Georreferenciamento em propriedades rurais é prorrogado desde 2000

O governo brasileiro editou nesta semana o Decreto nº 12.589, que amplia em quatro anos, até outubro de 2029, o prazo limite para a exigência de certificação de georreferenciamento dos imóveis rurais que são objeto de transferência. O texto foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União.

Desde o ano 2000 (Decreto 4.449/2002, INCRA, Lei 10.267) o georreferenciamento foi implantado no Brasil, e os prazos vêm sendo sucessivamente prorrogados, o que ajuda a entender o poder político de proprietários de terras, que muitas vezes resistem ou tentam ocultar informações sobre suas propriedades georreferenciadas por uma série de motivos econômicos, fiscais e até políticos.

“Assinei o decreto porque esta semana venceria o prazo para o georreferenciamento das propriedades rurais. Isso dá um prazo mais longo para que todos possam se adequar à lei e promover o georreferenciamento”, afirmou Geraldo Alckmin, presidente da República em Exercício. A extensão do prazo de adequação foi proposta pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). E nada mais foi dito pelo governo federal. A imprensa corporativa não toca no assunto há 25 anos.

O georreferenciamento é o processo de mapeamento técnico que define a localização, os limites e a dimensão de um imóvel rural por meio de coordenadas geográficas. Para isso, utilizam-se técnicas de levantamento topográfico, como GPS de alta precisão, drones ou até imagens de satélite.

A exigência de georreferenciamento por lei garante a exatidão dos limites de cada terreno e evita sobreposições com outras propriedades. O procedimento é necessário para transações como venda e doação, acesso a crédito rural e para fins de registro e regularização.

O georreferenciamento torna o imóvel rural plenamente identificado (limites, área exata, titularidade e uso do solo). Isso facilita a cobrança do ITR (Imposto Territorial Rural) com base real na área e grau de utilização da terra. A identificação de subdeclarações, pois muitos proprietários informam ao fisco uma área menor ou subutilizada para pagar menos imposto. Assim, quanto mais precisa for a informação, menor a margem para evasão fiscal.

Questões ambientais

Além dos limites físicos e legais da propriedade rural, o georreferenciamento controla o que é plantado, gestão produtiva, econômica e fiscal da terra, quantidades e registros de aplicação de agrotóxicos, além de identificar e manter limites de áreas de preservação e reserva legal. Também a origem e destino da produção, especialmente importante em cadeias exportadoras como soja, café e carne.

Com o cruzamento do georreferenciamento com imagens de satélite e cadastros ambientais (CAR), o Estado passa a saber a extensão real de desmatamento, áreas de reserva legal ou APPs invadidas, e se há uso irregular do solo (como plantio em áreas protegidas). Isso gera risco de multas e embargos ambientais, além de ações civis públicas.

 Irregularidades fundiárias

Muitas grandes propriedades rurais brasileiras têm origens documentais problemáticas, como sobreposições (duas ou mais propriedades sobre a mesma área); grilagem (falsificação de títulos para apropriação ilegal), apropriação de terras públicas (devolutas). O georreferenciamento revela essas incongruências, podendo levar à perda de posse ou à revisão judicial de títulos.

Concentração fundiária

A precisão do mapeamento mostra quem realmente possui a terra no Brasil — o que ameaça interesses de quem detém latifúndios improdutivos, ou ocupa terras públicas sob aparência de propriedade privada. A transparência do cadastro pode fortalecer políticas de reforma agrária, reduzir a especulação fundiária e expor grandes desequilíbrios regionais de posse.

Especulação e valorização imobiliária

Alguns proprietários preferem manter áreas “na sombra” para negociar informalmente; evitar fiscalização sobre transações, ou lucrar com futuras regularizações, aumentando o valor da terra quando o registro for oficializado.

Portanto, o georreferenciamento representa transparência fundiária — e transparência, no campo, significa controle estatal, justiça fiscal e ambiental.
Por isso, muitos proprietários de grandes áreas adiam ou resistem à sua implementação: quanto mais o Estado sabe, menor o espaço para irregularidades, subdeclarações e especulação.