Dez horas de carnaval esquentaram o sábado gelado

MATHEUS CHAPARINI
Logo na chegada à praça nossa equipe tomou sofreu uma abordagem: “Polícia, mão na cabeça!”, disse a moça de jaqueta dourada, calça preta, coturno e quepe. Mas se tratava de uma foliã, a farda era fantasia e a equipe foi liberada sem ser revistada.
Era uma hora da tarde de sábado e até a lua crescente compareceu à praça Júlio Aragão Bozzano, no bairro Santana, onde começava a concentração do bloco Avisem a Shana que Sábado Vai Chover.
carnaval de inverno 1
Esta foi a segunda saída do bloco, que deve fazer ainda outras duas este ano, uma no inverno, outra na primavera. A troça surgiu de uma brincadeira nos ensaios da fanfarra Bate e Sopra. Os ensaios eram combinados por Whatsapp e a Shana era a única do grupo que não tinha acesso ao aplicativo, então sempre que surgia uma combinação era preciso avisar a Shana. Os ensaios eram sempre aos sábados e em locais abertos, daí o resto do nome.

Shana, entre o casal de Fridos, com o estandarte do bloco / Léo Adalís
Shana, entre o casal de Fridos, com o estandarte do bloco / Léo Adalís

Blocos como este são comuns no carnaval carioca e nasceram a partir de um processo semelhante ao que vive Porto Alegre. O carnaval de rua cresceu, a Prefeitura interferiu para organizar, as cervejas colocaram patrocínio e ganharam exclusividade nas vendas. Surgiram daí os blocos piratas, que decidem a data em que vão pra rua e determinam o próprio trajeto, muitas vezes no improviso, pela rua, na contramão. Há pelo menos três integrantes que moraram no Rio de Janeiro e participaram de blocos lá.
Entre as recomendações divulgadas no evento do facebook, ítens como cuidar do lixo, pedir desculpas caso esbarrar em alguém, usar calçados confortáveis e ir fantasiado. E o povo leva mesmo a sério a parte das fantasias. Foi organizado até um concurso, através da rede social. E os trajes eram os mais variados. Teve gente vestida de gif do John Travolta, Topogigio, Batman, fantasmas, piratas e teve até ciclistas e Shivas. A Gertie, do filme ET, levou o amigo extraterreno para passear em um carrinho de feira.
As fantasias coletivas eram as melhores. Nos metais, os irmãos metralha. Um casal de Fridos Kahlos passeava de mãos dadas. Um cardume de peixes coloridos vinha “acompanhado” de um tubarão. E tinha ainda um pessoal de roupão e toalha, no estilo “tava no banho quando o bloco passou”.
Bloco percorreu 5 km em um dos dias mais frios do ano / Léo Adalís
Bloco percorreu 5 km em um dos dias mais frios do ano / Léo Adalís

O Avisem a Shana iniciou a caminhada ao som de Bandeira Branca, marchinha composta por Max Nunes e Laércio Alves. Na saída, um pequeno impasse: o bloco esqueceu a Shana em casa. Volta-se alguns metros e aí sim, uma pequena cerimônia para receber a moça, que desce do seu prédio, com sua peruca azul e o estandarte com o símbolo do bloco: uma nuvem com dois raios.
O bloco deu uma volta em torno da praça que desnorteou completamente o GPS da nossa equipe, de modo que informações sobre rotas e trajetos foram colhidas em sua maioria através de fontes bastante confiáveis, como John Travolta, um peixe azul e um cara de roupão de banho.
Segue a caminhada pelas praças do bairro, rua Santana e Redenção. Eram certamente  mais de cem, mas provavelmente menos de duzentos. Até a chegada ao parque, o cronograma estava sendo cumprido com pontualidade, segundo o tubarão. O bloco entrou na Cidade Baixa pela rua Lopo Gonçalves ao som de Ana Júlia, clássico renegado da banda Los Hermanos. Marchinhas, sambas, axés, Tim’s, Ben’s e tals compõem o repertório executado em looping pela percussão e os metais – também pudera, dez horas de repertório inédito seria uma exigência descabida. A resposta da vizinhança à passagem do grupo é positiva.
Esta foi a segunda saída do bloco / Léo Adalís
Esta foi a segunda saída do bloco / Léo Adalís

Da Lopo, o bloco faz o caminho mais longo e tortuoso possível para chegar até a praça Marquesa de Sevigné, no final da Lima e Silva, passando por João Alfredo, Sofia Veloso e outras ruas.Fica claro que o objetivo não é chegar a algum lugar, mas andar. E a troça andou. Cinco quilômetros.
O bloco subiu a escadaria da Borges de Medeiros, seguiu pela Duque de Caxias até a Praça da Matriz, onde deveria encontrar o grupo que participava da Caminhada Iluminada, o que não aconteceu. Em frente ao colégio Paula Soares rolou um “Ocupar e resistir” em apoio ao movimento de ocupações escolares.
Depois de algumas voltas pelo centro, finalmente, o Avisem a Shana que Sábado Vai Chover chegou ao largo Zumbi dos Palmares.
Às onze horas da noite, o clima era de quarta-feira de cinzas, mas, mesmo dez horas depois do início dos trabalhos, alguns resistentes ainda sopravam trompetes e batiam surdos e taróis. Era o fim de uma maratona carnavalesca-fora-de-época que percorreu a região central da cidade em um dos dias mais frios do ano.
Em meio a tantas e tão criativas fantasias, poucos foliões brincaram à paisana. Este que vos escreve escolheu a fantasia de repórter. A matéria tá escrita. Agora eu quero o prêmio.
Caminha culminou no Largo Zumbi dos Palmares, onde a festa durou até em torno das 11h / Léo Adalís
Caminha culminou no Largo Zumbi dos Palmares, onde a festa durou até em torno das 11h / Léo Adalís

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