Coriscos no céu da pátria

GERALDO HASSE
Seja lá como vai terminar esta estranhíssima campanha eleitoral, a liderança do deputado carioca Jair Bolsonaro nas pesquisas de intenção de voto nos faz lembrar de coriscos políticos que riscaram o céu da pátria em momentos críticos de nossa história.
Primeiro foi o histriônico Janio Quadros, eleito em 1960 e renunciante após sete meses em Brasília, onde colocou de lado a vassourinha anticorrupção e passou a buscar a saída dentro de uma garrafa.
Depois foi Fernando Collor, que renunciou para não ser demitido pelo Congresso após dois anos e meio (1990-1992) de um governo fissurado por medidas radicais como o confisco das contas de poupança popular, a abertura às importações e o fechamento de empresas estatais.
Dois anos atrás, a primeira mulher a presidir o Brasil foi tirada do cargo por um movimento político inspirado numa campanha de moralização da administração pública, cuja cúpula foi oportunisticamente acusada de se deixar contaminar pelo vírus da corrupção empresarial-privada. Nada de novo no tric tric do poder.
O nome oficial dessa campanha é Operação Lava Jato, liderada pelo Ministério Público, com apoio da Polícia Federal e o respaldo do Poder Judiciário e da Mídia.
Seus alvos principais são os governos do PT e seus aliados políticos (PMDB, PP e siglas menores) e parceiros empresariais, especialmente empreiteiras de obras públicas encomendadas por estatais.
Desde o início, a Operação Lava Jato foi comparada à Operação Mãos Limpas, realizada na Itália há cerca de 30 anos com o objetivo explícito de extirpar a influência da Máfia sobre a administração pública.
Muita gente boa (“tutti buonna gente”) foi presa na Itália mas, alguns anos depois, ascendeu ao poder a figura do empresário da mídia e cartola do futebol Luigi Berlusconi, ainda por cima envolvido em escândalos sexuais.
Segundo algumas interpretações veiculadas pela mídia, Berlusconi seria a ressaca após o porre moralista da Mãos Limpas.
Um risco semelhante ronda o Brasil na figura do deputado carioca Bolsonaro que, desde os ataques verbais à deputada gaúcha Maria do Rosário (“Não te estupro porque Você é feia”), passou a encarnar a figura emblemática do tosco, irado, primário, desequilibrado, machista, atrasado, racista etc.
Sua candidatura à Presidência parecia uma simples bravata de alguém buscando “aparecer”. Meses depois, ei-lo liderando as pesquisas de intenção de voto, ungido recentemente por um atentado que o manteve fora dos debates de TV.
Em resumo, o Brasil está na iminência de colocar no Planalto um corisco visivelmente despreparado para o cargo.
O fato emergente é que, agora começa a ficar claro, ele não está sozinho nessa parada. Por trás de sua campanha há um estado maior que pouco aparece enquanto seu candidato a vice, o general Mourão, solta faíscas em palestras pelo Brasil e o seu assessor econômico, Paulo Guedes, ameaça vender o que resta das estatais brasileiras.
A situação é tão paradoxal que, paralelamente à ascensão do ex-militar carioca, vem crescendo outra figura emblemática, o “promoter” paulista João Dória, que se elegeu prefeito de São Paulo e quer ser governador para, então, se lançar à Presidência — tudo isso em vôo solo, à revelia dos colegas de partido.
Alguém poderá argumentar que tais aberrações políticas são próprias do subdesenvolvimento cultural que caracteriza o Brasil, mas cabe perguntar se não está na hora de excluir do cenário essas figuras que, frequentemente ancoradas em alguma religião ou rede de TV, ocupam cargos públicos para alavancar posições no mundo dos negócios.
Afinal, a política é a convergência das melhores ideias em favor do bem comum. Pregar retrocessos, desprezando direitos elementares das pessoas, é o fim da picada.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Estamos vivendo um momento muito rico no Brasil: em pleno exercício da democracia, corremos o risco de cair no totalitarismo”
Donaldo Schüler, 86 anos, professor aposentado de literatura na UFRGS e autor de vários livros sobre as irradiações da cultura grega sobre o mundo moderno
 

O tempo não é linear – ou a política que dá voltas

MARÍLIA VERONESE
Fecho os olhos e de repente sou de novo uma estudante de 21 anos e não mais esta professora de 50, que hoje escreve para não enlouquecer. Estou num comício do Lula em Porto Alegre, o ano é 1989, acho que o mês é setembro, mas pode me falhar a memória nesse devaneio… Olívio tem cabelo e bigode pretos, Tarso é um galã intelectual de baixa estatura, tem pouca mulher no palanque (tinha alguma? Já não lembro bem), todos cantavam “Lula lá” (o jingle da campanha), empolgados. A sombra do candidato da Globo, o “caçador de Marajás”, dissipava-se naquela empolgação. Iríamos eleger o primeiro presidente operário da história da nação. Viva! Que entusiasmo! CORTA.
Outra cena no mesmo ano, novembro; estudantes da PUC caminham em direção ao estacionamento daquela universidade. Classe média umas, média alta outras. Iam de carro pra faculdade (eu dividia carro com irmão e ia quando dava).  “-Não estou gostando do rumo dessa eleição”, diz uma eleitora do Brizola.    “-Eu devia ter votado no Brizola…” responde a outra que caminhava ao lado dela. “-Em quem tu votou?” pergunto eu, eleitora do Lula. “No Maluf”, responde a outra. Penso cá comigo, “Mas quem raios vota no Maluf e poderia votar assim, de sopetão, no Brizola?!” sem entender nada. Me calo. Ao final daquele dia, confirma-se: Lula e Collor estavam no segundo turno. Apertado. Brizola em terceiro, quase foi ele a duelar com Collor (AH! SE LULA E BRIZOLA TIVESSEM SE UNIDO, BATÍAMOS O COLLORIDO NO PRIMEIRO TURNO![1]) grito eu desatinada. [Mas cada um tinha seu próprio projeto de ser presidente e não abriria mão, não é mesmo?!] Bom, logo Brizola avisa que precisará engolir o sapo barbudo e declara seu apoio a Lula no segundo turno. Nova esperança. Vamos lá. Comício com multidão e cantoria. Muita gente esperançosa, ou seria iludida…? CORTA.
Na manhã da confirmação da eleição do Collor, saio de casa com a cara fechada. Amarro uma fita preta no braço, pra simbolizar o luto. Perdemos, não adianta, o Brasil nunca será justo. As elites e a classe média inculta e vil não deixam. Vou pro estágio de psicologia clínica comunitária no Campus Aproximado da PUC na Vila Fátima. Lá pelo menos posso fazer alguma coisa pelo povo da periferia. CORTA.
Tomo um susto, abro os olhos. Volto à minha pele atual e já tenho meio século de existência, que baque. Eleição presidencial novamente. O fascismo ronda, é ainda pior que em 89. Collor era um canalha, mas fingia discurso democrático, apesar de conservador e moralizante.  Hoje – e me certifico de estar em 2018, olhando no espelho -, perdemos aquele mínimo pacto social de democracia, mesmo que fingido. Nem as aparências se salvam mais, ou tentam enganar. As pessoas deliram abertamente nas redes sociais, acham lindo ser violento e estúpido, acreditam em mentiras absurdas, acham que todo maluco por aí ter uma arma na mão vai solucionar a violência (mesmo que seja óbvio que vai agravá-la e muito). Candidatos a presidente exaltam o nome de torturadores que levavam crianças para ver a mãe ser brutalmente torturada. Seres ignóbeis dizem que é mentira. Onde estou? Será na mesma Porto Alegre que elegeu Olívio em 89, iniciando um ciclo de democracia participativa que nos botou no mapa do mundo com o Fórum Social Mundial, no início dos anos 2000? Fico tonta e tudo se confunde com David Gilmour cantando Wish You Were Here[2] ao fundo. Começo a cantar também. CORTA.
Acordo e aceito. Não, não é a mesma Porto Alegre. É uma cidade triste, emburrecida, esburacada. Não se abre mais para receber Noam Chomsky ou Vandana Shiva ou Boaventura de Sousa Santos.  Tá mais pra convidar o Alexandre Frota (dou uma escapada de volta a 89 pra lembrar da Claudia Raia dizendo que o Collor era bem nascido e não iria roubar, ela que foi casada com o Frota) ou o Olavo de Carvalho. Tá mais pras madames cheias de botox que tomam Rivotril com Veuve Clicquot para espairecer, nos seus condomínios fechados, as bandeiras do Brasil penduradas nas sacadas (e fotos delas em Miami e Orlando em cima da bancada de mármore).
Essa é a nova estética. E toda a estética tem uma ética, como dizia Paulo Freire… ou era o contrário? A toda ética acompanha uma estética? Enfim. A estética atual é grotesca, agressiva, quer exterminar aquilo que não se acomoda bem em seu mundo de plástico e mármore, cheio de preconceitos e ódios. De gente que adora postar fotos em lugares lindos e de manter “boa aparência” na vitrine social dos “bem-nascidos”. Aliás, lembram quando se pedia “boa aparência” nos classificados de emprego?! Depois, graças ao pacto democrático mínimo que conseguimos estabelecer, isso ficou parecendo discriminatório. Todos têm direito a um emprego, a trabalhar e receber salário digno, mesmo quem não tiver a “apresentação ideal”. Discriminação é anticonstitucional… Gentes! Isso tá acabando, viram? Os anúncios de emprego voltarão a exigir “boa aparência”. E talvez peçam também por “mulheres de direita”, que seriam mais limpas, higiênicas e belas. E quem diz essas estultices está com boas chances de ser eleito pelo voto popular.
Quem são os culpados da hecatombe ético-estético-política por que passa o Brasil? Muitos acusam o PT, porque dizer “a culpa é do petê” virou o maior lugar comum nacional. Mas eu vejo essa culpa bastante diluída (e o petê tem parte dela, sim). Prefiro falar em responsabilidades a falar em culpa, e quando se pensa no que o maior partido do país virou, em nível nacional, é realmente preocupante. Como essa estratégia para as eleições presidenciais de 2018 foi traçada? Em plenárias democráticas com amplos debates e votações? Pelo que soube, foi por decisão pessoal de Lula. O dono do partido é um líder carismático adorado e inquestionável, aquele da tipologia weberiana. Instituições democráticas não podem funcionar assim.
Não nego que o cara é um fenômeno, realmente. De boia-fria a operário sindicalista a deputado constituinte e a presidente da república! Que pegou uma onda favorável na economia e fez programas sociais louváveis – embora dentro dos preceitos de uma economia neoliberal de mercado -, tirando milhões da miséria, levando água a regiões secas (o programa das cisternas é uma lindeza), abrindo a universidade para os pobres. Quem mais tem essa trajetória no Brasil? A da Marina é bonita também, mas como chegou a presidente, o Lula é o próprio self-made-man. Com ele, os pobres começaram a acreditar que era possível, que podiam ser o que quisessem, que podiam sonhar alto. Lideranças populares entre os catadores de material reciclável eram apontadas como possíveis futuros presidentes do Brasil e, obviamente, foi a figura do Lula que os inspirou a aspirar.
E foi aí que as elites do atraso, para citar Jessé de Souza, da rapina eterna desse país, acharam que bastava. Era preciso manter o esquema escravagista que os sustenta no topo da pirâmide social e podendo explorar os pobres à vontade, sem serem incomodados.  A primeira coisa era destruir Lula como fonte de inspiração; demonizá-lo, destruí-lo moralmente. E começaram a campanha. Como a política no Brasil desde sempre se fez com conchavos, não demoraram a achar algum (quando seus políticos amigos participam, escondem-nos cuidadosamente). E foram pra cima, com tudo. Escarafuncharam toda a vida de Lula e nesse meio tempo criaram-se fakes a vontade, tendo o “Lulinha” sido apontado como dono de metade do Brasil, da Friboi etc. E as madames acreditaram em tudo porque convinha ao seu modo de vida, e botaram a bandeira do Brasil na janela, porque eram limpas, de direita e estavam longe da corrupção.
Os que fuçavam a vida financeira do Lula não achavam muita coisa, então um apartamento meio fuleiro no Guarujá-SP teria de servir, pronto (ué, mas ele não era o gênio do crime?!). Até barco de lata serviu. Criaram a onda, a mídia insuflou o ódio e pimba!  Estava aberto o baú dos horrores e seus shows diuturnos.
E cá estamos, em outubro de 2018. Falta só um ano pra completar três décadas que me separam daquela menina que estudava psicologia e queria um mundo mais justo, porque tinha aprendido que era o certo, que a justiça para todos seria o ápice da humanidade. Justiça sempre foi a palavra que mais me encantou, tenho-a até tatuada na pele. Mas como foi que chegamos até aqui, mesmo?
Empresas de mídia de massa, com seus jornalistas coniventes, pusilânimes e puxa-sacos (“podemos tirar, se achar melhor”)[3]; partes do poder judiciário e legislativo, igualmente pusilânimes, desonestos e que impediram uma presidenta honesta, mas acusada de estelionato eleitoral, porque tinha de “servir a dois senhores”: o “mercado” que lhe exigiu Levy e o povo que lhe exigia seus direitos. O dinheiro acabou, ela tentou manter os direitos do povo, fez manobras fiscais e… sofreu deposição. Foi um golpe, porque não havia razões para isso. O que houve foi uma manobra de gente muito rica e poderosa usando palhaços e palhaças plastificados e com cabelo acaju, no congresso nacional e no senado federal, gente da pior qualidade cuja feiura e falta de ética foi descoberta no dia 17 de abril de 2016. Usaram ainda uma figura patética que volta e meia era possuída pelo demônio e girava camisetas no ar, e que na absoluta crise ético-estética do país foi alçada ao papel de “advogada brilhante”. Isso sem falar em juízes de piso medíocres e obcecadamente partidários. Como essa gente horrenda tomou conta? O que os artífices de um país mais justo e decente fizeram de tão errado? Como chegamos ao ponto crítico em que estamos?
Muito já se escreveu tentando responder; eu inclusive, aqui nesta coluna. Cursos foram ministrados em aulas na pós-graduação, Brasil afora. Teve racismo, teve machismo, teve classismo e demais preconceitos, de vários tipos. Mas teve também falta de visão para usar estratégias e ferramentas de comunicação com mais sabedoria, nomear um STF mais digno e competente (fico pensando no meu colega de Unisinos, o grande jurista Lênio Streck, sonho com ele entrando lá e chutando uma daquelas porcarias pra fora), dialogar muito mais com as bases e saber fazer mea culpa pública quando necessário, sensibilizando o povo e não permitindo que a pecha de “corrupto” colasse, ou seja, estratégia. CORTA.
Eu e muitos companheiros e companheiras que foram às ruas em 2016 e voltaram agora em 2018 pedíamos, desde a farsa do impedimento-golpe, que se formasse uma frente ampla democrática, do centro à esquerda do espectro político (podendo incluir uma eventual direita democrática, que eu estou achando que nem existe no Brasil), para salvar um projeto de Estado democrático de direito. Uma sociedade alinhada com os valores dos objetivos de desenvolvimento sustentável, que sucederam os objetivos do milênio da Organização das Nações Unidas. São dezessete e podem servir de horizonte normativo para sociedades democráticas, para orientar sua norma jurídica. Coisas como “acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável; acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”… e por aí afora. Conheça os demais no site abaixo, nesta nota rodapé[4].  Se o coiso ganhar, nos afastaremos cada vez mais de todos eles.
Mas não foi possível fazer a frente democrática (afinal, como em 89, cada qual tinha seu projeto de poder ou presidência, não é?) e os que não quiseram compô-la têm responsabilidade nessa tragédia que vivemos. E ainda pode piorar muito. Querem nomes? Só alguns, completem a lista: Lula tem culpa, Ciro tem culpa, Marina tem culpa, FHC tem culpa. Esperávamos mais de todos eles. Esperávamos a frente democrática capaz de criar um novo pacto social para substituir o da Nova República, depois de 30 anos. Não sou mais aquela menina de 20 anos. Não tenho mais aquela sensação de ter toda a vida pela frente. Militei pelas Diretas Já aos 16 anos, estreando naquela ocasião em passeatas, quase sempre violentamente reprimidas pelas cacetadas e bombas da BM, mesmo quando pacíficas (aliás, quando a recomendação da ONU vai ser seguida e as polícias desmilitarizadas e democratizadas?).
Domingo passado (29/09/18) fomos às ruas bradar por decência, justiça, dignidade, por mais amor e menos ódio, por direitos iguais para todos, por liberdade, que são alguns dos sentidos do #elenão. Estávamos alegres e esperançosas. As pesquisas da semana, manipuladas ou não (e não o podem ser em demasia, ou os institutos perdem a credibilidade), foram balde de água fria. Parece que o Brasil das horrorosidades, das aberrações ético-estético-políticas está na frente. E podem eleger a vilania e a barbárie, enterrando pactos democráticos, ou prendendo-os em masmorras com Brilhante Ustra montando guarda. CORTA.
Respiro profundamente. Se eles têm espíritos sinistros e sombrios, nós temos os espíritos da luz nos guardando. Marielle encarnará em cada jovem mulher que no dia 29 de setembro foi às ruas, e com ela mais e mais flores brotarão do asfalto. Os netos de Chico Buarque também são compositores…, porque apesar daqueles todos, amanhã vai ser outro dia. A vida se reproduzirá e trará novas perspectivas de ação. Novas gerações de amantes da justiça crescerão e a buscarão incansavelmente; e a potência disso tudo haverá de trazer melhores dias de novo. O pacto será resgatado da masmorra. CORTA PRO FUTURO.
Nos aguardem. A gente já chega já!
 
Referências
[1] No primeiro turno, Fernando Collor teve 20,6 milhões de votos (o equivalente a 28% do total). Lula teve 11,6 milhões de votos (16,08% do total), conquistando a vaga do segundo turno numa disputa apertada com Leonel Brizola, que obteve 11,1 milhões de votos, apenas 454.445 a menos (cerca de 0,5% do total de votos). Fonte: http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/eleicoes-presidenciais-1989/o-primeiro-turno.htm
[2] http://www.youtube.com/watch?v=IXdNnw99-Ic
[3] http://www.cartacapital.com.br/blogs/midiatico/podemos-tirar-se-achar-melhor-podemos-2154.html
[4] http://nacoesunidas.org/conheca-os-novos-17-objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel-da-onu/

Espectro verde-amarelo

No início do ano, a lógica política indicava dialeticamente que a tendência conservadora do eleitorado brasileiro se fixaria na figura do candidato católico que governou São Paulo nos últimos anos.

Surpreendentemente, o tal Chuchu não decola. A dez dias das eleições, não foi além de 8% das intenções de votos declaradas em pesquisas.

Abaixo dele estão Marina Silva, Alvaro Dias, Amoedo e Meirelles. Juntos, os quatro não somam 12%.

O jurista Miguel Reale Junior, profeta do último impeachment presidencial, fez as contas e tentou criar uma candidatura única em lugar das cinco acima. Era uma jogada pró-Chuchu, mas deu em nada.

Em compensação, o conservadorismo se deixou atrair pela pregação desvairada do deputado ex-militar que abona o estupro, prega fuzilamentos e promete a privatização escancarada de estatais, entre outros despropósitos.
Sem conseguir um aliado civil para o cargo de vice, agregou à sua chapa um general da reserva que, subversivamente, prega a intervenção militar no governo.
Estariam os brasileiros com saudade da ditadura militar? Pode ser, mas com que base? Já se passou tanto tempo que a maioria da população não possui uma avaliação correta daquele período encerrado em 1985/88.
Tampouco se tem noção de onde pode parar um governo inspirado na doutrina militar, que se fundamenta no uso da força para eliminar os inimigos.
A pergunta que fica no ar é: se no mundo o Brasil vive uma situação de paz, quem dentro do país seriam os inimigos dos militares? Os artistas, para começar? Mais importante ainda, quem seriam seus amigos de verdade? Os banqueiros, talvez. Os fabricantes de armas, com certeza. E qual seria o partido político do fundo do coração dos militares, se a eles fosse permitido filiar-se? Direita, esquerda ou centro? Ora, ou são de direita ou de centro; não se conhece um militar que se declare de esquerda.
Como lembrou o jornalista Antonio Martins no site GGN, vivemos uma situação paradoxal: a maioria da população desaprova as principais medidas do governo Temer, que arde no inferno da mais profunda impopularidade, mas está prestigiando os candidatos que apoiaram o impeachment da presidenta Dilma e se dispõem a levar adiante reformas antidemocráticas.
É verdade que as coisas ainda estão confusas. A uma semana da eleição, nenhum candidato chegou a 30% das intenções de voto. Porém, somando as tendências das correntes de direita e de esquerda, a vantagem é da primeira, com mais de 40% dos votos. Mesmo que a chapa militar caia por sua absurda incivilidade, a tendência majoritária é que seus eleitores migrem para algum candidato de pendor autoritário.
A menos que ocorra uma reviravolta inesperada, temos então em perspectiva a continuidade e o aprofundamento do golpe político que há dois anos e meio afastou a presidenta eleita em 2014. Isso, focalizando apenas a Presidência da República.
Uma análise completa dos desdobramentos do atual quadro político precisa considerar o resultado das eleições para os governos estaduais e a nova composição da Câmara e do Senado, onde, aparentemente, haverá pouca renovação dos mandatos.
Há portanto dois perigos visíveis no horizonte político brasileiro. O primeiro é que o extremista militarista vença as eleições presidenciais e passe a praticar suas ameaças, bravatas e promessas. Como ele não tem equilíbrio para governar, a tendência é que transfira as responsabilidades para terceiros, seu vice em primeiro lugar.
Um governo de extrema direita é algo sinistro em todos os sentidos. “Na dúvida, lembre-se de que um governo autoritário serve mais às elites do que ao conjunto da sociedade”, escreveu a economista Laura Carvalho, professora da Universidade de São Paulo, em artigo em que sintetiza o governo Pinochet, que ficou no poder por 16 anos no Chile.
O segundo perigo é que o candidato da Esquerda seja eleito e, sem maioria no Congresso, logo comece a escorregar nas cascas de banana jogadas pela mídia branca a serviço do famigerado Mercado, que é elitista, globalizado e essencialmente antidemocrático. Ou, seja, a mecânica do golpe pode se manter ativa operante, contra a vontade majoritária do eleitorado.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Estávamos numa caminhonete robusta, na companhia daqueles homens a quem nunca tínhamos visto e cujas maneiras e aparência eu nunca imaginara que viesse um dia a ver de perto. Nenhum deles usava farda ou qualquer signo exterior que revelasse sua função. Tampouco a caminhonete era uma viatura de polícia que pudesse ser reconhecida como tal. Isso emprestava aos seus modos decididos mas vulgares um ar sinistro. Depois de rodarmos por muito tempo por ruas de São Paulo, vimo-nos pegando uma grande estrada. Quando pedimos explicação para esse fato, eles nos disseram com rudeza que não tínhamos o direito de fazer perguntas. Mas conversavam entre eles sem procurar esconder que rumávamos para o Rio.”
Caetano Veloso na página 351 do livro Verdade Tropical(Companhia das Letras, 1997), contando o dia de sua prisão, com Gilberto Gil, em 27/12/1968, duas semanas após o AI-5.

O voto anti-PT vai para Ciro Gomes

Haddad e Ciro disputarão o segundo turno. Bolsonaro alimentou o ódio ao petismo. Não avança mais simplesmente porque ninguém confia nele, nem no vice, sedento pra acabar com a democracia. Aliás, um não confia no outro. General Mourão foi desautorizado a participar de debates entre os vices. Patacoada sem fim.
Além do mais, os empresários não confiam em Bolsonaro, nem os banqueiros, tampouco a imprensa, as Forças Armadas, ninguém confia. Acham que ele é o Jânio Quadros piorado, o Collor em P&B. Quem tem muita grana guardada não quer mais saber de medidas tresloucadas.
Alguns notáveis anti-petistas já declararam que não votam em Bolsonaro – Arnaldo Jabor, Claudia Raia, Reinaldo Azevedo, Fernando Henrique Cardoso. A pá de cal foi a manifestação da jornalista radical anti-petista Rachel Sheherazade. Disse que, “como mãe, não poderia apoiar o ódio”.
Podem não admitir publicamente, mas os anti-petistas apostarão todas as fichas em Ciro Gomes, o único capaz de fazer frente a Haddad. Os conservadores irão optar pelo voto útil, naquele que tem mais condições de vencer o PT.
E Alckmin? Está inerte, quase morto, atropelado por inúmeras acusações de desvio de dinheiro públicos que pesam contra suas administrações e contra os caciques do PSDB. O velho Meirelles tira onda com ele, sugeriu que Alckimin desistisse da candidatura e o apoiasse. Os ‘mui’ amigos do tucano já avisaram que a debandada é certa.
Bolsonaro tem apoio daqueles pastores vidrados nos “bezerros de ouro”, como alertava Brizola; sustenta abertamente o ódio a tudo que é diferente e a todos que discordam dele; é um crítico do bolsa família mas não vê problema no uso do auxílio moradia pra pagar prostituta; brada contra a corrupção mas aceita 200 mil em propina de empreiteira através do partido; acha que mulher, negro e índio são inferiores aos homens “bem-nascidos” – seja lá o que isso quer dizer – e que o sangue dele é melhor do que o de um gay – defendeu isso na tevê, acredite -; acha que mulher tem que ganhar menos porque engravida; o cara é a favor da tortura e lamenta que a ditadura militar não matou mais!
Os eleitores convictos do Bolsonaro provavelmente aprovam tudo isso. E ninguém vai mudar esse conceito deles. Mas não são maioria. Aliás, fazem parte da minoria da população que o seu candidato tanto despreza.

Cobertura

A eleição mais eletrizante desde a redemocratização merece pífia e burocrática cobertura jornalística.
O noticiário limita-se a um registro insosso do que dizem os candidatos e de suas andanças, o que é uma repetição do que está no horário eleitoral no rádio e na tv.
As entrevistas, mesmo aquelas pomposas com dez perguntadores, ficam ao nível do noticiário superficial, de onde os repórteres tiram suas perguntas. A falta de informação é encoberta pela agressividade, quando se trata de certos candidatos.
Os debates, com sorteio de questões e de quem pergunta para quem, lembram os primórdios dos programas do Silvio Santos, sem a animação do auditório.
As restrições impostas pela Justiça Eleitoral, que a imprensa aceitou passivamente, contribuem, certamente. Mas longe de justificar a falta de jornalismo num momento em que a democracia mais precisa de informações confiáveis.
Fica evidente a falta independência para abordar certas questões. Não falta inteligência, falta liberdade. Exceções confirmam a regra.
É por isso que a melhor cobertura da eleição está sendo feita pelo espanhol El Pais, em sua edição para o Brasil.
 
 

Retrato do Brasil canalha

GERALDO HASSE
O Brasil que se faz ouvir e ver na maioria das emissoras de rádio e TV, obrigadas por lei a transmitir a propaganda eleitoral, expõe sem dó a mixórdia cultural que espelha a canalhice dominante. Todos querem fazer parte do circo responsável pela exploração da boa fé do povo mergulhado na ignorância.
A maioria dos candidatos fala em combater a corrupção, gerar emprego e distribuir a renda. Nada mais óbvio.
Examinando as propostas feitas pelos presidenciáveis, salvam-se poucas novidades. Por exemplo, Ciro Gomes (PDT) cresceu nas pesquisas ao sacar o lance de livrar as pessoas do Serasa, no qual estão pendurados mais de 60 milhões — um terço da população ou mais da metade do povo trabalhador.
É uma proposta aparentemente exequível, mas depende de um acordo operacional com os bancos, que não costumam dar pontos sem nós. Ademais, é um lance que pode ser executado por qualquer um, dando como resultado um alívio temporário. Do jeito que a máquina de endividamento funcione, logo o povo estará novamente com a corda no pescoço.
Por isso, a proposta mais importante do ponto de vista sociocultural foi apresentada por Fernando Haddad (PT), que promete a desconcentração da posse dos meios de comunicação — coisa que os governos petistas ensaiaram e não tiveram coragem de fazer, mesmo dispondo de um projeto elaborado pelo jornalista Franklin Martins, que conhece o assunto por dentro.
Evidentemente, o alvo central é a Rede Globo, que combina uma grande competência técnica a uma profunda capacidade de manipulação jornalística, habilidade que se espraia por outros departamentos como os de telenovelas e esportes.
A matriz do problema é que a Globo opera como um complexo cultural que se considera tutor do país, zelador das mentes e explorador dos corações dos brasileiros.
Tamanha distorção não seria tão grave se essa rede sediada no Rio de Janeiro tivesse ideias próprias e/ou independentes.
O pior da história é que a Globo se sente à vontade como agente de ideias alienígenas. A rede não é do tipo vira-lata. É de raça treinada para abanar o rabo aos gurus do famigerado Mercado, que só tem olhos para as roletas viciadas do rentismo favorecedor das cúpulas excludentes.
No programas ditos de jornalismo, somos forçados a assistir a uma matilha de lulus engravatados trabalhando diuturnamente para encher a cabeça dos teleouvintespectadores com algumas ideias prontas, sempre as mesmas. Acostumaram-se a menosprezar a inteligência dos “leitores”.
Enquanto isso, velhos perdigueiros bons de serviços são colocados em programas noturnos onde se resignam a recolher cacos de audiência. Isso quando não precisamos ver goiabeiras dando mangas fora de época.
Verdade que tais espetáculos não são exclusivos da Globo. Outras emissoras operam com o mesmo afã neoliberal, sem demonstrar paciência ou vontade de ouvir os outros lados das histórias, como deveria ser normal na mídia.
Não há dúvida de que o poder da Globo precisa ser diluído entre grupos menores, mas nem isso garante a pluralidade ideológica desejável nos meios de comunicação de um país democrático.
Por isso, é necessário que o povo eleja um presidente consciente de que o domínio globocrático sobre os brasileiros é apenas um dos aspectos mais notórios da desigualdade de oportunidades vigente no país.
Tal como acontece com as redes de rádio e TV, a má distribuição de renda reflete o enorme volume de privilégios expressos na legislação tributária, na posse de terras, no controle dos meios de produção e na acumulação de propriedades em geral, inclusive no volume de aplicações financeiras e depósitos bancários das minorias. Os pobres poupadores de cadernetas estão fora disso.
Sem um retalhamento desses mecanismos de concentração econômica, não se irá longe.
Também é preciso lembrar que nem todo o poder emana da Globo, já que o comando das redes de comunicação está nas mãos de grupos globais que controlam as redes de transmissão de dados.
Claro, Oi, Telefonica e TIM são os nomes dos polvos tentaculares que abusam dos usuários brasileiros sem lhes dar ouvidos ou menosprezando suas queixas, como não acontecia nem na época em que esses serviços eram monopólio estatal exercido pela Embratel.
Os órgãos de defesa dos consumidores e as agências reguladoras da prestação de serviços públicos concedidos têm pouca força diante desses potentados empresariais.
Portanto, não basta implodir legalmente o complexo plim-plim, é preciso reformar diversos itens desse quebra-cabeça chamado Brasil.
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
“O país inteiro é uma zona de cangaço pós-moderno, que corrompe não somente o sentido do público e a dignidade da democracia, mas também implode a solidariedade e o respeito à dignidade humana”.

Tarso Genro, em crônica no Sul21 de 5/9/2018

Bolsonaro

Penso que devemos estar preparados para o pior, mas não desistir de lutar para evitá-lo.
Pela minha ótica, o pior no momento seria uma eleição do capitão Jair Bolsonaro, que um alucinado mandou para o segundo turno com uma facada. Bolsonaro vai dividir o país.
Não, não acho que a alternativa seria o Lula. Temo que um terceiro governo Lula seria uma calamidade. Não por Lula, nem pelo PT, nem por nada. Seria um governo sob cerco implacável.
Lula está certo em lutar por sua inocência, se ele está convicto, e exigir provas cabais, não meras deduções a partir de delatores. Mas ele está derrotado no embate jurídico e a eleição tem uma data.
Haddad é uma saída para um impasse que ameaça embretar a eleição mais importante depois da redemocratização.
Há um aspecto positivo: de certa forma ele representa um avanço em relação a Lula, no sentido de ser menos messiânico, mais acadêmico.
Vai disputar com Ciro Gomes a candidatura da esquerda para o segundo turno. Um deles vai enfrentar Bolsonaro, o candidato que já se impôs à direita.
Não poderia haver cenário melhor para a esquerda e para as forças democráticas depois da avalanche de 2016.
 
 

Temporada da mentira

Uma das poucas novidades da atual campanha eleitoral é a participação acintosa de empresários adeptos do liberalismo econômico e de economistas que pregam o livre mercado em palestras, entrevistas e depoimentos aos meios de comunicação. Alguns são assessores, outros candidatos.
Se esses economistas são intelectualmente desonestos, os empresários são oportunistas hipócritas.
Citemos dois nomes “notáveis”: Persio Arida, economista do PSDB de Alckmin, e Paulo Guedes, “ministro da Fazenda” do candidato presidencial Jair Bolsonaro (PSL-RJ).
Agentes bancários dos mais ativos do país, empresários portanto, ambos são irracionalmente egoístas ao defender a primazia do mercado sobre o planejamento estatal num país desfigurado pela desigualdade socioeconômica.
Arida e Guedes são apenas duas cabeças supostamente lúcidas e racionais que sobressaem ao expressar o “pensamento único” que tomou conta do país depois do colapso da gestão petista.
Na realidade, eles defendem suas posições financeiras e os privilégios típicos do andar de cima, ignorando as agruras da maioria da população, que devia ser o alvo central dos projetos de governos ditos democráticos.
A racionalidade recomenda investimentos públicos em educação, saúde, segurança, emprego, habitação e construção de infraestrutura – coisas feitas pelos governos do PT enquanto alguns dos seus membros pisavam na bola em conluios com empresários pragmáticos e agentes públicos identificados com o Centrão político hoje majoritariamente acoplado à candidatura do paulista Geraldo Alckmin.
Nesse temporada de promessas vazias e afirmações falsas, bem faria o PT se reconhecesse seus erros (muito menores do que os acertos) para recuperar a credibilidade e seguir em frente nessa competição em que, evidentemente, leva vantagem quem tem dinheiro ou participa de uma coligação milionária, dessas com direito a muito mais tempo no rádio e na TV.
Se não fizer o mea culpa, o partido ganhador das quatro últimas eleições presidenciais corre o risco de sofrer o chamado “fogo amigo”, disparado por gente que até agora esteve na trincheira da esquerda.
É o que se deduz da manifestação do cientista político Wanderlei Guilherme dos Santos, da Unicamp.
Respeitado pensador de esquerda, ele detona a estratégia política do PT em defesa da candidatura do ex-presidente Lula ao Planalto.
Criticando o “duplo discurso de insultar o Judiciário e a ele recorrer com a linguagem das Vossas Excelências”, WG dos Santos acusa o PT, e Lula, de promoverem a mais profunda e doída divisão nas correntes de esquerda do País” — afirmação injusta, pois a divisão na esquerda brasileira é anterior ao PT e a Lula.
Para o cientista político, “o PT não tem como continuar mobilizando o seu eleitorado e apoiadores mediante a possibilidade de uma sessão mediúnica com eficácia sobre o mundo real”.
WG dos Santos duvida que Lula transfira seus votos para Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, candidato a vice-presidente escolhido para herdar os votos do ex-presidente preso em Curitiba por corrupção.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“O PT e membros estão a um passo de convocarem à mesa da fé o espírito autoritário do antigo Partidão. O PT e os cronistas de boa fé permanecem na senda de conduzir toda a esquerda ao inferno. Que, esse sim, existe”. (WGS)

O jogo sujo

 GERALDO HASSE
Quando eu nasci, já existiam no Brasil pelo menos seis grandes empresas estatais: o BB, a CEF, os Correios, a CSN, a CVRD e a VFRGS, braço sulino das ferrovias.
Em 1953, nasceu pelas mãos do presidente Getúlio Vargas a maior de todas as empresas nacionais: a Petrobras, orgulho dos brasileiros de todas as idades.
Naquele momento, o jogo estava 7 a 0, mas os “entreguistas” não desistiam. Agora que o jogo ainda está 4 a 3 para nós, “eles” estão em plena campanha pela privatização da BR, dos Correios, da CEF e do BB.
Jogo duro, torcida brasileira.
É hora de reagir contra a desnacionalização, privatização ou que nome tenha essa mania das minorias privilegiadas do Brasil de servir como montaria dos poderosos do Hemisfério Norte.
Em vez de investir na educação do povo, as elites afirmam que os brasileiros são vira-latas que precisam ser guiados pelos países mais adiantados. Ou, seja, querem que sejamos escravos, colonizados e submissos.
Ora, acaba de ser publicado no site do GGN, dirigido por Luis Nassif, um artigo, quase um manifesto, sobre a campanha pela privatização da Petrobras.
Seus autores são Felipe Coutinho, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, e Gilberto Bercovici, professor de Direito Econômico da Universidade de São Paulo.
O artigo saiu originalmente na Carta Campinas e destaca a onda de manipulação noticiosa (fake news) contra a BR ou, seja, contra a soberania nacional.
Aqui vai a transcrição completa do artigo:
“Qual personalidade ou instituição brasileira foi a mais perseguida por meio de mentiras e falácias na história moderna do país?
Certamente houve muita injúria contra Getúlio, Prestes, Jango, JK e Brizola.
Mas quando comparamos a difamação contra a Petrobras, com seus quase 65 anos de existência, é possível concluir que foi ainda maior, ponderando sua duração e intensidade.
A Petrobras é um fenômeno, sua história e resultados demonstram a capacidade de realização do povo brasileiro.
Por revelar a nossa capacidade ela é tão admirada e protegida pela maioria dos brasileiros que são imunes às reiteradas falácias e mentiras propaladas pelos porta vozes do interesse antinacional.
Segundo Barbosa Lima Sobrinho: “A Petrobras, desde a sua criação, foi mais que uma empresa pública. Surgiu como emblema da nacionalidade, a sigla mística que podia abranger e reunir o maior número possível de brasileiros fiéis à sua pátria. Petrobras era um símbolo que, por si só, despertava emoções, como se a sua missão fosse a de acender estrelas, para iluminar o céu do futuro do Brasil”.
Pesquisa recente apontou que 70% dos brasileiros são contra a privatização da Petrobras e 78% são contra o capital estrangeiro na estatal.
Recebeu pedras desde sua criação
Para registrar o contexto histórico basta apresentar trechos dos editoriais publicados em outubro de 1953 no jornal O Estado de S. Paulo.
Comentando o discurso do presidente Getúlio Vargas na cerimônia em que sancionou a Lei Nº 2004, o editorial criticou duramente a criação da Petrobras e afirmou que o Brasil enfrentaria sérias dificuldades econômicas e não resolveria o problema da falta de petróleo.
“A atitude do Executivo e do Legislativo federais em relação ao problema do petróleo denuncia absoluta irresponsabilidade em face dos interesses nacionais. Quanto à urgente necessidade de tudo se fazer com o objetivo de prospectar e explorar as riquezas petrolíferas que o nosso subsolo porventura encerre, a “solução” encontrada foi a da “Petrobras”, que onerará excessivamente os contribuintes, a ponto de prejudicar a economia nacional, sem nos trazer a menor esperança de resultados positivos. 
A “Petrobrás” significará um considerável desperdício de dinheiro e de tempo, atestando nossa incapacidade de resolver um dos mais urgentes problemas econômicos nacionais. Além disso, a aprovação e sanção do projeto de lei que cria essa empresa explicam-se menos pela ignorância do que pela sujeição do Executivo e do Legislativo à demagogia e a argumentos eleiçoeiros. Mais de uma vez tivemos o ensejo de registrar e condenar a corresponsabilidade da União Democrática Nacional nessa questão”
Mentiras e falácias atuais
Quem pensa que a Petrobras está quebrada, que a produção do pré-sal é lenta, que o pré-sal é um mico e não tem valor ou que a exportação de petróleo por multinacionais pode desenvolver o Brasil, está sendo enganado. É vítima da ignorância promovida pelos empresários da comunicação, políticos e executivos à serviço das multinacionais do petróleo e dos bancos.
FAKE #1 – O mito da Petrobras quebrada
A Petrobras é a maior e mais importante empresa do país. Embora tenha sido vítima de corrupção, sempre esteve muito longe do risco de falência. A estatal é uma grande geradora de caixa.
Entre 2012 e 2017, a geração se manteve estável entre 25 e 27 bilhões de dólares por ano. Também neste período manteve enormes reservas em caixa, entre 13,5 e US$ 25 bilhões, superiores às multinacionais estrangeiras.
A capacidade de honrar compromissos de curto prazo sempre foi evidenciada pelo índice de liquidez corrente superior a 1,5.
A dívida da Petrobras é proporcional às reservas em desenvolvimento do pré-sal e aos investimentos de mais de US$ 250 bilhões, de 2009 a 2014, sendo perfeitamente administrável pela companhia, que cresce tanto na produção quanto na geração operacional de caixa.
FAKE #2 – O “prejuízo” pelos subsídios ao consumidor entre 2011 e 2014 
Não é verdade que a Petrobras teve prejuízos enquanto adotou preços de combustíveis abaixo do internacional, entre 2011 e 2014, época em que o preço do petróleo se manteve elevado.
Neste período de altos preços do petróleo, os resultados das atividades de refino foram compensados pelos ótimos resultados das atividades de exploração e produção.
No período de 2015 a 2016, com os preços do petróleo mais baixos, os resultados de exploração e produção foram compensados pelos ótimos resultados do refino.
O fato é que o preço de venda dos derivados sempre foi acima dos custos de produção. Assim, a Petrobras, como empresa integrada e verticalizada, sempre apresentou lucros operacionais em linha com as maiores empresas de petróleo do mundo.
O gráfico abaixo mostra os lucros brutos da Petrobras no período de 2008 a 2017. Ao contrário do mencionado pelo Diretor-Geral da ANP, entre 2011 a 2014, a Companhia não teve prejuízos.
Os resultados operacionais apresentados foram estáveis ao longo dos últimos anos justamente para garantir a lucratividade da Companhia, mas sem prejudicar os consumidores brasileiros.
FAKE #3 – Os “maus investimentos” e a corrupção superestimados
Os detratores da Petrobras super dimensionam os prejuízos causados pelos corruptores e corruptos que lesaram a companhia, com o objetivo de justificar a privatização dos seus ativos e do petróleo.
O mito da Petrobras quebrada foi o pilar ideológico do plano lançado em setembro de 2016, Plano de Negócios e Gestão (PNG 2017/21), que tem como principal objetivo reduzir a alavancagem, antecipadamente, a 2,5 no final de 2018.
O indicador escolhido é obtido pela divisão da “dívida líquida” pelo “EBTIDA ajustado” e no plano anterior seria atingido em 2020.
Assim o plano pretende justificar a privatização de US$ 35 bilhões em ativos entre 2016 e 2018.
O mito da Petrobras quebrada é alimentado pela lenda do endividamento ameaçador.
O endividamento teria sido motivado pela corrupção e por maus investimentos.
Agora ele estaria a ponto de quebrar a Petrobras e a única alternativa seria privatizar os ativos da estatal a toque de caixa.
Esta falácia é revelada pela estimativa do impacto da corrupção e dos investimentos em ativos ditos improdutivos no endividamento da Petrobras.
Em síntese, concluímos que do total da dívida existente no final de 2014 (US$ 136,04 bilhões), 4,5% corresponde aos investimentos ditos “improdutivos” e 3,6% corresponde aos efeitos da corrupção.
Ressaltamos que os dois efeitos não podem ser somados porque existem efeitos redundantes pelo impacto da corrupção na “improdutividade” dos ativos.
Assim pôde ser revelada a lenda da origem perversa do endividamento que alimenta o mito da Petrobras quebrada e suporta ideologicamente o objetivo da privatização fatiada da estatal que é disfarçada pela meta da redução da alavancagem.
FAKE #4 – A incapacidade de investir e de exercer o direito de operação no pré-sal 
A construção da ignorância sobre a Petrobras, maior vítima histórica das mentiras e falácias (fake news) da História moderna do Brasil serve para convencer a opinião pública que a estatal não é capaz de exercer o direito de ser a operadora única no pré-sal e investir no desenvolvimento da sua produção.
Apesar do crescimento da produção no pré-sal ter ocorrido em tempo recorde, em comparação com o Golfo dos EUA, o Mar do Norte e a própria Bacia de Campos.
A produção no pré-sal já representa cerca de 55% da produção nacional.
FAKE #5 – A necessidade de privatizar ativos, alienar acumulações de petróleo e ceder direitos no pré-sal, como na cessão onerosa, para reduzir alavancagem no curto prazo. 
Desde 2016 foi demonstrado que a Petrobras não precisa vender ativos para reduzir seu nível de endividamento.
Ao contrário, na medida em que vende ativos ela reduz sua capacidade de pagamento da dívida no médio prazo e desestrutura sua cadeia produtiva, em prejuízo à geração futura de caixa, além de assumir riscos empresariais desnecessários.
A avaliação mostra o equívoco dessa escolha política e empresarial de alienação de ativos, e revela que ela é desnecessária.
A alternativa proposta preserva a integridade corporativa e sua capacidade de investir na medida do desenvolvimento nacional e em suporte a ele.
Enquanto garante a sustentação financeira, tanto pela redução da dívida quanto pela preservação da geração de caixa a médio prazo.
O verdadeiro objetivo da atual gestão é a privatização, por partes, dos ativos rentáveis da Petrobras.
A escolha do indicador de alavancagem, da meta de 2,5 e do prazo de 2018 são arbitrários.
São as consequências da meta de privatização e não o contrário.
Trata-se de uma falácia, de inversão de causa e efeito, que é repetida muitas vezes.
FAKE #6 – A política de preços que teria beneficiado a estatal desde 2016
A política de preços altos e vinculados à variação do preço do petróleo e do câmbio, inaugurada por Parente em 2016, prejudicou tanto a Petrobras quanto o consumidor brasileiro.
O diesel caro da estatal encalhou nas refinarias, assim ela perdeu mercado e receita de vendas com a ocupação de até 30% do mercado brasileiro pela cadeia de importação que é multinacional e estrangeira.
Sem conseguir escoar a produção de diesel, as refinarias da Petrobras precisaram limitar a carga de petróleo e se tornaram ociosas, em até 30%.
Ganharam os refinadores dos EUA, os operadores de logística “traders” estrangeiros e as distribuidoras concorrentes da Petrobras que operaram, lucrativamente e com baixo risco, na importação de diesel.
Assim como, os produtores de etanol que tomaram o mercado da gasolina cara.
Após a greve dos caminhoneiros, com preços mais baixos para os combustíveis e elevação dos riscos aos importadores, a Petrobras retomou o mercado doméstico de combustíveis, propiciando custos menores para a população e aumento da lucratividade para Companhia.
O lucro operacional do segmento de refino aumentou de US$ 3,8 Bi no 1T18, para US$ 7,2 Bi no 2T18, um aumento acima de 90% na lucratividade, através de preços menores na refinaria e recuperação do mercado.
Diante da menor competição com produtos importados, o fator de utilização do parque de refino da Petrobras no Brasil atingiu 81% no segundo trimestre deste ano, o que representa um avanço de 9 pontos porcentuais na comparação com os primeiros três meses do ano e de três pontos em relação a igual período de 2017.
Por outro lado, o aumento da carga processada nas refinarias reduziu a exportação de petróleo cru.
FAKE #7 – O “monopólio” do refino
Desde a promulgação da Lei nº 9.478/1997, a Petrobras não é mais a executora única do monopólio da União nas atividades de refino no Brasil.
Existem outras refinarias operando no País, que podem ampliar sua capacidade, e qualquer outra empresa estatal ou privada pode exercer atividades de refino, de acordo com seu apetite de assumir riscos de investimento, assim como a Petrobras fez, com objetivo de atender ao crescimento do mercado brasileiro de derivados, desde que autorizada pela União.
Obrigar a Petrobras a se desfazer de seus ativos em favor de empresas privadas representa uma ação contra a natureza de uma companhia integrada de petróleo, característica dessa indústria que objetiva a mitigação dos riscos da volatilidade do preço do petróleo e do câmbio, por exemplo.
Mas, acima de tudo, é uma agressão à Petrobras, que assumiu riscos ao realizar investimentos de longa maturação, como as refinarias.
Entregar refinarias ao setor privado irá enfraquecer a Petrobras, em um movimento na contramão da indústria, em um contexto onde as empresas nacionais de petróleo (NOCs) estão se fortalecendo em todo o mundo, inclusive através da expansão da capacidade de refino, a exemplo dos países da Ásia (China, Índia, Indonésia, Malásia), da Rússia (Rosneft e Gazprom) e do Oriente Médio.
Esse tipo de política proposta pelo Diretor Geral da ANP representa uma ação contra a lógica econômica da indústria de óleo & gás e contra o povo brasileiro.
O mercado brasileiro do refino é aberto e competitivo, faz parte da bacia do Atlântico, como demonstra a recente invasão do mercado pelo diesel produzido nos EUA, resultado dos preços altos de Parente na Petrobras.
É descabida a exigência de preços internacionais como condição para investimentos no refino.
Ainda mais estranho é o desejo de impedir a ação do Estado Brasileiro no setor.
FAKE #8 – A Petrobras é uma empresa como outra qualquer
A Petrobras teve sua criação autorizada pela Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953, como uma sociedade de economia mista.
No debate recente sobre a Petrobras, muito se tem dito e escrito sem que se preste atenção no significado concreto da natureza jurídica da Petrobras como uma sociedade de economia mista.
A sociedade de economia mista é uma espécie de empresa estatal.
De início, basta recordarmos que, segundo o artigo 5º, III do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, a sociedade de economia mista é uma entidade integrante da Administração Pública Indireta, dotada de personalidade jurídica de direito privado, cuja criação é autorizada por lei, como um instrumento de ação do Estado.
Apesar de sua personalidade de direito privado, a sociedade de economia mista, como qualquer empresa estatal, está submetida a regras especiais decorrentes de sua natureza de integrante da Administração Pública.
Estas regras especiais decorrem de sua criação autorizada por lei, cujo texto excepciona a legislação societária, comercial e civil aplicável às empresas privadas.
Na criação da sociedade de economia mista, autorizada pela via legislativa, o Estado age como Poder Público, não como acionista.
A sua constituição só pode se dar sob a forma de sociedade anônima, devendo o controle acionário majoritário pertencer ao Estado, em qualquer de suas esferas governamentais, pois ela foi criada deliberadamente como um instrumento da ação estatal.
Sob a Constituição de 1988, toda empresa estatal está submetida às regras gerais da Administração Pública (artigo 37 da Constituição), ao controle do Congresso Nacional (artigo 49, X, no caso das empresas estatais pertencentes à União) e do Tribunal de Contas da União (artigo 71, II, III e IV da Constituição, no caso das estatais da esfera federal).
Além disto, o orçamento de investimentos das estatais federais deve estar previsto no orçamento-geral da União (artigo 165, §5º da Constituição de 1988).
As empresas estatais, como a Petrobras, estão subordinadas às finalidades do Estado, como o desenvolvimento (artigo 3º, II da Constituição).
Neste sentido, é correta a afirmação de que o interesse público é o fundamento, o limite e o critério da iniciativa econômica pública.
A legitimação constitucional, no caso brasileiro, desta iniciativa econômica pública, da qual a sociedade de economia mista Petrobras constitui um exemplo, se dá pelo cumprimento dos requisitos constitucionais e legais fixados para a sua atuação.
A criação de uma empresa estatal, como uma sociedade de economia mista ou uma empresa pública, já é um ato de política econômica.
Os objetivos das empresas estatais estão fixados por lei, não podendo furtar-se a estes objetivos.
Devem cumpri-los, sob pena de desvio de finalidade. Para isto foram criadas e são mantidas pelo Poder Público.
A sociedade de economia mista é um instrumento de atuação do Estado, devendo estar acima, portanto, dos interesses privados. A Lei das S.A. (Lei nº 6.404, de 17 de dezembro de 1976), se aplica às sociedades de economia mista, desde que seja preservado o interesse público que justifica sua criação e atuação (artigo 235).
O seu artigo 238 também determina que a finalidade da sociedade de economia mista é atender ao interesse público, que motivou sua criação. A sociedade de economia mista está vinculada aos fins da lei que autoriza a sua instituição, que determina o seu objeto social e destina uma parcela do patrimônio público para aquele fim.
Não pode, portanto, a sociedade de economia mista, por sua própria vontade, utilizar o patrimônio público para atender finalidade diversa da prevista em lei, conforme expressa o artigo 237 da Lei das S.A.
FAKE #9 – A Petrobras pode alienar ativos como uma empresa privada qualquer
As empresas estatais, sejam sociedades de economia mista ou empresas públicas, são entidades integrantes da Administração Pública Indireta, apesar de dotadas de personalidade jurídica de direito privado.
Toda e qualquer empresa estatal está submetida a regras especiais decorrentes de sua natureza de integrante da Administração Pública. A alienação de bens e ativos de entes da Administração Pública tem por regra, advinda do próprio texto constitucional de 1988, a exigência de licitação.
A licitação é uma imposição constitucional expressa, conforma determinam os artigos 37, XXI e 173, §1º, III da Constituição de 1988.
A legalidade, a isonomia e a impessoalidade são os princípios estruturantes de qualquer licitação pública. Não apenas a Constituição, mas a legislação específica reitera estes princípios, como a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, dentre outras. A impessoalidade determina, entre outros deveres, o de que a Administração Pública esteja proibida expressamente de discriminar quem quer que seja sem fundamento legal, ou seja, todos devem ser tratados igualmente perante a Administração.
Do mesmo modo, a legislação é explícita ao vedar qualquer tipo de preferência ou distinção sem fundamento no ordenamento jurídico, visando frustrar justamente o caráter competitivo do procedimento licitatório. Afinal, o fundamento da ideia de licitação é o da competição, sem privilégios entre os concorrentes, como possibilidade de acesso de todos e quaisquer agentes econômico capacitados ao certame. No sistema constitucional brasileiro, a licitação, portanto, é a regra e a dispensa de licitação é a exceção.
Empresas e investidores, nacionais ou estrangeiros, que adquiriram, depois do golpe de 2016, recursos do povo brasileiro estão cometendo um crime. Os preços pagos são incompatíveis com o mercado e a situação institucional e política não é exatamente daquelas que inspiram confiança, muito menos certeza.
O que está ocorrendo com ativos da Petrobras e outros bens estatais estratégicos deve ser equiparado ao crime de receptação. Afinal, um bem público foi subtraído do patrimônio público de forma ilegal, pois a venda ocorreu sem licitação, e vendido a preço vil.
A empresa compradora obviamente sabe o que está adquirindo e a que preço.
Não há nenhum terceiro de boa-fé envolvido neste tipo de negócio.
Ou seja, todas as vendas de ativos da Petrobras que foram realizadas nos últimos tempos sem licitação, são nulas.
FAKE #10 – A Petrobras deve atender aos interesses dos seus acionistas minoritários
As empresas estatais passaram a atuar nas bolsas de valores, incentivadas pelo governo, especialmente após 1976, com a promulgação da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, que reforma a legislação sobre mercado de capitais e cria a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), e da Lei nº 6.404/1976, a lei das sociedades anônimas.
Não por acaso, seus papéis respondem ainda pela maior parte das operações realizadas na bolsa, refletindo a ideia de uma gestão “empresarial” que busca maximizar o lucro na empresa estatal. No entanto, o objetivo essencial das sociedades de economia mista, como a Petrobras, não é a obtenção de lucro, mas a implementação de políticas públicas.
O que legitima a ação do Estado como empresário (a iniciativa econômica pública do artigo 173 da Constituição de 1988) é a produção de bens e serviços que não podem ser obtidos de forma eficiente e justa no regime da exploração econômica privada. Não há nenhum sentido em o Estado procurar receitas por meio da exploração direta da atividade econômica.
A esfera de atuação das sociedades de economia mista é a dos objetivos da política econômica, de estruturação de finalidades maiores, cuja instituição e funcionamento ultrapassam a racionalidade de um único ator individual (como a própria sociedade ou seus acionistas). A empresa estatal em geral, e a sociedade de economia mista em particular, não tem apenas finalidades microeconômicas, ou seja, estritamente “empresariais”, mas tem essencialmente objetivos macroeconômicos a atingir, como instrumento da atuação econômica do Estado.
Conclusão
Um dos mitos mais presentes no imaginário brasileiro é o mito do Brasil como o país que tem um “encontro marcado com o futuro”. Porém, para as elites brasileiras, o futuro só poderia ser a cópia do estilo de vida dos países desenvolvidos, cujo usufruto teria que ser limitado a estas elites, para que não perdessem sua posição de hegemonia oligárquica no sistema.
A construção da Nação, assim, nunca foi um projeto das elites, nem a integração da população. O seu objetivo limita-se à sua integração subordinada ao mercado internacional.O Brasil, em seu processo de formação econômica, sempre oscilou entre duas grandes tendências e a exploração do pré-sal poderia conduzir o país tanto em uma, como em outra direção.
Uma é a constituição de um sistema econômico nacional, autônomo, com os centros de decisão econômica internalizados e baseado na expansão do mercado interno, em um processo de desenvolvimento vinculado a reformas estruturais. Essa alternativa está sendo destruída pelo governo golpista instaurado em 2016.
A outra consiste no modelo dependente ou associado, com preponderância das empresas multinacionais e do sistema financeiro internacional, dependente financeira e tecnologicamente e vinculado às oscilações externas da economia mundial.
Caso se confirme a tomada do pré-sal pelas multinacionais petroleiras e o esvaziamento da Petrobras, estaremos com grandes riscos de sermos apenas mais um fornecedor de óleo cru e de matérias primas, sem qualquer perspectiva de desenvolvimento e de integração social.
Seremos apenas mais um Estado rentista, cuja oligarquia vive de parasitar as rendas obtidas com a venda de produtos primários e da superexploração da nossa mão de obra.
A destruição da Petrobras e a entrega do pré-sal interessam a quem?
Ao povo brasileiro ou a uma minoria privilegiada que vive de rendas no mercado financeiro? A resposta a essa pergunta é mais do que óbvia e a defesa da Petrobras e do controle estatal sobre os nossos recursos petrolíferos é fundamental para o futuro do país como Nação livre e soberana”.
 

JÁ no debate

A partir do 31 de agosto todo nosso espaço será dedicado às eleições de 7 de outubro, que se configura como a mais importante desde a redemocratização.
É um esforço que pretendemos fazer, em que pesem nossas limitações, para não deixar fora do debate certas abordagens, certos fatos e informações que não entram na pauta dominante embora sejam decisivas para o entendimento do quadro eleitoral e político.
Estamos pensando até em edições impressas, além do noticiário on line.
Nossa disposição é grande, mas nossos recursos são escassos. Por isso vamos pedir uma contribuição aos nossos leitores, para reforçar a equipe e a produção. Aguarde.