A exploração de areia no rio Jacuí foi desastrosa e causou desbarrancamento e alterações na margem do rio, com prejuízos à vegetação ribeirinha. O IPH da UFRGS alerta para a necessidade de mais estudos para que este tipo de atividade, se possível, fique restrita a determinadas áreas. Mas estes estudos não foram realizados com o tempo e a profundidade necessários.
A pressa é inimiga da precaução. O lobby da mineração e da construção civil é pesado e esperava esta oportunidade. O governo estadual tem que deixar de submeter a área técnica da Fepam e Sema para os negócios imediatistas de sempre. A SEMA perdeu e se desvirtuou quando foi incorporada, nos governos de Eduardo Leite, a área de Infraestrutura, como prioridade.
A linha neoliberal atual provoca descontrole de serviços públicos, o que já começou a ocorrer em 2017, com a extinção da FZB, FEE, CIENTEC, etc, e com as recentes privatizações de empresas públicas de água (Corsan) e energia (CEE).
Não é possível que se admita submeter ingerência política nos estudos técnicos do Zoneamento Ambiental do Litoral Norte, como ocorreu ha cerca de dois anos.
Não é possível que se admita o atual enfraquecimento dos Polígonos de Exclusão de Pulverização Aérea de Agrotóxicos, em Nova Santa Rita, deixando vulneráveis produção agroecológica em assentamentos e milhares de pessoas sujeitas a estes venenos.
Não é possível que se permita que o Setor da Celulose e Madeira elabore e conduza a aprovação, há poucos meses, de um novo Zoneamento Ambiental da Silvicultura, que recebeu severas críticas do corpo técnico da Fepam, do Ibama e de entidades ambientalistas, com risco de destruir ainda mais o que resta do Pampa.
Não é possível que se interrompa o necessário Zoneamento Ecológico-Econômico do RS, iniciado em 2017, congelado a partir de 2019, nos governos de Eduardo Leite, sem explicação que não seja, subliminarmente, não atrapalhar os negócios imediatistas da elite econômica do Estado, em especial a expansão das monoculturas de soja que já alcançam 6,7 milhões de hectares no RS.
Não é possível repetir a violência que ocorreu em 2020, na aprovação da flexibilização do novo Código Estadual de Meio Ambiente, submetido a regime de urgência em 2019, não permitindo sequer que o CONSEMA tivesse oportunidade de discuti-lo à semelhança do que aconteceu com a mordaça imposta à área técnica da SEMA e FEPAM, resultando na perda de centenas de artigos e itens mais protetivos do Código anterior (Lei 11.520/2000).
Não é possível que o tema da mineração de areia, no curso d’água Guaíba, seja feito, mais uma vez, na pressa, tendo em conta, inclusive, a presença de metais pesados depositados em seu fundo. Vale a pena trazer metais pesados ao corpo d’água? Como ficarão a mata ciliar, os juncais, os sarandizais e a condição de pesca artesanal em suas margens?
Não é possível que se naturalize mais um processo apressado, como ocorreu nos regimes de urgência que resultaram na aprovação do PL dos venenos, do PL da irrigação, do PL da facilitação das podas de árvores para o cabeamento aéreo em prol das empresas de transmissão e distribuição de energia elétrica.
Não é possível admitir que setores econômicos possam seguir tendo supremacia sobre a área ambiental, contrariando a Constituição Federal, e submetam as políticas públicas a seu interesse imediatista, concentrador e destruidor do meio ambiente.
Este contexto de atropelos neoliberais, numa consulta de última hora, para um tema tão delicado da mineração de areia em um sistema profundamente complexo do curso de água Guaíba, poderá tornar-se em mais uma etapa para o desfazimento das políticas públicas ambientais ainda vigentes.
Um outro mundo é impossível quando a economia se desprende dos limites da natureza, como uma locomotiva sem freios, gerando destruição ecológica de grande dimensão e provavelmente sem volta para a qualidade socioambiental atual e futura do Estado do Rio Grande do Sul.
Paulo Brack
Professor, vereador de Porto Alegre