O crescimento significativo no número de prefeituras que serão comandadas por legendas do chamado Centrão e da direita a partir de 2025 não deveria surpreender ninguém. Há décadas os meios de comunicação corporativos controlam boa parte da informação, totalmente distorcida da realidade brasileira, destinada a uma população com educação precária e envolvida por pseudorreligiosos, que servem mais ao poder político do que à verdadeira espiritualidade. Rousseau, no Contrato Social, publicado em 1762, já argumentava que as religiões organizadas podem corromper o Estado, ao misturar a autoridade religiosa com a política.
Na origem do jornal Última Hora (UH), criado e dirigido pelo jornalista Samuel Wainer, estava a figura do presidente Getúlio Vargas (1882/1954), que chegou ao poder na Revolução de 1930 e governou o país até 1945, numa primeira etapa. A ideia inicial do Última Hora foi de Vargas, que conheceu Wainer quando este foi fazer uma entrevista com o então ex-presidente, em 1949.
Vargas estava “exilado” na sua fazenda em São Borja desde que fora deposto, mas já planejava seu retorno. Em 1950, voltou ao poder, eleito democraticamente. A UH foi criada em 1951 e defendeu o governo durante todo o seu mandato (1951-54). Por conta disso, enfrentou uma série de campanhas que ameaçavam a sua própria existência.
Mesmo assim, a crise política que levou o presidente Vargas ao suicídio em 24 de agosto de 1954 foi em grande parte montada pela imprensa carioca, liderada pelo O Globo, naquela época a mais importante do País pela quantidade e peso dos jornais.
O Partido dos Trabalhadores (PT) até tentou enfrentar a mídia corporativa nos quatro períodos que esteve na Presidência da República e no atual mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Até agora, não conseguiu.
No primeiro mandato de Lula, 2003/2006, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) se envolveu diretamente em debates sobre a necessidade de uma regulação mais democrática da mídia, combatendo a concentração de poder nas mãos de poucas famílias e grandes grupos empresariais de comunicação.
Apesar de algumas conquistas importantes no período, com o fortalecimento de rádios comunitárias e iniciativas voltadas para ampliar o acesso à internet, muitos dos principais desafios defendidos pelo FNDC, como a regulação dos monopólios midiáticos, enfrentaram grande resistência por parte de setores conservadores e empresariais da mídia brasileira. Assim, a luta pela democratização da comunicação permaneceu um tema importante e pendente no cenário político nacional.
Em julho de 2005, o então senador Hélio Costa (PMDB-MG) assume o Ministério das Comunicações, indicado pela bancada pelo PMDB, hoje MDB, no Senado. O jornalista ficou conhecido por sua atuação como repórter da Rede Globo. Durante o segundo governo Lula, 2007/2010, Costa via a criação de uma TV pública como desnecessária e acreditava que o foco deveria ser na modernização da radiodifusão comercial e na digitalização da televisão no Brasil.
Na Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, buscava uma TV pública com maior autonomia editorial e compromisso com a pluralidade, sem interferência do mercado. Esse conflito gerou impasses na definição do modelo da TV pública. As grandes emissoras de televisão, especialmente a Rede Globo, exerceram forte pressão para evitar a criação de uma TV pública que pudesse concorrer com as emissoras privadas ou que tivesse um papel mais relevante no cenário midiático.
Por essas razões, o projeto de TV pública acabou não indo adiante como planejado, e, no lugar, foi criado em 2007 a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), com uma estrutura mais próxima de uma emissora pública, embora enfrentando desafios e críticas até hoje. Hélio Costa deixa o Ministério das Comunicações em abril de 2010.
A EBC, responsável por veículos como a TV Brasil, Rádio Nacional e a Agência Brasil, foi criada durante o segundo mandato de Lula para garantir a difusão de informações de interesse público de forma imparcial e apartidária. No entanto, sua estrutura e missão foram bastante contestadas e reestruturadas ao longo dos anos. Durante o governo Bolsonaro, a EBC sofreu cortes de orçamento, mudanças na linha editorial e passou por uma tentativa de desmantelamento de suas características de serviço público.
Em outubro de 2023, durante o terceiro mandato de Lula, Hélio Doyle foi demitido da presidência da EBC após repercussões negativas geradas por uma repostagem em suas redes sociais. Ele compartilhou uma mensagem sobre o conflito entre Israel e o Hamas que criticava apoiadores de Israel, o que foi considerado inapropriado pelo governo. A postagem foi vista como contrária à postura oficial do governo Lula, que buscava manter uma posição neutra no conflito. Essa situação levou à sua exoneração a pedido do ministro Paulo Pimenta.
Governo Dilma
A comunicação pública durante o governo Dilma Rousseff (2011/2016) foi marcada por um esforço de adaptação às novas dinâmicas digitais e a crescente polarização política. Embora houvesse tentativas de democratizar o acesso à informação e de usar novas tecnologias para dialogar com a população, o governo enfrentou crescentes dificuldades em contrapor a narrativa negativa da grande mídia com o início da Operação Lava-Jato, em março de 2014, liderada por Sérgio Moro, juiz de 1ª instância em Curitiba, que é acusado de ter sido treinado por autoridades dos Estados Unidos para levar a presidenta Dilma Rousseff ao impeachment e destruir a economia brasileira. O impeachment de Dilma expôs as limitações da comunicação pública em tempos de intensa polarização e crise institucional. Naquele momento, ficou difícil vestir uma camisa do PT em público.
Lula 3
Desde o início do terceiro governo Lula, em 2023, continuam os desafios das questões históricas da democratização da comunicação no Brasil, como a concentração da propriedade dos meios de comunicação, e novos desafios, como a hegemonia das big techs, Google, Meta, X e Microsoft, e a disseminação de desinformação.
Atualmente, o governo Lula quer endurecer a regulação brasileira, mas para que os negócios no país não sejam prejudicados por práticas anticompetitivas das big techs. Elas lideram a lista de maiores empresas do mundo, com valores acima de US$ 1 trilhão (R$ 5,58 trilhões).
Apesar das expectativas de mudanças, algumas ações do governo têm sido vistas como um favorecimento à mídia comercial. A nomeação do maranhense Juscelino Filho (União Brasil), como Ministro das Comunicações, foi um exemplo disso. Ao longo de sua atuação no Legislativo, Juscelino votou a favor de pautas que o PT rejeitava, como o impeachment de Dilma Rousseff, Reforma Trabalhista e a PEC do Teto dos Gastos Públicos. Em junho de 2024, a Polícia Federal indiciou Juscelino Filho por crimes como corrupção passiva, fraude em licitações e organização criminosa. Juscelino continua no cargo.
A regulação das plataformas digitais é um tema que está ganhando destaque no Congresso Nacional do Brasil. O foco das discussões gira em torno da criação de um marco regulatório para plataformas digitais, como redes sociais, aplicativos de mensagens e serviços de streaming. O debate envolve questões relacionadas à desinformação, responsabilidade das plataformas, privacidade de dados, transparência de algoritmos e combate ao discurso de ódio.
Essas discussões refletem um esforço para equilibrar a liberdade de expressão, a proteção da privacidade e a responsabilidade das plataformas digitais no Brasil. A regulação é uma questão complexa, governo federal e Congresso conservador ainda estão em fase de debates e ajustes nas propostas para encontrar um modelo que atenda a essas demandas, ao mesmo tempo que evita violações de direitos.
Enquanto isso, a Comunicação no Brasil continua, em sua maioria, nas mãos de poucas famílias e grandes grupos empresariais e religiosos.