Márcia Turcato, jornalista
Claudia Sheinbaum, 63 anos, é a presidenta do México. No dia quatro de novembro ela foi assediada por um homem que tentou beijá-la e passou a mão no seu seio.
O abuso aconteceu na rua, no Centro Histórico da cidade do México, à luz do dia, quando a presidenta se dirigia ao Ministério da Educação Pública, cercada por eleitores.
Fátima Bosch, 25 anos, Miss México, foi humilhada em público em evento na Tailândia, também no dia quatro, pelo diretor do Miss Universo 2025.
No Brasil, 26.399 meninas entre 10 e 14 anos vivem em união conjugal, revelou o censo do IBGE, realizado em 2022 e divulgado no dia seis de novembro, e todas elas engravidaram, ou seja, foram estupradas.
O que há em comum entre esses três fatos?
Eles mostram que não importa a idade, a nacionalidade e o continente, a mulher é importunada, assediada, agredida, humilhada e estuprada por homens que contam com o suporte estrutural da sociedade.
O IBGE, na falta de um vocábulo, classificou a união das crianças e adolescentes como “união consensual”, quando sabemos que isso não existe.
Essas meninas não são maiores de idade, elas estão na faixa etária da vulnerabilidade. Portanto, essa “união consensual” é estupro, é violência.
A menina é retirada das brincadeiras de infância e da vida escolar por um homem que a explora de todas as formas e a faz assumir o papel de esposa, de mãe, de cuidadora, de cozinheira e de faxineira.
Sem ter acesso à educação escolar e ao convívio com outras crianças, as meninas perpetuam a ignorância e a feminização da pobreza.
É exatamente essa situação que parlamentares do Congresso Nacional querem manter para assegurar um mercado de mão-de-obra barato, ignorante de seus direitos civis e de seus direitos reprodutivos.
Para conseguir seu objetivo, deputadas e deputados do campo mais atrasado da política aprovaram o PDL 3/2025, que ficou conhecimento como Projeto de Decreto Legislativo da Pedofilia, de autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ), que pretende cancelar a Resolução 258/2024 do Conanda- Conselho Naconal dos Direitos da Criança e do Adolescente, que assegura o direito a interrupção da gravidez de meninas vítimas de estupro, quando sabemos que criança não é mãe e estuprador não é pai.
Mas o PDL é ainda mais cruel. Ele pretende que as meninas não recebam informações sobre seus direitos e que o governo federal não promova ações contra as tais de “união consensual”, ou seja, o casamento infantil, que é o estupro autorizado.
Por ser um PDL, caso o projeto seja aprovado no Senado, não poderá ser vetado pelo presidente da República. A matéria foi aprovada por 317 votos, com 111 votos contrários.
Desnecessário dizer que o Congresso é formado majoritariamente por homens. A Câmara tem 513 parlamentares, desse total, apenas 91 são mulheres, 422 são homens.
Entre 2013 e 2023, 232 mil meninas entre 10 e 14 anos tiveram filhos. Se elas engravidaram, isso é estupro de vulnerável. Mas o Congresso Nacional, ao invés de tratar esse crime como crime, prefere culpabilizar a menina e obrigá-la a ser mãe, a não ter acesso à escola, a não ter acesso à informação, a perpetuar a miséria, a dar prosseguimento a feminização da miséria e a gerar um batalhão de mão-de-obra barata para sustentar os mimos do capitalismo e pagar as contas desses deputados e deputadas que não querem um futuro para a infância do Brasil.