatórias vão bombear o esgoto do bairro Santinho para a Estação de Tratamento no outro extremo da praia dos Ingleses.

A localização delas é questionada por um forte movimento comunitário que, pela primeira vez, une todos os públicos da região: dos pescadores descendentes das antigas famílias, aos surfistas, agentes culturais e moradores mais recentes do Santinho e Ingleses.

A proposta apresentada teve, segundo Freitag, contribuição de vários especialistas voluntários e foi, inclusive, examinada e validada por um grupo de trabalho do Conselho do Parque, composto por técnicos da Fundação Municipal de Meio Ambiente, Floram, e professores da Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC.

As duas elevatórias junto à Lagoa do Jacaré, segundo uma perícia contratada pelo Ministério Público, representam um risco para uma área de preservação permanente, podendo atingir em caso de acidente o aquífero Ingleses que abastece mais de 100 mil pessoas em todo Norte da ilha.

A  lagoa tem o formato de um estômago e alaga uma área equivalente a seis campos de futebol, com profundidade de mais de três metros. Mas a parte visível é um olho d’água com uns cem metros de diâmetro.

O restante da superfície está coberta por uma vegetação que forma um tapete flutuante sobre o qual uma pessoa pode se equilibrar sem afundar. É campo de repouso para as aves migratórias que atravessam o continente de um extremo a outro e é ninho para reprodução de fauna nativa.

A lagoa está no centro do Parque Natural Municipal Lagoa do Jacaré das Dunas do Santinho, criado em 2016, por pressão do movimento comunitário, que luta há mais de 20 anos pela preservação ambiental do Santinho.

Há três anos esse movimento de moradores, embora favorável ao sistema de saneamento, questiona a localização de duas das três “estações elevatórias” projetadas. Um delas fica junto à lagoa, outra ao lado do pequeno rio que deságua no mar.

É uma área alagadiça, com “risco médio” de inundação, onde um acidente pode comprometer seriamente até o abastecimento de água da região.

O acidente com o rompimento da barragem da lagoa de evapoinfiltração (LEI) na Lagoa da Conceição, no dia 25 de janeiro, com reflexos até agora, reforçou as teses do movimento: subestimar os riscos ambientais pode resultar em enormes prejuízos não só ambientais, mas sociais e financeiros também.

O presidente do ISAS, Rafael Freitag, diz que não são convincentes os argumentos da Casan de que a mudança de local das elevatórias vai implicar em custo maior e um novo adiamento, que pode comprometer a continuidade do projeto.

“Já foram apresentadas as alternativas de local, não precisa novo licenciamento ambiental, e o custo de mudar o lugar é irrisório, está calculado em torno de 60 mil reais. Para uma obra de 84 milhões, que já teve dois aditivos no total de R$ 11 milhões, não é problema nenhum. E a agência financiadora japonesa, a JICA, vai entender este cuidado com a questão ambiental, sempre considerada nos projetos que eles financiam”.

As elevatórias em questão representam a etapa final de um projeto de R$ 84 milhões, para implantar 58 quilômetros de redes coletoras do esgoto doméstico de toda área central dos Ingleses (áreas norte e sul do bairro) e de parte da comunidade do Santinho, alcançando 42 mil moradores.

O projeto remonta a 2006, mas só foi sair do papel em 2017, quando foi aprovado pela Agência de Cooperação Internacional do Japão e recebeu as licenças ambientais de operação.

Setembro de 2017: as primeiras escavações para colocação da rede de esgoto nos Ingleses/Divulgação/JÁ

Os primeiros valos para a canalização começaram a ser abertos em setembro de 2017. Daí em diante até o fim de 2018, as informações são constantes sobre o movimento das obras.

Depois de outubro de 2018 o noticiário cessa para retornar em janeiro de 2020, com a informação de que “mais de 50,5 Km de rede coletora de esgoto já instalados (o que corresponde a cerca de 75% do total previsto no projeto), e cerca de 10% dos serviços previstos para a construção da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) já executados”.

Agora, a nota da Casan diz que só falta concluir a Estação de Tratamento, cujas obras, em fase final, estão paralisadas por “transtornos decorrentes da Covid”.

Mas as obras da rede no Santinho, cuja etapa final começou este ano, também não estão concluídas.

Faltam pelo menos dois quilômetros da tubulação principal e faltam as três estações elevatórias de esgoto, duas das quais são objeto da controvérsia.

Como recurso extremo, o movimento dos moradores está discutindo bloquear as vias de acesso para impedir a construção das estações elevatórias dentro do Parque.

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Perguntas encaminhadas à Assessoria de Imprensa da Casan

Estou preparando para o jornal JÁ uma série sobre projetos de saneamento, principalmente aqueles que implicam envolvimento das comunidades.

É o caso do projeto de Ampliação do Sistema de Esgoto  Sanitário dos Ingleses e Santinho, em que um forte movimento comunitário reivindica a mudança do local previsto para a Estação de Tratamento, que, na avaliação dos moradores, trará  riscos ao manancial da Lagoa do Jacaré.

Minhas questões são as seguintes:

Em que estágio está  esse  projeto?

A rede coletora já foi toda implantada no Santinho?

A ETE tem já cronograma de implantação?

A verba para a conclusão das obras já está garantida?

A proposta dos moradores, de uma alternativa à localização prevista,  já foi analisada pela Casan? Há uma decisão em relação a essa demanda?

Seria possível uma entrevista com a presidente da Casan, ou alguém designado por ela para tratar deste assunto?

Elmar Bones

Nota da Casan em resposta às perguntas encaminhadas:

Todos os projetos de esgotamento sanitário suscitam movimentações das comunidades que, em geral, se mostram favoráveis ao tratamento de esgoto desde que sem proximidade com Estações de Tratamento.

Ou não aprovam o lançamento do efluente tratado em um corpo d´água, seja rio, lagoa ou mar.

No caso de Florianópolis, os desafios são muito maiores, pois praticamente todo o território da Capital é formado por Área de Preservação, seja praia, dunas, restinga, lagoas ou mangue.

E os poucos rios da Ilha são de pequeno porte e vazão limitada, dificultando a diluição do efluente tratado.

Emissário submarino? A rejeição é ainda maior.

O que a associação de moradores questiona em relação ao SES Ingleses-Santinho não é sobre a localização da Estação de Tratamento, como diz o e-mail, mas sobre duas Estações Elevatórias, que são unidades intermediárias de bombeamento.

Para tranquilizar os moradores, a CASAN se assegurou de estudos técnicos realizados ao longo de anos e de um conjunto de precauções operacionais capazes de embasar a localização de todas as Elevatórias, inclusive as que ficam próximas à Lagoa do Jacaré.

Mesmo assim, a Diretoria solicitou nova avaliação para mensurar todos os impactos que seriam causados pela eventual alteração de local às vésperas de concluir a obra.

Os reflexos, aliás, já foram foco do Inquérito Civil 06.201800000127-0, aberto justamente para apurar o assunto.

Após avaliar farta documentação e todas as alegações de inúmeros entes envolvidos, a 22ª Promotoria de Justiça do Ministério Público (MP/SC) entendeu que alterar a localização traria muito mais prejuízos do que benefícios ao meio ambiente.

“Não havendo, por ora, qualquer dano ao meio ambiente que possa fundamentar a adoção de outras providências pelo MP, pois a obra investigada trará uma melhoria das atuais condições ambientais … promovo o arquivamento”, determinou o Promotor de Justiça, Felipe Martins de Azevedo.

A decisão, tomada depois de dois anos de investigações e perícias, levou em conta que uma eventual realocação exigiria alteração do projeto, novo licenciamento ambiental, novas avaliações, novas desapropriações de áreas, um aditivo e nova aprovação da Agência Internacional de Cooperação do Japão (JICA), órgão financiador e avaliador técnico da obra.

Ou seja, a mudança traria riscos de inviabilizar o projeto que, depois de quase quatro anos de obras, já está quase entrando em operação – repetindo o que ocorreu em outras obras que estavam previstas para elevar a cobertura em coleta e tratamento em Florianópolis.

Ao longo do inquérito, a Companhia mostrou ao MP que a realocação das Elevatórias  impediria que 40 economias pudessem se conectar ao sistema já instalado, deixando essas residências sem atendimento, obrigadas a manter em operação suas fossas sépticas, justamente  em uma área de lençol freático pouco profundo.

A empresa também mostrou no processo que todas as Estações Elevatórias estão projetadas para operar com duas bombas, para que em caso de falha operacional uma delas esteja sempre em operação.

Além disso, todas a unidades do SES Ingleses/Santinho serão equipadas com Telemetria, sistema que permite monitoramento a distância e por 24 horas.

A Estação Elevatória da Bacia de Esgotamento Sanitário Nº 11, mais próxima da Lagoa do Jacaré, contará com gerador permanente, o que garantirá também seu funcionamento constante mesmo em caso de interrupções no fornecimento de energia. Uma eventual realocação dessa unidade implicaria na desapropriação de um terreno particular para a instalação do gerador, processo que costuma se estender por anos.

Por fim, a Companhia ressalta a importância do Sistema de Esgotamento Sanitário Ingleses/Santinho para a conservação do ambiente e para ampliação da cobertura de coleta e tratamento em Florianópolis.

Desenhado inicialmente na década de 1990, o Projeto Ingleses teve uma fase inicial executada entre 2006 e 2008, que pôde ser reiniciada a partir de 2017 após todos os trâmites terem sido vencidos.

Depois de 15 anos, portanto, a obra sonhada está perto do fim, faltando apenas a conclusão da Estação de Tratamento, que só não está em operação ainda devido a contratempos gerados pela pandemia.

Proposta dos Moradores à Casan

Assunto: Realocação das Estações Elevatórias de Esgoto na Praia do Santinho

Considerando que no Brasil, o saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição Federal;

Considerando que parte da “solução” apresentada pela CASAN para o esgotamento sanitário na Praia do Santinho envolve uma Estação Elevatória de Esgoto (EEE) localizada ao lado da Lagoa do Jacaré e outra ao lado de um córrego que deságua no mar, impondo risco de contaminação para estes corpos hídricos e para o Aquífero Ingleses;

Considerando que a Lagoa do Jacaré é parte integrante de Unidade de Conservação de proteção Integral, o Parque Natural Municipal Lagoa do Jacaré das Dunas do Santinho, e que é área de recarga importante para o Aquifero Ingleses – manancial que abastece uma população de mais de 100 mil habitantes do norte da ilha e que se encontra sob alta pressão;

Considerando que há três anos a comunidade da Praia do Santinho, através do Movimento Eu Sou Jacaré Poio, Instituto Socioambiental da Praia do Santinho e Associação de Pescadores do Canto Sul dos Ingleses vem solicitando a realocação das EEEs devido ao risco de contaminação dos corpos hídricos;

Considerando que a comunidade já sugeriu alternativa locacional para a EEE n. 11 (ANEXO)

Considerando o laudo pericial que compõe o Inquérito Civil n. 06.2018.00000127-0 do Ministério Público de Santa Catarina sobre apuração de possível construção de estação de tratamento de esgoto pela CASAN em área de preservação permanente, situada no Parque Natural Municipal Lagoa do Jacaré das Dunas do Santinho, que identifica possibilidades de realocação das elevatórias n. 11 e 12 na Praia do Santinho (ANEXO);

Considerando que a perícia verificou a existência de alternativas locacionais para a construção das EEEs n. 11 e 12: para a primeira foi sugerida utilização da via pública por se tratar de área sem risco de inundação e fora do limite da Unidade de Conservação, minimizando os riscos de poluição em períodos de precipitações intensas. Para a EEE n. 12, o local do projeto da CASAN é considerado Área de Preservação Permanente, sendo que a perícia sugere a realocação para 70 metros à montante do local original.

Considerando que a perícia concluiu que a área da EEE n. 12 está em área com “risco de inundação médio” e que “o extravasamento durante os períodos de inundação deverá ocorrer para a restinga (área mais baixa em relação ao local da estação elevatória), podendo atingir o espelho d’água da Lagoa do Jacaré, trazendo riscos de poluição durante períodos de intensas precipitações”. Da mesma forma, a perícia concluiu que para a EEE n. 12 o “extravasamento durante períodos de inundação deve ocorrer para a restinga, podendo atingir o rio próximo ao local de projeto da estação elevatória e/o mar, porém com risco baixo por não estar em área com risco inundável”;

Considerando que tanto a sugestão do laudo pericial quanto a sugestão da comunidade permitem que as elevatórias estejam em áreas mais facilmente acessíveis, especialmente em casos de chuvas intensas e eventuais acidentes, e de monitoramento social constante;

Considerando o Princípio da Precaução;

Considerando que o ISAS é a favor do saneamento básico, porém ressaltando que tal sistema não deve impor risco maior de contaminação em comparação aos que os corpos hídricos já estão submetidos com a poluição difusa pelo fato de estarem localizados à jusante do bairro;

Considerando a reunião realizada com a presidente da CASAN em 22 de fevereiro de 2021, na qual o ISAS enviaria uma proposta para a realocação das EEEs n. 11 e 12 na Praia do Santinho;

Considerando que o projeto das elevatórias recebeu as licenças ambientais anteriormente à criação do Parque Natural Municipal Lagoa do Jacaré das Dunas do Santinho, em 2016, portanto, esta nova Unidade de Conservação é um fator novo relevante para a realocação das elevatórias em questão;

O ISAS vem por meio deste solicitar à CASAN a realocação das elevatórias n. 11 e 12 conforme sugestão do laudo pericial visando minimizar os riscos de contaminação da Lagoa do Jacaré e do mar na Praia do Santinho;

Atenciosamente,

Rafael Freitag

Presidente do Instituto Socioambiental da Praia do Santinho