Há 20 anos ameaças fermentam na internet

Por Tiago Lobo
No fórum Dogolachan, localizado na primeira camada da Deep Web, uma parte da internet invisível aos motores de busca como o Google, adolescentes intitulados Incels (celibatários involuntários na sua linguagem), trocam informações e pedem dicas de forma anônima. Os assuntos variam desde a compra facilitada de armas, esquemas de bombas caseiras, tipos de ácidos para agredir pessoas, até troca de conteúdo pedófilo e dicas para planejar e cometer atentados terroristas.

Há um espaço, inclusive, que funciona como um confessionário. Um “padre” responde às confissões dos usuários. Um deles pede, por exemplo, ajuda após 9 dias de celibato para se livrar do vício pela masturbação que teria o tornado “impuro”…

O fórum é terreno fértil onde apologia ao crime é rotina. De lá que partiram incentivos para tragédias que mobilizam o país desde o final dos anos 90.

Até novembro de 1999, “tiroteios em massa” não eram uma realidade no Brasil. Isso era tido como um problema da terra do Tio Sam, nada Tupiniquim.

A partir de 20 de abril daquele ano o chamado “Massacre de Columbine” inundou a pauta na imprensa internacional: dois adolescentes mataram 12 alunos  e um professor, feriram outras 21 pessoas para depois se suicidarem em uma escola do Colorado, Estados Unidos. Desde 1996 os adolescentes alimentavam um site onde compartilhavam mapas e estratégias sobre o jogo de tiro “Doom”. No final de 97 já havia conteúdo sobre como construir bombas caseiras e postagens que descreviam o ódio que a dupla sentia da sociedade.

Na noite de 3 de novembro, pouco mais de 6 meses depois de Columbine, cerca de 30 pessoas assistiam ao filme O Clube da Luta na sala 5 do cinema do Shopping Morumbi, em São Paulo. Um estudante de medicina de 24 anos começou a atirar até esvaziar o pente de uma submetralhadora, matando três pessoas e ferindo outras quatro. Ele foi imobilizado quando ficou sem munição e logo em seguida foi detido pela polícia.

Advogados de defesa, na época, tentaram alegar insanidade, o que o tornaria ininputável: alguém que não tem discernimento sobre certo e errado, e possibilitaria o cumprimento da pena em um hospital psiquiátrico. Alegaram também que ele havia sofrido influência de um jogo de tiro, o clássico Duke Nukem: não colou e ele foi condenado a 120 anos e seis meses de prisão.

Um psiquiatra contratado pela família afirmou que o jovem sofria de Transtorno de Personalidade Esquizoide (TPE), caracterizado pelo distanciamento e desinteresse no convívio social e uma gama limitada de emoções em seus relacionamentos interpessoais.

Membro de família da classe média alta de Salvador, o “atirador do shopping” começou a apresentar indícios de depressão e ideação suicida aos 13 anos: queixava-se à mãe que não tinha amigos. Aos 15, durante um intercâmbio nos E.U.A, foi mandado de volta pela família que o acolheu no exterior por conta da sua agressividade e, ao retornar, passou a agredir fisicamente os próprios pais chegando a fraturar a costela de um deles.

Por recomendação médica, foi morar sozinho em São Paulo, para ter “uma vida social independente”. Na faculdade de medicina (seguindo os caminhos do pai), ingressou como aluno brilhante e foi decaindo. Introspectivo e com reações desproporcionais às brincadeiras dos colegas foi ficando sozinho. Um professor o definiria como uma pessoa “apática, diferente”. Nas primeiras férias da faculdade tentou suicídio, depois teve que sair da pensão onde morava por agredir um colega, na sequência ameaçou o porteiro de um apartamento que os pais lhe alugavam e passou a ter alucinações.

Cinco dias antes do crime, resolveu largar a medicação psiquiátrica por conta própria e fazia uso frequente de cocaína. A polícia encontraria 37 papelotes da droga no apartamento do estudante, que não pagava o condomínio havia dois meses.

Três anos depois do julgamento, a pena foi reduzida a 48 anos e nove meses de prisão por uma tecnicalidade da legislação. Hoje ele segue preso, institucionalizado no Hospital de Custódia e Tratamento de Salvador, destinado a doentes mentais.

Logo após ser detido, policiais do 96º DP perguntaram se havia alguma namorada ou amigos para avisá-los da situação do atirador. “Eu não gosto de ninguém”, ele respondeu. A primeira escola

A cidade de Taiúva, a 363 km de São Paulo foi o palco para o primeiro tiroteio em massa dentro de uma escola que o Brasil registra. Às 14h40min do dia 27/01/2003, um jovem de 18 anos armado com um revólver calibre 38 e 105 projéteis invadiu o pátio da sua ex-escola e disparou quinze vezes contra alunos, professores e funcionários. Após ferir cinco estudantes, zelador e vice-diretora, se matou com um tiro na cabeça. Uma das vítimas ficou tetraplégica.

O colégio estadual Coronel Benedito Ortiz, cena do crime, foi frequentado pelo atirador durante toda sua vida escolar. À época a diretora da escola, Maria Luiza Gonçalves Oliveira disse para a imprensa que eram muito amigos e que “ele nunca deu problemas, era educado, sempre andou bem vestido”.

A polícia concluiu que o atirador teria cometido o crime motivado por revolta, devido ao bullying que sofria por ter “problemas com peso”. Em 1999, segundo a diretora Oliveira, o jovem conseguiu emagrecer quase 30 quilos.

Filho único de família simples, o pai trabalhava no campo e a mãe dona-de-casa, o atirador de Taiúva era tido como bom aluno, sem problemas com disciplina e sem inimigos. Saía pouco e não tinha namorada.Luto nacional

O caso que teve maior repercussão na imprensa e comoção pública, levando a então presidente Dilma Roussef a decretar luto nacional, teve início na manhã de 7 de abril de 2011.

Um rapaz com 23 anos, ex-aluno da Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro de Realengo, na zona oeste do Rio de Janeiro, invadiu a instituição armado com dois revólveres calibres .32 e .38 e abriu fogo contra alunos deixando 12 crianças mortas (10 meninas e 2 meninos) e 17 feridas. Uma sobrevivente que foi entrevistada pela TV Record logo após o crime revelou que o assassino atirava nas meninas para matar e nos meninos para ferir.

Após ser baleado na perna por um policial, o atirador se matou.

Os investigadores apuraram que a motivação seria vingança por conta do bullying que sofria. O jovem já havia chamado de “irmão”  o atirador que matou 32 pessoas na Universidade Virginia Tech, nos E.U.A., em 2007. Este último venerava os autores de Columbine. O autor do massacre em Realengo também se identificava com o atirador de Taiúva.

Ele chegou a deixar um vídeo onde dizia ter sido vítima de “bullying”. “Muitas vezes, aconteceu comigo de ser agredido por um grupo e todos os que estavam por perto debochavam, se divertiam com as humilhações que eu sofria sem se importar com meus sentimentos”, declarou em a nota suicida. Nela também havia instruções de como deveriam ser feitas a retirada de seu corpo e o sepultamento. Nenhuma pessoa “impura” poderia tocar no cadáver. Análises do computador do jovem mostraram que ele constantemente fazia pesquisas sobre terrorismo e se identificava com Osama Bin Laden.

15 dias após o massacre nenhum familiar compareceu ao Instituto Médico Legal para liberar o corpo do atirador: ele foi enterrado como indigente.

Padrões se repetem

Mesmo com um intervalo de tempo, parece que o efeito de um atentado em massa se desdobra em cascata.

Em setembro de 2011, 5 meses após Realengo, uma criança de 10 anos atirou contra sua professora e, em seguida, cometeu suicídio na escola Professora Alcina Dantas Feijão, no município de São Caetano do Sul, do ABC paulista.  O crime ocorreu às 15h50min, após uma discussão em sala de aula. A arma foi um revólver calibre .38 que pertencia ao pai da criança, um guarda civil. Ambos foram socorridos com vida, mas após duas paradas cardíacas o menino foi declarado morto às 16h50. A professora sobreviveu. Os investigadores chegaram a afirmar que o menino era “manco”, que sofria gozações dos colegas e esta seria a motivação do crime, mas abandonaram a tese.

Em outubro de 2017 um adolescente de 14 anos matou dois colegas e feriu outros quatro ao disparar uma pistola .40 da mãe, que assim como o pai, era policial militar. O crime ocorreu no Colégio Goyases, em Goiânia (GO). Segundo os colegas, o jovem era constantemente chamado de “fedorento”.

Este ano, o ataque ocorrido na escola paulista Raul Brasil, em Suzano, no dia 13 de março, deixou 10 mortos e 11 feridos, por dois jovens encapuzados que abriram fogo nas dependências da instituição. Suspeita-se que os atiradores tenham sido frequentadores do Dogolachan, onde são celebrados como heróis.

Acompanhe as reportagens da série:

Identidades culturais, democratização da mídia e a onda de golpes: uma pauta de integração

Guilherme Castro é cineasta e jornalista, professor na ULBRA e doutorando em cinema na Universidade Anhembi Morumbi/SP. Presidiu o Conselho Estadual de Cultura e a Associação de Cineastas do RGS (APTC-RS) e dirigiu a programação da TVERS. Participou da fundação do Foro EntreFronteras.
Três países, várias culturas
A travessia é de balsa, no Alto Rio Uruguai. De Porto Mauá, pouco além de Santa Rosa, noroeste gaúcho, chega-se à margem argentina, no porto de Alba Posse. Estamos na Província de Misiones, cuja capital é Posadas. É uma estreita faixa de terra da Argentina, entre o Brasil e o Paraguai. Uma região de cultura guaranítica comum aos povos, mas também de afluência de imigrações diversas, que se estende até Foz do Iguaçu, no Paraná. Já fiz essa viagem outras vezes para mostrar filmes e para a integração do cinema e da política do audiovisual com colegas e amigos dos países vizinhos. A partir da cidade de Oberá, por iniciativa do líder e jovem cineasta Axel Mansu, faz dez anos iniciamos o Foro EntreFronteras1, integrando realizadores e políticas de audiovisual das Províncias do Nordeste da Argentina, do Paraguai e do Rio Grande do Sul, Brasil. O Santa Maria Vídeo e Cinema2 (Luiz Alberto Cassol, parceiro e incentivador desde então) e o Oberá en Cortos3 (dirigido por Axel) foram os centros dessa integração, mas também houve diversas atividades em outras províncias participantes e mesmo em Assunção (Paraguai). Participei diretamente do EntreFronteras entre 2007 e 2011. Em julho de 2016, retorno a convite ao 13º Oberá en Cortos4.

Travessia do Alto Uruguai, entre Porto Mauá e Alba Posse.
Travessia do Alto Uruguai, entre Porto Mauá e Alba Posse

Identidades culturais e democratização da mídia
A integração, e sobretudo a valorização e proteção das identidades culturais dessa região de tríplice nacionalidade ocorrem no âmbito da implantação da Lei dos Meios na Argentina (2009), da criação da TV Pública Paraguay (2011) e também das políticas públicas de cultura e comunicação do Brasil no período.
O tema é político e atual5. O movimento é pela resistência e afirmação das identidades culturais dos povos. Além de reencontrar os companheiros dessa jornada, nessa viagem a Oberá constato avanços concretos no desenvolvimento descentralizado e democrático do audiovisual e da mídia, mas também as consequências do atual contexto político da região. Agora, os golpes de Estado no Paraguai e no Brasil e os retrocessos ultraconservadores também na Argentina transformam o ambiente e atualizam a pauta da integração.
Na Argentina, as medidas de democratização da mídia são mais profundas e até agora também mais estáveis. Já no primeiro Governo Cristina Kirchner, a Lei dos Serviços de Comunicação Audiovisual (dos Meios) foi aprovada no Congresso e convalidada pela Suprema Corte, sob forte pressão popular. Entre os princípios democráticos da regulamentação de 2009 estão a limitação aos oligopólios, o fortalecimento das emissoras comunitárias e a proteção e promoção da cultura e produção regionais e locais. A Lei foi parcialmente implementada.
Nesse contexto presenciamos, no âmbito do EntreFronteras, o surgimento de toda uma cadeia de produção e exibição de conteúdo audiovisual, por produtores locais. Segundo os realizadores Pablo Testoni, de Santa Fé, e Juan Ferreira, de Misiones, houve uma explosão do audiovisual, porque a Lei exige a produção e veiculação de conteúdos locais, mas o processo não se completou. Para eles, o poder econômico segue controlando a mídia. Testoni é da Cooperativa de Produtores Audiovisuais Imagica e da Associação Nacional de Produtores Cooperativados ContAr – Contenidos Argentinos. Ele avalia que houve dois processos: um social e legítimo, da Coalização por uma Radiofusão Democrática (a “massa crítica” que sustenta o embate), e outro econômico, que manteve o controle sobre os meios de comunicação. Explica que os veículos alternativos, mesmo com a Lei, seguiram com pouco alcance ou viabilidade. Se a rádio pequena, afirma como exemplo, não tiver relação com os grandes grupos econômicos, não sobrevive.
Oberá em cortos
Oberá em cortos

Juan Ferreira, da Produtora da Terra e organizador do Festival, aponta que a Lei dos Meios perde a eficácia porque os organismos de fiscalização foram desmontados. Uma das primeiras medidas do Governo Macri foi a dissolução da Autoridad Federal de Servicios de Comunicación Audiovisual (AFSCA). Deste modo, segundo eles, não há mais como verificar a proporcionalidade de conteúdo, nem proteger as culturas e linguagens minoritárias, conforme dita a Lei. Na Argentina, concluem, o retrocesso é via eleições, mas mediante a atuação do poder econômico para impedir a continuidade das mudanças, e agora Macri promove o desmonte da Lei dos Meios.
No Paraguai, também muito próximo a nós por esse território, conforme Sady Barrios, jovem cineasta de Assuncion, pela primeira vez se dava importância e criavam políticas de proteção às culturas locais. Mas em apenas dois dias, em junho de 2012, o golpe parlamentar destituiu o Presidente Fernando Lugo. Barrios integrava a equipe de implantação da recém criada Televisão Pública Paraguay, que durante semanas, apoiada por manifestantes, resistiu ao golpe. Ela enche os olhos de lágrimas ao relembrar que de súbito o sonho foi interrompido.
Em nossos diálogos em Oberá, constatamos que outro traço comum aos atuais golpes políticos é a criminalização dos movimentos sociais. No Paraguai, líderes populares foram os únicos julgados e, há poucos dias, condenados a até 35 anos de prisão pelo polêmico massacre de Curuguaty, o pretexto para a destituição do Presidente.
No Brasil, aonde não temos uma Lei dos Meios, o governo golpista que destitui a Presidenta Dilma tenta de imediato extinguir o Ministério da Cultura e intervém de modo direto e ilegal na Empresa Brasileira de Comunicação (criada em 2007), que opera a TV Brasil e outros veículos. Aqui, o projeto que se destinava a construir e fortalecer a comunicação pública está sendo interrompido e desmontado.
A resistência e o líder luminoso Oberá
A afirmação das identidades culturais é o gesto político de resistência que motiva a promoção e integração do audiovisual da região. Axel Monsu, diretor do Oberá en Cortos e também do Instituto de Artes Audiovisuais de Misiones, enfatiza que “não é tradição, porque é um processo vivo. A todo o momento, desse lugar, acontece o exercício da identidade e da diversidade, e isso define o que sou frente a outra cultura”.
Os golpes no Paraguai e no Brasil se assemelham, mas a agenda de retrocessos na Argentina também é intensa. No que diz respeito a centralidade da pauta da democratização da mídia e da cultura, no Brasil, as iniciativas foram tímidas, e agora sofrem riscos de serem perdidas. Talvez os envolvidos não percebam tanto, e no Brasil nada foi noticiado, mas na Argentina foram dados passos mais importantes para a democratização da mídia.
O tema da integração não é novo, mas está longe de ter amadurecido e ganha atualidade e redobrada importância. Tão próximos na geografia e na cultura, a geopolítica nos afasta e os liames que nos ligam permanecem quase sempre ocultos. Porém, Oberá significa em Guarani ‘o luminoso’, ‘o resplandecente’. É o nome adotado pelo Cacique que liderou a resistência muito singular, através da cultura, à ocupação espanhola da região no Século XVI. A travessia da fronteira, o gesto de afirmação da cultura e de integração abarca muitos sentidos possíveis e pertinentes6, de resistência e construção democráticas.
 
Cacique Oberá
Cacique Oberá

Carta de Oberá
Carta de Oberá

 
1 https://www.facebook.com/ForoEntreFronteras/
2 http://www.smvc.org.br/?secao=quemsomos
3 http://www.oberaencortos.com.ar/
4 A Mostra brasileira do 13º Oberá en Cortos teve Boa Ventura, roteirizado e dirigido por mim, adaptando Porteira Fechada, de Cyro Martins, além dos documentários Edmundo, de Luiz Alberto Cassol, sobre o dramaturgo santa-mariense Edmundo Cardoso, e Mais uma Canção, sobre o universo musical de Bebeto Alves, dirigido por Rene Goya Filho e Alexandre Derlam, três filmes que tratam do tema das fronteiras e culturas regionais.
5 Durante o 13º Oberá en Cortos, entre 12 e 16 de julho, entregamos e lemos carta do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito esclarecendo as circunstâncias do golpe no Brasil.
6 Durante o 13º Obera en Cortos reunimos mais uma vez o Foro EntreFronteras, que lançou nota sobre novas ações de integração frente ao atual momento político.
A LA COMUNIDAD ARTÍSTICA INTERNACIONAL REUNIDA EN EL 13ER ENCUENTRO INTERNACIONAL DE REALIZADORES OBERÁ EN CORTOS
(de 12 a 16 de julio de 2016)
Les traemos aclaraciones acerca del Golpe de Estado que ocurre en Brasil contra la Presidenta de la República, Dilma Rousseff, ¡que se reeligió democráticamente en octubre de 2014!
1) El recurso de destitución está previsto en la Constitución brasileña. Pero la ley también exige el respeto a un rito procesal (algo que la oposición golpista intentó incumplir en 2015, pero que el Supremo Tribunal Federal -STF– ha impedido) y a la comprobación de la práctica de crimen de responsabilidad por parte del gobernante;
2) Es en este punto que el proceso contra la Presidenta Dilma está totalmente desprovisto de legitimidad, ya que no la acusaron de ningún crimen. Nunca hubo acusaciones y denuncias formales contra Dilma. Ella no responde a ningún tipo de acusación por parte de la Justicia brasileña;
3) A la vez, son numerosas las denuncias de corrupción contra políticos de partidos que objetivan destituir a la Presidenta Dilma, incluso de partidos derrotados en las elecciones de 2014. Entre los políticos que integran el primer escalón del gobierno interino de Michel Temer, varios son acusados de corrupción, hecho que provocó la caída de dos Ministros.
4) Otra información relevante es la de que la pieza de la destitución pide el alejamiento de Dilma de la Presidencia de la República, en razón de prácticas llamadas “pedaladas fiscales”1 y del uso de créditos adicionales, que son meras prácticas contables y administrativas y que jamás han sido juzgadas por el Congreso Nacional brasileño.
Esa es la verdad: Dilma es acusada por algo que aún ni siquiera ha sido juzgado por el Poder Legislativo brasileño (Diputados Federales y Senadores). Entonces, ¿cómo pueden derrocarla por dichas prácticas si estas ni siquiera han sido juzgadas?
Aunque las llamadas “pedaladas fiscales” fueran consideradas crimen de responsabilidad fiscal, y susceptibles a drásticas penas, los peritajes técnicos realizados concluyeron que Dilma Rousseff no tuvo responsabilidad directa por tales medidas contables.
5) Además, dichas prácticas son comunes y rutinarias en nuestro país, y no configuran cualquier tipo de crimen. Otros Presidentes de la República (Fernando Henrique Cardoso, por ejemplo, que es uno de los líderes del movimiento golpista que busca derrocar la presidenta Dilma) también han usado estos expedientes;
6) Además, 16 Gobernadores de estado (como es el caso de Geraldo Alckmin del PSDB, que apoya el Golpe de Estado contra la Presidenta Dilma) han hecho uso de dichas prácticas y nunca han sido acusados o juzgados por ello.
Nadie jamás ha pedido la destitución de estos gobernantes por dichas prácticas, lo han hecho solo para Dilma, lo que configura la práctica de una política de dos pesos y dos medidas;
7) Otra información importante, y sobre la cual los golpistas que desean derrocar a Dilma no comentan: el presidente interino Michel Temer también ha firmado decretos que autorizan dichas “pedaladas fiscales” y el uso de créditos adicionales por parte del gobierno federal. Sin embargo, la oposición golpista no pide su destitución, lo que muestra que no hay seriedad ninguna en ese proceso.
Si se considera que utilizar estos recursos configura crimen de responsabilidad (lo que nunca ha sido y que no es este el caso), ¿por qué, entonces, la oposición golpista no pide la destitución de Michel Temer?
¿Por qué esa oposición golpista desea derrocar solamente a la Presidenta Dilma, si Michel Temer, uno de los líderes de las articulaciones que buscan derrocar la gobernante del país, ha firmado decretos semejantes?
8) Por lo tanto, el actual movimiento político, que se desarrolla en nuestro país y que está liderado por numerosos políticos que responden a acusaciones en la Justicia, es un caso clásico de Golpe de estado, pues intenta derrocar a una gobernante, la Presidenta Dilma, sin el debido respaldo de la Ley.
Como lo ha dicho la Presidenta Dilma: “Si los golpistas no respetan ni siquiera los derechos de la Presidenta de la República, no respetarán los derechos de los ciudadanos comunes”.
9) Hoy, bajo el gobierno interino de Michel Temer, están en proceso de desmantelamiento los avances realizados por los gobiernos del expresidente Lula y de la Presidenta Dilma en lo dice respecto al petróleo, considerado por ellos un recurso fundamental para la emancipación social de los brasileños. Dicho desmantelamiento está directamente relacionado a los intereses estratégicos de EEUU. El protagonismo que Brasil ha alcanzado en la última década, con su política externa de alianza con países de América del Sur, África, Asia y Leste Europeo, es uno de los motivos centrales del golpe en andamiento. Lo que está pasando sigue la misma lógica de otros golpes de estado ocurridos en nuestro continente.
10) Además del desmantelamiento de la política de explotación nacional del petróleo, el gobierno interino está organizando el desmantelamiento de las políticas de valoración del sueldo mínimo y de la protección de los derechos laborales. Además, ya propusieron la reducción de recursos disponibles para las políticas de educación y salud, a través de la limitación constitucional de los recursos financieros que pueden ser utilizados en esas dos áreas.
11) En el área cultural, una de las primeras medidas del gobierno interino fue el intento de extinguir el Ministerio de la Cultura, volviendo a incluirlo en el Ministerio de la Educación, como era en el pasado, cuando aún no se había desarrollado en el país la red de actividades y de profesionales que hoy actúan en dicha área. Tras una gran movilización de artistas e intelectuales en todo el país, incluso con la ocupación de órganos del Gobierno dedicados al desarrollo de la cultura, el gobierno interino retrocedió en su decisión. Sin embargo, actualmente, las políticas de incentivo a la producción de bienes culturales están amenazadas, representando un gran retroceso para la producción cultural brasileña.
12) El ambiente en el que se articulan y crecen las fuerzas favorables a la destitución de la Presidenta Dilma está marcado por una importante intolerancia política y comportamental, con el crecimiento de manifestaciones machistas, homofóbicas y racistas.
13) El golpe en andamiento en Brasil trae graves consecuencias económicas, sociales y culturales para gran parte del pueblo brasileño y representa un enorme riesgo de retroceso en el proceso de construcción de la democracia. Ese no es el camino que buscamos, ni para Brasil, ni para el continente sudamericano. Por ello, les traemos a todos, artísticas e intelectuales presentes en el 13er Encuentro Internacional de realizadores Oberá en Cortos, informaciones sobre lo que está ocurriendo en nuestro país y les rogamos solidaridad en la lucha de resistencia democrática brasileña.
¡GOLPE NUNCA JAMÁS! ¡DEMOCRACIA SIEMPRE!
Firma el Comité en Defensa de la Democracia y del Estado Democrático de Derecho – Brasil
Contáctennos e infórmense más:
E-mail: comitedemocracia@gmail.com
Facebook: https://www.facebook.com/comiteemdefesadademocracia/
Página Já: http://www.jornalja.com.br/comite/
1 Supuesta violación de normas fiscales para maquillar el déficit presupuestal.

O ambiente do golpe: o Brasil midiatizado e colonialista e dois filmes atuais

Guilherme Castro*
O ambiente cultural em que prosperou o golpe mostra o Brasil altamente conectado nas mídias de hoje, mas alienado. Um país tão ‘dentro’ do mundo contemporâneo e, ao mesmo tempo, ainda colonialista.
O papel e os efeitos da mídia na crise política brasileira vão além e são mais profundos do que a manipulação direta e generalizada pró golpe das grandes empresas de comunicação. Uma das maiores estranhezas desses dias é perceber nas próprias redes sociais, entre debates e mesmo em manifestações de rua, os efeitos do que está sendo chamado de ‘a bolha midiática’. Os espaços de contato e debates entre diferentes são mínimos, e conversamos sempre entre iguais. A sociedade midiática é radical ao dar forma ao Brasil de hoje: atua um estranho e contemporâneo efeito de impermeabilidade e transparência da diferença. É o que explica o prof. Gelson Santana em Representação e formas da diferença na cultura midiatizada de hoje (2016):  “a experiência do saber desaparece no fluxo incessante de informação” e, complementa, a estratégia é “sermos encapsulados pela midiatização da cultura”. Esses traços sensíveis marcam o Brasil e a crise atual: a espécie de ‘revolução de direita’ que pretendem em pleno 2016 se ampara na ampla massificação e alienação. É presente, por exemplo, que a maioria dos alunos chegue à graduação com quase total desconhecimento da história e da realidade brasileira, por mais próxima que esteja.
A resistência, por isso, é também e sobretudo entender os acontecimentos históricos e ter memória – papel e valor centrais da produção artística. Dois filmes recentes, O mercado de Notícias (Jorge Furtado, 2014) e Que horas ela volta? (Anna Muylaert, 2015), nos ajudam a entender o ambiente cultural e midiático da crise política que o Brasil atravessa.
Expressão do estilo e modo de pensar de Furtado, O Mercado de Notícias mistura documentário, ficção, gêneros e ironias ao tema de fundo: o filme procura desvendar o papel do jornalismo na sociedade brasileira atual. Há duas linhas narrativas principais: a série de entrevistas com grandes nomes da imprensa, e a representação e ensaios da peça teatral O Mercado de Notícias (The staple of News), escrita pelo inglês Ben Jonson, que em 1626 já ironizava e criticava as mazelas do incipiente e recém surgido jornalismo.
O filme O Mercado de Notícias vai ao ponto: qual o poder político e como operam o jornalismo e a grande mídia no Brasil? Narrando casos conhecidos de erros ou manipulações grosseiras da mídia (exemplos do falso Picasso na repartição do INSS, em Brasília, e da Escola Base de São Paulo) e com as entrevistas sobre o dia-a-dia da profissão, o longa traça um quadro em que vigora o mau jornalismo, cujo resultado notável é uma massa de pessoas desinformadas.  A apuração, a difícil busca da certeza, da objetividade e da isenção, o compromisso ético com os envolvidos e com o público, tornam a profissão do jornalismo altamente pulsante no dia-a-dia. Mas essas práticas profissionais, que já eram raras, desaparecem das grandes mídias. Fica evidenciada a crise da profissão.  Quando o jornalismo mercadoria abandona qualquer disfarce e se joga ao golpe, hoje, dois anos após o lançamento, O Mercado de Notícias se torna uma obra essencial, um excelente filme sobre o nosso tempo.
Igualmente revelador, embora de forma muito diferente, é  Que horas ela volta?, de Anna Muylaert. O filme narra a situação de conflito que se cria quando a filha da empregada doméstica Val/Regina Cazé é recebida e se hóspeda na casa dos patrões (a família de Dona Bárbara/Karine Teles). O filme teve grande repercussão porque o público se identifica com as personagens do microcosmo social que a narrativa constrói, muito típico e revelador do Brasil de hoje. Na família burguesa, a empregada doméstica convive no dia-a-dia, numa relação de trabalho que possivelmente só exista nesse país e envolve fortes vestígios do servilismo típico das sociedades coloniais – situação difícil de explicar a um estrangeiro, mas que todos aqui conhecem. Entre os conflitos do filme, a filha de Val, vinda do interior do Nordeste, é inteligente, curiosa, focada, e, por isso, passa no difícil vestibular que faz, em contraste à falta de motivação e infantilidade do jovem filho dos donos da casa. Que horas ela volta? mostra o que talvez seja a maior de todas as novidades trazidas pelas políticas sociais: a possiblidade de ascensão entre classes, e o desgosto que causa nos que se apegam, mesmo que simbolicamente, a privilégios arcaicos.
O filme constrói o ponto de vista raro da cozinha da casa; pelo olhar simples, mas sábio, da doméstica Val, conhecemos o vazio de afetos em que se tornou a família burguesa de Bárbara. É um drama social, profundo e até difícil de digerir, por certeiro na crítica que faz, mas o tom é jocoso, irônico e leve.
A diretora Muylaert apreendeu algo que infelizmente constitui um traço muito atrasado do Brasil. A personagem Bárbara tem o rei na barriga, expressão de uso corrente, que expressa um comportamento típico. Revela um estranho vestígio material do tempo do Império, ainda um pensamento escravocrata, que ficou em nossa cultura com grandes consequências também na política.
Um dos motivos do golpe, a rejeição, por parcela importante, de qualquer ação de Governo que diminua a enorme desigualdade social histórica do país está ligado também a esse traço pré-republicano ainda tão marcante.
O Brasil entrou no contemporâneo, está inteiro no mundo midiático, tomado e fortemente constituído por um novo tipo de sociedade e cultura. Ao mesmo tempo e de modo paradoxal segue colonialista, no âmago. Essa força do passado tenta se sobrepor ao presente.  Que seja espécie de último suspiro, e que a superação do golpe, que acontece sobretudo nas ruas e nas mídias, traga avanços muito maiores na construção da Democracia. Há essa chance.
[avatar user=”X-CDD – Guilherme Castro” size=”thumbnail” align=”left” /]* Guilherme Castro é cineasta e jornalista, professor na ULBRA, e doutorando em cinema na Universidade Anhembi Morumbi/SP. Presidiu o Conselho Estadual de Cultura e a Associação de Cineastas do RGS (APTC-RS).