Tratadas como “boas notícias”, neste cenário de guerra do Rio Grande Sul pós-enchente, duas medidas anunciadas nesta terça-feira, 15 de maio, indicam a visão de curto prazo, de quem toma providências paliativas.
A longo prazo, ambas são “más notícias” para o Rio Grande do Sul.
A primeira, anunciada pelo governador Eduardo Leite, é a suspensão do pagamento da dívida que o Rio Grande do Sul tem com a União.
O governador disse que o acordo representa “um “alívio” nas contas do governo Estadual, de 11 bilhões de reais.
Esse “alívio” é relativo, porque há sete anos o governo gaúcho não paga as parcelas do principal da dívida com a União. (Paga apenas os atrasados, renegociados em 30 anos.) Os pagamentos iriam recomeçar a partir da renegociação com o Tesouro Nacional, agora concluída com a suspensão, por conta da enchente. .
Com a suspensão por três anos, Leite salva seu mandato e empurra com a barriga uma situação insustentável, uma dívida impagável que foi gerada por contratos lesivos ao Estado.
Era uma dívida de R$ 9 bilhões em 1998, quando foi renegociada pela primeira vez. Depois de ter pago algo como R$ 40 bilhões, nos últimos sete anos, o Estado deixou de pagar as parcelas. Mas o saldo devedor supera os R$ 95 bilhões.
Ao aceitar a suspensão por três anos, sem questionar as condições de pagamento da dívida, Eduardo Leite livra seu mandato, mas empurra com a barriga um problema estrutural e perde a oportunidade de uma revisão nos fundamentos dessa dívida que, segundo estudos já feitos na Assembleia, já foi paga. Deixa uma bomba-relógio para o próximo governo.
Já o prefeito Sebastião Melo anunciou a contratação de uma “consultoria internacional” para gerir a reconstrução da capital arrasada pelas águas do Guaíba.
O prefeito, segundo ele mesmo disse, foi procurado pelo diretor no Brasil da Alvarez & Marsal, que é gaúcho, e se prontificou. Nos primeiros 60 dias, a consultoria não cobra nada, depois haverá um contrato. Algumas concessionárias de serviços públicos, como a Equatorial, já manifestaram seu apoio ao projeto.
A Alvarez& Marsal é uma consultoria americana que tem escritório no Brasil desde 2004. Suas especialidades são as soluções corporativas, reestruturações financeiras, gestão empresarial. Suas credenciais para assumir a gestão da reconstrução de Porto Alegre seriam suas atuações no desastre provocado pelo ciclone Catrina, em New Orleans, e na tragédia de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Mas essas “atuações” são questionadas e sequer aparecem no site da empesa.
Sejam quais forem as qualificações da A&M para atuar em desastres climáticos, sua contratação pela prefeitura de Porto Alegre sinaliza para o caminho das soluções paliativas, pontuais. Qualificar os quadros técnicos existentes e preparar a estrutura pública, não só para reparar os estragos de agora, mas para uma ação permanente de prevenção e redução de riscos, seria o prioritário, numa visão de longo prazo. Em vez disso, contrata-se uma consultoria, que vai se valer do conhecimento local para montar um plano de gestão da crise e, depois da crise, quando termina seu contrato, ela vai embora, levando a expertise em seu portfolio. Voltará na próxima enchente.
Acorda, Rio Grande.
(Elmar Bones)
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