O potencial da região do Quarto Distrito como novo pólo de inovação de Porto Alegre foi o principal consenso entre os debatedores do evento Menu Porto Alegre, realizado nesta terça pela ACPA (Associação Comercial de Porto Alegre). O evento busca criar um espaço de debate em um ambiente descontraído, sempre com uma apresentação cultural na abertura, onde os convidados possam participar, trazendo dúvidas e contribuições.
O coordenador do Núcleo de Estudos em Inovação (Nitec) da UFRGS, professor Paulo Antônio Lawislak, afirmou que a região é “a cereja que falta para comermos o bolo”. Rafael Prikladnicki, diretor do Tecnopuc, afirmou que a área é dez vezes maior que a ocupada pelo parque tecnológico da cidade e que é necessário que sejam criados outros parques tecnológicos na cidade. A secretária do Gabinete de Inovação e Tecnologia (Inovapoa), Maria Fernanda Bermúdez, destacou táticas da Prefeitura para atrair empresas, como a isenção de IPTU nos primeiros cinco anos para empresas de diversas áreas ligadas à tecnologia.
“Caminhos da inovação em Porto Alegre” foi o tema da primeira edição do evento. “A primeira de muitas”, garantiu o presidente da ACPA, Paulo Afonso Pereira, explicando que o evento será realizado quinzenalmente até o fim do ano. Para 2017, o plano é aumentar a periodicidade, com edições semanais.
Zawislak apresentou o relatório “Caminhos da inovação na indústria gaúcha”, de 2015, que é resultado de uma pesquisa realizada com mais 1.500 empresas ao longo de quatro anos. O trabalho reuniu 50 pesquisadores de quatro universidades do estado: UFRGS, PUC, Unisinos e UCS.
O trabalho constatou um cenário que ainda explora pouco a inovação. A grande maioria dos empreendimentos são de pequenas e médias empresas (87%), com predominância de um modelo de gestão familiar (88%) e que tem o foco nos custos (81%). Para o professor, a questão é focar em agregar valor, em quanto o produto vale, não quanto custa. Zawislak defendeu que o potencial do estado está em buscar produtos diferenciados. “Nós não temos que fabricar o sapato mais barato, temos que fazer o calçado de luxo; não temos que produzir móveis em grande escala, temos que buscar o diferencial.”
Outro ponto destacado da pesquisa é que em muitos casos, as empresas pesquisadas apontavam aquisição de equipamentos como inovação, focando na inovação do processo quando os maiores resultados costumam vir da inovação do produto e de inovações na área de marketing.
Para Zawislak, a grande questão do momento é como dar condições para a indústria criativa. O professor citou o surgimento de novas empresas, voltadas à economia criativa, mas defendeu a importância de as empresas que já existem buscarem a renovação.
O diretor do Tecnopuc, Rafael Prikladnicki, citou o caso de empresas consolidadas no mercado que buscaram o parque tecnológico da universidade, como a Thyssen Krup, que mantém uma sala de inovação, e o grupo Randon. Outro exemplo trazido por Prikladnicki foi o de uma empresa que em 2009 visitou diversas capitais brasileiras com o intuito de instalar sua primeira base no país. Porto Alegre foi a cidade escolhida e, na sequência, veio a expansão por outras cidades brasileiras. Para ele, foram três os principais fatores que atraíram a empresa: nível cultural da população, uma ampla base de recursos humanos e mão de obra qualificada.
O Tecnopuc foi criado em 2003, com o objetivo de integrar universidade, empresas e governo. Hoje, o parque tecnológico conta com 120 empresas instaladas e já foi premiado duas vezes como melhor parque tecnológico do país.
Prikladnicki citou alguns exemplos de produtos inovadores desenvolvidos dentro do parque, como a primeira impressora 3D do Brasil. O produto foi desenvolvido pela Cliever, empresa criada dentro da incubadora, por um ex-estudante da universidade, e que hoje funciona de forma independente.
A secretária do Inovapoa, Maria Fernanda Bermúdez, apresentou o panorama do município em relação à inovação e seus atrativos. Porto Alegre tem hoje 22 empresas em 5 incubadoras. Segundo ela, é a 3ª cidade no país com maior número de PhDs tem mais de mil quilômetros de infovias, enquanto outras capitais brasileiras, como o Rio de Janeiro, por exemplo, possui cerca de 380 quilômetros.
A visão dos urbanistas
Pela sua localização estratégica e oportunidades espaciais, a área demanda um olhar especial por parte de todos os envolvidos na produção da cidade. O desafio de promover a revitalização urbana e a reconversão econômica foi apresentado por Benamy Turkienicz, envolvendo o processo de proposição de um Master Plan. O professor da UFRGS falou sobre a formulação de uma legislação com os conteúdos de uma Operação Urbana Consorciada, conforme Estatuto da Cidade, para esta parte da cidade.
“O Quarto Distrito é o filtro de entrada e saída da cidade e podemos pensar como este grande filtro acaba sendo tão degradado, tão pobre de atividades econômicas, já que ele tem altíssima acessibilidade”, observou Benany.
“Temos obras urbanas que não foram pensadas pelo conjunto municipal, como a ponte do Guaíba, o metrô, e a avenida Farrapos, por exemplo. Porto Alegre teve obras de cunho metropolitano sem nenhuma reação com a trama viária municipal, e por causa desta inércia o setor oeste ficou isolado do resto da cidade”, registrou o professor.
A estratégia seria criar programas econômicos e sociais em escala regional nas áreas de saúde, tecnologia da informação, economia criativa e educação superior. Como estratégica municipal, a ideia é criar projetos de moradia, serviços, cultura e lazer.
“A ideia do sistema viário é que possamos ter essa ligação dos principais eixos de articulação municipal com eixos de articulação regional, visando atrair investimentos. Precisamos casar estas malhas e oferecer o que o município já tem, com sinergia dos modais integrados”, destacou.
Segundo ele, o projeto busca potencializar parcerias públicas e privadas, visando financiamento destas estruturas. “Também queremos estimular a criação de atividades econômicas e sociais, baseado consolidando arranjos produtivos locais”.
O arquiteto Iran Rosa declarou-se entusiasmado com a alternativa de desenvolvimento urbano, econômico, social e cultural para alavancar um grande processo revitalização num pequeno território da cidade. “A gente teima em acreditar que o projeto será sempre possível, e às vezes é, mas muitas vezes ele vai ser real e nem sempre como a gente pensou. Então, pergunto de que modo este Master Plan vai acontecer e como a cidade vai absorver estas mudanças? E com que base nós podemos sustentar que o Master Plan aconteça com esta integração e eficiência?”
Benany garantiu que uma das possibilidades é alterar o estatuto da cidade, o que não seria uma novidade brasileira. “Não podemos ficar à mercê do Plano Diretor, que é mecanismo regulador e não tem a capacidade de um projeto de reunir um conjunto de parceiros e atores de uma maneira bem definida com a dimensão tempo. “Temos um caldo altamente realista, por si só o Quarto Distrito tem este potencial”, enfatizou.
O historiador Francisco Marshall afirmou que é um enorme desafio trabalhar numa área tão degradada, com esgotamento de ciclos sociais e econômicos. “Como ocorrerá a conversão de um bairro que já tem um perfil que não corresponde ao projeto?”, questionou. Para ele, a iniciativa encontra uma cidade com pessoas que estão “escaldadas com projetos como o do Cais Mauá, de baixíssima qualidade arquitetônica e ponto de consistência econômica e escassez de diálogo”.

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