UTA e Pretagô apresentam Mesa Farta e Zaze Zaze: uma festa para Vavó, em Porto Alegre
Zaze Zaze - credito Fábio Zambom/ Divulgação
A troca e o encontro de dois grandes grupos de teatro do sul do Brasil, o UTA e o Pretagô, está sendo celebrada com uma circulação de seus mais recentes espetáculos pelo RS. As cidades de Canoas, Pelotas, Porto Alegre e Santa Maria estão vendo ou revendo as montagens de Mesa Farta, do Pretagô e Zaze-Zaze: uma festa para Vavó, do UTA.
Os dois grupos desenvolvem com maestria as dramaturgias com temáticas negras. Intitulado UTA e Pretagô: encontro e circulação de temáticas negras, oprojeto iniciou sua circulação em Canoas, passa por Pelotas dias 18 e 19 de julho e chega a Porto Alegre nos dias 24 e 25, onde se apresenta no Teatro de Câmara Túlio Piva, além de realizar uma oficina. Este projeto é realizado com recursos do edital 26/2024 – SEDAC PNAB RS com financiamento Pró-Cultura do Governo do Estado do RS e realização do Ministério da Cultura do Governo Federal.
Zaze Zaze – Foto: Fabio Zambom / Divulgação
O espetáculo Zaze-zaze: uma festa para Vavó, do UTA, estreou em 2023, após ser aprovado no edital FAC-RS das Artes de Espetáculo, pelo qual recebeu um financiamento para a montagem da obra. Realizou dez apresentações em bairros periféricos e áreas centrais da cidade de Porto Alegre, e, além disso, oportunizou workshops para grupos de teatro periféricos.
ZAZE ZAZE . credito Fábio Zambom/ Divulgação
Em 2024, foi um dos espetáculos convidados a participar do Festival Porto Verão Alegre, pelo qual realizou duas apresentações. Foi selecionado como uma das montagens locais a participar do 18º Palco Giratório, em 2024. Mesa Farta, do Pretagô retrata o cotidiano da vida de pessoas negras. A metáfora da mesa alude ao fato de que comemos, bebemos, rimos, sonhamos, divagamos, decidimos, celebramos a vida e choramos a morte. Nela são feitos acordos sobre o mundo. Na mesa, o grupo Pretagô se lança a pensar sobre as possibilidades de mudanças a partir de escolhas, confissões, compartilhamentos, celebrações e decisões que se observam na atualidade.
Mesa Farta- Foto: Anelise de Carli/ Divulgação
Os dois espetáculos abordam temáticas negras em suas concepções dramatúrgicas de modos distintos. O encontro entre os dois grupos se mostra potente justamente por isso. “Acreditamos que tal encontro justifica-se tanto pela troca artística entre os grupos na elaboração da oficina a ser ministrada em conjunto, quanto pela oportunidade do público de assistir aos espetáculos e entrar em contato com estéticas diversificadas, ainda que o foco de discussão encontre pontos de contato no que se refere à temática negra”, afirma Thiago Pirajira, professor da Universidade Federal de Pelotas e artista da UTA e Pretagô.
movimenta cena sul_mesa- farta. Foto: laura testa/ Divulgação
Ao todo, na circulação, serão três apresentações de cada grupo e quatro oficinas ministradas pelos dois grupos em conjunto. As oficinas tem como público alvo artistas, professores e estudantes de artes cênicas, visto que três das cidades escolhidas para a circulação, Santa Maria, Pelotas e Porto Alegre, têm cursos de graduação que formam tanto professores de artes cênicas quanto artistas da cena. “Embora exista a previsão de ensino da história e da cultura negra nos currículos escolares, ainda há uma grande lacuna na formação de artistas e professores nas universidades. Desse modo, o projeto contribui para a formação de professores, artistas e o público em geral, seja por meio das apresentações, seja por meio das oficinas”, reflete Pirajira.
Mesa_Farta- credito Laura_Testa./ Divulgação
Sobre os espetáculos:
Mesa Farta
O título Mesa Farta traz em si uma metáfora que se faz de forma encruzilhada, nas ondas simultâneas e ambíguas. Inicialmente corresponde ao objeto mesa, repleto de alimentos. Metaforicamente a mesa farta é uma imagem que representa o desejo de fartura de vida, de prosperidade, de experiências positivas, de axé – a potência vital. Por outro lado, pode ser entendida também como um local, um tempo, ou ainda, um espaço que está inconformado, rebelado, em aspecto de recusa. A mesa, objeto real, imaginário e imaginado, elemento cênico e arranjador metafórico da narrativa do espetáculo, toma a própria dimensão de mundo, operando como o lugar que pertence àqueles que detêm o poder. A mesa assume o sentido metafórico de poder, sendo ela mesma destinatária dos papéis e documentos que organizam o tempo e as condutas sob as quais vivemos. Ao tomar a mesa como este lugar emblemático, limítrofe, as cenas que se apresentam ao longo do espetáculo se referenciam a este objeto e o tornam material e imaterial. A mesa, em Mesa Farta, possui a ambivalência e o movimento do orixá Exu, por ser ela mesma encruzilhada, morada, e o princípio causador destes movimentos / deslocamentos.
A dramaturgia é composta por cenas coletivas autorais, cenas individuais e coletivas, intercaladas ao longo do roteiro por monólogos extraídos de textos clássicos da dramaturgia euro-ocidental como Medeia de Eurípedes; Dona Rosita, a Solteira, de Frederico Garcia Lorca; A vida é sonho, de Pedro Calderón de La Barca; Medeamaterial, de Heiner Müller. Desde seu início o grupo constrói suas dramaturgias a partir de relatos pessoais, experiências individuais e coletivas, misturadas a outras histórias, textos e memórias. No caso de Mesa Farta, foram trabalhados textos clássicos euro referenciados. A trilha sonora é embalada por mixagens eletrônicas, beats sonoros misturados com ritmos como funk carioca, rap, rhythm and blues, hip hop e distorções nos microfones.
Zaze-Zaze: uma festa para Vavó
O espetáculo de rua Zaze-Zaze: uma festa para Vavó, inspirado no texto dramático Zaze-Zaze, de Hermes Mancilha, comemorou os 30 anos do UTA, de um dos mais importantes grupos teatrais do sul do Brasil. Mancilha foi uma personalidade do teatro na cena sulista. Autor, ator, iluminador, dramaturgo, diretor e professor de teatro, foi coautor de “Bailei na curva”, espetáculo tão importante na história que continua em cartaz até os nossos dias. Muitos de seus textos não foram ainda publicados, quase trinta anos depois de sua morte e este espetáculo dá visibilidade à herança desse dramaturgo tão importante na constituição do teatro negro gaúcho. A montagem conta e canta a história da vida de Vavó, uma mulher negra e pobre, símbolo da resistência negra brasileira. Em cena figuram seus percalços e conquistas até seu final, quando se torna uma árvore. A linha do tempo de sua vida, suas memórias, as conversas com seu companheiro, as cenas ritualísticas e recordações expõem a condição de vida da mulher negra no Brasil. O espetáculo explora sua caminhada, os sonhos, as relações familiares, oscilando entre cenas rituais, líricas e cômicas.
Os espetáculos da UTA têm sua identidade bem marcada. O grupo não utiliza o texto dramático tradicional como ponto de partida, e sim um processo criativo de improvisações, que resultam em narrativas diversas até chegar ao espetáculo final. Trabalhos de destaque como O Ronco do Bugio (1996) mostram a força criativa desse conjunto de atores e atrizes. Nesse espetáculo de rua o grupo fundia a figura do bugio – macaco típico do sul do Brasil que com seu ronco deu origem ao ritmo gauchesco – e o bufão europeu, figura grotesca que originou uma técnica específica de atuação na qual o ator usa sua própria força bizarra para fazer rir. Esse tipo de mescla esteve também em Mundéu o segredo da Noite (1998), no qual o grupo misturou a técnica de dança-teatro do sul da Índia, conhecida como Bharata Natyam e os personagens das Lendas do Sul, de Simões Lopes Neto. A temática sulista, bastante recorrente nos trabalhos, aparecia, também, de forma não estereotipada em Nos meses da corticeira florir (2001), espetáculo em que o público era convidado a entrar na casa de uma costureira e ali experimentar histórias antigas.
FICHA TÉCNICA:
ZAZE-ZAZE: uma festa para Vavó Inspirado na obra de Hermes Mancilha
UTA e Pretagô: encontro e circulação de temáticas negras
Pelotas – UFPel / Campus Porto
18 de julho às 16h – Zaze-Zaze ( Largo do Bola, em frente ao ICH – Rua Alberto Rosa, 117, Centro)
19 de julho às 10h – Oficina ( Bloco 3 Centro de Artes – Rua Alberto Rosa, 117, Centro)
Porto Alegre – Teatro de Câmara Túlio Piva / Rua da República, 575
24 de julho às 19h – Mesa Farta
25 de julho às 10h – Oficina
25 de julho às 19h – Zaze-Zaze
Santa Maria – Teatro Caixa Preta UFSM /Teatro Caixa Preta – Espaço Cultural Rozane Cardoso/
Avenida Roraima, 1000, Camobi
08 de agosto às 19h – Mesa Farta
09 de agosto às 10h – Oficina
Este projeto é realizado com recursos do edital 26/2024 – SEDAC PNAB RS com financiamento Pró-Cultura do Governo do Estado do RS e realização do Ministério da Cultura do Governo Federal