RUALDO MENEGAT/ Sobre a emergência climática e ambiental no RS

Devemos reconhecer, em primeiro lugar, que não só há um apagão da infraestrutura do Estado do RS – que Leite e Melo privatizaram e que agora gerenciam de forma incompetente, estruturas como CEEE-Equatorial, Corsan, entre outras. Sartori e Leite desmontaram também a inteligência estratégica do Estado: Metroplan, FZB, FEE, SEMA e CIENTEC. Além disso e muito importante: há um apagão da natureza para mitigar os efeitos de eventos climáticos extremos, posto que a drenagem natural e os ciclos hídricos foram destroçados pelas políticas de uso intensivo do solo. Flexibilizaram leis para aumentar áreas de plantio de soja, desmontaram planos diretores para ampliar a especulação imobiliária em zona ribeirinhas, para implantar minas de carvão e para favorecer a especulação imobiliária. Sem inteligência social e com a infraestrutura natural destroçada, temos pela frente um longo caminho para adquirirmos condições de enfrentar a emergência climática e ambiental que estamos atravessando.

Temos que ter em mente que isso é apenas um começo. Temos que agir estrategicamente se quisermos encorajar a sociedade a enfrentar os tempos que estão aí e os que advirão. A UFRGS é uma instituição fundamental para isso. É a inteligência estratégica que sobrou em um Estado que está sendo desmontado peça por peça. Sem inteligência social, a sociedade não só fica muito mais vulnerável frente aos impactos adversos dos tempos severos, mas também fica refém da ação de forças externas, sobre as quais não tem controle, como o Exército e empresas privadas.

Tudo conduz para a ideia que nada podemos fazer enquanto sociedade, cada vez mais submetida à inclemência da natureza e ao horror de políticas autocráticas e ignorantes. A Universidade é a esperança possível para desenvolver uma inteligência social que encoraje a sociedade a enfrentar a emergência climática-ambiental do século XXI.

GERALDO HASSE/ Lições e riscos da grande enchente de 2024

Foram aparentemente muito bons os encontros do presidente Lula e seus ministros com o governador Eduardo Leite na terça-feira, 2 de maio de
2024, em Santa Maria, e no domingo em Porto Alegre (aqui incluindo o prefeito da capital). O assunto que os unia era a defesa do Estado diante da devastação produzida pelas chuvas e pelo transbordamento
generalizado dos cursos d’água.

Novidade, os dois encontros foram realizados em unidades militares. E quem foi colocado no comando das operações? Não um engenheiro civil ou um geólogo ou um médico, mas um general do Exército. Não um general
genérico, mas o atual vice-chefe do Estado Maior do Exército, general Hertz Pires do Nascimento, nascido em 1963 no Rio de Janeiro. Ora, se estamos sendo atacados – não de surpresa ou inesperadamente – por poderosas forças da Natureza, nada mais lógico do que empregar a logística militar. Afinal, o que está em jogo não é somente a vida das pessoas, mas a integridade dos recursos naturais do território nacional. Resta agora esperar os desdobramentos dessa mudança numa democracia periclitante e historicamente ameaçada pela insubordinação militar.

Entretanto, embora contenha riscos à luz de acontecimentos recentes e antigos, essa nova organização das coisas faz sentido, pois vivemos uma
situação equivalente a um ataque de guerra desfechado, no caso, por elementos tri-perigosos: a chuva em volume suficiente para bagunçar a vida de milhares de pessoas por meio de enchentes destruidoras de cidades, estradas, pontes, postes e lavouras. É certo que não temos aqui
incêndios, vulcões ou terremotos, mas podemos  comparar a situação atual a um tsunami ao contrário. Um tsunami que não veio do oceano, mas das nuvens, das cabeceiras dos rios. Um fenômeno natural turbinado pelo
desprezo humano pelo equilíbrio ambiental. De agora em diante, é preciso ficar em guarda.

E pensar que toda essa desastreira veio ocorrer no estado pioneiro na criação de leis ambientais. Penso em José Lutzenberger, desde 2002 sepultado no perímetro da Fundação Gaia, em Pantano Grande. Me pergunto
o que ele diria dessas enxurradas e de tudo que faz parte do quadro que estamos vivendo. Ele foi comparado a um profeta ecológico. É natural, agora, pensar que as mais recentes catástrofes climáticas no RS sinalizam a necessidade de encarar a emergência não como uma batalha eventual, mas como uma guerra permanente pela restauração do equilíbrio ambiental. Faz sentido, portanto, incumbir as Forças Armadas de coordenar os esforços para tirar a população do sufoco, sem deixar as
coisas ao deus-dará, com milhares de fios desencapados à mercê de ocorrências deletérias. Sou da mesma geração de Lula e logo não estaremos mais aqui, mas eu gostaria que fôssemos lembrados como aquele tipo de pessoa que lutou pelo bem comum e teve coragem de afrontar os poderosos que só pensam em dinheiro. Sim, Lula está tendo a rara oportunidade de enquadrar os malfeitores do meio ambiente. Pode alguém argumentar que ele se
aproveitou do momento para promover um grande lance de fundo eleitoral, mas não dá para duvidar de sua sinceridade ao ouvir o que ele disse ao prefeito de Faxinal do Soturno, no final da reunião de quinta em Santa Maria. Poderia ter deixado passar a queixa do gestor municipal, mas com poucas palavras o confortou e prometeu ajuda.
Estamos focalizando momentaneamente o Rio Grande do Sul, mas o ciclo das emergências climáticas está rolando em todo o planeta. É quase como um ataque alienígena. A tarefa de salvação é gigantesca e não se resume à pós-enchente. Há toda uma correção de rumos a fazer. É preciso identificar os vilões ambientais e processá-los para que não se perpetue esse estado de coisas. Falemos dos especuladores imobiliários urbanos. Dos administradores públicos lenientes. Dos praticantes da agricultura predatória, autora impune de desmatamentos e ocupação de banhados. Os agricultores não agem sozinhos ou isolados. Eles operam segundo uma lógica determinada pela indústria de insumos e máquinas. Seguem um modelo implantado desde o início do século XX, a partir dos EUA e da Europa e que vem incorporando grandes áreas da Ásia, da América e da África. O Brasil é caudatário e refém – prazeroso – dessas perversões
empresariais que incluem as revendas agropecuárias, a aviação agrícola, os bancos liderados pelo BB, os governos em geral e até instituições de pesquisa como a Embrapa. É um sistema poderoso que literalmente tratora os recursos naturais, destrói as matas ciliares, contamina os cursos d’água e os lençóis freáticos. Ninguém está imune às forças da natureza, mas o bom senso indica que é preciso dar um basta ao despautério ecológico. É um direito das novas gerações receber um ambiente limpo.

Por arriscada que seja, a gestão militar das operações de salvamento dá às Forças Armadas um bom motivo para trabalhar pela maioria da população ameaçada pelo “inimigo ambiental”. Que seja bem sucedida e não ceda a
tentações fora da ordem democrática constitucional. Essa situação que se agrava sem remédio deixa claro que está na hora de reformular o conceito de segurança nacional. Não faz sentido manter as Forças Armadas em quartéis à  espera de um improvável ataque militar inimigo. Está tudo sob controle, menos o vetor ambiental.

Estamos cansados de saber que as potências lutam para impor a dominação econômica, mas o verdadeiro inimigo agora é o risco de decomposição do equilíbrio ecológico via distúrbios climáticos, poluição desenfreada e outros problemas, entre os quais se alinham crimes praticados por brasileiros mancomunados com estrangeiros – para citar um caso extremo, o garimpo em reservas indígenas, a mineração na Amazônia e outros crimes ecológicos em todos os biomas nacionais, do Pampa ao Semiárido.

LISIANE ACOSTA* / Testagem rápida da Dengue é importante, também, para o manejo ambiental

*PhD Saúde Coletiva

Após vinte anos de trabalho na vigilância epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, auxiliando na publicação do Boletim Epidemiológico das Doenças Transmissíveis do município, o qual registra toda a história da Dengue na cidade, me pergunto o porquê de a testagem rápida da dengue ainda não ser valorizada na orientação ágil em ações de controle ambiental, além de ser uma definição diagnóstica clínica rápida?

Com a identificação do vetor Aedes Aegypti em 2001 e dos primeiros casos autóctones em maio de 2010, uma importante discussão na Capital foi trabalhar na agilidade de ações ambientais direcionadas à presença do vetor e da circulação do vírus, principalmente.

Os objetivos eram usar o inseticida de forma que não gerasse resistência e não agredisse muito o ambiente, pois ele elimina também outros insetos, e conseguir chegar o mais rápido possível na área para impedir a transmissão, através de diagnósticos rápidos de casos suspeitos de Dengue, agilizados com a compra de testes tipo Ns1(antígeno Dengue), realizados no início dos sintomas e com alta especificidade. Além disso, foram distribuídas armadilhas em pontos com maior prevalência de casos e vetores para detectar o vírus já no vetor, agindo antes mesmo de ter casos em humanos.

Também a divulgação de locais de potencial risco sempre foi uma grande preocupação, tendo em vista a ação da população, e foi criado o site de geolocalização de focos e casos estratificados por graduação de risco .

Apesar de todas essas ações, ocorreram três grandes surtos (2013, 2016 e 2019) e duas epidemias 2022 e 2023 com mais de 5 mil casos confirmados em cada ano, descritos no Plano Municipal de Contingência Dengue, Zika e Chikungunya de 2023. O subtipo viral nos surtos foi o DENV1 e o DENV 2 em 2023.

Hoje, o município se encontra no nível 2 de alerta, com 455 casos, segundo a Secretaria Estadual de Saúde no painel de casos de Dengue, e está com 85 agentes de endemias, segundo o mesmo site, que, com certeza, possuem mais condições de trabalho agora que nos momentos de pandemia do COVID de 2020 a 2023.

Sabemos da complexidade de controle de doenças transmissíveis, especialmente as que se relacionam ao meio ambiente e determinantes sociais em saúde. Por essa razão, todos os fatores que possam auxiliar nesse momento devem ser disponibilizados, como a testagem rápida para Dengue.

O Ministério da Saúde do Brasil aderiu a essa tecnologia e a disponibilizará, conforme noticiou o jornal Zero Hora, em 13/3/2024. Portanto, cabe às  secretarias Estadual e Municipal de Saúde a utilizar, visando não só um diagnóstico precoce de casos, mas uma celeridade nas ações de controle dos vetores, primordial sempre neste agravo.

Pense comigo, se ao procurar um serviço de saúde com sintomas de Dengue, o diagnóstico fosse em 20 minutos, com todos os cuidados clínicos e demais exames realizados naquele momento, você certamente se cuidaria melhor e ao chegar em casa revisaria todo o ambiente, eliminando prováveis criadouros do mosquito e logo receberia o agente da dengue para auxiliar no controle ambiental da sua região. Portanto, a testagem rápida, além de agilizar o procedimento clínico, balizaria um rápido manejo ambiental.

GERALDO HASSE/ 200 anos da dívida que estrangula o Brasil

Geraldo Hasse

Este ano a dívida pública brasileira está completando 200 anos. Começou com 2 milhões de libras esterlinas emprestados pelos Rottschild ingleses ao governo do imperador Pedro I.

A grana foi usada para pagar Portugal, que se colocou como credor do valor negociado. O Brasil independente
sofreu na origem com uma facada internacional que vem se perpetuando. E assim estamos até hoje.

Aquela dívida original foi sendo rolada e ampliada até o valor atual da ordem de R$ 6,5 trilhões, cujo “serviço”
(juros e amortizações) nos custou mais de R$ 1,89 trilhões bilhões em 2023.

O que o Brasil pagou em 2023 (Grafico atualizado pela Auditoria Cidadã da Dívida)

Está previsto que no final deste ano a dívida pública passará de R$ 7 trilhões. Uma merreca impagável! E fica o ministro Haddad buscando fazer economia dos recursos disponíveis no Tesouro Nacional e o Lula manobrando para conseguir grana do Orçamento, para investir em educação, saúde e infraestrutura. A única despesa que se aproxima do valor da dívida pública é a da previdência (R$ 867 bilhões em 2023), menos da metade.

Esta é um direito social de milhões de brasileiros, enquanto a dívida pública é uma armação em favor
de rentistas, banqueiros e especuladores/investidores em títulos do Tesouro.
Não se entende por que a diplomacia brasileira não pega o touro pelos chifres.

Na última vez em que surgiu uma oportunidade de dar um chega-pra-lá nas sanguessugas grudadas em nossas pernas subdesenvolvidas, o ministro da Fazenda Pedro Malan elevou os juros da dívida  para 49% ao ano.

Foi temporário, até voltar à normalidade dos juros de dois dígitos, bem acima da prática internacional (hoje está em
pouco mais de 11%).

Nessa época, em pleno governo do príncipe FHC, Malan
legou à posteridade uma frase histórica: “O rabo está balançando o cachorro”.

Continua balançando e, em lugar do Malan, está no comando do BC o neto do raposão Roberto Campos. Até quando essa espiral de agiotagem vai continuar sufocando a capacidade de desenvolvimento do
Brasil?
Hoje, por incrível que pareça, são mulheres que reclamam justiça nesse campo. Há anos a auditora fiscal aposentada Maria Lucia Fatorelli advoga a realização de uma auditoria da dívida.

Segundo ela, a dívida já foi paga há anos e o Brasil está sendo simplesmente bicado pelos abutres do
mercado financeiro.

Fatorelli deu uma bem-sucedida consultoria ao
Equador, mas aqui entre nós quase não lhe dão ouvidos.

Agora está sendo lançado pela Boitempo no Brasil o livro A Ordem do Capital, da italiana Clara E. Mattei, que afirma que a austeridade fiscal praticada pelo governo brasileiro é um biombo que protege os rentistas e espolia as classes trabalhadoras.

No site Outras Palavras, a autora afirma que o
maior problema do Brasil é o endividamento público, mas as autoridades nacionais parecem indiferentes a esse escândalo “normalizado” por todo mundo, da mídia ao parlamento, passando pelo TCU, a Procuradoria Geral
da República e demais servidores da república.
Enquanto vai pagando a dívida, o Brasil vai privando a população brasileira de investimentos em melhorias sociais e obras materiais.

MÁRCIA TURCATO/ Democracia inabalada

Márcia Turcato, de Brasília
Para nunca esquecer, para que não se repita. Há um ano, nesse dia, milhares de pessoas vestindo camisetas verde e amarela, como se fosse a torcida da Seleção Brasileira de
Futebol, desceram o Eixo Monumental em direção à Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
Seguiam protegidos pela Polícia Militar.
Um pouco antes, em 12 de dezembro de 2022, dia da diplomação do presidente da República eleito, Luís Inácio Lula da Silva, os mesmos manifestantes haviam promovido um quebra-quebra no centro de Brasília, inclusive queimando carros e ônibus. Ninguém foi preso. Na antevéspera do Natal, dois desses manifestantes planejaram explodir um caminhão tanque de combustível na área do aeroporto de Brasília. O artefato falhou e o
plano terrorista foi desmontado.
Esse contexto continha informações suficientes de que não havia clima de paz entre os manifestantes e que a marcha do dia 8 de janeiro de 2023 até o Congresso Nacional era, no mínimo, suspeita. Mesmo assim, o policiamento era frouxo, amistoso e conivente. O então
Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, e que havia sido Ministro da Justiça do ex-presidente Jair Bolsonaro, estava de férias nos Estados Unidos. O governador, Ibaneis Rocha, alegava que a situação era de total tranquilidade.
Nesse dia, eu passei de carro ao lado da fila de manifestantes que ocupava duas pistas do Eixo Monumental e seguia gritando palavras de ordem e era protegida pela polícia. Eu diminuí a velocidade para gritar: “Zumbis, vão pra casa!”. Fui vaiada e eles seguiram. Estavam acampados há meses na Praça dos Cristais, área militar, em frente ao QG do Exército. Lá tinham acesso a eletricidade, água, banheiros químicos, distribuição de marmitas e centenas de barracas. Desnecessário dizer que a praça, obra do paisagista Burle Marx, foi
depredada. E foi assim, xingando o presidente eleito, clamando pela volta de Bolsonaro, que estava em
Miami, e exigindo intervenção militar, que a turba tomou de assalto a Praça dos 3 Poderes e invadiu e depredou o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.

Obras de arte e documentos do acervo público foram saqueadas e danificadas, a arte e a cultura não têm valor para a turba. Isso precisa ser lembrado.

Um ano depois, com a ministra da Cultura Margareth Menezes cantando com entusiasmo o hino nacional do Brasil para celebrar o ato Democracia Inabalada, é uma alegria imensa ver as obras restauradas e os poderes funcionando normalmente.  Aliás, 24 horas após a
vandalização, todos os chefes dos Poderes estavam em seus gabinetes trabalhando. O presidente Lula visitou o cenário de destruição, agradeceu a todos que trabalhavam na limpeza do espaço, e no outro dia estava lá dando expediente.

Apesar dos vândalos declararem seu apoio a Bolsonaro e de afirmarem terem feito o que fizeram para que houvesse uma intervenção militar para trazer o ex-presidente, derrotado nas urnas, de volta ao Palácio do Planalto, é incrível que circule nas redes sociais e entre
deputados, senadores, governadores e prefeitos eleitos, todos de direita, a versão de que a desordem foi promovida pela esquerda para fortalecer o novo governo.

A que ponto chegaram as fake news! Como disse o ministro Roberto Barroso, presidente do STF, a
mentira precisa voltar a ser mentira! E rezar para uma pilha de pneus deve ser visto como uma coisa insana e nunca um ato de fé.

E a direita precisa dizer a que veio. Se os partidos de direita não querem ser confundidos com fascistas, golpistas e vândalos, é necessário que condenem publicamente os atos golpistas e reconheçam que eles foram planejados nos subterrâneos.

Mas onde estão os governadores de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Santa Catarina e do Distrito Federal?

Ibaneis Rocha, governador do DF, este eu sei, está em Miami. Eles não estão no ato Democracia Inabalada, que um ano após o vandalismo que sacudiu o país, festeja o Estado de Direito e o fortalecimento das instituições. Que direita é essa que se diz honesta, seguidora da lei e conservadora mas que parece deitar com o fascismo e beijar o diabo? E nesse grupo suspeito também está o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, que na
última hora alegou doença na família e permaneceu na sua Alagoas.
O ministro do STF Alexandre de Moraes, que também é presidente do Superior Tribunal Eleitoral, reafirmou no ato que celebrou a democracia a importância de lembrar, de nunca esquecer, para que manifestações golpistas não se repitam e pregou a urgente regulamentação das plataformas digitais para impedir o avanço da construção de conteúdos falsos que impulsionam nazistas e fascistas. E declarou que a internet não pode continuar sendo uma terra sem lei e ainda criticou as plataformas digitais, que permitem monetizar perfis de ódio.
O presidente Lula, ao fazer o discurso que encerrou o ato, disse que hoje é um dia muito especial para quem ama e pratica a democracia, é um exercício que precisa ser feito todos os dias. A democracia supera as divergências políticas, porque a divergência faz parte da democracia, e é assim que se vence o fascismo. E chamou o ex-presidente (Jair Bolsonaro) e seus seguidores de golpistas, afirmando que o golpe foi tramado nas redes sociais. O
presidente salientou que não há perdão para quem atenta contra a democracia e foi ovacionado diversas vezes.

É isso, sem anista para golpista!

VILSON ROMERO / Ataques à imprensa: pelo fim da impunidade!

Alguém disse ou escreveu que “a primeira vítima de uma guerra é a verdade”, embora não haja consenso quanto à autoria.

São citados desde o dramaturgo grego Ésquilo (524 A.C. – 455 A.C.), o pensador e escritor inglês Samuel Johnson (1709-1784) e até o político britânico Philip Snowden (1864-1937), do Partido Trabalhista Independente.

Nos conflitos bélicos mais recentes, não só a verdade perece: os profissionais da comunicação social também tombam pelo caminho.

O Comitê de Proteção dos Jornalistas (CPJ) revela que, até 30 de outubro, 31 profissionais de imprensa foram mortos no conflito entre Hamas x Israel, além de um sem-número de feridos e desaparecidos.

A organização também relatou ataques contínuos, detenções, ameaças, censura e assassinatos de familiares de jornalistas que trabalham em Gaza.

Na Ucrânia, pelo menos 15 trabalhadores da mídia foram mortos desde a invasão russa em fevereiro de 2022.

Os russos são acusados pelo Sindicato Nacional dos Jornalistas da Ucrânia de atingir premeditadamente veículos de comunicação e jornalistas, fazendo-os de alvos ao lado de hospitais, escolas, orfanatos e prédios residenciais.

A ONG Human Rights Watch e a Unesco repudiam o fato de que os governos se omitem ou são muito lerdos na busca de punição aos responsáveis pelas agressões e homicídios. Avaliam que ficam livres nove em cada 10 homicidas de comunicadores.

Segundo a agência da ONU, essa impunidade “leva a mais assassinatos e muitas vezes é um sintoma de agravamento do conflito e da falência dos sistemas legais e judiciais”.

Cá em Pindorama (me perdoe o mestre Élio Gaspari!), a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) denuncia que número de agressões graves a jornalistas cresceu 34,2% nos primeiros cinco meses deste ano, em comparação com o mesmo período do ano anterior. Os ataques à Esplanada dos Ministérios em 8 de janeiro reforçaram a violente contabilidade, mas casos esparsos têm proliferado em todo o Brasil e se espalhado principalmente em quatro continentes: Europa, América, Ásia e África, como sempre relatamos e denunciamos em nosso blog Tambor da Aldeia (https://tambordaaldeia.blogspot.com/).

Uma relevante iniciativa para coibir, responsabilizar e punir agressores dos nossos profissionais foi deflagrada no final de outubro pelo Observatório da Violência contra Jornalistas e Comunicadores Sociais, coordenado pela Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP): um canal exclusivo para jornalistas denunciarem agressões no exercício da profissão.

Isto tudo vêm a calhar neste Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas, adotado pela ONU desde 2013, não nos permitindo olvidar o sequestro e assassinato dos jornalistas Ghislaine Dupont e Claude Verlon, da Radio France International (RFI), no Mali, em 2 de novembro daquele ano.

A imprensa é fundamental para a cidadania e os ataques aos profissionais e veículos de comunicação devem ter seus autores identificados, responsabilizados e punidos, sem demora e sem quaisquer protelações. Pelo fim da impunidade!

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(*) Volson Antônio Romero é jornalista, diretor de Direitos Sociais da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e membro da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Liberdade de Imprensa da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)

VILSON ROMERO: Os servidores, o patrão e a reforma

Vilson Antonio Romero (*)

O artigo 236 da Lei n°. 8112, de 11 de novembro de 1990, que dispõe sobre o regime jurídico (RJU) dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, estabelece que “o Dia do Servidor Público será comemorado a vinte e oito de outubro”.

Neste ano, grande parcela do funcionalismo federal, ou seja, os trabalhadores do serviço público chegam ao mês de outubro comemorando: escolheram seu “patrão”. Ou seja, fizeram campanha e votaram no atual presidente da República.

Desde a instalação da equipe de transição, depois do pleito, ainda em 2022, os integrantes da equipe governamental recebem inúmeras demandas dos servidores, começando pela comprovação do congelamento de vencimentos e subsídios no governo anterior que redundou em mais de 27% de perdas salariais acumuladas, desde janeiro de 2019.

Além desta efetiva queda no poder aquisitivo dos funcionários, foram pautadas a revisão ou revogação de muitos dispositivos com medidas chamadas “antissindicais”, como decretos, portarias e normas infralegais atentatórias ao bom desempenho do serviço prestado à sociedade.

Mas nada disto avançou, a não ser uma recomposição parcial de 9% nos salários desde maio passado, que foi efusivamente aplaudida por algumas lideranças mais apaixonadas pelo novo comando palaciano.

Mas, como sempre reforçamos, uma das principais medidas de ajuste fiscal, em qualquer mandato, seja progressista ou conservador, de direita ou de esquerda, na União ou nos entes federados, sempre será a folha de salários dos servidores ativos, aposentados e pensionistas do Poder Executivo. Legislativo e Judiciário sempre se livram das agruras infligidas aos “barnabés”.

A despeito disto, o governo instalou uma Mesa Nacional de Negociação Permanente (MNNP) onde não se anunciava a possibilidade de avanços nas tratativas de, inclusive, pautas não-salariais. Mas tal ainda não se concretizou num eterno jogo de empurra.

Por outro lado, as lideranças partidárias de direita, insufladas por frentes parlamentares ligadas ao empreendedorismo e a setores econômicos, pressionam parlamentares para que seja retomada a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, que trata da reforma administrativa.

Reforma esta que pretende lotear o Estado brasileiro, como avaliam especialistas, e atacar conquistas democráticas e pactos sociais construídos desde a redemocratização.

Seus efeitos, portanto, estão relacionados ao aprofundamento das desigualdades sociais e ao esgarçamento do tecido social, analisa o Dieese.

Fim da estabilidade do servidor, contratação por tempo determinado, demissão de “cargos obsoletos” e dificuldade de acesso aos direitos básicos são algumas das mudanças que podem ser implementadas com a PEC 32/2020 que afetam os servidores públicos e a organização do Estado brasileiro.

Portanto, as ameaças continuam e recrudescem, mas o atual governo também urde suas mudanças sem dialogar com os servidores federais, inclusive sinalizando com criação de cargos e carreiras “transversais”, sem explicar o que vem a ser isso.

Além disso, as regras do arcabouço fiscal e a postura dos governantes na MNNP já sinalizam que os dias difíceis continuarão. Servidor, festeje, se possível, mas com moderação, pois parece que o patrão escolhido virou as costas a você. Rezemos que não.

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(*) auditor fiscal e jornalista

 

Câmara de Porto Alegre: O dia do Patriota e a CPI de duas cabeças

Elmar Bones

Rodrigo Lopes disse tudo no artigo sobre o ridículo da promulgação do Dia do Patriota, pela Câmara de Vereadores de Porto Alegre.

Um detalhe: a desatenção, que Rodrigo justamente cobra do eleitor em relação aos trabalhos do legislativo municipal, tem origem no descaso da própria imprensa com o que se passa no Palácio Aloísio Filho,(sim, esse é o nome)  onde os edis mal ou bem decidem os destinos da cidade.

O Dia do Patriota, projeto de autoria de um vereador que foi cassado, promulgado esta semana, diz muito sobre a Câmara. Mas diz também sobre uma imprensa que não acompanha os trabalhos do legislativo municipal (nem do Estadual e nem no federal, se for ver bem).

Nem no tempo da ditadura havia tanto desinteresse pelo trabalho parlamentar nos municípios e nos Estados.

Na Câmara de Porto Alegre, por exemplo, ocorre um fato inusitado, inédito talvez: formaram-se duas CPIs para investigar os mesmos fatos: as compras de livros e materiais didáticos e esportivos pela Secretaria Municipal de Educação, em licitações de carona (sem licitação, na verdade).

A carona em licitações alheias é permitida por lei em situações emergenciais, mas que emergência havia em adquirir os livros e todo aquele material para deixar acumulados em vários depósitos, inclusive pagando aluguel?

Os livros não se enquadravam no projeto pedagógico da Secretaria Municipal e teriam sido adquiridos numa carona em licitação do Estado de Sergipe,  junto com outras 15 prefeituras, que compraram um total de quatro milhões de exemplares ao preço médio em torno de 40 reais o exemplar. Como e por que a prefeitura entrou nesta carona? E nas outras?

São alguns dos fatos que precisam ser esclarecidos  e há duas comissões de inquérito na Câmara Municipal com esse objetivo.

Uma formada pela oposição que quer explicações do prefeito. Outra da base governista para mostrar que o prefeito já esclareceu tudo, tomou as providências devidas, não há o que explicar.

E a imprensa? Pelo pouco que publicou até agora tende a endossar a versão oficial.  A informação bombástica, de que o prefeito se reuniu com os empresários antes da compra, revelada pelo Matinal,  foi ignorada  pelos demais veículos.

Como é que a população vai se interessar pelo que se passa na Câmara se não há informação sobre o que se passa na Câmara?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VILSON ROMERO/ Fios soltos na simplificação tributária

Vilson Antonio Romero (*)

Vamos combinar: não está sendo feita uma reforma tributária. O texto em tramitação hoje no Senado Federal traz, isto sim, uma simplificação parcial do “manicômio tributário” no qual vivem os contribuintes brasileiros.

Surgem dois novos tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), no âmbito federal, fundindo a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), o Programa de Integração Social (PIS) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), no subnacional, juntando o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) com o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN ou ISS).

Houve alguns avanços nessa unificação dos impostos e contribuições incidentes sobre o consumo de bens e serviços, usualmente chamada de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) mas as benesses finais do texto aprovado na Câmara exigem a necessidade de compensação na alíquota média dos novos tributos que pode elevar a mesma ao topo da taxação do gênero em termos internacionais.

Há inúmeros fios soltos ainda no processo que tem apoiadores entusiasmados tanto quanto críticos exacerbados. As autoridades afirmam que não teremos o melhor IVA do mundo, mas talvez o melhor sistema de cobrança.

Algumas mudanças sinalizadas são alentadoras, como observar a taxação no destino, acabar com a cumulatividade (tributo dobre tributo) e, a despeito da centralização da gestão em um Conselho, tentar preservar o pacto federativo, assim como instituir um “imposto do pecado” sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente.

Porém as pressões setoriais surtiram efeito: na Câmara, inúmeros setores foram privilegiados com isenções ou redução em até 60% nas alíquotas aplicáveis.

Foram expressamente isentadas atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística; serviços de educação previstos pelo ProUni; serviços de transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano; produtor rural pessoa física ou jurídica com receita anual inferior a R$ 3,6 milhões e para produtos integrados; serviços relacionados ao programa emergencial de retomada do setor de eventos (Perse); bem como itens de uma futura cesta básica nacional.

Outros setores lograram constitucionalizar a redução das alíquotas em cerca de 60%, como serviços de educação; serviços de saúde; dispositivos médicos e de acessibilidade para deficientes; medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; insumos agropecuários e aquícolas, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal; produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais e atividades desportivas; bens e serviços relacionados à segurança e soberania nacional, segurança da informação e cibernética.

É uma questão aritmética: se a alíquota de referência, estimada em 24%, diminuir ou zerar para alguns, deverá ser compensada com a elevação para outros segmentos econômicos de modo a termos o que se chama da “reforma neutra”, sem elevação da carga tributária já paquidérmica.

Isso sem falar que a Cofins, principal contribuição mantenedora do maior programa de mitigação da desigualdade, a Seguridade Social, deve sumir nesse cipoal, sem que permaneça a garantia e integridade dos recursos orçamentários destinados à saúde, assistência e previdência social, políticas fundamentais do nosso “welfarestate” tupiniquim.

Há inúmeras outras questões que nos fazem duvidar se, efetivamente, teremos uma mitigação da chamada “guerra fiscal”, nos termos do texto em tramitação no Congresso Nacional, até porque com essa simplificação tributária ainda não chegaremos perto de cumprir a promessa eleitoral de “colocar o pobre no orçamento e o rico no imposto de renda”. Falta muito. Vamos torcer.

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(*) jornalista, auditor fiscal, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, diretor da Associação Riograndense de Imprensa.

 

O Brasil do êxodo urbano

Vilson Antonio Romero (*)

Entre 1960 e 1990, o Brasil viveu um movimento migratório intenso, em razão do intenso processode industrialização nacional, levando hordas de cidadãos do campo para a cidade, fazendo com que mais do que 50% da população fosse morar e se “amontoar” em comunidades nas metrópoles, em especial nas regiões circunvizinhas às capitais da Regiões Sul e Sudeste.

Passado meio século do fenômeno denominado“êxodo rural”, o censo demográfico de 2022, divulgado em julho pelo IBGE,escancara os números de um movimento inverso, com a tendência ao deslocamento da população dos grandes centros urbanos para cidades menores do interior ou polos em desenvolvimento, afastados das regiões metropolitanas.

Capitais estaduais como Salvador, Belém, Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Fortaleza, mesmo passados 12 anos do último censo, não cresceram em termos populacionais.

O número de habitantes de cada uma delas caiu, em percentuais superiores a cinco por cento,em alguns casos, com destaque para a capital baiana que perdeu quase 10% de sua população.

Os analistas e demógrafos estão debruçados na busca das motivações e justificativas desse êxodo urbano na direção de municípios com menor densidade demográfica.

Um dos fatores evidenciados pelos próprios pesquisadores do IBGE é a quase absoluta ausência do Estado na periferia das grandes cidades, com carência de serviços públicos, como saúde, segurança, escolas e saneamento básico.

Parte dessa população mais vulnerável decidiu migrar para outras paragens ou retornar para suas origens no campo ou perto dele, na direção do desenvolvimento do agronegócio ou novos polos industriais, como petroleiros, por exemplo.

Houve uma efetiva migração não só dessa parcela da população, mas de um contingente expressivo de brasileiros, em busca em busca de outros aglomerados urbanos ou rurais com melhor infraestrutura ou menor custo de vida.

E a pandemia de Covid-19 também contribuiu decisivamente para isto. As mais de 700 mil vidas perdidas e a ameaça de contaminação,que ainda perdura, assustou os brasileiros, empurrando contingentes expressivos para o isolamento ou locais com menor densidade demográfica e uma melhor qualidade de vida.

As cidades litorâneas são exemplos desse deslocamento. Só no estado do Rio de Janeiro, as localidades da Região dos Lagos aparecem entre os municípios que mais cresceram como Rio das Ostras (48,1%),Búzios (45,16%) Saquarema (20,55%) e Cabo Frio (19,18%).

Esse novo retrato do Brasil, além de ter frustrado a expectativa do crescimento populacional, com a menor taxa registrada em 150 anos, vai exigir um redimensionamento do repasse dos recursos públicos para muitos municípios e reorganização de infraestrutura nas cidades que mais ganharam moradores.

Essa transição demográfica vai exigir imediata providência sobre a estrutura de seguridades social, sobre a constatação da tendência de envelhecimento, o esgotamento do chamado bônus demográfico, e consequente redução de jovens e força de trabalho da população economicamente ativa.

Faltam as avaliações mais detalhadas do censo eas variáveis detectadas de fecundidade, mortalidade, migração internacional, faixas etárias e de renda. Mas, de fato, um novo Brasil bate à porta.

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(*) jornalista, vice-presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e membro da Comissão de Liberdade de Imprensa da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)