Crescimento da gestão de fortunas pelos bancos mostra a concentração de renda

A gestão de fortunas pelos bancos brasileiros apresentou crescimento significativo nos últimos anos. Também conhecido como private banking, é um serviço bancário especializado em gestão de patrimônios de alto valor.  O acesso ao private banking está limitado a clientes que atendam a uma disponibilidade mínima de investimento, que normalmente é superior a R$ 1 milhão.  

De acordo com os dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), no primeiro semestre de 2024, o volume administrado atingiu R$ 694 bilhões, um aumento de 7,6% em relação ao semestre anterior. Em 2023, as gestoras de patrimônio encerraram o ano com um total sob gestão de R$ 457,4 bilhões, representando um crescimento de 7,5% em relação a dezembro de 2022.  

Entre janeiro e junho de 2021, apesar da pandemia da covid19, o montante das fortunas administradas pelos bancos cresceu 8,8%, para R$ 1,768 trilhão. Em 12 meses a expansão foi de 35,4%.

É importante notar que os dados de 2023 e 2024 referem-se especificamente a gestores de patrimônio, enquanto o dado de 2021 abrange a gestão de fortunas por bancos de forma mais ampla. A diferença nos valores pode estar relacionada às distintas metodologias de coleta de dados e às definições específicas de cada segmento dentro da gestão de fortunas. O que parece é que o sistema não tem interesse em mostrar o real valor de gestão das grandes fortunas.

Esses dados evidenciam de maneira clara a crescente concentração de riqueza, um fenômeno que não se limita ao Brasil, mas afeta todo o mundo. De acordo com o relatório da organização não governamental internacional Oxfam sobre concentração de renda e suas consequências, o ano de 2024 registrou um novo pico nesse processo, semelhante ao observado durante a pandemia de covid-19. Nesse período, 204 novos bilionários emergiram globalmente, e a velocidade de acumulação de riqueza pelos super-ricos triplicou em comparação a 2023.

Os bilionários, pouco mais de 2.900 pessoas, enriqueceram, em média, US$ 2 milhões por dia. Os dez mais ricos, por sua vez, enriqueceram em média US$ 100 milhões por dia. Os cinco primeiros trilionários podem surgir em uma década.

Essa concentração brutal de renda no pós-guerra começou com o fim do Acordo de Bretton Woods (1971). – O colapso do sistema de paridade fixa entre o dólar e o ouro levou à maior volatilidade cambial e à liberalização dos mercados financeiros.

A financeirização na economia mundial começou a ganhar força a partir da década de 1970, impulsionada por mudanças estruturais no capitalismo. Esse processo pode ser entendido como a crescente predominância das finanças sobre a produção e o comércio na economia global.

A partir dos anos 1980, governos de diversos países flexibilizaram as regras sobre bancos e instituições financeiras, permitindo a expansão dos mercados de crédito e capitais. Houve um crescimento expressivo das bolsas de valores, fundos de investimento, derivativos e outras inovações financeiras que permitiram maior especulação e interconexão global.

Um poder de influência muito maior foi permitido aos bancos centrais sobre a economia. Em vez de fazer escolhas politicamente difíceis entre vários grupos de interesse, a bola ficou com bancos centrais “independentes”, que passaram a controlar a política monetária. O que significa taxa de juros e o câmbio, entre outros, nas mãos do sistema financeiro em muitos países, inclusive no Brasil.

Com a desculpa da inflação, as taxas de juros para remunerar os títulos públicos, que são comprados principalmente pelos gestores de fortunas, foram às alturas.  Esta semana, o Banco Central brasileiro aumentou a taxa básica de juros, a Selic, para 14,25% ao ano, enquanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 5,06% nos últimos 12 meses. Isso significa que os compradores de títulos públicos passaram a ter um ganho real acima da inflação de 9,19 pontos percentuais sem produzir absolutamente nada.

As grandes empresas passaram a priorizar a valorização das ações e a distribuição de dividendos, em vez do investimento produtivo, o que consolidou a influência do setor financeiro sobre a economia real. A BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo, atingiu um recorde de US$ 11,6 trilhões em ativos sob gestão no quarto trimestre de 2024, conforme a Forbes Brasil. Este montante equivale a aproximadamente 7,5 vezes o total da indústria brasileira de fundos de investimento, que detinha R$ 9,34 trilhões (cerca de US$ 1,55 trilhão) no mesmo período.

A BlackRock pode ser vista como um sintoma da concentração de riqueza, pois apenas grandes fortunas e instituições financeiras conseguem investir e se beneficiar plenamente desse modelo. Pequenos investidores têm menos acesso e controle sobre esses ativos, reforçando desigualdades no sistema financeiro.

Esse processo tem impactos profundos, incluindo o aumento da instabilidade econômica (como crises financeiras), o crescimento da desigualdade e a maior influência de instituições financeiras sobre políticas públicas e empresas.

A concentração de renda pela implantação dos conceitos do neoliberalismo foi um dos fatores fundamentais para a crise de 2008 – conhecida como “Crise do subprime” – que teve sua origem nos EUA e se alastrou pelo mundo. Resultou do estouro de uma bolha de investimentos massivos em hipotecas nos EUA que cresceram ao longo dos anos 2000.

 Embora a crise de 2008 tenha revelado os limites do neoliberalismo, ela não resultou em um abandono desse modelo pelas elites econômicas. Muitos governos continuaram a adotar políticas neoliberais após a crise, como austeridade fiscal e reformas de mercado, como é o caso do Brasil. No entanto, o evento também gerou debates sobre a necessidade de maior regulação financeira, novos modelos de governança econômica e políticas que lidem melhor com desigualdade social e estabilidade financeira.

Hoje, há uma percepção de que, embora o neoliberalismo tenha sido enfraquecido pela crise, ele ainda não foi substituído por um novo paradigma econômico amplamente aceito. A busca por um equilíbrio entre o papel do mercado e do Estado continua sendo um dos principais debates no cenário político e econômico global.

 

Nova configuração das potências em andamento

Muito tem-se falado que está em curso um realinhamento global que levará a uma nova configuração das potências, comparável à Conferência de Yalta, com um possível encontro entre os presidentes da Rússia, Vladimir Putin, dos Estados Unidos, Donald Trump, e da China, Xi Jinping.

A Conferência de Yalta reuniu três grandes líderes históricos: Franklin D. Roosevelt (EUA), Josef Stalin (URSS) e Winston Churchill (Reino Unido) de 4 a 11 de fevereiro de 1945 em Yalta, na Crimeia, após mais de cinco anos de guerra e milhões de mortos.

Se o objetivo de Yalta era criar as condições para uma ordem pós-guerra genuinamente pacífica, então a conferência fracassou. Na verdade, devido as aspirações contraditórias de EUA e URSS, esse objetivo nunca foi considerado.

Praticamente já ocupada, a Alemanha não estava mais em condições de resistir por muitas semanas. A Itália estava rendida e o Japão ainda resistia. Na Conferência de Yalta, Roosevelt, Churchill e Stalin, considerando-se vencedores sobre os nazistas e fascistas, moldaram o mundo do pós-guerra. Iniciava-se a discussão sobre a nova ordem internacional.

Apesar de suas diferenças ideológicas, eles concordaram em erradicar o nazismo alemão e o militarismo japonês de uma vez por todas. Os acordos alcançados na Crimeia foram posteriormente confirmados e expandidos na Conferência de Paz de Potsdam em julho-agosto de 1945.

Um dos principais resultados dessas negociações foi a criação das Nações Unidas e a adoção da Carta da ONU, que continua sendo a principal fonte do direito internacional. Os propósitos e princípios consagrados na Carta são projetados para garantir a coexistência pacífica e o desenvolvimento progressivo das nações.

O sistema Yalta-Potsdam foi baseado no princípio da igualdade soberana: Nenhum estado poderia reivindicar domínio – todos são formalmente iguais, independentemente de território, população, poder militar ou outros fatores. A realidade foi bem outra nas décadas seguintes.

A Conferência de Yalta, às margens do Mar Negro, foi uma das três grandes conferências que determinaram o futuro da Europa e do mundo no pós-Guerra (além da de Teerã, em 1943, e a de Potsdam, em meados de 1945). Mesmo que a divisão do mundo não estivesse nos planos das lideranças aliadas neste momento, a Guerra Fria acabou sendo uma das consequências do encontro.

Foi aprovada uma declaração sobre a Europa libertada e discutiram-se várias questões, cuja solução era apenas parcial. Por fim, eles tiveram que se curvar aos fatos: os russos estavam às margens do rio Oder, no Leste, e os estadunidenses, na fronteira oeste da Alemanha.

Tanto os EUA quanto a URSS queriam cooperação em seus próprios termos. Apesar dos acordos da Conferência de Yalta, em poucos meses o palco estaria montado para a Guerra Fria — a disputa entre as duas superpotências recém-emergidas que dividiram o mundo em dois campos ideológicos durante décadas.

“A Rússia, como a maioria da comunidade internacional, sempre aderiu ao princípio da cooperação interestatal. No entanto, o Ocidente, ainda afligido por uma síndrome de excepcionalismo e acostumado a agir dentro de um paradigma neocolonial, nunca se sentiu confortável com uma estrutura de cooperação interestatal baseada no respeito ao direito internacional. Como a ex-secretária de Estado adjunta para Assuntos Europeus e Euroasiáticos dos Estados Unidos, durante a administração do presidente Barack Obama (de setembro de 2013 até janeiro de 2017), Victoria Nuland admitiu abertamente, que em sua opinião os acordos de Yalta não foram um bom negócio para os EUA e nunca deveriam ter sido assinados. Essa mentalidade explica muito do comportamento de Washington no pós-guerra, pois as elites americanas viam o sistema Yalta-Potsdam como uma restrição inconveniente”, disse em entrevista para a Russian Today, Sergey Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Federação Russa.

Segundo ele, “a revisão da ordem pós-guerra pelo Ocidente começou quase imediatamente, com o infame discurso de Fulton de Winston Churchill, em 1946, efetivamente declarando uma Guerra Fria contra a União Soviética. Os acordos de Yalta-Potsdam foram tratados como uma concessão tática em vez de um compromisso vinculativo. Consequentemente, o princípio fundamental da igualdade soberana consagrado na Carta da ONU nunca foi totalmente adotado pelos EUA e seus aliados.” 

 Lavrov se refere a um dos discursos mais importantes que Churchill faria em sua carreira, o “Sinews of Peace”, também conhecido como o “Discurso da Cortina de Ferro”, onde definiu como “ambições agressivas da União Soviética”. Proferido no Westminster College, na cidade de Fulton, Missouri, apenas um ano após o fim da Segunda Guerra Mundial, este discurso serviria como base na retórica do Ocidente para os próximos quarenta e cinco anos da Guerra Fria. Churchill havia viajado para os Estados Unidos a convite do presidente Truman.

Os acordos e tratados de paz internacionais, negociados sobretudo a partir de 1944, consagraram a primazia da moeda norte-americana por meio de diferentes mecanismos. No capítulo V sobre reparações, presente no documento aprovado na Conferência de Yalta, em seu artigo quarto, ficou acordado, entre os Estados Unidos e a URSS, que as reparações a serem pagas pela Alemanha em forma material seriam contabilizadas em dólares, numa quantia máxima de US$ 22 bilhões, sendo que 50% à URSS. 

 

PIB fecha 2024 em 3,4% e registra maior crescimento desde 2021

O Produto Interno Bruto (PIB) do País apresentou variação positiva de 0,2% no quarto trimestre de 2024 contra o terceiro e encerrou o ano com crescimento de 3,4%, totalizando R$ 11,7 trilhões.

As variações positivas no desempenho do PIB vieram dos Serviços e da Indústria que, em comparação a 2023, cresceram 3,7% e 3,3% respectivamente. Na mesma comparação, a Agropecuária sofreu queda de 3,2%. Já o PIB per capita alcançou R$ 55.247,45, um avanço, em termos reais, de 3,0% frente ao ano anterior. Os dados são do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais, divulgado nesta sexta-feira (7), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Pela ótica da demanda, destaque para a Despesa de Consumo das Famílias, que avançou 4,8% em relação a 2023. “Para o consumo das famílias tivemos uma conjunção positiva, como os programas de transferência de renda do governo, a continuação da melhoria do mercado de trabalho e os juros que foram, em média, mais baixos que em 2023”, explica Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE. 

Outro destaque foi o investimento na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), 7,3%, que apesar de ter crescido mais, tem peso menor que o consumo das famílias. Esse indicador mede o quanto as empresas aumentaram os seus bens de capital, ou seja, ativos utilizados por empresas para produzir outros bens ou prestar serviços.

Já os principais destaques do PIB pela ótica produtiva (das atividades econômicas) foram Outras atividades de  serviços (5,3%), Indústria de transformação (3,8%) e Comércio (3,8%), que juntos foram responsáveis por cerca da metade do crescimento do PIB em 2024.

Na Indústria, a atividade de Construção foi o destaque positivo ao registrar alta de 4,3% em 2024, em função do crescimento da ocupação na atividade, da produção de insumos típicos e da expansão do crédito. Outra influência positiva, além da Indústria de Transformação, foi a Eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos (3,6%).

A queda na Agropecuária (-3,2%) reflete o desempenho da Agricultura. Efeitos climáticos adversos impactaram várias culturas importantes da lavoura que registraram queda na estimativa anual de produção e perda de produtividade, tendo como destaque a soja (-4,6%) e o milho (-12,5%).

A Despesa do Consumo do Governo teve crescimento de 1,9% no ano. As Importações de Bens e Serviços apresentaram alta de 14,7% em 2024 e as Exportações cresceram 2,9%. Já a taxa de investimento em 2024 foi de 17,0% do PIB, maior que em 2023, quando foi de 16,4%. A taxa de poupança, por sua vez, ficou em 14,5% em 2024 (ante 15,0% no ano anterior).

Do PIB de R$ 11,7 trilhões, R$ 10,1 trilhões vieram do Valor Adicionado a preços básicos, que é o quanto a atividade econômica contribui para os bens e serviços durante sua produção. Já a diferença de R$ 1,6 bilhões vem da rubrica Impostos sobre Produtos líquidos de Subsídios, que inclui impostos, taxas e contribuições pagas sobre a produção, comercialização, importação e exportação de bens e serviços, que representou um aumento de 5,5% em relação a 2023.

O desempenho dos impostos também foi influenciado pelas importações, que cresceram 14,7% em 2024. Em relação a 2023,  os impostos de importação cresceram 20,5%, enquanto o IPI teve alta de 8%. O ICMS, por sua vez, avançou 4,7%, mesma taxa do segmento de outros impostos.

 O PIB apresentou variação positiva (0,2%) na comparação do 4º trimestre contra o 3º de 2024. Entre os setores, a Indústria variou 0,3%, enquanto os Serviços tiveram variação de 0,1% e a Agropecuária recuou 2,3%. Esses números mostram a perda de fôlego no quarto trimestre, maior do que era projetado pelo mercado.

O consumo das famílias caiu 1% em relação aos três meses anteriores, a primeira queda depois de 13 altas consecutivas. Os economistas projetavam um aumento de 0,4% para esse componente da demanda. Os juros altos começam a fazer efeito sobre a atividade econômica. Além disso, a inflação de alimentos elevada também afeta o poder de compra da população, especialmente dos mais pobres.

 

Brics mantém plano de desdolarização no comércio

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), surpreendeu positivamente durante sua intervenção, nesta semana, na sessão especial de Reunião de Sherpas da presidência brasileira do Brics, em Brasília. Os sherpas são enviados dos chefes de estado/governo dos integrantes do Brics, com responsabilidade de conduzir discussões rumo à Cúpula de Líderes, que ocorrerá nos dias 6 e 7 de julho, no Rio de Janeiro.

Havia uma dúvida no ar sobre a postura do governo Lula na presidência do Brics depois de suas posições na 16ª Cúpula do Brics, que aconteceu em Kazan, Federação Russa, em outubro de 2024. Lula enviou o chanceler Mauro Vieira como chefe da delegação brasileira, devido ao acidente doméstico no banheiro do Palácio da Alvorada, com pouca expressão, ficando na borda das fotos oficiais. Mas o que realmente criou um mal-estar foi o veto ao ingresso da Venezuela no novo grupo de “parceiros”.

No entanto, na Reunião de Sherpas, ao comentar sobre cada uma das prioridades do Brasil no Brics, reforçou o comprometimento com a manutenção do uso de moedas locais em operações financeiras relacionadas ao comércio e investimentos dos países-membros do grupo, favorecendo a desdolarização. O objetivo é reduzir os custos de operações comerciais-financeiras das nações em desenvolvimento.

“A atual escalada protecionista na área de comércio e investimentos reforça a importância de medidas que busquem superar os entraves à nossa integração econômica. Aumentar as opções de pagamento significa reduzir vulnerabilidades e custos. A presidência brasileira (no Brics) está comprometida com o desenvolvimento de plataformas de pagamento complementares, voluntárias, acessíveis, transparentes e seguras”, garantiu.

Foi um recado dos países do Brics ao presidente Donald Trump, que reiterou que os Estados Unidos exigem um compromisso dos países do bloco  de que não substituirão o dólar, ou enfrentarão “tarifas de 100%”, segundo uma postagem sua na rede social Truth Social. Trump completou que os EUA exigirão um compromisso desses países de que não criarão uma nova moeda do Brics nem apoiarão qualquer moeda para substituir o dólar estadunidense.

A participação do dólar estadunidense nas reservas cambiais globais caiu para o menor nível em quase 30 anos, 57,4% no final de 2024, de acordo com o levantamento do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a Composição em Moedas das Reservas Cambiais Oficiais (COFER). Enquanto os dados mostram que a participação do dólar tem caído constantemente nos últimos três trimestres, a participação de moedas “não tradicionais” ganha terreno.

 No final de 2024, os países integrantes do bloco econômico Brics estavam usando moedas nacionais em 65% dos acordos comerciais mútuos. Em um discurso na cúpula do BRICS em Kazan em outubro de 2024, o presidente russo Vladimir Putin alertou que o uso político do dólar por Washington por meio de sanções e negação de acesso dos países ao sistema financeiro ocidental foi um “grande erro” que os forçará “a procurar outras alternativas, que é o que está acontecendo”.

Inteligência artificial

O presidente Lula ainda ressaltou que, ao mesmo tempo que a inteligência artificial oferece oportunidades extraordinárias, também traz desafios éticos, sociais e econômicos. Nesse sentido, o Brasil está propondo a Declaração de Líderes sobre Governança da Inteligência Artificial para o Desenvolvimento.

“Essa tecnologia não pode se tornar monopólio de poucos países e poucas empresas. Grandes corporações não têm o direito de silenciar e desestabilizar nações inteiras com desinformação. Mitigar os riscos e distribuir os benefícios da revolução digital é uma responsabilidade compartilhada”, disse Lula.

Para o presidente, o Brics “precisa tomar para si” a tarefa de recolocar o Estado no centro dos debates para uma governança “justa e equitativa” dessa tecnologia, sob o amparo das Nações Unidas. “Qualquer tentativa de desenvolvimento econômico hoje passa pela inteligência artificial. Não podemos permitir que a distribuição desigual dessa tecnologia deixe o Sul Global à margem”, afirmou.

Lula reforçou que a liderança do Brasil no Brics neste ano vai ressaltar o espaço para o diálogo na busca de soluções e propostas, com ênfase no multilateralismo. “A presidência brasileira vai reforçar a vocação do bloco como espaço de diversidade e diálogo em prol de um mundo multipolar e de relações menos assimétricas. Esses objetivos guiarão o nosso trabalho ao longo deste ano”, adiantou o presidente brasileiro.

Ao destacar a importância e responsabilidade histórica do bloco neste momento, Lula lembrou a chegada da Indonésia como mais recente membro pleno do grupo e afirmou que esta é a primeira vez que o bloco se reúne no Brasil em seu novo formato.

“Neste momento de crise, nossa responsabilidade histórica é buscar soluções construtivas e equilibradas. Ao longo das últimas quatro presidências do G20, sob a liderança da Indonésia, da Índia, do Brasil, e agora da África do Sul, o Brics tem sido central para avanços importantes. O Brics também continuará a ser peça-chave para que os ideais da Agenda 2030, do Acordo de Paris e do Pacto para o Futuro possam ser cumpridos. A presidência brasileira vai reforçar a vocação do bloco como espaço de diversidade e diálogo em prol de um mundo multipolar e de relações menos assimétricas”, disse Lula.

 

Retomada da indústria naval beneficia economia gaúcha

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou, nesta semana, da cerimônia de anúncio do Programa de Renovação da Frota Naval do Sistema Petrobras, em Angra dos Reis (RJ), um marco para a retomada da indústria naval brasileira. No evento, foram assinados protocolos de intenções para o reaproveitamento de plataformas da Petrobras que estão em fase de desmobilização, além da publicação de um edital da segunda licitação para a aquisição de oito navios gaseiros para a Transpetro, a maior subsidiária da Petrobras.

A licitação pública internacional lançada pela Transpetro é para a aquisição de oito navios gaseiros com capacidades de 7 mil, 10 mil e 14 mil metros cúbicos.  Com a contratação, sobe de seis para 14 o número de navios da frota de gaseiros, ampliando a capacidade de transporte de 36 mil para até 108 mil metros cúbicos.

A retomada da contratação de embarcações próprias do Sistema Petrobras integra o TP 25, programa da Transpetro que visa renovar e ampliar a frota de navios de cabotagem e aumentar a capacidade logística da Transpetro em 25%. O programa prevê a aquisição de 25 navios de cabotagem e vai atender prioritariamente às demandas de transporte de produtos da Petrobras.

Além disso, a Transpetro anunciou a contratação de 44 novas embarcações de apoio marítimo, incluindo navios de apoio e resposta a emergências (OSRVs), embarcações para inspeção e intervenções em sistemas submarinos (RSVs) e unidades para ancoragem de plataformas (AHTS).

Por meio do Ministério de Portos e Aeroportos, serão investidos mais de R$ 10 bilhões, com recursos do Fundo da Marinha Mercante, para estimular a indústria naval e fortalecer esse setor, fundamental para a economia brasileira, com a criação de 44 mil empregos diretos e indiretos.

“A nossa ideia de colocar as coisas nacionais, fabricadas pelas nossas empresas, nos nossos navios, na nossa plataforma, na nossa refinaria, é uma missão que a gente vai cumprir a cada dia. Porque nós precisamos ter consciência que um país só será soberano quando o povo tiver orgulho, não só do seu país, mas daquilo que faz, daquilo que ele acredita”, pontuou Lula.

Para o Presidente, é preciso assumir a responsabilidade de defender com mais coragem aquilo que se acredita. “Não é o Brasil que é da Petrobras, é a Petrobras que é do Brasil. Vamos continuar construindo navio, construindo sonda, construindo plataforma, pesquisando, produzindo e refinando petróleo”, destacou.

A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, ressaltou a importância da companhia para o desenvolvimento do Brasil, destacando o papel da Lei do Pré-Sal no crescimento da cadeia de petróleo e gás no país e garantindo que o reaquecimento da indústria nacional será conduzido com uma transição energética justa.

Segundo ela, a Petrobras é responsável pelo fornecimento de 31% de toda a energia primária consumida no Brasil. “Estamos projetando o futuro da companhia até 2029, com mais de 10 plataformas de grande porte, das quais sete já estão contratadas. Tudo isso é resultado de políticas públicas implementadas por meio da Lei do Pré-Sal. A expectativa é que essas iniciativas impulsionem a geração de empregos e ampliem a participação da indústria brasileira no setor naval e offshore”, afirmou.

Polo Naval de Rio Grande ressurge

O Programa de Renovação da Frota Naval do Sistema Petrobras teve início em julho de 2024 e concluiu a primeira negociação em janeiro passado.  Venceu a licitação  promovida pela Transpetro o consórcio formado pelos grupos Ecovix e Mac Laren no valor de US$ 278 milhões.

A Ecovix, responsável pelo Estaleiro Rio Grande, localizado na cidade de Rio Grande (RS), que projeta e constrói estruturas destinadas a operações oceânicas, e o Estaleiro Mac Laren (RJ) Construções de Embarcações irão construir quatro navios classe Handy, graneleiros com capacidade de carga entre 15 mil e 18 mil toneladas, que serão utilizados para transportar derivados de petróleo, como diesel, gasolina e querosene.

O Programa de Renovação e Ampliação da Frota tem a capacidade de reativação de uma indústria que já foi uma das principais do mundo na construção, desmantelada nos últimos 10 anos, com a falta de projetos e a consequente desmobilização da mão de obra.

No Rio Grande do Sul, o polo naval naufragou após o golpe parlamentar que derrubou a presidenta Dilma Rousseff (PT) e possibilitou a ascensão de Michel Temer (MDB) à presidência da República, em 2016, e a eleição de Jair Bolsonaro (2019/2022), deixando centenas de desempregados, que vieram de todo o Brasil, e a cidade de Rio Grande literalmente a ver navios.

O complexo que seria instalado pela Construtora Queiroz Galvão, por exemplo, na extremidade sul do Porto Novo, tinha investimento previsto na época de mais de R$ 20 milhões, com uma unidade para construção de estruturas navais, conversão de navios, industrialização de módulos e construção de plataformas de petróleo e gás natural. Não foi adiante.

O consórcio formado pelas empresas WTorre, Estaleiro Rio Grande, Rio Bravo Investimentos, Quip e Petrobras, previa que o dique seco de Rio Grande seria o maior do país e representaria dois mil empregos. Nele seriam construídas plataformas oceânicas de exploração de petróleo e gás, com investimento de R$ 222,8 milhões. Esse projeto também foi suspenso.

Antes, em 2008, a plataforma P-53, da Petrobras, foi a primeira montada integralmente no Porto de Rio Grande, com a utilização de 75% de conteúdo nacional. Na construção foram gerados 4.500 empregos diretos e 15 mil indiretos. Em 2013, ficou pronta a maior plataforma semissubmersível construída no Brasil, a P-55, que estava atracada no cais do Estaleiro Rio Grande 1 (ERG1).

Já no governo Bolsonaro, a Petrobras assinou contrato com a empresa Keppel Shipyard Limited, grupo de Singapura, para a construção naquela cidade da plataforma P-83, com custo de US$ 2,8 bilhões.

O mais impressionante é que, nos últimos 10 anos desse golpe na economia do Rio Grande do Sul provocado por Temer e Bolsonaro, praticamente todas as entidades empresariais gaúchas ficaram num silêncio sepulcral em relação ao abandono do Polo Naval de Rio Grande.

Com agências de notícias do governo federal, Ministério de Portos e Aeroportos, Petrobras e Transpetro

 

Fiergs alerta sobre suspensão de recursos para inovação

A Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) enviou um documento aos deputados federais e senadores gaúchos manifestando sua preocupação com a suspensão temporária do Crédito Descentralizado da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que ocorreu devido aos ajustes no orçamento para o primeiro semestre de 2025. “A recente suspensão dos financiamentos da Finep e a redução de 18% no orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para 2025 podem comprometer investimentos em inovação e a competitividade industrial”, alerta o presidente do Sistema Fiergs, Claudio Bier.

O documento enviado pela entidade destaca que a suspensão das submissões de projetos surpreendeu empresas que dependiam desses recursos para pesquisa e desenvolvimento. E lembra que a redução orçamentária é vista como um retrocesso, impactando setores estratégicos como indústria 4.0, biotecnologia e energias renováveis. “Além disso, pode gerar efeitos negativos na competitividade, reduzindo investimentos, empregos e o crescimento de novos negócios. O setor produtivo destaca a necessidade de previsibilidade e defende a ampliação dos recursos para inovação, garantindo um ambiente estável e favorável ao desenvolvimento tecnológico”, diz a carta.

O Fundo, principal fonte de recursos da Finep, terá seu orçamento reduzido de R$ 12,7 bilhões em 2024 para R$ 10,3 bilhões em 2025, afetando diretamente a concessão de crédito para inovação. A entidade pede o apoio dos parlamentares na agilização da votação da Lei Orçamentária e a ampliação da dotação financeira do FNDCT, de modo a fazer com que os recursos cheguem ao seu destino e incrementem projetos de inovação tecnológica da indústria gaúcha.

Em nota, a Finep informa que a suspensão ocorreu devido ao comprometimento de todo o limite orçamentário estabelecido para o primeiro semestre de 2025 em função do aumento expressivo da demanda e para a manutenção dos compromissos de contratos já firmados.

Além disso, a ampliação desse orçamento depende do cenário de captação de recursos reembolsáveis do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) em 2025, a serem definidos na Lei Orçamentária Anual (LOA) que ainda precisa ser votada pelo Congresso Nacional.

Em 2024, governo federal pagou R$ 950,4 bilhões em juros da dívida pública

Influenciada pelo nível alto de juros, a Dívida Pública Federal (DPF) subiu em 2024 e superou a marca de R$ 7,3 trilhões. Segundo números divulgados nesta semana pelo Tesouro Nacional, a DPF passou de R$ 6,52 trilhões em 2023 para R$ 7,316 trilhões no ano passado, alta de 12,2%.  Apenas em dezembro, a DPF subiu 1,55% em relação a novembro, quando estava em R$ 7,204 trilhões. A DPF engloba toda a dívida do governo federal, tanto interna quanto externa.

Apesar da alta em 2024, a DPF está dentro da faixa prevista. De acordo com o Plano Anual de Financiamento, revisado em setembro do ano passado, o estoque da DPF deveria encerrar 2024 entre R$ 7 trilhões e R$ 7,4 trilhões. Para 2025, o Tesouro Nacional projeta que a DPF possa alcançar até R$ 8,5 trilhões, o que representaria um aumento nominal de até 16,2%.

Tudo dentro do previsto e ninguém discute esse valor absurdo da dívida pública. Para efeito de comparação, fica acima do orçamento do Brasil para 2024, que foi de R$ 5,41 trilhões para a receita e R$ 5,39 trilhões para a despesa.

Aproximadamente R$ 762,4 bilhões desse aumento são atribuídos à apropriação de juros, que é o reconhecimento mensal dos encargos financeiros que incidem sobre os títulos da dívida.

A elevação nos juros pagos está relacionada ao aumento da taxa Selic (juros básicos da economia), que influencia diretamente o custo da dívida pública. Em dezembro de 2024, a Selic estava em 12,25% ao ano, pressionando o endividamento do governo.  

Em 2024, o setor público consolidado do Brasil pagou R$ 950,4 bilhões em juros nominais da dívida pública, o que corresponde a 8,05% do Produto Interno Bruto (PIB). Enquanto isso, o pacote fiscal enviado pelo Executivo e aprovado pelo Senado no final de 2024, com muita discussão, deverá provocar uma economia nas contas públicas de R$ 71,9 bilhões até o fim do mandato do presidente Lula da Silva.

Por causa da demanda por títulos vinculados à Selic, a proporção dos papéis corrigidos pelos juros básicos subiu de 39,66% em 2023 para 46,29% em 2024. O Plano Anual de Financiamento de 2024 revisado em setembro previa que o indicador fecharia 2024 entre 44% e 47%, contra estimativa anterior de 40% a 44%. Esse tipo de papel atrai o interesse dos compradores por causa do nível alto da taxa Selic. O percentual pode subir ainda mais nos próximos meses por causa da perspectiva de alta nos juros básicos da economia.

Dívida mobiliária

A Dívida Pública Mobiliária Interna (DPMFi) subiu 11,13%, passando de R$ 6,269 trilhões, em 2023, para R$ 6,967 trilhões, em 2024. É uma parte da DPF que se refere especificamente aos títulos públicos emitidos pelo governo federal no mercado interno.

Esse valor representa em torno de 95,2% do total da DPF. Portanto, quem está ganhando com a taxa de juros acima da inflação é a elite rentista brasileira.  Com o BC pagando aos bancos e grandes fortunas 13,25% ao ano como taxa básica pelos títulos públicos, descontando a inflação do IPCA de 2024 de 4,83%, o ganho real do investidor é de 8,42 pontos percentuais, um dos maiores do mundo.

 As instituições financeiras seguiram em 2024 como principais detentoras da Dívida Pública Federal interna, com 29,5% de participação no estoque. Os fundos de pensão, com 23,9%, e os fundos de investimento, com 21,7%, aparecem em seguida na lista de detentores da dívida.

Com a alta dos juros nos Estados Unidos e em outros países do Ocidente, os títulos do Tesouro dos EUA (Treasuries) passaram a oferecer retornos elevados com menor risco. Isso reduz o apetite por ativos de mercados emergentes, como os títulos brasileiros.

Projeção 2025

A parcela de títulos atrelados à taxa Selic na dívida pública deve seguir crescendo em 2025, conforme apontou o Plano Anual de Financiamento, em meio ao ambiente de alta de juros no Brasil e elevadas incertezas no cenário externo. A previsão é que os títulos com taxas flutuantes (pós-fixados) terminem 2025 representando de 48% a 52% da Dívida Pública Federal (DPF).

A banda representa uma elevação do nível atual da parcela de Letras Financeiras do Tesouro (LFTs, os títulos atrelados à Selic) que, atualmente, são 46,29% do montante total da dívida. E representa a continuidade na trajetória de piora na composição da dívida, que vem ganhando força desde 2023, quando a parcela pós-fixada terminou o ano em 39,66%.

Por meio da dívida pública, o governo pega dinheiro emprestado dos investidores para honrar compromissos financeiros. Em troca, compromete-se a devolver os recursos depois de alguns anos, com alguma correção, que pode seguir a Selic, a inflação, o dólar ou ser prefixada (definida com antecedência).

Com Agência Brasil e Banco Central

 

Galípolo mantém alta de juros e acalma o mercado

Na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), sob o comando de Gabriel Galípolo a taxa básica de juros, a Selic, foi elevada esta semana em um ponto percentual, para 13,25% ao ano. Galípolo foi indicado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para substituir, na presidência do banco,  Roberto Campos Neto, escolhido pelo governo Bolsonaro. Em nota, o Copom explica que a decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante…essa decisão também implica suavização das flutuações…” Uma ducha de água fria para quem esperava mudanças de rumo.

E a nota complementa: “Diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de mesma magnitude na próxima reunião. Para além da próxima reunião, o Comitê reforça que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação”.

Sempre o argumento do “perigo” da inflação, que na verdade está muito abaixo das taxas de juros. Juros em elevação significam ainda maior concentração de renda, crédito caro para aumentar a produção e o consumo, crescimento da dívida pública e da pobreza, além de um processo de recessão econômica em andamento.

O neocolonialismo no século XXI não envolve ocupação militar direta, mas mantém a desigualdade global por meio de estratégias econômicas, políticas e culturais. Isso perpetua a dependência dos países do Sul Global em relação às potências ocidentais, tornando difícil a busca pela soberania real.

Lula disse à imprensa em entrevista coletiva que num país do tamanho do Brasil, o presidente do BC não pode dar um cavalo de pau de um dia para outro. “A alta dos juros já estava demarcada. Nós temos consciência que é preciso ter paciência. Eu tenho certeza de que o Galípolo irá entregar para o povo brasileiro uma taxa de juros menor. Tenho certeza de que ele vai entregar uma inflação mais baixa.”

Em entrevista à TV 247, o economista Guido Mantega, ministro da Fazenda nos dois mandatos do presidente Lula e no primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff, explicou a arapuca preparada para Galípolo por seu antecessor, que impossibilitou um cavalo de pau na primeira reunião. Para ele, houve uma “armação” de Campos Neto, ao longo de 2024, ao não tomar providência alguma para que houvesse uma certa tranquilidade no mercado, provocando um “terrorismo” econômico. “Ele fez de tudo para que o câmbio subisse, aceitando passivamente a pressão do mercado financeiro”, disse.

Segundo Mantega, se Campos Neto tivesse tomado providências quando o dólar estadunidense valia R$ 5,50 e começasse a atuar em sentido contrário, teria contido o câmbio. Campos Neto foi provocando uma desconfiança no mercado que o governo não estava cumprindo a meta fiscal. Não fez as operações de swap cambial, que tem como objetivo proteção contra variações excessivas da moeda estadunidense em relação ao real, além de liquidez ao mercado de câmbio doméstico.

A partir disso, inventou o novo ciclo de aumento de juros, com a Selic passando de 10,50% a.a., em julho, a 12, 25%, em dezembro de 2024. De fato, quando o real se desvaloriza e os juros aumentam o processo inflacionário é criado. A desvalorização cambial repercute de forma direta na inflação de alimentos e isso tira o sono de qualquer governo, o presidente perde popularidade e as mais recentes pesquisas mostraram isso.

A desvalorização do real foi forte. No início de 2024, o real estava R$ 5,00 por dólar, depois passou para R$ 6,20 e chegou a R$ 6,27. “Tiveram outras razões, mas não inflação de consumo, quando o Banco Central realmente deve agir”, completou Mantega.

Com o BC pagando  aos bancos e grandes fortunas 13,25% ao ano como taxa básica pelos títulos púbicos, descontando a inflação do IPCA de 2024 de 4,83%, o ganho real do investidor é de 8,42 pontos percentuais. Como o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de mesma magnitude na próxima reunião, os ganhos dos rentistas se aproximam dos 10 pontos percentuais acima da inflação. Quem vai correr riscos e investir em produção no Brasil com um consumo interno nada animador, com grande parte da população vivendo da mão pra boca?

Com as atuais taxas básicas de juros, o ganho é tão extraordinário que está criando um certo constrangimento no mercado, que aconselha ao investidor não inventar muita moda e aplicar em papéis de renda fixa que acompanham o CDI (uma taxa que anda colada na Selic) e na própria Selic, os mais seguros, especialmente os isentos de Imposto de Renda. Para que inventar, não precisa.

Com as taxas de juros futuras a 15%, 16%, é óbvio que o dólar tende a se acomodar num nível mais baixo.  O dólar se acalma não havendo más notícias para os rentistas, com total apoio da mídia corporativa e neocolonial. Quem não gosta de juros de 15% a.a. no CDI livre de imposto?

O preocupante é que nos últimos anos as decisões do Copom lembram um movimento de moto-contínuo. Durante o governo Bolsonaro a taxa Selic ficou em 13,75% a.a. de julho de 2022 até junho de 2023. Depois começou a baixar para 13,25% até 11,75% em dezembro de 2023 por causa das eleições presidenciais.  

A partir de janeiro de 2024, o governo Lula continuou a redução da taxa Selic  de 11,25% até 10,50% em agosto. Em setembro sobe para 10,75%, acaba o ano em 12,25% e janeiro de 2025 passa para 13,25%. Na próxima reunião deve chegar a 14,25%. Em algum momento o Galípolo deve começar a baixar, mas os números não devem mudar muito. O mercado agradece.

 

Número de bilionários cresce, mas até quando?

Relatório da organização não governamental (ONG) internacional Oxfam sobre concentração de renda e suas condições mostra que o ritmo de concentração em 2024 teve novo pico, a exemplo do que ocorreu durante a pandemia de covid-19. Surgiram 204 novos bilionários no planeta, e o ritmo de enriquecimento dos super-ricos aumentou três vezes em relação a 2023.

Os bilionários, pouco mais de 2.900 pessoas, enriqueceram, em média, US$ 2 milhões por dia. Os dez mais ricos, por sua vez, enriqueceram em média US$ 100 milhões por dia. Alguém que receba um salário mínimo no Brasil demoraria 109 anos para receber R$ 2 milhões e, pela cotação atual, 650 anos para receber U$$ 2 milhões.

 “No ano passado, a Oxfam previu um trilionário em uma década. Se as tendências atuais continuarem, haverá agora cinco trilionários em uma década. Enquanto isso, de acordo com o Banco Mundial, o número de pessoas que vivem na pobreza praticamente não mudou desde 1990”, destaca o relatório, que aponta que os 44% mais pobres do mundo vivem com menos de US$ 6,85 por dia.

Para efeito de comparação, o Produto Interno Bruto (PIB) Global, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), teve aumento de cerca de 3,2%, para uma população que a Organização das Nações Unidas (ONU) estima de oito bilhões de pessoas. Segundo o Banco Mundial, o PIB Global era de US$ 33,86 trilhões em 2000, e chegou aos US$ 106,7 trilhões em 2023, ainda que com diminuição dos índices de extrema pobreza (aqueles que recebem menos de U$$ 2,15 por dia), que eram 29,3% da população mundial em 2000 e são ainda 9% da população nos dados de 2023. A Oxfam destacou que os 10% mais ricos, por sua vez, detém 45% de toda a riqueza do mundo.

No Brasil, a lógica não é diferente. Segundo Viviana Santiago, diretora executiva da Oxfam Brasil, de uma maneira geral, somos levados a pensar a desigualdade no Brasil a partir da chave da pobreza, mas o que torna a realidade brasileira complexa é pensar o outro lado da moeda. “Ao mesmo tempo em que temos milhões de pessoas em situação de fome e insegurança alimentar, a imensa população de rua, ou quando pensamos nas pessoas sem acesso à água e ao saneamento básico, temos o outro extremo, que são aquelas muito ricas, bilionárias. Durante a pandemia, enquanto vimos pessoas perdendo tudo e tendo de ir morar na rua, surgiram dez novos bilionários no país. Hoje, menos de 100 pessoas no país tem R$ 146 bilhões”, esclareceu.

Desigualdade global

Esse processo de brutal concentração de renda no mundo e a consequente miséria de boa parte da população dá seus primeiros passos na história recente ao final da Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos (EUA) conduziram as negociações para a construção de uma nova ordem mundial e, ao longo desta, lograram definir sua moeda nacional, o dólar, como o padrão de referência internacional. A reunião na pequena cidade rural de Bretton Woods, estado de New Hampshire, EUA, em 1º de julho de 1944, em plena Segunda Guerra Mundial, mas prenunciando cada vez mais a vitória dos Aliados, é considerada um marco no processo hegemônico dos Estados Unidos.  

Michael Hudson, economista estadunidense, historiador econômico e analista político amplamente conhecido por seus estudos, é um dos críticos mais consistentes do papel das finanças no aumento da desigualdade global. Ele argumenta que o sistema financeiro moderno explora economias produtivas ao priorizar o pagamento de dívidas e juros em vez de investir no bem-estar social ou no crescimento econômico sustentável.

Ele entende que ainda estamos vivendo uma consequência da Segunda Guerra Mundial, cujo resultado foi os EUA  assumirem o controle da organização econômica e política internacional a fim de operarem em interesse nacional próprio: o Fundo Monetário Internacional (FMI) para impor o controle financeiro estadunidense e dolarizar a economia; o Banco Mundial para emprestar dinheiro aos governos para bancar os custos de infraestrutura da criação de dependência  comercial nos alimentos e produtos manufaturados americanos; a promoção da agricultura de commodities; o controle pelos Estados Unidos/Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) do petróleo, da mineração e dos recursos naturais; e organismos das Nações Unidas, sob o controle dos EUA, com poder de veto sobre todas as organizações internacionais criadas pelos Estados Unidos ou às quais eles se filiaram.

 Ameaça vem do Sul Global

O BRICS é um grupo estratégico no contexto do Sul Global, com potencial de reconfigurar essas injustas dinâmicas econômicas globais comandadas pelo Ocidente. Pela primeira vez após o fim da União Soviética, em 1991, o império dos Estados Unidos está sendo fustigado. Atualmente, os membros plenos do BRICS são: Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e Indonésia.

O BRICS busca diversificar a ordem econômica global dominada por instituições como o FMI e o Banco Mundial, controladas pelos EUA. Com o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o BRICS procura oferecer alternativas de financiamento para países em desenvolvimento sem as rígidas imposições do FMI, que muitas vezes aprofundam desigualdades.

O BRICS também tem se posicionado contra a hegemonia do dólar estadunidense no comércio internacional. Recentemente, há discussões sobre a utilização de moedas nacionais entre os países-membros, além da criação no futuro de uma moeda comum. A redução dessa dependência pode diminuir o impacto das flutuações cambiais nas economias em desenvolvimento.

Com Agência Brasil

 

Prefeito Melo planeja conceder a gestão da Usina do Gasômetro à iniciativa privada

O prefeito Sebastião Melo (MDB) planeja conceder a gestão da Usina do Gasômetro à iniciativa privada por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) com duração de 20 anos. Os estudos para essa concessão estão em andamento e devem ser concluídos até julho de 2025.

A Prefeitura de Porto Alegre promoveu uma consulta pública referente à Parceria Público-Privada (PPP) para a gestão da Usina do Gasômetro. Todos que quisessem participar da Consulta Pública deveriam preencher o Formulário de Contribuições online via Google Forms, no período de 16 de fevereiro de 2024 até 18 de março de 2024.

A consulta pública foi anunciada para coletar sugestões e opiniões da população sobre o projeto de concessão. No entanto, até o momento não foram divulgados publicamente os resultados detalhados dessa consulta, incluindo o número de participantes, as principais contribuições recebidas ou eventuais alterações no projeto inicial decorrentes das sugestões apresentadas. Um dos marcos históricos e culturais mais emblemáticos de Porto Alegre corre o risco de ser encaminhado a uma concessão sem a participação popular.

Sebastião Melo assumiu a prefeitura de Porto Alegre em 2021, mas a Usina do Gasômetro só reabriu suas portas em 1º de janeiro de 2025, após sete anos de interdição para reformas. E de forma precária, somente para eventos. A cerimônia de reabertura seria com a posse de Melo para o seu segundo mandato. No entanto, a mãe natureza não aceita desaforo. Um temporal impediu a realização da festa.  

Com um investimento total de R$ 21 milhões, as melhorias incluem: reforma do telhado, novo piso, modernização da rede elétrica e instalação de elevadores. O teatro Elis Regina, parte do complexo, também foi reformado, recebendo um novo telhado e piso renovado.

Depois de todo esse investimento de dinheiro público, Sebastião Melo, cada vez mais próximo do Partido Liberal (PL), resolve conceder a gestão da Usina do Gasômetro à iniciativa privada, por meio de uma PPP.

O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) deverá realizar uma análise criteriosa de diversos aspectos para assegurar a legalidade, economicidade e eficiência do projeto.

Considerar as especificidades relacionadas ao patrimônio histórico da Usina, garantindo que as intervenções respeitem e preservem seu valor cultural e arquitetônico. Avaliar se a PPP oferece benefícios econômicos claros em comparação com outras formas de contratação, garantindo que os recursos públicos sejam utilizados de maneira eficiente.

Verificar se as empresas interessadas possuem garantias sólidas e capacidade financeira para executar os investimentos previstos, evitando riscos de inadimplência ou abandono do projeto.

História de recuperação e abandono

Inaugurada em 1928, originalmente foi construída para a geração de energia elétrica e produção de gás de iluminação. Com o avanço da tecnologia e o surgimento de novas formas de geração de energia, a usina foi desativada em 1970.

Na década de 1980, o prédio foi tombado como patrimônio histórico e ocorreu uma reforma para torná-lo um centro de formação profissional. Em 1991, Olívio Dutra, primeiro prefeito de Porto Alegre eleito pelo Partido dos Trabalhadores (PT) , abre a Usina como centro cultural administrado pela Secretaria da Cultura.

O local passa a abrigar exposições, espetáculos, oficinas e outras manifestações artísticas. Valoriza-se a chaminé de 117 metros de altura, um símbolo icônico da cidade, situado às margens do Lago Guaíba. Um ponto turístico importante, especialmente por seu famoso pôr do sol.

Em novembro de 2004, o ex-senador José Fogaça, então no PPS, venceu as eleições para a Prefeitura de Porto Alegre, estabelecendo uma derrota histórica para o PT, que mantinha hegemonia de 16 anos na cidade. Aos poucos começa o abandono da Usina do Gasômetro, com administrações que passaram a dar prioridade aos interesses da iniciativa privada.

É preciso reconhecer que houve uma tentativa de requalificação da Usina na gestão do prefeito José Fortunati, na época licenciado do PDT, com a ordem de serviço assinada em 18 de dezembro de 2015. O projeto original de revitalização da Usina do Gasômetro, elaborado pela 3C Arquitetura e Urbanismo durante a gestão de Fortunati, previa uma ampla reforma estimada em R$ 40 milhões.

No projeto os espaços ganhariam equipamentos modernos, mas mantendo a essência de exibição de espetáculos experimentais.  A ideia era que, com as operações comerciais, a Usina se tornasse financeiramente sustentável.

Usina é fechada em 2017

No entanto, na administração subsequente de Nelson Marchezan Jr. (2017/2021 – PSDB), a visão neoliberal prosperou e esse projeto foi considerado inviável devido ao seu alto custo e complexidade e a Usina do Gasômetro foi simplesmente fechada em 2017. Como resultado, optou-se por uma versão reduzida, focada em melhorias essenciais, como recuperação de pisos, infiltrações, pintura geral, reformulação das instalações elétricas e atualização do Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI).

Em 26 de agosto de 2019, Marchezan Júnior lançou o edital de concorrência pública internacional para as obras da Usina. Os investimentos oriundos do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) e de recursos próprios do município para a revitalização da Usina do Gasômetro foram reduzidos de R$ 40 milhões para R$ 12,5 milhões, R$ 10 milhões viriam de empréstimo junto à CAF e R$ 2,5 milhões, dos cofres da prefeitura.

Em 2021, foi revelado que a prefeitura utilizou um projeto reprovado por técnicos municipais para licitar a obra, resultando em inconsistências no processo licitatório e na execução do restauro. Essas falhas contribuíram para atrasos no cronograma e aumentos no orçamento, que poderiam chegar a R$ 20 milhões, representando um acréscimo de 70% em relação ao previsto inicialmente.

Em resumo, o projeto original da 3C Arquitetura e Urbanismo foi significativamente alterado e reduzido durante a administração Marchezan. As modificações e problemas subsequentes na execução das obras resultaram em atrasos e aumentos de custos. Por coincidência ou não, a  revitalização da Usina do Gasômetro só ocorreu em 2024,  concomitantemente   ao plano de conceder a gestão da Usina do Gasômetro à iniciativa privada por meio de uma Parceria Público-Privada com duração de 20 anos.