A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, anunciou nesta quinta-feira (5), um investimento de R$ 220 milhões na Ceitec, empresa pública nacional produtora de semicondutores, o dobro do previsto inicialmente. A cerimônia aconteceu no auditório da companhia, em Porto Alegre, com a presença do presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Celso Pansera, e do presidente da Ceitec, Augusto Gadelha.
O investimento será aplicado na adequação da plataforma industrial da Ceitec para a produção em escala de semicondutores de carbeto de silício (SiC), utilizados em dispositivos de potência, componentes eletrônicos que controlam e chaveiam o fornecimento de energia a motores e máquinas elétricas; na transferência de tecnologia; e na internalização de novos processos produtivos. Eles terão aplicações estratégicas, como em sistemas de conversão de energia solar e em módulos de controle para veículos elétricos, setores-chave para a transição energética e a sustentabilidade.
“A produção local desses semicondutores posicionará a Ceitec como uma peça fundamental no fortalecimento da cadeia tecnológica nacional e no atendimento às demandas de mercados em expansão”, enfatizou a ministra. “Não temos dúvidas que a Ceitec reúne as condições para o desenvolvimento e a fabricação de dispositivos que atendam aos desafios globais, como o da transição energética, fornecendo insumos para painéis fotovoltaicos, veículos elétricos e híbridos. Já há, inclusive, encomendas de chips feitas.”
O aporte de R$ 220 milhões será dividido em três anos: R$ 96,5 milhões em 2024; R$ 101,5 milhões em 2025; e R$ 22,36 milhões em 2026. Os recursos são do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
A empresa representa o caminho natural para a aquisição, pelo Brasil, do conhecimento científico, tecnológico e produtivo detido por poucos países do mundo, em um setor no qual tem ocorrido nos últimos anos uma expressiva transformação tecnológica, impulsionada principalmente pelo amplo uso de chips semicondutores em componentes eletrônicos, presentes em praticamente todas as atividades da sociedade moderna.
Rio Grande apoia e abandona
O presidente da Finep, Celso Pansera, lembrou que a Ceitec passou por sérios desafios nos últimos anos, como o processo de liquidação que foi revertido a partir de 2023. Segundo ele, os investimentos estratégicos demandam tempo para serem bem-sucedidos. “A transição energética precisa muito de semicondutores, e a Ceitec tem condições de ocupar esse mercado”, disse.
O projeto Ceitec começou a tomar forma em 2000, quando um protocolo de intenções foi firmado entre os governos municipal, estadual e federal, instituições de ensino superior e empresas privadas (incluindo a Motorola). Em 20 de abril de 2002 foi realizada a assembleia de fundação de uma associação civil que daria início aos trabalhos.
Em 2005 iniciaram-se as atividades do Centro de Design, onde são desenhados os projetos de chips, nos parques tecnológicos da UFRGS e da PUCRS. No mesmo ano, também começou a construção do prédio de pesquisa e manufatura da futura empresa, localizado no bairro Lomba do Pinheiro. Portanto, era um projeto que envolvia amplamente os setores tecnológicos do Rio Grande do Sul.
De repente, em julho de 2018, o jornal Zero Hora, do Grupo RBS, publicou um editorial com o título: “Ceitec: coleção de promessas”, com uma linha de apoio: “A criação de uma fábrica estatal de chips é, sobretudo, fruto da visão equivocada de que o Estado deve gerar riqueza, quando o papel deve ser o de não atrapalhar a livre-iniciativa”. Poucos meses depois, Jair Bolsonaro conquistou a Presidência da República.
Em junho de 2021, Bolsonaro determinou a extinção da Ceitec. A recomendação pela extinção foi formalizada pelo conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), sob a alegação de que, apesar dos aportes, a estatal ainda depende de injeções anuais do Tesouro. O argumento era que a Ceitec tinha prejuízo de R$ 80 milhões por ano e consumido R$ 1 bilhão de recursos federais.
A presidência da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) ficou em silêncio, assim como a maioria dos empresários gaúchos. E a Fiergs acreditava no projeto. Em seu material de divulgação dizia: “A consolidação de um centro de tecnologia avançada nas áreas de semicondutores e microeletrônica faz parte das ações que vêm sendo desenvolvidas pela Fiergs. A entidade trabalhou fortemente e obteve a primeira vitória em 2000, quando foi criado o Ceitec.”
Naquele momento, quem se manifestou contra a possibilidade de extinção da Ceitec foi Ricardo Felizzola, empresário do setor de microeletrônica, CEO do grupo Parit, que reúne as gaúchas Altus e Teikon, que fez uma joint venture com a coreana Hanna Micron em 2009, fundando a HT Micron, localizada localizada no Campus da Unisinos. Em 2016, o Grupo Parit saiu da joint venture.
Para ele, a Ceitec cumpriu o papel de fazer com que o Brasil passasse a dominar o processo de produção de chips e ajudou a criar um ambiente que fez surgir outras empresas e formou mão de obra qualificada. Salientou que se investiu pouco. “Em qualquer lugar do mundo, se gasta de US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões”, disse à imprensa.
O processo de liquidação da Ceitec ficou parado desde setembro de 2021, por decisão cautelar do Tribunal de Contas da União (TCU). Em novembro de 2023, o presidente Lula assinou um decreto que autorizava a reversão do processo de dissolução societária da Ceitec.