Quando ele nasceu, em 23 de setembro de 1788, na Estância da Piedade, em Triunfo, os pais decidiram que Bento seria um padre. Ele era o décimo filho do casal Joaquim e Perpétua Gonçalves da Silva e não revelou em nenhum momento pendores para o sacerdócio.
Atilado e com espírito de iniciativa, sentia prazer nas lides do campo. Carta de seu pai observa que o filho “sabe o que é trabalhar e cuidar do que se encarrega e eu, sem ele, não posso estar um dia”. Ao redor dos 18 anos, Bento matou um homem em um duelo.
O nome do homem não ficou registrado, mas segundo o historiador Riopardense Macedo, era “um provocador contumaz, de porta de venda” (no final da Revolução Farroupilha, também em duelo, mataria seu companheiro Onofre Pires).
O velho Joaquim, nessa época, pensou em fazer o filho assentar praça, mas acabou desistindo. A carreira militar era mesmo a vocação de Bento, mas ela só se manifestaria quando ele tinha 23 anos.
Em 1811, apresenta-se à Companhia de Ordenanças de D. Diogo de Souza, que preparava a invasão da Banda Oriental (Uruguai atual). Dispensado como excedente, seis meses depois, ele adquire uma casa de negócios em Cerro Largo (atual Melo, no Uruguai). Pouco depois, compra uma estância chamada Leonche e se fixa em definitivo na região.

Em 1814, aos 26 anos, casa-se com a uruguaia Cayetana. Nessa época, muitos rio-grandenses se haviam estabelecido na Banda Oriental, já anexada ao Brasil. Alguns tinham aderido ao movimento republicano, inclusive naturalizando-se para melhor participar da luta dos federalistas uruguaios.
Em 1820, ao passar pela região, o botânico francês Augusto de Saint Hilaire escreve sobre “os corpos de voluntários formados no decorrer da guerra atual por um estancieiro chamado Bento Gonçalves”. E registra: “Segundo me relataram, esse homem tinha a princípio reunido sob seu comando uma dúzia de desertores. Em seguida, essa tropa foi reconhecida de utilidade pelos chefes militares e aumentada posteriormente, de um número considerável de voluntários”.
Saint Hilaire se referia a acontecimentos de 1816, quando Bento organizara um pequeno grupo de guerrilha para proteger sua fazenda e a de vizinhos contra o roubo de gado, praticado pelas facções em luta.
Naquele ano, seus homens chegaram a ocupar Cerro Largo. O historiador argentino José Domingo Sarmiento sustentou que o pastoreio no pampa garantia aos estancieiros as mesmas condições dos cidadãos livres de Esparta ou Roma. O gado substituía o escravo, como sustentáculo da vida material, deixando aos proprietários o tempo livre para se dedicar à política ou à guerra, o que frequentemente era a mesma coisa.
A campanha se dividia em comandâncias, de que faziam parte todos os habitantes. As milícias eram tropas ocasionais “surgindo ou se dispersando com a mobilidade indispensável à guerra no pampa”.
O comandante era sempre um estancieiro, “pronto para agrupar a gauchada da zona”. O Estado “recorria aos chefes prestigiosos entregando-lhes os comandos”. Ter propriedade rural, charqueada ou comércio e se dispor a fardar e armar seus guerreiros eram condições indispensáveis para ser um oficial de milícias.

Bento, assim como Neto, ascendeu rapidamente nesta “escola de desgraças”, como define Rubem de Barcellos. Aos 29 anos, Bento era major de milícias, amigo dos caudilhos orientais. Muitos deles o visitavam na fazenda Leonche. Seu irmão, Antônio Gonçalves, era amigo pessoal do próprio Artigas.
Mas quando estoura a guerra de libertação da Banda Oriental (hoje Uruguai), em 1825, a casa comercial de Bento é destruída e a fazenda Leonche, saqueada. Ele transfere sua casa para a estância Cristal, em Camaquã, no lado brasileiro.
Em 1833, como comandante da fronteira de Jaguarão, sofre um duro golpe: influenciado por integrantes da Sociedade Militar, o presidente da Província, José Mariani, acusa Bento de conspiração com rebeldes uruguaios para anexar o Rio Grande à Cisplatina. Ao fazer a própria defesa perante o padre Diogo Feijó, ministro da Justiça com poderes excepcionais, Bento não só provou sua inocência como derrubou o acusador. A seguir, indicou o novo presidente da Província, que iria derrubar pouco depois.

Braga renovaria a acusação a Bento em abril de 1835, pouco depois de ele haver sido nomeado comandante da Guarda Nacional do Rio Grande do Sul. Na abertura da primavera daquele ano, ele se insurgiu contra o presidente, obrigando-o a fugir. Bento Gonçalves morreu dois anos depois da pacificação, quando ainda era proibido falar em Revolução Farroupilha.
Uma das lendas a seu respeito diz que ele morreu “na miséria”, socorrido pela caridade de amigos. Seu inventário desmente isso, segundo Costa Franco. Ele deixou uma fazenda de mais de uma légua de sesmaria, com 700 cabeças de gado e 33 escravos, totalizando um patrimônio de 57 contos de réis.