Há uma rede de pesquisadores de plantas medicinais no serviço público de saúde

Em vias de aposentar-se na Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, onde trabalha há 39 anos, a farmacêutica Silvia Ciemainski decidiu manter-se trabalhando em sua especialidade — o uso de plantas medicinais na saúde pública –, mesmo sabendo que a escassez de recursos orçamentários criou uma situação extremamente desfavorável à pesquisa e ao uso de fitoterapia no Serviço Único de Saúde (SUS).
Para Silvia, não teria cabimento desanimar só porque o tratamento da maioria das doenças é feito com medicamentos sintéticos fabricados por grandes laboratórios industriais. Ela coordena há 13 anos no RS um programa que, ao nascer em 2006, envolveu 13 ministérios coordenados pelo de Saúde. No Rio Grande do Sul, foi criado o projeto Planta Viva, liderado pela farmacêutica Jussara Cony, militante do PCdoB que chegou a exercer o cargo de deputada estadual. Graças a uma rede de mais de 800 pessoas, o Planta Viva se espalhou por todo o território gaúcho, onde “cada município tem pelo menos uma prática nessa área”, informa a Dra. Silvia.
A lei estadual 12560/2006, denominada lei da fitoterapia, prescreve práticas integradas, em contraponto à fragmentação da prática médica, dividida em especialidades que se ignoram ou pouco se comunicam entre si. Além de fazer seminários para difundir os objetivos e métodos de uso de plantas medicinais no SUS, o departamento de Silvia (composto por oito especialistas) promove cursos de 42 horas para capacitação de pessoal, dando ênfase às políticas públicas, ao princípio da integralidade, esmiuçando a legislação e ensinando o cultivo de espécies vegetais e sua aplicação. Já passaram pelo curso 320 pessoas. Ela acredita que a partir de 2020 o uso de plantas medicinais vai virar rotina na gestão da Saúde, como já acontece em alguns municípios.
Nova Petrópolis, na Serra Gaúcha, é modelo de atuação no SUS. Lá, além de cultivar, o pessoal colhe, seca e embala o material fitoterápico. Para chegar a esse nível, chamado de “farmácia viva”, o município precisa ter um horto, como acontece também no município de Sapucaia do Sul, na Grande Porto Alegre. O Jardim Botânico de Porto Alegre, ameaçado de extinção pelo governo de Ivo Sartori (2015-2018), foi preservado sob a responsabilidade do biólogo Fernando Vargas.
O berço da farmácia viva no Brasil é Fortaleza. Em Curitiba, funciona sob o comando do Dr. Graça. No Espírito Santo, sobressai Henriqueta Sacramento. No Maranhão, onde trabalha a Dra. Moema, há mais de 500 farmácias vivas. Em Pelotas, destaca-se a Embrapa. No Rio, a Fundação Osvaldo Cruz. Em tudo quanto é lugar, a Emater, que dá assistência a agricultores familiares, indígenas e quilombolas. No Cepes, em Porto Alegre, onde trabalham seis pessoas, foram criadas quatro patentes na época do governo Olívio Dutra. No Ministério da Saúde, a pessoa de referência se chama Katia Torres. Parece pouco, mas é uma rede.
Segundo um levantamento sobre as 50 espécies vegetais mais usadas em fitoterapia, concluiu-se que 30 não são nativas, contrariando exigência da lei 12560. A partir dessa descoberta, o pessoal envolvido com o projeto passou a focalizar a salvação de espécies nativas ameaçadas de extinção, como a espinheira santa. “Não é fácil trabalhar no universo vegetal”, diz Silvia, salientando que só de carqueja há 60 variedades, nem todas portadoras dos mesmos princípios ativos.
Por tabela, passou-se a encarar mais fortemente o trabalho das abelhas no campo da preservação da biodiversidade, ameaçada pelo uso predatório de produtos químicos de alta toxicidade na agricultura. Segundo a Dra Silvia, os riscos sobre os seres vivos crescem à medida que se agravam os sinais das mudanças climáticas na superfície terrestre.
 
 
 

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