A atualidade de Herzog na luta pelo jornalismo e a democracia

Foto: Fundação Herzog

Foi impressionante. Sábado de sol, em plena de primavera, e lá estavam aquelas pessoas, umas 60 ou pouco mais, confinadas no sétimo andar de um edifício no centro de Porto Alegre para falar de um fato hediondo, ocorrido a meio século.

Foram trocar informações e refletir sobre o assassinato de Wladimir Herzog, seu significado na história, sua atualidade na luta pela democracia.

Um jornalista reconhecido, admirado pelos colegas, um homem cordial, pai de família. Foi de livre vontade prestar depoimento num inquérito que apurava a influência de comunistas na imprensa.

Foi torturado até a morte. Uma foto escabrosa tentou mostrar que ele havia se suicidado. Provou o contrário.

“O assassinato do Vlado em dependências militares marcou o início do fim da ditadura militar de 1964”, disse Rafael Guimarães.

“Herzog foi indiciado num inquérito contra os comunistas, mas ele foi morto por ser jornalista”, afirmou Elmar Bones.

Os dois jornalistas, também presos durante a ditadura, fizeram a “exposição de motivos” para o debate, mediado pela repórter Márcia Turcato.

Bones lembrou que o assassinato de Herzog aconteceu num momento crucial das relações da ditadura militar com a imprensa. “O núcleo duro da ditadura naquele momento tinha dois alvos: os comunistas e os jornalistas, que muitas vezes se confundiam, como no caso de Vlado, que era filiado ao PCB, embora não fosse um militante ativo”.

Como Diretor de Jornalismo na TV Cultura de São Paulo,  inteiramente absorvido por projeto de jornalismo profissional é que ele se tornou alvo.  Para um regime que pretendia controlar o noticiário, o bom jornalismo que sua equipe praticava  era muito incômodo.

“Havia um racha no poder militar que governava o país. Ernesto Geisel, o general presidente, queria uma retirada dos militares, “lenta, gradual e segura”. Seus adversários internos estavam atras de inimigos para provar que era um erro “abrir o regime”.

A imprensa era o fator decisivo nesse embate. Os grandes grupos de comunicação haviam apoiado o golpe, mas não estavam dispostos a bancar a perpetuação dos generais no poder, ainda mais com a censura que vigorava.

Foi nesse contexto que se desencadearam as perseguições a jornalistas. Vlado foi o caso mais simbólico, mas não o único.

Passados 50 anos, os militares estão fora do poder, mas a democracia brasileira continua à espera de um jornalismo como o que pretendeu Herzog: voltado para as demandas da população, por informações confiáveis que lhe facultem o exercício da cidadania em todos os níveis.

As demandas são imensas e crescentes, a oferta minguada e, com escassas exceções, de baixa qualidade. “Lutar para mudar esse quadro é o desafio dos jornalistas que pretendam honrar a memória de Wladimir Herzog”, concluiu Bones.