Governo do Estado apela para mais um plano de desenvolvimento salvador

O título da matéria publicada site do governo do Estado RS esta semana foi certeiro: “Governo reúne empresários para construir nova agenda de desenvolvimento do Estado”. Ele escancara um dos principais problemas desse e dezenas de outros planos nas últimas décadas apresentados pelos governos neoliberais e das entidades do Sistema S para tirar o Rio Gr.ande do buraco. Mesas-redondas formadas pelos convidados nesses encontros debatem basicamente propostas das corporações empresariais.

O primeiro plano mais significativo das últimas décadas foi o Relatório Sayad, que apresentou recomendações atinentes ao setor público. Esse documento foi encomendado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) e apresentado à imprensa no início de janeiro de 1989, quando se tornou conhecido como “Relatório Sayad”, porque feito pela equipe do economista já falecido João Sayad, que foi ministro do Planejamento no governo José Sarney.

No final do século passado, esses planos tinham espaço na imprensa, mas aos poucos foram relegados a pequenas matérias somente no dia do lançamento, por total falta de consequências relevantes. Os diversos projetos foram esquecidos nas gavetas e serviram mais como marketing.

 Agora, o governador Eduardo Leite, que enfrenta a contrariedade do setor empresarial, liderado pela Fiergs, que questiona a necessidade de o governo aumentar impostos ou cortar benefícios fiscais, resgata a velha fórmula desgastada.

Ele organizou um encontro no Palácio Piratini com a participação de empresários,  presidentes e burocratas de entidades de classe, principalmente do Sistema S. Leite apresentou um pré-diagnóstico sobre competitividade do Estado, detalhamento das técnicas de construção do futuro plano de desenvolvimento e a coleta de ideias para a elaboração do Plano Estadual de Desenvolvimento Econômico, Inovador e Sustentável.

O problema é que o governo de Eduardo Leite aderiu ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), ainda no governo Bolsonaro, suspendendo por um período de até dez anos o pagamento da dívida do Estado, sob a justificativa de ajustar as contas.

A contrapartida foi que o RRF permite o congelamento de investimentos em educação, segurança, saúde, assistência e todas as demais áreas de atuação do poder público. Retira a autonomia do Estado e, inclusive, da Assembleia Legislativa sobre orçamento público, delegando decisões como o reajuste de servidores para os gestores do Ministério da Fazenda.

Outra questão que os burocratas do governo e convidados evitam discutir é a criação de um novo imposto estadual para produtos primários ou semielaborados. A Lei Kandir, aprovada em 1996, trouxe para os estados brasileiros a desoneração das exportações de produtos primários e semielaborados. Depois de 25 anos de espera, em 2020, finalmente a compensação para as perdas da Lei Kandir dos estados e municípios foi regulamentada, o que garantiu o repasse no total de R$ 58 bilhões, entre os anos de 2020 e 2037.

No entanto, só o Rio Grande do Sul, um estado agroexportador, que deverá receber cerca de R$ 6,5 bilhões até 2037, calcula perdas na ordem de R$ 80 bilhões no acumulado. Assim, os juros da dívida com a União e a Lei Kandir, provocaram déficits crescentes nas contas do Rio Grande do Sul, que não fecharam mais.

Consultoria internacional

A reunião no Palácio Piratini foi conduzida pela McKinsey & Company, que tem sede nos Estados Unidos, empresa de consultoria internacional contratada pelo Estado para apoiar o projeto. Não foi divulgado o valor do projeto e se houve licitação. A consultoria também fará a estruturação da nova Agência de Desenvolvimento do Estado, aprovada em dezembro passado pela Assembleia Legislativa.

Em julho de 2022, foi publicada no Diário Oficial da Estado a dispensa de licitação para contratação da consultoria McKinsey para o estudo sobre uma cadeia de hidrogênio verde no Rio Grande do Sul pelo valor de R$ 4,9 milhões.

Acompanhando as ações dos governos neoliberais gaúchos, percebe-se que eles não acreditam na capacidade dos técnicos do Estado desenvolverem planos consistentes para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul, sem desembolsar milhões de reais com empresas norte-americanas. Um decreto assinado pelo governador José Ivo Sartori (MDB), por exemplo, encerrou as atividades da Fundação de Economia e Estatística (FEE) em 2017. A FEE foi criada em 1973, no governo de Euclides Triches, como Fundação de direito privado, destinada à execução de estudos, pesquisas e análises da economia do Estado e à elaboração de estatísticas, como órgão de apoio operacional do planejamento estadual.

A Fundação, que tinha sede própria com um número significativo de economistas extremamente capacitados, foi integrada a estrutura da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão (SPGG) com a criação do Departamento de Economia e Estatística (DEE). A equipe reduzida sucumbiu no Centro Administrativo Fernando Ferrari.

Agora, todo o processo de construção do Plano Estadual de Desenvolvimento Econômico, Inovador e Sustentável conta com o auxílio e acompanhamento da Mckinsey. A consultora está operando junto com equipes técnicas do governo em uma base instalada no mesmo Centro Administrativo. A empresa treinará a equipe que operará a Agência de Desenvolvimento, oferecendo mentoria e capacitação.  

Além da subserviência neocolonial, o pior é que tudo pode acabar nos escaninhos, misturado com gotas de café e restos de sanduiches, como os diversos planos de desenvolvimento mirabolantes criados nas últimas décadas.

    

Garrote da dívida pública e a apropriação da riqueza nacional

A dívida líquida do setor público – balanço entre o total de créditos e débitos dos governos federal, estaduais e municipais – chegou a R$ 6,693 trilhões em fevereiro de 2024, o que corresponde a 60,9% do Produto Interno Bruto (PIB). Em janeiro passado, o percentual da dívida líquida em relação ao PIB estava em 60,1% (R$ 6,565 trilhões). Portanto, em apenas um mês a dívida líquida aumentou em R$ 128 bilhões.

Em fevereiro deste ano, a dívida bruta do governo geral (DBGG) – que contabiliza apenas os passivos dos governos federal, estaduais e municipais – chegou a R$ 8,301 trilhões ou 75,5% do PIB, enquanto em janeiro foi de R$ 8,210 trilhões, 75,1% do PIB. Em um mês a dívida bruta aumentou em R$ 91 bilhões.

Para efeito de comparação, o Congresso Nacional aprovou o Orçamento da União para 2024 (PLN 29/2023), que prevê receitas e despesas de R$ 5,5 trilhões. Os recursos previstos para investimentos federais chegam a R$ 73,2 bilhões.

Os gastos com juros ficaram em R$ 65,166 bilhões em fevereiro deste ano, um aumento em relação aos R$ 64,153 bilhões registrados em fevereiro de 2023.

É só analisar os números acima para perceber que tem algo muito errado nas contas da União. Enquanto o governo federal tem para investir em 2024 R$ 73,2 bilhões, paga de juros da dívida pública, numa projeção simplificada, algo em torno de R$ 780 bilhões no mesmo período.

O Complô

Como celebração dos 35 anos da Constituição, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado promoveu em outubro de 2023 o debate “Uma Visão sobre a Dívida Pública”, com a análise do assunto desde a Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988) e seus impactos na realidade da população.

O encontro teve como ponto de partida a exibição do documentário O Complô – como o sistema financeiro e seus agentes políticos sequestraram a economia brasileira, obra inspirada no livro do ex-deputado constituinte gaúcho Hermes Zaneti, que levanta o tema do “rentismo”, definido como o ganho monetário não associado à produção, a exemplo do recebimento de juros por investidores.

O ex-deputado, diretores e participantes do documentário apresentaram suas visões sobre o que chamam de “conspiração do sistema financeiro e seus agentes infiltrados” nos três Poderes do Estado brasileiro. O debate foi comandado pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), que também foi constituinte. 

Zaneti disse que, durante a discussão para elaboração da Constituição, chegou a apresentar um projeto para que a Carta Magna previsse uma auditoria nas contas públicas e a adoção de uma gestão transparente para que a sociedade pudesse acompanhá-la. A proposta foi rejeitada e os motivos são explicados na obra. 

Segundo ele, “O Complô” é a ação das instituições de poder federal, de forma coordenada, agindo contra o povo brasileiro que as mantém, a favor de uma minoria que se beneficia do rentismo. 

No documentário, o autor defende que a política econômica do Executivo esconde uma manobra para favorecer as elites financeiras, às custas do sacrifício da população, que convive com falta de investimentos em saúde, educação, além de carestia e baixos salários. Ele ainda destaca que cerca de R$ 2 trilhões dos R$ 5,5 trilhões do Orçamento da União são direcionados para pagar a dívida pública. Ainda de acordo com Zaneti, 82% dos mais de R$ 8 trilhões do atual valor bruto da dívida, são originários dos juros. 

“A Constituição foi criada com o equilíbrio necessário entre direitos e deveres, mas seu constante desmantelamento resultou no cenário dramático que vivemos hoje. A existência de uma dívida pública de R$ 8 trilhões, nunca devidamente auditada, que paga juros de mais de R$ 600 bilhões ao ano, juntamente com os juros extorsivos cobrados pelo mercado financeiro que prejudicam a nossa economia, destroem empregos e oprimem o povo são as barreiras que impedem uma melhor qualidade de vida para nossa população. Isso não é obra da natureza, mas sim resultado das ações e omissões do poder público ao longo do tempo. Ao mesmo tempo que é obra de um poder privado que se expande sem limites”, disse o ex-deputado ao citar um trecho do Manifesto dos Constituintes em apoio ao tema abordado pelo documentário. 

Didático 

Para o diretor do curta-metragem, Luiz Alberto Cassol, o grande mérito do filme é que ele abre uma perspectiva didática para expor, de forma clara e com base histórica, onde está o rentismo, como ele opera e a serviço de quem. Ele também liberou a obra para exibição em escolas e universidades. 

É fundamental dialogarmos, mas, acima de tudo, é (necessário) colocar, de forma didática, como opera o sistema financeiro, dia e noite retirando a possibilidade do povo brasileiro à sua emancipação. E daí, os demais assuntos como a importância da saúde, a importância da vida, a importância da Amazônia, todos esses temas vão perpassar pelo sistema financeiro. Porque esse sistema financeiro atinge todos esses temas”, afirma Cassol.

Na avaliação do ex-deputado e ex-ministro do Trabalho, das Comunicações e da Previdência Ricardo Berzoini, responsável por incentivar a transformação do livro em documentário, os direitos sociais, civis e econômicos conquistados pela Constituição estão em disputa desde a sua promulgação. Na sua visão, o sistema financeiro e sua sanha por dividendos colocam em risco a soberania nacional. 

“De 1988 para cá, apesar de a Constituição ter assegurado inúmeros direitos sociais importantes, a situação do povo brasileiro não melhorou na medida do que a Constituição propunha (….). E por que não melhorou? Não melhorou porque se aplicou exatamente sobre a economia brasileira o garrote da especulação financeira, da apropriação da riqueza nacional pelo 1% mais rico, especialmente pelo sistema financeiro”, acrescentou. 

Com Agência Brasil e Agência Senado

 

 

Citi Private Bank projeta a maior transferência de riqueza da história na próxima década

“Estamos hoje no meio da maior transferência de riqueza da história. Espera-se que US$ 70 trilhões sejam transferidos durante a próxima década para a próxima geração, a Y, também conhecida como os “millennials”, dos nascidos a partir da segunda metade dos anos 1980 até o início dos anos 2000. Já está acontecendo. É o maior volume da história recente. E esta mudança é muito importante na indústria de gestão de fortunas, como private equity, fundos de hedge e investimentos diretos.” Quem fez essa projeção foi Ida Liu, sino-americana chefe global da área que atende às famílias mais ricas do Citi Private Bank, em entrevista ao jornal Valor Econômico.

É risível a generalização da geração Y como beneficiária dessa transferência de trilhões. Como sempre, aqueles que vivem o mundo dos sonhos das famílias mais ricas fogem do tema incômodo da luta de classes. Na verdade, os beneficiários serão alguns poucos filhos de bilionários, aumentando ainda mais a concentração de renda no mundo e, consequentemente, pobreza e miséria da maioria da população.

Outro questionamento em relação à projeção de Ida Liu, do Citi Private Bank, é que ela está esquecendo, certamente de propósito, que na próxima década o grupo Brics, que representa o sul global, estará com um número bem maior de países e muito mais forte. E a primeira ação desse grupo liderado pela China e Rússia, do qual o Brasil faz parte, já está em andamento, a desdolarização da economia.

Para simplificar a análise, vamos ficar com a concentração de renda no pós-Segunda Guerra Mundial. O resultado desses movimentos do imperialismo foi que em 2020, 1% mais rico do mundo já detinha mais do que o dobro da riqueza do resto da humanidade combinada, de acordo com a Oxfam. Em relatório publicado na reunião anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos, a instituição de caridade do Reino Unido disse que os impostos cobrados de indivíduos ricos e empresas estavam muito aquém do necessário, com recursos abaixo do esperado para serviços públicos. “A desigualdade econômica está fora de controle”, com 2.153 bilionários com mais patrimônio do que 4,6 bilhões de pessoas em 2019, segundo o estudo.

Todos os movimentos do neoliberalismo da segunda metade do século XX têm por trás o objetivo da burguesia de concentrar renda e poder. A razão foi que a destruição da Segunda Guerra Mundial, obrigou os Estados Unidos a criar o Foreign Assistance Act (Lei de Assistência Estrangeira), aprovado em março de 1948, conhecido como Plano Marshall. O auxílio foi estabelecido por meio de diferentes instrumentos de subsídios, financiamentos, entre outros. Em sua legislação, os valores, garantias, modalidades, remunerações, fundos etc. foram definidos em termos da moeda norte-americana.

Segundo o professor de Economia e Política Internacional, Maurício Metri, no artigo   “A ascensão do dólar e a resistência da libra: uma disputa político-diplomática”, como resultado do Plano Marshall os Estados Unidos não só tornaram possíveis os “milagres” nacionais de reconstrução e/ ou de crescimento, estabilizando as regiões estratégicas para a Guerra Fria, como também consolidaram a primazia de sua moeda ao longo das décadas seguintes, quando o mundo, em geral, presenciou uma época de prosperidade, que foi denominada a “Era de Ouro”, fundamentalmente para os Estados Unidos e Europa.

Assim surgiu o welfare state, o estado de bem-estar social, uma rede bem estabelecida de instituições sociais para proteger os cidadãos europeus, com base nos princípios da igualddade de oportunidades, distribuição equitativa da riqueza. Na verdade, a geopolítica da Guerra Fria do pós-Segunda Guerra Mundial foi que provocou o apoio dos Estados Unidos à região com incentivos econômicos do Plano Marshall para evitar o crescimento do comunismo da região.

No início dos anos 1970, o imperialismo sob o comando estadunidense recomeçou o processo de concentração de renda no mundo, fundamental para a sustentação do capitalismo. Michael Hudson, professor pesquisador de Economia na Universidade de Missouri, Kansas City, entende que ainda estamos vivendo uma consequência da Segunda Guerra Mundial, cujo resultado foi os Estados Unidos  assumirem o controle da organização econômica e política internacional a fim de operarem em interesse nacional próprio: “O Fundo Monetário Internacional para impor o controle financeiro dos Estados Unidos e dolarizar a economia; o Banco Mundial para emprestar dinheiro aos governos para bancar os custos de infraestrutura da criação de dependência  comercial nos alimentos e produtos manufaturados americanos; a promoção da agricultura de commodities; o controle pelos Estados Unidos/OTAN do petróleo, da mineração e dos recursos naturais; e organismos das Nações Unidas, sob o controle dos Estados Unidos, com poder de veto sobre todas as organizações internacionais criadas pelos Estados Unidos ou às quais eles se filiaram”.

A globalização da economia, com a financeirização ocupando espaço da produção; controle de suas riquezas, redução dos direitos dos trabalhadores, aposentados, entre outras ações, tudo levou a uma transferência de renda para milionários, hoje bilionários, e o aumento da pobreza no mundo. Se ocorria resistência, era usada a violência, golpes de estado e mesmo destruição de países como a Iugoslávia, Líbano, Síria e Iraque.

A burguesia dos países colonizados sempre foi aliada ao projeto neoliberal do império em troca de benesses, que na sua essência é concentrar a renda para si através do controle do Estado e da terra, inviabilizando um mercado interno consistente através de altas taxas de juros e baixos salários.

Essa mesma burguesia entrega as riquezas do país através de privatizações, principalmente as estratégicas para sua soberania, como as estatais de petróleo, minérios, energia e água em benefícios de fundos compostos de bilionários como o Citi Private Bank. Empresas saudáveis, construídas com os impostos pagos pela população são transformadas em geradoras de dividendos para esses fundos internacionais.

BNDES aprovou R$ 90 bilhões para a indústria

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já aprovou R$ 90 bilhões para a indústria brasileira desde 2023, disse o presidente da instituição, Aloizio Mercadante, durante a abertura esta semana do seminário “Descarbonização: Os Caminhos Para a Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil”. “A nossa meta é R$ 300 bilhões, já entregamos R$ 90 bilhões”, revelou. Os recursos integram o Plano Mais Produção, da Nova Indústria Brasil.

A Nova Indústria Brasil define metas para cada uma das seis missões que norteiam os esforços até 2033. Para alcançar cada meta, há áreas prioritárias para investimentos e um conjunto de ações propostas e que envolvem esforços de todos os ministérios membros do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) e do setor produtivo nacional. Serão R$ 300 bilhões para financiamentos destinados à nova política industrial até 2026.

Para reverter a desindustrialização precoce do país, a nova política prevê a articulação de diversos instrumentos de Estado, como linhas de crédito especiais, recursos não-reembolsáveis, ações regulatórias e de propriedade intelectual, além de uma política de obras e compras públicas, com incentivos ao conteúdo local, para estimular o setor produtivo em favor do desenvolvimento do país.

Segundo Mercadante, em 2023, as consultas no Banco cresceram 88%, as aprovações 32% e o desembolso 17%. “O projeto entra, é avaliado, é aprovado, o desembolso vai no ritmo em que os investimentos são feitos. É a melhor consulta dos últimos dez anos, a maior aprovação dos últimos nove anos e o maior desembolso dos últimos oito anos”, completou, referindo-se aos dois primeiros meses de 2024.

Durante sua participação no seminário, o presidente do Banco destacou ainda a importância do Fundo Clima, com recursos na ordem de R$ 10,4 bilhões, que foi regulamentado em março pelo comitê gestor. “É um instrumento novo e muito poderoso para a transição climática, para a descarbonização e para a transição elétrica”.

Mercadante lembrou que o BNDES é o banco que mais financiou energia renovável no mundo. E que 83% dos investimentos em energia renovável da América Latina, no ano passado, vieram para o Brasil. “O país tem todas as condições de liderar a transição para a economia e a transição com a energia sustentável”, disse.

Oportunidade no setor automotivo

 Para o presidente do BNDES, o Brasil está assistindo agora à recomposição da indústria automotiva. “Conseguimos aprovar R$ 5 bilhões por ano para a inovação. E uma de nossas determinações é induzir o P&D do carro híbrido no Brasil, para a gente poder ter novos produtos mais competitivos, mais eficientes, adequando a nossa realidade e a nossas potências internas”, defendeu. “O Brasil tem uma história de 48 anos com o etanol. Hoje temos etanol de segunda geração, com cada vez mais produtividade, cada vez mais eficiência. E a própria economia mundial está mostrando que essa rota é muito mais promissora do que o (carro) elétrico.”

Com BNDES

Resultados da Petrobras batem recordes, mas mídia corporativa só enxerga dividendos

Após o anúncio do resultado financeiro da Petrobras em 2023, com um lucro líquido de R$ 124,6 bilhões, segundo maior valor da história, a mídia corporativa surtou, publicando diversas matérias com viés ideológico, colunistas espumando pela boca, editoriais “demolidores”.

As ações da petroleira caíram cerca de 10% e os ADRs (American Depositary Receipts), os recibos de ações negociados no exterior, “desabaram” nas negociações do pré-mercado da Bolsa de Nova York, nos Estados Unidos. Alguns dias depois, a PETR3 subiu 3,03%  e PETR4 avançou 3,28%. Portanto, a queda no preço das ações foi um movimento circunstancial.

Tudo porque a Petrobras decidiu não pagar os dividendos extraordinários para os acionistas. A estatal anunciou que o Conselho de Administração (CA) autorizou o encaminhamento à Assembleia Geral Ordinária (AGO), prevista para 25 de abril próximo, a proposta de distribuição de dividendos equivalentes a R$ 14,2 bilhões relativos ao 4º trimestre de 2023. Caso haja aprovação da AGO, considerando os dividendos antecipados pela companhia ao longo do exercício, ajustados pela Selic, os dividendos totais do exercício de 2023 totalizarão R$ 72,4 bilhões. Já o lucro remanescente do exercício, de R$ 43,9 bilhões, a proposta do CA é de que seja integralmente destinado para a reserva estatutária, podendo ser utilizado exclusivamente para pagamento de dividendos no futuro.

“A gente segue pagando dividendo compatível com a nossa estratégia de crescimento. Investimos em projetos rentáveis que vão gerar dividendos futuros e garantir vida sustentável para a nossa empresa. Estamos olhando para as novas energias, sem abrir mão da produção de petróleo”, afirmou o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates.

O editorial do jornal O Globo de 13 de março deixou os leitores confusos. Primeiro está escrito “que a Petrobras é uma empresa de capital misto controlada pelo governo”. Logo após, “que os acionistas têm conhecimento das regras de governança que a protegem do risco de interferência do Palácio do Planalto”. Como diria Putin à Otan: Que regras? E vai adiante: “ter o controle não significa poder fazer o que se quer a qualquer hora, nem mudar a direção dos negócios ao sabor das próprias vontades”. Mas ter o controle não é exatamente isso?

Já meio atordoado por sua missão, o editorialista complementa: “Desde 2021, a Petrobras distribui entre os acionistas uma fatia extra dos lucros quando obtém bons resultados, os dividendos extraordinários. A expectativa de que voltassem a ser distribuídos neste ano alavancou as ações”. Bem, o governo Lula não pensa igual ao governo Bolsonaro em relação a Petrobras e ganhou as eleições. Os dividendos extraordinários foram suspensos porque a estatal tem planos de novos investimentos. No entanto, os rentistas brasileiros e da Bolsa de Nova York tinham a expectativa de continuarem a ganhar fortunas que praticamente nenhuma petroleira paga a seus acionistas. Realmente, a mídia corporativa perdeu a vergonha de defender interesses de fora, de bancos e fundos de bilionários.

A abertura maciça de capital da estatal só ocorreu no governo entreguista de Fernando Henrique Cardoso (PSDB): primeiro em 1997 – quando 180 milhões de ações foram vendidas na Bolsa de São Paulo – e depois em 2000 – quando a empresa passou a negociar papéis na Bolsa de Nova York.

Em 2001, a Petrobras distribuiu R$ 3,5 bilhões em dividendos, um aumento de 39% em relação a 2000.  No biênio 2021/2022, do governo Bolsonaro extrapolou ao pagar dividendos extraordinários aos acionistas, média anual de R$ 155,7 bilhões, 12 vezes maior que a média observada entre 2003 e 2020 (R$ 5,9 bilhões), conforme o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep). Claramente o objetivo do governo Bolsonaro era fatiar a Petrobras, como aconteceu com a venda da BR Distribuidora, e não investir em benefício do povo brasileiro, o verdadeiro dono da Petrobras.

Com a redução no pagamento de dividendos ordinários anunciado pela Petrobras referentes ao ano de 2023, a petroleira brasileira deixou o ranking das 20 companhias que mais pagam dividendos globalmente, elaborado pela gestora de fundos britânica Janus Henderson. Em 2022 — quando a Petrobras registrou lucro recorde de US$ 36,6 bilhões —, a petroleira figurou em segundo lugar, atrás apenas da mineradora australiana BHP.

O economista do Observatório Social do Petróleo, Eric Gil Dantas, avaliou que a reação negativa do mercado é um movimento especulativo com objetivo de pressionar a empresa a pagar os dividendos de forma imediata. “Há uma pressão para que a Petrobras pague ainda mais dividendos. Mesmo ela sendo a maior pagadora de dividendos do Brasil, o mercado sempre vai querer que a Petrobras pague mais, mesmo que isso prejudique o caixa da empresa”, destacou.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, explicou que os recursos apurados de lucro que não são obrigatórios de serem divididos (estão além do mínimo estabelecido pela Lei das Sociedades Anônimas). Os dividendos extraordinários foram para uma conta de contingência, que remunera o capital. “Num momento oportuno, o Conselho de Administração pode reavaliar a possibilidade de dividir parte ou a totalidade”, disse ao chegar ao Ministério da Fazenda acompanhado do ministro Fernando Haddad.

Com Agência Brasil, O Globo e Petrobras

Regulamentação do trabalho de motorista de aplicativo em debate

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou nesta semana um projeto de lei complementar, em regime de urgência, que regulamenta o trabalho de motorista de aplicativo. O texto foi enviado para votação no Congresso Nacional. Caso seja aprovada pelos parlamentares, passará a valer após 90 dias.

O objetivo do Projeto de Lei Complementar 12/24 é garantir aos motoristas de aplicativos um pacote de direitos trabalhistas e previdenciários e negociação entre patrões e trabalhadores via acordos coletivos. Como o texto ainda vai ser analisado por deputados e senadores, o PL pode sofrer modificações em relação ao que foi assinado pelo presidente Lula. A proposta não inclui entregadores que prestam serviço por aplicativo.

A proposta de projeto de lei é resultado de um grupo de trabalho, criado em maio de 2023, com a participação de representantes do governo federal, trabalhadores e empresas, e que foi acompanhado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

No entanto, nada disso importa para aqueles motoristas de aplicativos que estão empapados por décadas de ideologia neoliberal e apoiam o falso discurso do empreendedorismo, dos terceirizados que não têm direito a nada. Apoiam a criação de novas modalidades de contratação com a figura do autônomo, que exploram o trabalhador sem reconhecê-lo como tal, criando o fenômeno da “pejotização”, que é quando o trabalhador precisa atuar por meio de CNPJ, sem nenhum vínculo empregatício.

Acreditaram quando o então presidente Temer levantou as bandeiras das reformas trabalhistas e previdenciárias como a solução para a crise econômica do país. E ainda acreditam. Essa carga ideológica é difundida diariamente pela mídia corporativa e entidades patronais, sempre ouvidas, ao contrário dos sindicatos dos empregados. E, para viabilizar todas essas atrocidades contra os trabalhadores sem a revolta dos mesmos, ocorre uma destruição contínua, desde o Golpe de 1964, do sistema educacional público. Sem falar na intromissão da religião no Congresso e até mesmo no Supremo Tribunal Federal.

Avesso do avesso

 Num transcurso de uma corrida, perguntei para o motorista do aplicativo o que ele achava do projeto. Ele respondeu que se o projeto passasse pelo Congresso deixaria de trabalhar com o aplicativo porque teria que pagar taxas para o governo, para vagabundos do sindicato e ainda reclamou da volta do “Lula ladrão”. É contra esse tipo de mentalidade o enfrentamento dos apoiadores do projeto de Lula no Congresso.

Esse trabalhador esquece que toda a infraestrutura que utiliza nas suas viagens pelo aplicativo é viabilizada pelo Estado que ele tanto detesta, mas usufrui sem reclamar; que o sindicato existe para defender seus direitos cada vez mais precarizados, além do percentual de sua renda pagas ao INSS para garantir sua aposentadoria.

Essa visão obscura, partidária, não o deixa ver uma questão muito importante: o quanto essas mudanças vão mexer com valores das corridas. Os aplicativos vão repassar esses custos para os usuários? O sucesso dos aplicativos foi exatamente os valores inferiores aos táxis comuns e mesmo das lotações. Se isso ocorrer, uma fatia da população voltará para os ônibus e lotações.

A remuneração mínima para os trabalhadores, pelo projeto, é proporcional ao salário mínimo atual, de R$ 1.412. Foi fixada em R$ 32,10 por hora trabalhada, entendida como o período das corridas e não aquele “em espera”. Desse total, R$ 8,03 são referentes aos serviços prestados. Os outros R$ 24,07 serão para cobrir custos (celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, etc).

Assim, um trabalhador que trabalhar oito horas por dia em 20 dias no mês receberá, no mínimo, R$ 5.136. Os valores serão reajustados mediante a valorização do salário mínimo por meio de aumentos reais vinculados ao Produto Interno Bruto (PIB, conforme Lei 14.663/23). As empresas não poderão limitar a distribuição de viagens quando o trabalhador atingir a remuneração horária mínima.

A jornada de trabalho será de oito horas diárias, podendo chegar ao máximo de 12 horas em uma mesma plataforma. A proposta não prevê acordo de exclusividade. O motorista poderá trabalhar para quantas plataformas desejar e terá autonomia para organizar o tempo e horários de trabalho. Pode continuar conciliando atividades profissionais com outras responsabilidades, sem abrir mão de direitos e benefícios.

Pela proposta, os motoristas passam a ser enquadrados como contribuintes individuais para fins previdenciários e serão classificados como “trabalhador autônomo por plataforma”. O texto institui contribuições previdenciárias dos motoristas e das empresas operadoras de aplicativos, equivalentes a 7,5% (motoristas) e a 20% (empresas) do salário de contribuição (R$ 8,03/hora). As operadoras ficarão responsáveis pelo recolhimento de ambas as contribuições. Mulheres motoristas de aplicativo terão direito a auxílio-maternidade.

Os motoristas serão representados por sindicato nas negociações, assinatura de acordos e convenção coletiva, em demandas judiciais e extrajudiciais. Atualmente, não há uma mesa de negociação entre as partes que permita a apresentação de reivindicações coletivas da categoria.

Benefícios ou direitos não previstos na proposta, como plano de saúde, seguro de vida ou horas extras, poderão ser negociados no acordo coletivo. Além disso, o que for acordado em convenção coletiva não poderá ser desfeito por meio de acordos individuais.

Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, o país tinha 778 mil pessoas trabalhando em aplicativos de transporte de passageiros, o equivalente a 52,2% dos trabalhadores de plataformas digitais e aplicativos de serviços. Outro indicador mostra que 70,1% dos ocupados em aplicativos eram informais.

 

Brasil quer a taxação de super-ricos no mundo

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse durante a 1ª Reunião de Ministros de Finanças e Presidentes de Bancos Centrais da Trilha de Finanças do G20, realizada nos dias 28 e 29, em São Paulo, que o Brasil vai trabalhar para que o G20 faça uma declaração “ambiciosa” a respeito da tributação dos super-ricos. Os trabalhos do grupo – que reúne as maiores economias mundiais – estão sob presidência brasileira. No discurso que abriu o último dia de encontro na capital paulista, Haddad enfatizou que tem como principal objetivo construir a cooperação internacional para taxar grandes fortunas.

Para embasar a posição pela necessidade de tributação das famílias mais ricas do mundo, Haddad apresentou dados do relatório do EU Tax Observatory, que apontou que os bilionários ou não pagam nada, ou pagam, no máximo, 0,5% de impostos sobre o que acumulam. “Colegas, eu, sinceramente, me pergunto como nós, ministros da Fazenda do G20, permitimos que uma situação como essa continue.”

Segundo o ministro, esse pequeno grupo de pessoas se aproveita de “buracos” nos sistemas tributários para evitar o pagamento de tributos. Por isso, Haddad vê o tema também sendo tratado por outras organizações internacionais, como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que aprovou medidas para taxar empresas multinacionais.

“Quero anunciar que essa presidência buscará construir uma declaração do G20 sobre tributação internacional até nossa reunião ministerial, em julho. Consultaremos todos os membros e trabalharemos em conjunto para termos um documento equilibrado, porém ambicioso, que reflita as nossas legítimas aspirações”, afirmou, ao participar presencialmente do encontro pela primeira vez.

A Forbes USA divulgou sua lista com as pessoas mais ricas do mundo em 2023. Em todo o mundo há 2.640 fortunas de pelo menos dez dígitos. Ao todo, os bilionários do planeta agora valem US$ 12,2 trilhões.

Será uma árdua tarefa tributar os super-ricos. Desde a década de 1970, a desigualdade voltou a aumentar no mundo, principalmente nos países pobres, mas também nos ricos, com a concentração de riqueza aumentando sem parar. Thomas Piketty cita em seu livro “O capital no século XXI” o exemplo dos Estados Unidos, onde a concentração de renda na primeira década do século XXI voltou a atingir – e até excedeu – o nível recorde visto nos anos 1910-1920.

Pikkety acrescenta: “A dinâmica da distribuição de riqueza revela uma engrenagem poderosa que ora tende para a convergência, ora para divergência, e não há qualquer processo natural ou espontâneo para impedir que prevaleçam as formas desestabilizadoras, aquelas que promovem a desigualdade.”

Para ele, a história da distribuição da riqueza jamais deixou de ser profundamente política, o que impede sua restrição aos mecanismos puramente econômicos. “A redução da desigualdade que ocorreu nos países desenvolvidos entre 1900-1910 e 1950-1960 foi, antes de tudo, resultado das guerras e das políticas públicas adotadas para atenuar o impacto desses choques.”

Após o final da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos lançaram a Doutrina Truman, cuja orientação principal era a de contenção permanente e global da então URSS. Inaugurou-se a Guerra Fria.  “Doutrina Truman” é uma expressão que designa um conjunto de medidas políticas e econômicas assumidas, quando em 12 de março 1947, o então presidente Harry Truman, proferiu um violento discurso contra a “ameaça comunista”, onde diz que os EUA assumem o compromisso de defender o mundo dos soviéticos.

A Doutrina Truman foi responsável pelo chamado Plano Marshall para evitar o crescimento do comunismo na Europa e Ásia. A pesquisadora e graduanda em Relações Internacionais do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (IRID/UFRJ), Haylana Burite, calcula que no Pós-Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos gastaram US$ 182 bilhões na reconstrução da Europa, e US$ 18 bilhões, na reconstrução do Japão, por meio do Plano Marshall. Todo esse dinheiro resultou na redução da desigualdade com o Estado de bem-estar social na Europa Ocidental, conhecido como Welfare State. Boa parte desse dinheiro retornou aos EUA através de suas exportações para a reconstrução da Europa. 

 A partir dos anos 1970 começa novamente o processo de concentração de renda, com a recuperação do poder do dólar, que instaurou um novo regime de coordenação da economia mundial e abriu espaço para a financeirização, com o comando dos mercados financeiros anglo-saxões sobre as estratégias empresariais, conforme os economistas Luiz Gonzaga Belluzzo e Gabriel Galípolo, no livro com o sugestivo título “Manda quem pode, obedece quem tem prejuízo”.

Reação à globalização

O ministro Haddad pediu que seja feito um novo entendimento sobre globalização e cooperação internacional, diferente do que ocorreu nas décadas anteriores e vem sendo rejeitado por diversas populações em todo o mundo. “A atual reação à globalização pode ser atribuída ao tipo específico de globalização que prevaleceu até a crise financeira de 2008. Até então, a integração econômica global se confundiu com a liberalização de mercados, a flexibilização das leis trabalhistas, desregulamentação financeira e a livre circulação de capitais. As crises financeiras resultantes causaram grandes perdas socioeconômicas”.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou que o governo não tem uma alíquota para apresentar na sua proposta de criação de um terceiro pilar na taxação internacional que dê conta de uma tributação mínima global para as riquezas. “É um conceito. A dinâmica nos fóruns internacionais demanda um tempo maior. É preciso galvanizar o apoio na ideia, no conceito, e, a partir daí, fazer estudos de impacto, para ver o que é possível ser aceito politicamente.”

O economista e diretor do Observatório Fiscal da União Europeia, Gabriel Zucman, disse em entrevista concedida a jornalistas que cobriram a reunião do G20,  que apresentou a proposta de aplicação de uma alíquota mínima de 2% sobre a riqueza dos bilionários.  “Fiz a proposta de uma cobrança mínima de 2% sobre a riqueza de bilionários. É uma taxa baixa, mas ainda faria uma diferença muito grande. Mas acredito que podemos ser mais ambiciosos do que isso”, disse.

Solução de dois estados entre Palestina e Israel é unanimidade no G20

A solução de dois estados – um Palestino e um Israelense – foi unanimidade entre os integrantes do G20, grupo dos 20 países que reúnem as principais economias do mundo, como único caminho para a paz no Oriente Médio. A posição foi repassada na quinta-feira (22) pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, ao término do encontro de chanceleres, no Rio de Janeiro. A reunião foi a primeira de nível ministerial realizada sob a presidência brasileira no G20.

De acordo com o chanceler brasileiro, “grande número de países, de todas as regiões, expressou a preocupação com o conflito na Palestina, destacando o risco de alastramento aos países vizinhos. Vários demandaram a imediata libertação dos reféns em poder do Hamas”, completou. Mauro Vieira acrescentou que houve “virtual unanimidade no apoio à solução de dois estados como sendo a única solução possível para o conflito entre Israel e Palestina”.

Foi considerado no encontro especial destaque o deslocamento forçado de mais de 1,1 milhão de palestinos para o sul da Faixa de Gaza. “Nesse contexto, houve diversos pedidos em favor da liberação imediata do acesso para ajuda humanitária na Palestina, bem como apelos pela cessação das hostilidades. Muitos se posicionaram contrariamente à anunciada operação de Israel em Rafah, pedindo que o governo de Israel reconsidere e suspenda imediatamente essa decisão”, ressaltou.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu na quarta-feira, no Palácio do Planalto, com o chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken. Na saída do encontro de quase duas horas, Blinken afirmou que os dois países estão trabalhando juntos de forma bilateral e global, e disse ser grato pela “amizade” com o Brasil. Em nota, o Palácio do Planalto afirmou que Lula reafirmou no encontro o desejo pela paz e fim dos conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza. Os dois também concordaram com a necessidade de criação de um Estado Palestino.

O governo do presidente dos EUA, Joe Biden, está circulando um projeto de resolução no Conselho de Segurança da ONU que alertaria o exército israelense para não realizar uma ofensiva terrestre em Rafah, perto do Egito, onde mais de 1 milhão de refugiados palestinos estão se abrigando. Também pediria um cessar-fogo temporário.

Reforma na ONU

Outra unanimidade destacada pelo ministro Mauro Vieira durante o encontro de chanceleres é a necessidade de uma reforma no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), instituição multilateral máxima para temas ligados à paz mundial e resolução de conflitos e guerras. O apelo do Brasil à reforma das atuais instituições multilaterais representa a visão da maioria dos países do Sul Global. O atual sistema internacional tem sido dominado e até mesmo sequestrado por alguns países ocidentais para servir os seus propósitos hegemônicos, ignorando ao mesmo tempo os interesses dos países do Sul Global.

A presidência brasileira do G20 espera impulsionar uma reforma que inclua novos países membros, rotativos e permanentes, com aumento na representação, sobretudo da América Latina, do Caribe e da África. Atualmente, o conselho é formado por 15 países, mas apenas cinco – Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido – têm poder de veto, o que tem inviabilizado resoluções como um cessar-fogo na Faixa de Gaza, por exemplo.

Parceria Brasil e China

O vice-ministro das Relações Exteriores, Ma Zhaoxu, que representou a China na reunião de ministros das Relações Exteriores do G20, se reuniu com o ministro Mauro Vieira. Ma disse que a China está disposta a aproveitar esta oportunidade para trabalhar com o Brasil para dar continuidade aos importantes entendimentos comuns alcançados entre os dois chefes de Estado, impulsionar ainda mais as estratégias de desenvolvimento, aprofundar a cooperação em vários campos e levar as relações China-Brasil a um novo nível. A China apoia o trabalho do Brasil como presidência do G20 para promover conjuntamente o sucesso da Cúpula do G20 deste ano.

Na quarta-feira passada (21), Moscou questionou a que a segurança da Ucrânia fizesse parte da agenda do encontro, afirmando num comunicado divulgado pelo seu Ministério dos Negócios Estrangeiros que a questão é “não essencial” para o G20. “A delegação russa pretendeu chamar a atenção especial dos parceiros para a inaceitabilidade da politização do G20, que  foi concebido para se concentrar estritamente nos desafios socioeconômicos”, afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Moscou no seu site.

Falando ao jornal O Globo, o ministro de Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, disse que “a Rússia está aberta a resolver o conflito pacificamente”, mas até que as “políticas russo-fóbicas” em Kiev e no Ocidente coletivo sejam abandonadas, as “decisões de Moscou serão baseadas em nossos interesses nacionais”.

O encontro, realizado na Marina da Glória, ponto turístico na orla carioca, contou com a presença de 45 delegações de integrantes do G20, convidados e entidades multilaterais, como a ONU, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Comércio (OMC). Dos países, 32 estiveram presentes com representantes de nível ministerial.

Foi a primeira reunião em nível ministerial do G20 sob a presidência brasileira. Na semana que vem, dias 28 e 29 de fevereiro, ministros das finanças e presidentes de bancos centrais se encontrarão em São Paulo.

Também estão previstas diversas reuniões de grupos de trabalho em cidades brasileiras até o encontro final sob a presidência brasileira, quando chefes de Estado e de governo se encontram nos dias 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro.

Além de encontros em território brasileiro, o país pretende organizar uma cúpula de ministros também em Nova York, em setembro, em paralelo ao encontro anual da Assembleia Geral da ONU.

Com Agência Brasil, O Globo, Global Times e Russian Today 

 

Setor de Private Equity deveria partilhar riqueza com trabalhadores

Os executivos de Private Equity precisam “partilhar a riqueza” que criam com os trabalhadores das empresas que compram, de acordo com o responsável pelos investimentos do Calstrs (California State Teachers’ Retirement System – Sistema de Aposentadoria aos Professores do Estado da Califórnia), o gigante fundo de pensões dos EUA que é um dos maiores investidores mundiais no setor.

É importante o depoimento nesta semana de Christopher Ailman, que está deixando o cargo no fundo que gerencia US$ 327 bilhões, ao Financial Times, jornal diário de negócios britânico. Após uma década de rápido crescimento na indústria de aquisições, muitos negociadores fizeram grandes fortunas com as pesadas taxas que cobraram de investidores como o Calstrs.

Algumas empresas de Private Equity foram acusadas de obter lucros excessivos em detrimento dos interesses das empresas escolhidas e de seus funcionários. Essas críticas têm levado a um debate sobre se o setor deve ser mais regulamentado para proteger os interesses das organizações investidas e do público em geral.

Os fundadores e altos executivos de grupos dos Estados Unidos como Blackstone, KKR e Apollo Global Management desfrutaram de um aumento de mais de 40 bilhões de dólares no valor das suas ações desde o início do ano passado, à medida que os ativos  continuam a aumentar. No entanto, o capital privado não partilhou receitas suficientes, reclamou Ailman, que foi pioneiro na mudança da Calstrs para o capital privado há duas décadas, que detém agora 50 bilhões de dólares na classe de ativos.

“É ótimo que eles ganhem dinheiro para nossos aposentados – que são professores – e para outros fundos”, disse ele. “Mas precisam também partilhar a riqueza com os trabalhadores dessas empresas e com as comunidades em que investem.”

O setor de Private Equity cresceu significativamente nos últimos anos, com investimentos em todo o mundo, atingindo um valor recorde de mais de US$ 1 trilhão em negócios no ano de 2022, de acordo com dados da Pitchbook. O Private Equity tem se tornado cada vez mais o investimento preferido dos super ricos, buscando retornos espetaculares para seus patrimônios. Lembrando que 1% mais rico do mundo tem mais do que o dobro da riqueza do resto da humanidade combinada, de acordo com a Oxfam.

O Private Equity é uma forma privada de executar ações financeiras que não estejam ligadas à Bolsa de Valores, e sim diretamente com as empresas. O objetivo dos investidores, principalmente individuais, de alto patrimônio líquido, é buscar retornos significativos. Eles fornecem capital para empresas que precisam de financiamento para crescer, expandir ou se reestruturar. Em troca, esses indivíduos recebem uma participação acionária na empresa, fazendo parte da gestão e tomada de decisões estratégicas. As empresas deixam de ter a cara do dono e transformam-se em fundos de super ricos invisíveis.  

Um bom exemplo é a poderosa BlackRock, de Nova York, uma empresa gestora de investimentos global, que opera especialmente ativos e gestão de risco. Fundada em 1988, administra um patrimônio de US$ 8 trilhões. Com alta referência no mercado financeiro, a BlackRock tem a sua atuação, em especial, nos fundos de investimentos, além de fundos de pensão ou fundos soberanos.

Pressão dos reguladores

Os comentários de Ailman surgem num momento em que a indústria de Private Equity enfrenta uma pressão crescente por parte de reguladores, ativistas e investidores devido à sua crescente influência sobre o panorama empresarial estadunidense e a uma série de escândalos envolvendo trabalhadores de empresas de sua propriedade. As empresas apoiadas por capitais privados nos EUA empregam agora 12 milhões de pessoas, de acordo com o grupo de lobby American Investment Council.

A Calstrs, que aumentou a percentagem do seu fundo investido em capital privado de cerca de 10% em 2020 para quase 16% hoje, tem estado sob pressão de ativistas por causa dos seus investimentos na Blackstone. A PSSI, uma empresa de saneamento de propriedade da gigante de Private Equity, foi condenada a parar de usar trabalho infantil após uma investigação de 2022 do Departamento do Trabalho. Ailman disse que a indústria “criou uma reação” contra ela, “que precisava fazer um trabalho melhor”.

Ele acrescentou que a Calstrs vem pressionando gestores como a Blackstone nos bastidores sobre seus investimentos. “Vamos diretamente aos nossos sócios gerais para conversar, só não fizemos isso na imprensa”, disse ele. Alguns gestores de Private Equity tomaram medidas para garantir que os funcionários das empresas que possuem possam participar nos lucros, se a empresa tiver um bom desempenho.

Mais de duas dezenas de grupos de aquisição, incluindo Apollo, TPG, Warburg Pincus e Advent International, comprometeram-se com um plano chamado Ownership Works, que visa gerar mais de 20 bilhões de dólares em riqueza para os trabalhadores até 2030.

Os comentários de Ailman surgem num momento em que os retornos para os investidores de capital privado caíram drasticamente devido a uma combinação de menor crescimento econômico e taxas de juros mais elevadas, que aumentam o custo do empréstimo da indústria de aquisições para tornar as empresas privadas.

“Quando comecei, assumimos que o capital privado geraria até 500 pontos base em relação aos públicos, mas depois reduzimos para 300”, disse Ailman, que é diretor de investimentos desde 2000. “Pergunto-me se agora não é mais realista supor que o capital privado gerará apenas cerca de 150 pontos base em relação aos públicos.” Acrescentou que as taxas “eram elevadas” e “precisavam de ser mais baixas”, mas disse que o retorno líquido “ainda vale a pena” e que o fundo está tomando medidas para reduzir esses custos.

 

Desdolarização cada vez aumenta mais

Durante a crise financeira de 2008, o dólar como moeda internacional sem lastro sofreu o primeiro abalo de credibilidade desde o início dos anos 1970. No entanto, em nenhum momento, após o estouro da crise dos créditos imobiliários, o governo dos Estados Unidos aceitou discutir questões do sistema monetário internacional como a permanência do dólar como moeda global, simplesmente porque a hegemonia norte-americana ainda não estava em jogo.

O momento atual é muito diferente daquele da crise financeira, principalmente depois do conflito entre Rússia e a Otan, na Ucrânia, iniciado em fevereiro de 2022. No final de 2023, Moscou e Pequim abandonaram quase totalmente o dólar nos acordos bilaterais, informou o primeiro-ministro russo, Mikhail Mishustin, na 28ª reunião regular dos chefes dos governos dos dois países. “O comércio mútuo aumentou quase um terço no acumulado do ano. Entretanto, a maioria dos pagamentos, mais de 90%, são feitos em moedas nacionais, o que demonstra uma desdolarização quase total dos laços econômicos”, afirmou.

 O consumo mundial foi estimulado pelas importações dos Estados Unidos, que ocorreram via endividamento. Os dólares nas mãos dos exportadores são reinvestidos nos títulos públicos norte-americanos. Até agora esta foi uma equação fechada beneficiando totalmente os Estados Unidos, que crescem com o dinheiro alheio. 

No entanto, essa equação está cada vez mais difícil de fechar e o endividamento dos EUA sobe sem parar. O Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA ao final de 2008 era de U$ 14 trilhões, enquanto a dívida pública federal era de U$10,70 trilhões. Em 2018, o PIB era de U$ 20,41 trilhões e a dívida de U$ 21,19 trilhões. A evolução dos números mostra que o crescimento do período veio pelo aumento da dívida.

A dívida pública federal dos Estados Unidos ultrapassou US$ 30 trilhões pela primeira vez no final de 2022, refletindo o aumento dos empréstimos federais durante a pandemia de coronavírus, segundo dados do Departamento do Tesouro dos EUA. O Escritório de Orçamento do Congresso dos Estados Unidos (CBO, na sigla em inglês) prevê que o déficit fiscal dos Estados Unidos crescerá cerca de US$ 1 trilhão ao longo dos próximos 10 anos, em mais um alerta de que a dívida pública americana continuará a trajetória ascendente à frente.

Os títulos do governo dos Estados Unidos tradicionalmente atraíram alto interesse do mercado graças ao “retorno relativamente livre de risco” da moeda nacional, o dólar. No entanto, a tendência global para a utilização de moedas nacionais no comércio, em vez do dólar estadunidense, começou a ganhar maior impulso em 2022, depois de as sanções relacionadas com a Ucrânia terem feito com que a Rússia fosse desligada do sistema financeiro ocidental e também viu as suas reservas estrangeiras congeladas.

As sanções econômicas totalmente irregulares impostas à Rússia pelo conflito com a Ucrânia envolveram um bloqueio de US$ 643,2 bilhões depositados no Ocidente também provocaram um baque na confiança de outros países. A rapidez com que os EUA impuseram sanções à Rússia, acompanhada dos reajustes da taxa básica de juros definida pelo banco central dos EUA (o Federal Reserve), levaram a um movimento de venda de dólares e investimento em outros ativos.

 O principal diplomata russo, ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergey Lavrov, afirmou num comunicado que o dólar estadunidense é usado como instrumento para mudança de regime e interferência nos assuntos internos de outros países. “Todos” estão cansados do dólar, que se tornou num instrumento de influência, num instrumento para minar os direitos competitivos legítimos de países em diferentes regiões e num instrumento para interferir nos assuntos internos e na mudança de regime.”

Segundo a BBC News, os bancos centrais de todo o mundo estão usando os dólares de suas reservas para comprar ouro com o objetivo de reduzir sua dependência dos EUA. O Conselho Mundial do Ouro, organização dedicada ao desenvolvimento de mercado para o setor, informou que as autoridades monetárias adicionaram em 2022 a maior quantidade de ouro às suas reservas desde 1950 (início da série histórica). E os dados indicam que essa tendência continua.

O SWIFT, com sede na Bélgica, é um sistema de mensagens bancárias de alta segurança que permite transferências financeiras em todo o mundo. Embora vários países tenham os seus próprios sistemas de mensagens, a maioria das transações globais ainda são realizadas através do SWIFT. Em 2023, os principais bancos russos foram desligados da rede como parte das sanções relacionadas com o conflito na Ucrânia.

 As restrições ocidentais forçaram a Rússia a promover ativamente o seu sistema de pagamentos interno, o SPFS, como alternativa ao SWIFT. O mecanismo foi introduzido pela primeira vez quando os EUA impuseram sanções ao país em 2014. O sistema, que facilita a transferência de mensagens financeiras entre bancos dentro e fora do país, teve 514 participantes, incluindo 131 entidades estrangeiras de 15 nações, a partir do primeiro semestre do ano passado.

 Nos primeiros dias de 2024, o Irã e a Rússia saíram oficialmente do sistema SWIFT do Ocidente para um mecanismo de transferências interbancárias diretas. Para o vice-chefe do Banco Central do Irã (CBI), Mohsen Karimi, o sistema permite que empresas de ambos os países negociem nas suas respectivas moedas nacionais em vez de usarem o dólar ou o euro, informou a agência de notícias FARS.

“Isto significa que os bancos dos nossos dois países já não precisam da Suíça para comunicar entre si e os bancos comerciais de ambos os países podem estabelecer relações de corretagem entre si. O exportador [iraniano] pode agora cobrar do lado russo em riais e receber dinheiro deles através de bancos russos no Irã”, acrescentou Karimi, observando que o sistema também permite pagamentos em rublos russos.

A participação do dólar americano nas reservas globais dos bancos centrais continuou a diminuir, caindo para 59,2% no terceiro trimestre de 2023, de acordo com os últimos dados divulgados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). O declínio ocorre em meio à tendência de desdolarização que ganha impulso em todo o mundo.

 As estatísticas do FMI mostram que a participação do dólar caiu em relação aos cerca de 70% em 2000. O dólar continua a ser a principal moeda de reserva do mundo, com o euro a ocupar o segundo lugar, enquanto a participação deste último caiu para 19,6%. A proporção do iene japonês nas reservas mundiais cresceu para 5,5%, face a 5,3% no período de três meses anterior. O yuan chinês, a libra esterlina, o dólar canadense e o franco suíço permaneceram pouco alterados.

 Entretanto, de acordo com dados compilados pelo serviço global de mensagens financeiras SWIFT, a participação do yuan nos pagamentos internacionais atingiu um máximo histórico em novembro de 2023, com o renminbi a tornar-se a quarta moeda mais utilizada em todo o mundo. Os empréstimos transfronteiriços em yuan também aumentaram, enquanto o Banco Popular da China mantém mais de 30 swaps cambiais bilaterais com bancos centrais estrangeiros, incluindo a Arábia Saudita.

Com Russian Today e RIA Novosti e Tass