Felipe Uhr
Pela terceira vez em 2015, o ato festivo do coletivo Cais Mauá de Todos – que questiona a concessão e o projeto de revitalização da antiga área portuária de Porto Alegre – movimentou a noite de sábado (23), na avenida Sapúlveda, centro da Capital.
Em quase quatro horas, os manifestantes expuseram seus principais argumentos contra a obra, que prevê, além do restauro da área, a construção de três torres de 100 metros, um shopping center e estacionamentos para 4.500 automóveis.
A proposta do grupo é seguir realizando encontros mensais para debater o assunto. “Desde março, foram três atos festivos. Queremos manter essa regularidade”, explica a radialista Katia Suman.
Katia é uma das fundadoras do grupo que cobra maior participação popular no debate sobre o projeto. Para o coletivo, o desenho proposto pelo consórcio Cais Mauá do Brasil – e acatado pela prefeitura e Governo de Estado – não foi discutido com a sociedade. “É uma descaraterização do patrimônio histórico da cidade” defende a comunicadora.
Os ativistas não veem vantagens inclusive nas contrapartidas de R$ 36 milhões, propostas pelo consórcio à prefeitura. “As obras fecham o Caís para a cidade. É tudo maquiagem”, completa.
Além das noites de música e debate, o coletivo atua em outras frentes, como o questionamento jurídicos que está sob análise da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul.
A advogada Jaqueline Custódio destaca que há clausulas que não foram compridas pelo consórcio dono do negócio. “Não foram apresentadas as garantias financeiras do projeto e após ganha a licitação, não foi apresentado um projeto consolidado no período de 120 dias”, condena.
Por fim, o grupo comanda estudos para pressionar o tombamento da paisagem do Cais pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), protegendo assim, a área de alterações físicas.
Noite de sábado terminou com chuva
O manifesto pacifico teve início pelas 20h do sábado e contou com presença de aproximadamente de 500 pessoas. O público era um pouco menor que em atividades anteriores, porque havia ameaça de chuva que havia desde o final da tarde – o que se transformou em realidade próximo da meia noite, quando os participantes se dispersaram.
Com uma pequena alteração em seu cronograma, o evento começou com a palestra do engenheiro Jorge Luís Stocker que destacou a importância do lugar para a cidade, fazendo uma reflexão histórica e patrimonial do espaço.
O ato seguiu com a palestra do especialista em redes sociais Marcelo Branco, que destacou movimentos incentivados exclusivamente pela internet. Um processo que teve seu ápice no Brasil em 2013, com as manifestações de junho. Branco reafirmou a importância das redes sociais nesse processo: “é importante que isso seja discutido e debatido nas redes”.
A fala de Marcelo foi seguida por um vídeo onde personalidades, pensadores, manifestantes, sociólogos e moradores se mostravam contra o projeto atual.
Após o vídeo, foi a vez do sociólogo João Volino ocupar o microfone. João resgatou o processo histórico do atual contrato, ressaltando pontos em desacordo contra o Plano Diretor como a altura dos edifícios, de 100 metros, quando o máximo permitido na cidade é de 52 metros. A autorização para utilizar padrões construtivos acima do previsto na lei pode ser solicitada quando o empreendedor protocola na Prefeitura um projeto especial, como é o caso do Cais Mauá.
O sociólogo ainda sublinhou que a construção de um shopping irá desfavorecer o Mercado Público e o comércio de porta de rua, característico no centro da Capital. Volino pediu três coisas: “Queremos participação popular, transparência e legalidade”.
Conexão contra a privatização de espaços públicos
As palestras encerraram com a participação da advogada gaúcha, Liana Cirne Lins, uma das envolvidas do Ocupe Estelita, via skype e depois telefone direto de Recife. Na capital pernambucana ativistas lutam há um ano contra a demolição da área portuária para a dar lugar a torres.
Liana classificou esse tipo de projeto como um “estrupo histórico” para as cidades. Destacou a luta travada em Recife e também as manifestações contra a privatização de espaços públicos, hoje rotineiros em todos lugares do mundo.
Um dos palestrantes esperados, o historiador Eduardo Bueno faltou ao evento devido a compromissos profissionais.
Após os discursos e pedidos de uma maior discussão entre prefeitura e sociedade, as manifestações tiveram continuidade com atrações musicais de duardo Pitta, The Jalmas, Tonho Crocco, Tribo Brasil e Yanto Laitano e dos Dj’s Rafa Ferretti (Pulp) e Maurício Cunha (Fiesta Latina).